Convite à literatura - Sarau Virtual

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ARAU

Convite Ă literatura Textos publicados no Sarau Virtual da Unafisco

Volume Um



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ARAU

Convite Ă literatura Textos publicados no Sarau Virtual da Unafisco

Volume Um


Convite à literatura — Textos publicados no Sarau Virtual da Unafisco — Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil. Jornalista Responsável: Julio Scarparo (MTB-SP 45.245) – Jornalista: Bruno Chagas – Designer: Alencar Botari – Banco de imagens: SXC – Tiragem: 500 exemplares – Sede Administrativa da Unafisco Associação Nacional: – Av. Ipiranga, 1.267, 14º andar – República – São Paulo, SP – CEP 01039-907 – Tel. (11) 3228-4766 E-mail: comunicacao@unafiscoassociacao.org.br – Site: www.unafiscoassociacao.org.br.


Índice Convite à literatura

Apresentação

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O curandeiro

9

Alzira Ebe

Amizade

11

Vida

13

Abigail: mediunidade e redenção

15

Um cearense no céu

17

O heróico aratuense

19

Canto pela paz

21

Monalisa de reservado

23

Eu queria voltar no tempo…

25

A criança-anjo e o arco-íris

27

Status quo

29

Modéstia à parte

31

Infernos

33

Amilton Paulo Lemos Anastacia Lucia Baran Antônio Carlos Guimarães Carlos Louzada Páscoa Djalma Jacobina Neto Ernesto Weber Rossa Eurídice Macedo Pinheiro

Jandyra Adami Neves de Carvalho José Carlos da Silva

José Cezar Matesich Pinto José Peixoto Júnior

Marco Aurélio Barbiero

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Diretoria 2010-2013 Presidente Paulo Fernandes Bouças – Aposentado/RJ

Diretor Adjunto de Comunicação Social Francisco Paulo Favilla – Aposentado/RJ

1º Vice-Presidente Ildebrando Zoldan – Aposentado/SP

Diretor de Assuntos de Aposentadoria, Proventos e Pensões José Carlos Nogueira Ribeiro – Aposentado/SC

Secretário-Geral Marco Aurélio Baumgarten de Azevedo – Aposentado/RS 1ª Secretária Massumi Takeishi – Aposentada/SP Diretor de Finanças e Contabilidade Narayan de Souza Duque – Defis/SP Diretor Adjunto de Finanças e Contabilidade José Ricardo Alves Pinto – Defis/SP Diretora de Administração Aparecida Bernadete Donadon Faria – Aposentada/SP Diretor de Assuntos Jurídicos Valmir da Cruz – DRF – São José do Rio Preto/SP Diretor Adjunto de Assuntos Jurídicos Kleber Cabral – Deain/SP Diretor de Defesa Profissional e Estudos Técnicos Jairo Luís Soares Tenório – Defis/SP Diretor de Comunicação Social Alcebíades Ferreira Filho – Aposentado/MG

Diretora Adjunta de Assuntos de Aposentadoria, Proventos e Pensões Icléa Camargo Lima – Aposentada/SP Diretora de Eventos Associativos, Recreativos e Culturais Nélia Cruvinel Resende – Aposentada/GO Diretor de Convênios e Serviços Carlos Alberto Ramos G. Pacheco – Inspetoria – Confins/MG Diretor de Coordenação das Representações Regionais Amilton Paulo Lemos – Aposentado/PR

Conselho Fiscal

Efetivos: Jorge do Carmo Sant’Anna – Defis/SP José Aloísio Barroso Nunes – Aposentado/CE Osvaldino Messias de Aragão – Aposentado/RJ Suplentes: Osmário Mendonça de Paula – Aposentado/GO Wilson Meira – Aposentado/DF


Apresentação É com satisfação que a Unafisco lhe oferece este livro, elaborado originalmente para ser distribuído durante o nosso 3º Encontro Nacional de Aposentados e Pensionistas, realizado em outubro de 2012, na cidade de Gramado/RS. A obra reúne, neste primeiro volume, textos de nossos associados que foram publicados no Sarau Virtual da entidade, www.unafiscoassociacao.org.br/sarauvirtual. São manifestações literárias que, de uma maneira ou outra, lançam luz em uma determinada questão intrínseca ao ser humano. Os associados que também desejarem participar do Sarau Virtual podem enviar poesias, crônicas, etc. para o e-mail sarau.virtual@ unafiscoassociacao.org.br. Boa leitura!

UNAFISCO ASSOCIAÇÃO NACIONAL

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O curandeiro Alzira Ebe — Avaré/SP

O

velho Zé Bento tinha um único filho, Toninho, deixado pela mulher quando morrera de doença do coração.
Zé Bento nascera na fazenda e dela nunca saíra. Tudo que conhecia deste mundo era o imenso canavial, um oceano verde que se estendia em toda direção. Assim como seu pai e avô o fizeram, após a labuta diária, Zé Bento folheava o Manual de Medicina Popular do Dr. Chernoviz, já gasto por tantos anos de uso e com marcas de mão. No manual encontrava a descrição das moléstias, bem como os conselhos úteis e medicamentos que deveriam ser empregados em cada uma delas, de fácil formulação. O povo das redondezas recorria a ele em busca de alívio para suas dores e males, já que Zé Bento era o curandeiro da região. Na horta havia muitas ervas, como alecrim, boldo, camomila, hortelã e agrião. Seguia as orientações do livro para utilizar as plantas em infusão ou maceração. Só se afastava de sua casa a fim de visitar um amigo ou parente, ou para levar alívio das dores e cura a um doente ou para velar um corpo e confortar a família enlutada com uma oração. Das modernidades da cidade só conhecia os caminhões que transportavam a cana, os tratores, um velho radinho de pilha que trocara com um motorista por um galo briguento e o carro do patrão. Seu filho Toninho desde criança ajudava o pai, indo até onde estava a lida, matando a sede dos trabalhadores suados, oferecendo água fresca de um garrafão. Toninho começou a fazer pequenos trabalhos de adulto assim que teve forças para segurar uma enxada ou um facão. Pai e filho ouviam no rádio as notícias de desastres, mortes, crises [continua] 9


O curandeiro

econômicas, vida de artistas, jogos de futebol e as músicas sertanejas que falavam de amor, vingança e traição. Com isso, Toninho prometeu a si mesmo que sairia daquela fazenda e correria o mundo em busca de diversão.
Um dia, na cidade, Toninho soube que estava havendo um curso de tratorista e procurou se inscrever. Não conseguiu, pois era exigido o diploma de primeiro Grau, o que lhe causou grande decepção. Para se informar sobre a continuação de seus estudos, Toninho foi até a cidade pedalando sua bicicleta comprada de segunda mão. Inscreveu-se no Curso Supletivo e em aproximadamente um ano e meio, Toninho conseguiu seu diploma de Primeiro Grau, superando a primeira fase de seu projeto de vida, sendo que agora poderia dedicar-se ao aprendizado de uma profissão. Foi na praça que viu pela primeira vez Maria, moça miúda, clarinha, de cabelos escuros e ondulados, vestida com elegante simplicidade, que lhe chamou a atenção. Maria viu Toninho e sorriu. Aquele sorriso o emocionou e acelerou seu coração. Domingo vai, domingo vem, Toninho sempre vendo Maria de longe, recebendo tímidos sorrisos que lhe causavam muita emoção. Aos poucos, as trocas de sorrisos foram se transformando em trocas de cumprimentos, depois em conversas e em pouco tempo os dois já passeavam na praça de mãos dadas, bem juntinhos, de cochichos nos ouvidos um do outro, demonstrando grande paixão. Foi um amigo que lhe preveniu que a garota não era para o seu bico, pois era filha de gente rica que morava na cidade, num casarão. Procurou saber quem era sua família e, pergunta daqui e de lá, sem dar muita bandeira, perturbado, de coração palpitante, descobriu que Maria era a filha do dono da fazenda, seu patrão.

A íntegra do conto O Curandeiro se encontra no Sarau Virtual da Unafisco (http://bit.ly/ocurandeiro).


Amizade

Amilton Paulo Lemos — Curitiba/PR

T

er uma boa amizade é importante. Encontrar amigos os quais não vemos a tempo. Conversar e colocar os papos em dia.

É salutável, agradável e proveitoso. Amizade é desprendimento. Um cafezinho. Um abraço. Um sorriso. São momentos preciosos da vida. Relembrar fatos, passagens e acontecimentos. Para os mais idosos, os filhos e netos são as lembranças que aparecem nas conversas. Para os jovens os tempos escolares. Lembranças dos namoros, bailes, festas e aventuras. Há bastante assunto para conversar. Uma boa amizade quando consolidada, no passar dos anos ela torna-se duradoura. Um amigo não se compra, se conquista. A amizade está dentro do coração de cada pessoa.

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Vida

Anastacia Lucia Baran — Curitiba/PR

N

o mundo da criação Amigos somos, no ar Na água, somos também Se o fogo nos afligir Temos a terra que acolhe As vidas que o mundo tem. Ressurreição é vida nova Que brota dentro de nós É vida que se renova Na consciência mais pura De vencermos o algoz, Dando ao mestre uma prova De seguirmos seu preceito E honrarmos o que é direito. E assim vamos caminhando Na terra que bem nos quer No verde que vem brotando Com o ar se misturando Como um sono profundo Transformando o ar mais puro Em oxigênio, que em tudo Onde estamos presentes, Conserva o nosso ente E a nossa vida, requer.

Ressurgindo um novo ser No meio que nos acolhe, O amor proliferando, Como da flor, o pólen, A vida sempre benigna, E trazendo lá no fundo O mais completo enigma, Que o criador deu ao mundo. E como um sono tranquilo Alegres perpetuamos, O sonho que nós vivemos Dele sermos semelhantes E ter o mundo que queremos E a vida que tanto amamos. 13



Abigail: mediunidade e redenção

Antônio Carlos Guimarães — Belo Horizonte/MG

E

le me faz repousar em pastos verdejantes. Leva-me para junto das águas de descanso. (SALMOS, cap. 23, v. 2).

A cidadezinha de Águas Virtuosas é vista como a mais bonita da região das estâncias hidrominerais do Sul de Minas. Situada no centro de um vale suntuoso, em forma de concha, é resguardada ao norte das fortes correntes de ar pela imponente e majestosa Serra das Águas, que se alteia a mais de mil e duzentos metros. Ao sopé da montanha, através do rio Mumbuca, que nessa serra tem sua cabeceira, águas cristalinas serpeiam e rolam ligeiras, borbulhando nas pequenas quedas e nos trechos mais sinuosos. No centro da várzea em que manam as águas avigorantes, um casario modesto mas bem ordenado se distribui por ruas e avenidas largas e bem traçadas, que revelam adequado planejamento urbano. Ao derredor, como a emoldurar o vale, erguem-se colinas e montes. Uma longa encosta, denominada Sertãozinho, abriga em seu topo o cruzeiro; um outeiro mais sóbrio, a matriz de Nossa Senhora da Saúde. Ao sul avista-se o pico do Morro do Selado, a sudoeste a Serra de Santa Catarina, a nordeste as montanhas de Conceição do Rio Verde, próxima da qual se cortou o Caminho Velho da Estrada Real. Nuanças de verde pintam esse belo quadro montanhês: verdivivo nos morros mais próximos e tons verde-azulados que aos poucos se acinzentam nos montes mais ao fundo. De qualquer dos pontos elevados mais próximos, pode-se mirar obras do engenheiro Américo Werneck — o prédio do cassino, o lago, o farol, a cascata, o parque novo —, que acentuaram à cidadezinha o seu ar de estância européia e a prepararam para vir a ser um grande centro de turismo. [continua] 15


Abigail: mediunidade e redenção

E assim também se avista a linha férrea, que corre ao entorno, e liga a aprazível vila aos principais centros urbanos do país. A esse sítio montanhoso tão extraordinário, permanentemente exposto ao sol, a Natureza dotou ainda de vária vegetação e de clima suave, bem dosado entre o quente e o frio, no qual se goza de ar puríssimo e de atmosfera vivificante. São essas fontes de águas medicamentosas e o cenário encantador, tão nutritivos ao espírito quanto ao corpo, que atraem milhares de turistas nas estações de veraneio à busca de repouso, tranquilidade e saúde. Corria o ano de 1925, quando um jovem alto, forte, desempenado, tez amorenada de quem lida ao sol, desceu a Serra das Águas ao trote seguro e macio de uma vistosa mula ruana, cuja toada seguia livre, que o cavaleiro deixara soltas as rédeas, com o pensamento vagando longe e a ponta de um sorriso a vincar-lhe o canto dos lábios. Retornava ele da Ressaca, distrito de São Gonçalo do Sapucaí, onde fora pedir a mão de Margarida Augusta Fernandes, moça pequena e formosa que lhe tomara, de um só
golpe, o coração e a alma, há dois meses passados. O sorriso que ensaiava nascer tinha como origem a cena do primeiro encontro. Numa visita inesperada ao sítio em que morava, Margarida e sua mãe Francisca Finalda surpreenderam-no a espojar-se pelo
chão da sala, brincando com Guiomar e outros sobrinhos, que entre gritarias haviam-lhe enfeitado os cabelos negros e fartos, penteados para trás, com flores campestres, e se divertiam com as momices daquele tio de mais de vinte anos a comportar-se como um menino. Recordava-se bem do rubor que lhe cobrira o rosto e do desacocho que passou para cumprimentar as recém-chegadas. Agora fazia planos de ter com Margarida uma casinha repleta de alegria das suas próprias crianças.

Trecho da obra Abigail: mediunidade e redenção, publicada em 2009 pela editora Casa Espírita Francisco de Paula Vítor.


Um cearense no céu

Carlos Louzada Páscoa — Brasília/DF

U

m justo chegando ao Céu Cheio de curiosidade Andou por ali ao léu Olhando a Divina Cidade Vibravam músicas suaves De harpas, violinos e banjos E, como belíssimas aves Passavam cantando os anjos … Sorrisos por toda parte Por toda parte esplendores Mundo de prantos e dores Quem poderá ali recordar-te?! O justo maravilhado Continuava o passeio Quando de surpresa cheio Viu um sujeito amarrado Pegando um anjo pela asa Pediu-lhe uma explicação E o anjo disse: “É um cearense saudoso Quer voltar pro Ceará!” Escolham um cearense arretado, “caba da peste”, para recitar esse hino ao amor à “terrinha”. 17



O heróico aratuense Djalma Jacobina Neto — Salvador/BA

Tributo a Cleomir Ferreira Pontes

A

lgum tempo atrás uma criança por aqui brotou
 Abriu os braços aos céus e em um desejo profundo Balbuciou sobre um certo futuro de encantos de Iemanjá Com bravos gritos a um mar sulcado pelas veias do mundo Chamou pelas divindades no anseio de um destino ensejo Esparramou-se em um almejo tão lindo uma revoada de bênçãos Sobre uma terra promissora de amores e de alegrias Em um rincão tão belo e sagrado de um estado de alma Bahia O menino que em espírito tão livre sentia-se em pura energia Tão jovem e já em tenra mirada visava o horizonte azul Desejo que de tanto fervor cativou uma alma que havia Amante de uma água então fria do mar da baía de Aratu Chegou assim ao termo clamado por uma criança pujante Com um destino marcado por deuses para a faina servir Honesto e em humilde vontade grande alma cativante Galante e amigo sereno em forma de ser de Cleomir Era um desafio à altura do bronze de um brio infatigante Um porto do mundo que frágil como uma criança se pense Viu-se protegida de tudo pela verve fulgurante De um ser humano vertido em HERÓICO ARATUENSE. 19



Canto pela paz Ernesto Weber Rossa — Florianópolis/SC

V

oa simbólica pomba branca Voa bem alto e muito ligeiro Percorre logo o mundo inteiro Levando esta mensagem franca Ao budista, judeu, muçulmano, E também ao que se diz cristão Enfim a todo vivente ser humano Que esteja em paz, ou ainda não. Vai pelo mundo carente de paz, vai Leva a toda criatura esta afirmação: Todo ser foi gerado pelo mesmo Pai Para vir aprender e evoluir na Terra. Acredite nesta mensagem ou não Necessita acabar com toda guerra Pois cada um é do outro o seu irmão. Esta é a real e grandíssima verdade A ser aprendida pela humanidade. A fim de acabar com o danoso mal 0 caminho é o da vera fraternidade Porque como este não há outro igual A verdadeira Fraternidade Universal.

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Monalisa de reservado
 Eurídice Macedo Pinheiro — Salvador/BA

N

o banheiro, eu sou por inteiro. E quem não é no banheiro verdadeiro? Somente pele e sem panos, não há quem não se revele. No banheiro, eu sou palhaça, eu acho graça e não disfarço. Não nego a dor, sofro, choro e o sal da lágrima transforma em mar uma simples chuveirada! No banheiro, sou sexy, sexo, sou Madona encarnada. O sabonete, meu microfone, espuma delicada que acaricia e amplia o desejo perfumado. O estreito palco molhado se transforma em um Maracanã lotado! Enquanto o estresse desce pelo ralo. No banheiro eu canto Roberto Carlos, lavo as mãos nas águas de março com Elis Regina, choro com Shakespeare, no dilema de ser ou não ser. Rio e zombo de Descartes, aciono a descarga, e coloco a matéria no seu devido lugar. Sentada no vaso, relaxada, me faço realista e dispenso o analista. Que Freud que nada! É na privada que se descobre, como disse o Poeta, “a delícia e a malícia de ser o que é”. No banheiro às vezes penso: ah! Se me vissem assim… como sou de fato, na certeza do anonimato. Lá fora sou de direito, aqui, nunca se viu mais torta! E, no espelho, uma Monalisa de reservado, me olha com indisfarçável e despudorado sorriso. A única testemunha cúmplice de mim. Saio refeita, cara limpa, cabeça feita e alma lavada. 23



Eu queria voltar no tempo…

Jandyra Adami Neves de Carvalho — Belo Horizonte/MG

E

u queria voltar no tempo. Qualquer dia…qualquer hora. Viver o que não vivi. Ser mais feliz do que fui Queria aproveitar os momentos. Ter e dar alegria em abundância Ser mais otimista e alegre. Saber encarar meus 20 anos com a felicidade e o charme que tinha, para desfilar em todas as passarelas. Vibrar mais com os aplausos… Acreditar que era bonita e aceitar os galanteios com prazer…
 Queria ter meus 11 anos, quando recebi Jesus pela primeira vez em meu coraçãozinho tão puro. Aproveitar bem a presença de meu pai, antes de sua partida quando eu tinha só 10 anos. Voltar à infância, naquela pureza de meu tempo. Cantar, dançar, com meu pai ao piano. Fazer tudo que fazia, com a família reunida. Cabelos cacheados, olhos bem verdes… Linda menina eu era… Voltar para os braços da mamãe e de todos. Ser aquele bebê bonito que todos amavam.

[continua] 25


Eu queria voltar no tempo...

Alimentar-me com o leite materno, mais puro e cheio de amor, amor de mãe que é o maior que existe. Queria, depois, voltar ao útero materno, lugar mais protegido que tem o ser humano. E, finalmente, queria ser o orgasmo de um casal apaixonado, pois eu fui feita com muito amor… O verdadeiro amor de duas pessoas que viveram somente uma para a outra: Meu pai e minha mãe…

O poema faz parte do e-book Sonhos e lembranças.


A criança-anjo e o arco-íris José Carlos da Silva — Goiânia/GO

Q

uando era criança me disseram que no fim do arco-íris havia um pote de ouro. Pensei logo: “Nossa” vou ser “dono” de um tesouro. Nos anos que sobravam da meninice, armado de um estilingue, eu tornei-me um intrépido caçador de arco-íris. Certa vez, enquanto atravessava um campo em desabalada carreira, com os olhos fitos nas cores do horizonte, caí. A serpente da desesperança, que sempre espreitava, deu o bote e me picou. Destilou todo seu veneno, mortal para os sonhos nascidos puros. Quando levantei o arco-íris ainda estava lá, mas eu não queria continuar, havia perdido a FÉ. Passaram-se os anos e já nem me recordava, mas não era o fim. Podemos haver desistido do arco-íris, ainda assim, por uma GRAÇA, ele vem até nós. Um dia o arco-íris passou por minha casa. Trouxe consigo, brincando de “escorregador”, um anjo aprendiz disfarçado de criança especial, um tesouro com o qual não sonhara. Essa criança-anjo, sem a menor cerimônia, enfiou sua mãozinha dentro do meu peito e segurou meu coração, apertou tanto que quase me matou. Quando soltou, seus dedos tinham deixado marcas, que inflamam ao sabor dos seus suspiros. Depois povoou minha casa de sorrisos mágicos, capazes de inebriar a alma, deixando todos meio que “loucos” de felicidade. Desde então, eu e minha família temos vivido como dizia um poeta (do qual não me recordo): “A vida não é para ser contada pelo número de respirações, mas pelo número de vezes que perdemos o fôlego”.

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Status quo

José Cezar Matesich Pinto — Alvorada/RS

Às vezes me retraio e me coloco Muito longe de todos e de tudo, Me abraço em mim, com todo conteúdo Dos sonhos com que vivo e me provoco. Outras vezes, porém, me torno o foco Das atenções do mundo, sobretudo, Se invento frustrações e não me acudo Das tempestades que produzo “in loco”. Assim eu vou viver cada momento, Enquanto coração e pensamento Andem buscando suas razões de ser. Até que um dia, num lugar qualquer, Eu me contente com o que tiver, Me diga adeus e deixe de viver.

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Modéstia à parte José Peixoto Júnior — Brasília/DF

E

u quase que cheguei a sonetista. Fazia versos com rigor e arte, Não eram versos ruins, modéstia à parte, Mesmo não sendo versos de um artista. Eu me considerava bom versista, Modéstia à parte, posso confessar-te Não decorava os versos meus, destarte Não podia deles ser propagandista. Os produzia assim, de improviso, Arrebanhava ritmo e rimas E os soltava à toa sem mandar aviso. Reconheço, não foram obras-primas. No versejar eu, hoje, já agonizo, Seca-me a terra das frutas opimas.

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Infernos

Marco Aurélio Barbiero — Passo Fundo/RS

C

omo católico “meia-boca” fico um tanto receoso de criticar a Igreja. Afinal, a religião foi sempre muito importante no desenvolvimento humano. Ao colocar alguns freios nas pessoas, permitiu a criação de regras de convivência quase impossíveis de serem implantadas por leis normais. No entanto, há coisas na religião que ficam engasgadas. Vocês sabem: histórias malcontadas, brechas de tempo e conceitos confusos. Um dos conceitos mais confusos da Igreja Católica é o conceito de inferno. A Igreja insiste no “fogo eterno” quando está claro para mim que no inferno não tem fogo, o inferno é assolado eternamente por chuvas. No inferno chove todos os dias. Uma garoa leve e gelada na maior parte do tempo, que engrossa nos horários de pegar as crianças na escola ou parar na padaria. Para atrapalhar, no inferno chuvoso quase todo mundo tem carro, sejam demônios, residentes ou hóspedes; e usam-no constantemente, porque, afinal, está sempre chovendo. Não há locais para estacionamento, porque todo o meio-fio está ocupado com entradas de garagem. Há muitas garagens no inferno, porque há muitos carros. As ruas são estreitas, mal sinalizadas e os semáforos são sadicamente sincronizados para impedir o fluxo de carros. Os poucos habitantes não motorizados usam o serviço da Cooperativa de Demônios Taxistas Sádicos, a CDTS.
O inferno chuvoso é o inferno legítimo, oficial e real. Se existe um segundo inferno, de fogo, como defende a Igreja, é nele que os demônios do inferno chuvoso vão passar as férias de verão. E, de lá, voltam dizendo: – Ah! Aquilo é um paraíso! Quando me aposentar, mudo para lá. Os pecadores incorrigíveis são enviados para o inferno de chuva. É o castigo final. Se não se arrependerem dos pecados ali, não há [continua] 33


Infernos

mais nada a fazer. Para quem duvida da existência do inferno úmido, basta programar uma visita a uma de suas sucursais — aqui mesmo no Brasil. São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e mesmo cidades pequenas do interior já têm seus próprios “cantinhos infernais”, é só prestar atenção. Para quem já conhece o ambiente infernal, fica o conselho: arrependei-vos enquanto há tempo!

Texto extraído do livro Escolhedores de sagu: crônicas, publicado em 2011 pela Méritos Editora.



A obra reúne textos de nossos associados, que foram publicados no Sarau Virtual da entidade, www.unafiscoassociacao.org.br/sarauvirtual. São manifestações literárias que, de uma maneira ou outra, lançam luz em uma determinada questão intrínseca ao ser humano.

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