Revista Goiabeira - Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro! 2014

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porque Goiabeiras brotam no Terminal Parque Dom Pedro II e transformam o ônibus em poesia TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 3


sumÁrio 4 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


..........6 .........8 A produção como movimento de pesquisa Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro! 2014.......... 21 .......................... ................ .......... .......................... ............................... ................................. .................................... ............................ .... ......................... .................... Ficha técnica ................................. 136 Sonhei que era o motorista sonhador | Anderson Mauricio

| Tatiane Lustoza

Atividades realizadas em 2014 Espetáculos da Trupe Sinhá Zózima | janeiro e março Cinebus – 1ª Mostra de Teatro e Cinema em Movimento | fevereiro Embarcando com humor!!! | abril Sarau no busão! | maio Cantoria | junho Dança | julho Histórias contadas | agosto #VoudeBus – Mobilidade SP – Mostra de Intervenções Artísticas | setembro Conversações | outubro e novembro Goiabeira – exposição multimídia | dezembro

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Filhos dos integrantes da Trupe Sinhá Zózima durante ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro!_ foto Priscila Reis

Sonhei que era

o motorista sonhador 6 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Pequerrucho, o ônibus é um carrão grande que cabe o mundo inteiro lá dentro. Tem espaço pra tanta gente, viaja por tantos lugares, ouve e conta tantas histórias que eu vou te contar. Vou começar quando um dia sonhei, olhando pela janela, que as pessoas estavam morando dentro dos carros sozinhas. Lá elas comiam, bebiam, ouviam músicas, viam o YouTube que você gosta tanto de ver, mas não conversavam com ninguém. Eram tantos e tantos carros, tantas e tantas pessoas sozinhas, que formavam uma fila gigante sem sair do lugar. Sonhei que um carrão enorme e mágico vinha retirar todas as pessoas dos carros e levar para onde elas queriam. Bastava fechar os olhos, olhar pela janela e sonhar com o lugar que ela queria morar. Teve uma que sonhou que morava na praia, onde o quintal era feito de areia, o sol brilhava o dia todo e os peixes a chamavam para brincar no fundo do mar. Teve outra que sonhou que ela morava na nuvem para onde o ônibus a levou. Lá era tudo branco e suave, onde nascia a chuva, onde morava o vento e o trovão e, de lá, ela via o mundo inteiro. Teve um que sonhou que morava na floresta onde vive também o macaco, o leão, a girafa e as borboletas. Onde brotam todas as árvores de banana, mexerica, amora e tantas e tantas frutas que você gosta de comer. Eu sonhei que morava no busão, no ônibus, no carrão enorme que viajava para todos os lugares, sonhei que era o motorista sonhador, que ouvia todas as histórias, as conversas, os lugares que as pessoas sonhavam morar. Sonhei que morava nesta casa em movimento onde as pessoas podiam conversar, brincar, contar as histórias, sonhar olhando pela janela grande por onde víamos o mundo todo, todos os mundos, por onde todo mundo queria agora viajar.

Anderson Maurício

artista-pesquisador, diretor e cofundador da Trupe Sinhá Zózima 22 de setembro de 2014 rascunhos e devaneios de uma história para ninar seu filho TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 7


A produção como

movimento de pesquisa

#solidãocompartilhada, com Projeto Nau(frágil) e Núcleo de Dança Amoràterra_ foto Jesú Severo 8 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Falar da produção da Trupe Sinhá Zózima é falar de dificuldades, insistência e resistência

de um grupo que surgiu apenas com a vontade de fazer teatro com amor, respeito ao público e respeito às suas origens. Digo isso porque a maioria dos integrantes da Trupe é de alguma periferia do cafundó de São Paulo. Pessoas que sabem exatamente o que é a falta de acesso à educação de qualidade, a falta de acesso ao lazer, à saúde, às artes e tudo aquilo que deveria ser direito de todos. Os integrantes da Trupe possuem uma característica comum: uma inquietude que leva ao inconformismo e um inconformismo que leva a uma ação: porque quem nasce pobre sabe desde cedo que não temos tempo para reclamar; sabemos desde cedo que nascemos para trabalhar, trabalhar honestamente com qualquer coisa que garanta o sustento da família. Com essa ânsia por fazer algo, decidimos fazer teatro no ônibus. Aparentemente uma escolha inocente. Teve até gente que pensou que escolhemos fazer isso para se aparecer! Mas não nos incomodamos, porque não tínhamos tempo a perder. O que pulsava lá dentro era tão forte que não havia nada nesse mundo que pudesse nos abalar! Inicialmente tínhamos a ideia, já tínhamos escolhido o apaixonante texto Cordel do amor sem fim – da autora baiana Claudia Barral, mas ainda faltava muita coisa para realizarmos a estreia do espetáculo. E nos questionávamos sobre o problema principal: como conseguir um ônibus e toda a estrutura necessária para um espetáculo sem dinheiro? A alternativa que estava ao nosso alcance era fazer parcerias com comerciantes, pessoas físicas e algumas empreTRUPE SINHÁ ZÓZIMA 9


sas. Sabíamos que seria uma tarefa árdua, mas não imaginamos que seria tão difícil. No início achamos que as pessoas se encantariam rapidamente pelo nosso projeto e aceitariam uma parceria. Afinal de contas era algo inovador, diferente e necessário para a sociedade. Entramos em contato com diversas empresas de transporte urbano de São Paulo e nenhuma demonstrou interesse. Aí percebemos que tudo que é diferente parece apenas loucura. Até você provar que a loucura pode ser algo necessário e real. Mesmo com essa situação, continuamos ensaiando quatro vezes por semana, cuidando do cenário, figurino, iluminação, sonoplastia, programação visual etc. Porque o espetáculo tinha data de pré-estreia: 15 de setembro de 2007. Essa data não podia mudar porque estávamos fazendo inúmeras parcerias e precisávamos cumprir com esse compromisso. No final de julho de 2007, começamos a ficar muito preocupados, na verdade, desesperados pelo fato de não ter o principal: o ônibus!!! O desespero foi tão grande que certo dia o Anderson fez um ônibus de madeira em miniatura para que de alguma forma 10 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

essa energia do ônibus se concretizasse, se plasmasse e se tornasse real. Até que no início de agosto, uma das integrantes da Trupe, disparou um e-mail para dezenas de empresas de ônibus falando sobre o nosso projeto. E, para a nossa surpresa, uma empresa respondeu: a Transguarulhense. Uma empresa de Guarulhos que estava iniciando um projeto de conscientização sobre trânsito e vandalismo e necessitava de atores para começar o projeto. A partir daí iniciou a parceria! Eles nos cediam o ônibus, motorista e combustível e, em troca, oferecíamos o trabalho de ator a um preço acessível. Finalmente tínhamos o ônibus e fizemos a tão sonhada estreia! Na verdade tivemos até pré-estreia, que aconteceu no dia 15 de setembro, no Bar do Batata, com o Cordel do amor sem fim – texto de Claudia Barral, na região do Jardins. Fazíamos duas apresentações todos os sábados e domingos para pouquíssimas pessoas. A sensação daquele vazio dentro do ônibus era angustiante. Queríamos aquele ônibus lotado. A primeira vez que lotou foi quando a autora do texto Claudia Barral, veio com a sua


família de Salvador. A segunda vez que o nosso busão ficou lotado foi durante o Satyrianas. A loucura foi tanta que quando partimos para iniciar o espetáculo tinha gente correndo atrás do busão. Tudo foi estranho e divertido ao mesmo tempo. E o sucesso nesse evento foi tão grande que o SESC Consolação nos convidou para fazer temporada em janeiro e fevereiro de 2008. Ficamos radiantes com esse convite, ficamos super entusiasmados com a temporada, porque, antes da estreia, os ingressos estavam todos vendidos; nós nem acreditávamos que aquilo estava acontecendo. Com o decorrer da temporada percebemos que o nosso busão atraia muitos trabalhadores que não tinham hábito de ir ao teatro e que, muitas vezes, se deslocavam de muito longe para nos assistir. E começamos a nos questionar: Como poderíamos fazer um projeto específico para a classe trabalhadora? Afinal de contas pertencemos a essa classe. Enquanto tínhamos a parceria com a Transguarulhense, fizemos muitas temporadas na capital, interior, litoral, outros estados... Enfim... Trabalhamos muito e iniciamos o projeto Arte Expressa

– 1ª Mostra de artes dentro do transporte público do município de São Paulo, em 2009, realizado em parceria com a SPTrans no Terminal Expresso Tiradentes. Queríamos que outros grupos vivessem essa experiência apaixonante! Para a realização do projeto, tivemos que elaborar um sistema organizacional infalível para a SPTrans aceitar essa parceria. Tivemos que nos dispor a inúmeras reuniões com diversos departamentos, convencer a todos que faríamos o projeto com qualidade, responsabilidade, profissionalismo e, é claro, sem verba! Para realizar esta façanha, 12 grupos de diversas linguagens artísticas aceitaram fazer apresentações sem cachê. Fizemos parceria com restaurantes para a equipe técnica ter suas devidas refeições e para os artistas terem um serviço de camarim adequado. Fizemos parceria com uma faculdade para conseguir pessoas para trabalhar como estagiários na produção e equipe técnica. Conseguimos também designer gráfico, fotógrafo, gráfica... Enfim... quase tudo! Fizemos o cálculo do valor do evento. Caso tivéssemos custeado tudo sem parcerias sairia por aproximadamente R$ 70.000,00. TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 11


Como contamos com a colaboração de inúmeras pessoas que acreditaram na importância do projeto, gastamos do nosso bolso apenas R$ 1.800,00. Durante a Mostra fizemos uma pesquisa com os passageiros e coletamos os seguintes dados:

• 75% das pessoas nunca tiveram contato com teatro; • 97% das pessoas escolheriam um ônibus com intervenções artísticas para se deslocar; • 100% das pessoas aprovaram a iniciativa do projeto; Essa pesquisa foi decisiva para compreendermos que não era loucura fazer um projeto para o trabalhador; isso era algo absolutamente necessário!!! Durante a Mostra, vimos o quanto o projeto era potente e surgiu o desejo de fazer uma residência artística naquele lugar. Mas ainda precisávamos amadurecer melhor a ideia. Enquanto isso, estávamos ensaiando o segundo espetáculo da Trupe: Valsa nº 6 e durante esse processo, 12 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

a parceria que durou três anos com a Transguarulhense foi rompida, por conta de uma mudança na gestão e a tal necessidade de reduzir custos. Ficamos sem eira nem beira e mais uma vez voltamos à estaca zero. Mas, para o nosso alívio, não era a tão zero assim, porque o grupo já tinha três anos de história e isso contribuiu para conseguirmos uma parceria com uma empresa de São Bernardo do Campo. Conseguimos, assim, estrear o espetáculo. Só que essa parceria não durou muito tempo, porque a arte não é pensada como algo importante pela Secretaria de Transporte e, muito menos, pelas empresas prestadoras de serviço. Nesse momento sentimos uma grande tensão. Estávamos prestes a estrear o terceiro espetáculo O Poeta e o Cavaleiro, que foi contemplado com o Prêmio Myrian Muniz (2010) e não tínhamos ônibus mais uma vez. Esse espetáculo foi dirigido por Alexandre Lindo, que tem um trabalho de pesquisa incrível com a linguagem do clown. Só que ele não tinha experiência com ônibus e foi difícil para ele dirigir o espetáculo sem ter um ônibus para ensaiar e se apropriar.


Exposição Goiabeira_ foto Priscila Reis

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Então optamos por fazer um ônibus inflável como cenário. E, enquanto fazíamos a temporada do novo espetáculo, ganharíamos tempo para conseguir outra parceria. Perante as inúmeras dificuldades o grupo decidiu dar uma pausa de um ano e meio para refletir sobre o que de fato queria fazer e como fazer. Sentimos necessidade de nos estruturarmos melhor para não passarmos por essa situação novamente. Na verdade ficamos desanimados, quase desistimos. Foi uma conversa no msn que nos inspirou a continuar novamente. Essa conversa foi com a Lala Bradshaw, uma psiquiatra que conhecemos durante o processo de pesquisa do Valsa nº 6, ela me chamou no msn perguntando sobre as novidades da Trupe e eu falei tudo o que estávamos vivendo naquele momento e estávamos pensando seriamente em desistir. Ela ficou chocada com isso, disse que não podíamos nem pensar nessa possibilidade, conversou comigo e com o Anderson e nos deu uma super injeção de ânimo. Ela apontou tantas qualidades no nosso trabalho que em meio ao caos que estávamos vivendo não conseguía14 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

mos enxergar. Após essa conversa decidimos estudar cada qual na sua área de identificação e eu comecei a fazer um curso de Gestão de Projetos Cênicos. A partir daí, começamos a fazer uma revolução na estrutura de pensamento e ação do grupo. Entendemos a importância de ter uma linha de pesquisa, criamos uma logomarca com a cara da Trupe, fizemos um site adequado, traçamos um plano de curto, médio e longo prazo do que a Trupe queria fazer e entendemos que não podíamos fazer tudo e que, para determinadas áreas, era necessário ter pessoas qualificadas. Decidimos fazer parcerias com profissionais que possuíam habilidades específicas e que, ao mesmo tempo, tinham a cara da Trupe. Para vocês terem uma ideia, o Danilo Peres que trabalha com a gente atualmente como webmaster, nos conheceu em setembro de 2006, quando estávamos nos formando na FASCS com o espetáculo O Capeta em Caruaru. Nessa época ele trabalhava na empresa Big Format, que foi nossa parceira essa época e que também continua nos apoiando até hoje.


A Deborah Erê é designer gráfica, trabalha com a gente desde 2010 e os nossos caminhos se cruzaram de uma forma curiosa. Ela escolheu essa profissão após assistir o trabalho da Trupe, porque durante as primeiras apresentações do grupo, nós conseguimos uma parceria de divulgação com a revista Piauí e eles nos davam revistas para distribuir para o nosso público. Numa dessas apresentações a Deborah Erê foi nos assistir, ela não conhecia ninguém da Trupe, leu a revista e uma das matérias falava sobre a profissão de web design, ela gostou tanto da matéria que decidiu fazer o curso. Alguns meses depois ela encontrou com uma das atrizes da Trupe, entusiasmadamente falou sobre como escolheu sua profissão e se dispôs a nos ajudar sempre que necessário. E, de um acaso a outro, conseguimos todas as parcerias necessárias para levantarmos o nosso trabalho. Infelizmente não tínhamos condições de remunerar ninguém nesse período, mas era incrível ver o empenho, comprometimento e a dedicação de todos durante esse processo. Foi um ano e meio de trabalho exaustivo. Nesse período eu e

o Anderson nos casamos, e fizemos um acordo: ele trabalhava exclusivamente para estruturar a Trupe e eu pagava as contas da casa, isso não demorou muito tempo porque eu engravidei, fiquei desempregada e o desespero financeiro aumentou, mas não desistimos, acreditávamos que tanto empenho não podia ser simplesmente jogado no lixo. Durante esse processo de estruturação retomamos o contato com a SPTrans para continuarmos o projeto de intervenções artísticas e eles se demonstraram animados, nos deram uma carta autorizando nossa residência artística no Terminal Parque Dom Pedro II e nos ajudaram a firmar uma parceria com a Consórcio Plus no início de 2012. Em maio desse mesmo ano fomos contemplados com a 20ª Edição da Lei de Fomento ao Teatro de São Paulo, com o projeto Plantar no ferro frio do ônibus o ninho, onde tivemos a oportunidade de trabalhar com todos os nossos parceiros de forma remunerada. E fizemos isso com grande alegria e satisfação! Quando nos inscrevemos para o fomento, estávamos no limite, era tudo ou nada. Eu e o Anderson deixamos de pagar as contas da nossa casa para TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 15


imprimir o projeto. Se não fossemos contemplados naquele momento, não teríamos mais forças para continuar. Afinal de contas um bebê estava para chegar e essa pressão era gigantesca. Os familiares diziam que a gente tinha que parar de sonhar e acordar para a realidade, eu me sentia completamente maluca e irresponsável por ser uma artista tão louca, apaixonada e grávida. Não conseguíamos pensar na possibilidade de desistir. Quando saiu o resultado dos grupos contemplados a alegria e emoção era tão grande, que sabíamos que a Trupe entraria numa nova era de possibilidades. Logo liguei para minha mãe para dar a boa notícia dizendo que durante um ano eu teria um salário fixo e conseguiria sustentar o meu filho e a Trupe. Ela ficou muito aliviada e feliz por essa conquista. Fizemos um almoço com todos os trabalhadores do projeto. Ai, que dia emocionante!!! Tinha valido a pena cada gota de suor. Após tantos dias nublados, finalmente o sol voltou a brilhar e encher nossos corações de entusiasmo. E em julho de 2012 o Theo nasceu!!! Parecia tudo perfeito, até que houve uma troca de gestão na SPTrans 16 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

e fomos impedidos de iniciar as atividades do projeto. Foram nove meses de muita luta, insistência, resistência. A própria equipe de trabalho não acreditava que seria possível reverter a situação. Mas os cinco anos de existência do grupo foi tempo suficiente para nos ensinar que, quando se trata de arte, tudo é muito difícil mesmo e a palavra desistir não existe no nosso vocabulário. E não tem aquela história que o não a gente já tem? O que precisamos é do sim. Esse sim demorou para acontecer, aconteceu após nove meses, o tempo de uma gestação. Sentimos como se fosse um parto fórceps, assustador, difícil, que no final dá tudo certo. Mas, antes de recebermos o sim, tivemos que partir para o plano B, começamos a fazer algumas ações fora do terminal para não atrasar ainda mais o nosso calendário. Após mais uma batalha gigante, finalmente começamos a realizar o tão sonhado projeto dentro do Terminal! O problema é que essa demora para começar atrasou muita coisa, e não tínhamos tempo a perder. Afinal, tínhamos que estrear um espetáculo, fazer um documentário, publicar dois livros e uma re-


vista. Para realizar tudo isso em tão pouco tempo, era necessário ter uma organização e um cronograma bem detalhado para cumprir com todas as ações previstas no projeto. Com toda essa pressão o Anderson ficou doente, começou a ter várias crises de labirintite, vários ensaios do Dentro é lugar longe, ele caia de repente. Teve dias que saíamos do ensaio diretamente para o hospital. Como se não bastasse, iniciou a CPI do transporte em São Paulo e a empresa Consórcio Plus teve que fazer um corte na verba e é claro que encerraram a parceria com a Trupe. Nesse momento ficamos arrasados, não achávamos justo que alguém ou alguma empresa tivesse o poder de impedir nossa existência. Mas, como sempre fomos organizados e sabíamos da possibilidade disso ocorrer a qualquer momento. Tínhamos um caixa do grupo com pouco dinheiro, é claro, mas era suficiente para darmos uma entrada e comprar o NOSSO BUSÃO, porque definitivamente estávamos cansados de passar por esse tipo de situação. Tomamos essa atitude rapidamente, mas com aquele frio na barriga de assumir dezenas de prestações e ainda pagar combustível

e motorista. Essas despesas são pagas com o caixa da Trupe. No dia 1º de maio, dia do trabalhaDOR fizemos a pré-estreia com o nosso busão! Escolhemos essa data porque ela nos representava de uma forma grandiosa, após tanto trabalho e dor, tínhamos que estrear no dia do trabalhador. E foi uma pré-estreia especial, porque fizemos apenas para motoristas e cobradores. Nesse dia só tinham homens. Eles não sabiam que era uma apresentação de teatro. A informação que eles receberam é iam assistir uma palestra e estavam todos com a cara amarrada na fila querendo ir embora para casa naquele feriadão. Mas, quando eles perceberam que era teatro, a felicidade deles era tão grande! Eu me diverti quando o espetáculo começou e vi aquele bando de homem ajudando a gente a colocar a cortina, outros pediram vassoura, nos ajudaram a arrumar as malas. Enfim... quando fizemos o bate-papo no final, muitos deles emocionados disseram que foi o melhor dia do trabalhador e que aquela experiência tinha sido inesquecível. Após a estreia podíamos respirar e comemorar!!! Nos meses seguintes nos TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 17


Pré-estreia de Dentro é Lugar Longe, com Trupe Sinhá Zózima, no dia 1º de maio (dia do trabalhador) para motoristas e cobradores de ônibus_ foto Christiane Forcinito

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sentimos livres e muito entusiasmados por ter o nosso busão. E essa conquista foi tão grande que não podia ficar só entre a gente, queríamos que outros artistas tivessem a oportunidade de viver essa experiência. E, em 2014, iniciamos a ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro!, em que convidamos diversos artistas para mostrar seus trabalhos e viver essa experiência dentro do busão. A ação está dando muito certo, artistas de diversas linguagens e formação ficam radiantes com essa possibilidade e a cada dia me surpreendo com o mar de possibilidades que surge no nosso horizonte. Escrevi tudo isso para dizer que quando a gente realmente quer alguma coisa, não há nada nesse mundo que possa nos impedir. E que uma menina, vários meninos da periferia, sem eira nem beira, podem deixar um rastro de amor e humanidade nesse mundão. E que, apesar de todas as dificuldades, temos o direito de sonhar, pois os sonhos podem nos levar a lugares inimagináveis. Lembro que, quando eu tinha 12 anos, estava na aula de Geografia e a professora pediu para eu estudar o mapa da Europa. Eu achei esse estudo desne-

cessário e questionei: Para que eu preciso estudar o mapa da Europa sabendo que eu nunca vou para lá? A professora olhou bem firme dentro dos meus olhos e disse: Quem falou que você nunca vai para lá? Você vai estudar sim! Ela foi tão incisiva que decidi estudar, mesmo sabendo que nunca iria para lá, afinal, mal tinha dinheiro para comer, muito menos para viajar. Quando eu tinha 24 anos, fomos convidados a participar de um festival em Portugal. E, aquilo que era algo inimaginável, se tornou real! Mas como nada para a gente é fácil, eles não tinham como bancar todas as passagens. Enfim... decidimos rifar uma TV 42”, vendemos 1000 números a R$ 5,00. Fizemos um esforço sobrenatural para vender tantos números em pouquíssimo tempo até que, finalmente, compramos as passagens e partimos rumo às terras portuguesas. Fomos muito bem recebidos, eles adoraram nosso trabalho e vivemos uma experiência maravilhosa. Nesse momento entendi que mesmo com todos os nãos que a vida nos impõe, também é possível encontrar o sim escondido em algum cantinho desse mundão. Aquela frase que dizem que “sonhar não custa nada” é pura balela. TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 19


Sonhar custa muitas noites de pouco sono, muitas horas de dedicação, perseverança, medos, angústias, estudos. Mas também de alegrias, lágrimas de uma boa surpresa, um sorriso inocente de um menino que vê teatro pela primeira vez, um abraço apertado de uma pessoa que você acabou de conhecer, um olhar curioso, uma revelação secreta. Enfim... podemos viver coisas inesquecíveis que não têm preço e que ficarão para sempre em nossas memórias!!! Sabe, tem uma pessoa que é extremamente importante na história da Trupe, a nossa querida e amada Lídia Zózima. Ela nos ensinou a ouvir o caos desse mundão e transformar suas lamúrias em poesia, ela nos ensinou a acreditar na capacidade de existir verdadeiramente, ela nos ensinou que podemos construir nosso mundo do jeitinho que a gente quer, ela nos ensinou a ser passarinho para voar para terras distantes e ter boas histórias contar, ela nos ensinou a olhar com amor para dor, ela nos ensinou que não existe certo ou errado, porque cada um escolhe o seu caminho e paga o seu preço por isso. Ela nos ensinou a amar o desconhecido e não ter 20 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

medo da escuridão.

por Tatiane Lustoza artista-pesquisadora, produtora e cofundadora da Trupe Sinhá Zózima


Trupe Sinhá Zózima Projeto Arte Expressa 2014

mais de 50 atividades realizadas, contemplando diversas linguagens artísticas e culturais

mais de 120 artistas e grupos envolvidos,

vindos de diversos estados do Brasil e até mesmo de outros países

mais de 1.400 pessoas embarcaram no ônibus da Trupe Sinhá Zózima

e, ao longo das atividades que aconteceram dentro e fora do ônibus estacionado no Terminal Parque Dom Pedro II e das ações de divulgação (imprensa, redes sociais, banners, flyers e locução no terminal), indiretamente foi atingindo o imaginário poético dos passageiros de que

a arte é possível dentro daquele espaço, onde circulam diariamente 200 mil pessoas TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 21


A ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro!

é um dos pilares do projeto Arte Expressa, que integra a pesquisa teatral-poética da Trupe Sinhá Zózima e tem como principal objetivo promover o encontro de passageiros de ônibus com as mais variadas manifestações artísticas: teatro, cinema, música, literatura e artes plásticas. Atualmente o projeto Arte Expressa organiza-se a partir de três ações:

1. Arte Expressa: Mostra de teatro no ônibus Realização de encenações teatrais em terminais de ônibus na cidade de São Paulo e outras cidades brasileiras e países estrangeiros. Também é um convite para que jovens grupos de teatro dialoguem com a Trupe e realizem apresentações em ônibus.

1ª Mostra de Teatro no ônibus, com Grupo Caixa de Imagens_ foto Danilo Dantas 22 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


2. Arte Expressa: Residência artística no Terminal Parque Dom Pedro II Ação desenvolvida por meio dos projetos Plantar no ferro frio do ônibus o ninho e Os minutos que se vão com o tempo: da imobilidade urbana ao direito à poesia, à cidade e à vida, contemplados pelo Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a cidade de São Paulo da Secretaria Municipal de Cultura, possibilitando a criação de espetáculos teatrais, carpintarias, conversações, partilhas de vivências e elaboração de publicações e formas de difusão dos trabalhos da Trupe em busca do diálogo com passageiros e frequentadores do terminal.

Cabeças Trocadas, com Andrea Cavinato_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 23


Motiva Bus_ foto Priscila Reis

3. Arte Expressa: Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro! A ação, que conta com o apoio de cessão de espaço da SPTrans, no Terminal Parque Dom Pedro II, pretende promover a cidadania artística, o encontro, a humanização do transporte, a ampliação de público para as artes cênicas, o diálogo com os trabalhadores. Possibilita a experimentação do espaço (ônibus e Terminal) não só pelos integrantes da Trupe como também por outros grupos e artistas de diversas linguagens. 24 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Durante 2014, a

Trupe Sinhá Zózima desenvolveu duas das ações do projeto Arte Expressa sem nenhum apoio financeiro (Mostra de Teatro e Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro!), contando apenas com a cessão de espaço por parte da SPTrans. A ação de residência artística (que compõe mais um braço do projeto Arte Expressa), de certa forma, recebeu investimento via Fomento ao Teatro, por conta do projeto Os minutos que se vão com o tempo: da imobilidade urbana ao direito à poesia, à cidade e à vida, que contempla conversações (bate-papos) e a criação de espetáculo teatral. Trazer as conversações para dentro da ação Toda Terça foi uma solução estratégica pensada pela Trupe para que as atividades não fossem interrompidas em 2014. A execução da ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro!, ao longo de 2014, apontou para os integrantes da Trupe novas possibilidades de intervenção no espaço público e de abertura para que outros artistas e grupos pudessem vivenciar esse processo. Tanto que a programação foi pensada de forma temática, contemplando a apre-

sentação de grupos e/ou artistas convidados, além da abertura de editais (Cinebus e #Voudebus). Os editais viabilizaram o acesso às artes e despertaram em grupos e artistas, não necessariamente próximos à Trupe, o interesse pela proposição de atividades dentro dos terminais urbanos. Essa ação foi fruto da articulação junto à equipe da SPTrans, para que cedesse espaço não apenas para as apresentações da Trupe, além da articulação junto à artistas e grupos que abraçaram a proposta, mesmo cientes da falta de remuneração. Vieram por compartilhar dos mesmos ideais e pela possibilidade de experimentar as nuances que este espaço tão peculiar oferece, com sua própria dinâmica e seu público. Ao realocar a ação cênica para o ônibus, a Trupe Sinhá Zózima assume a aproximação com um público, em sua maioria, pouco familiarizado com as artes cênicas. Como indicado por Tatiane Lustoza, atriz, produtora e cofundadora da Trupe, em 2009, foi realizada uma pesquisa sobre a relação dos passageiros de ônibus com as artes. Foi constatado que 75% das pessoas entrevistadas que TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 25


usavam o transporte municipal nunca tinham tido contato com as artes cênicas. Mas foi mais surpreendente que 95% escolheriam para se locomover um ônibus onde houvesse encenações teatrais. Nesse mesmo ano foi levantado que 8% das pessoas entrevistadas que nunca haviam assistido a um espetáculo teatral estiveram no ônibus da Trupe Sinhá Zózima. Número que, no primeiro semestre de 2014, subiu para 15%. Para a Trupe Sinhá Zózima o ônibus representa um espaço constante de desafio e descobertas. Sua exploração nas pesquisas cênicas da Trupe interessa em diversos sentidos: a exploração de sua estrutura física (espaço restrito, o posicionamento e a relação de atores e público, a acústica), a encenação em movimento tanto nas acepções simbólicas quanto práticas (o ator em equilíbrio, os cruzamentos entre tempo e espaço, interior e exterior do ônibus, a paisagem da cidade como elemento de encenação); o ônibus como transporte coletivo e público (a intervenção na cidade e na sua lógica cotidiana, a ressignificação do meio de transporte). Trata-se de uma proposta artística e de um posicionamento 26 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

político, em busca do teatro (da arte) do encontro sem fronteiras. Além disso, o estudo do ônibus como transporte público e coletivo tem indicado alguns caminhos de pesquisa, uma vez que é um dos norteadores da concepção de cidade e de organização social no país. No município de São Paulo, de acordo com a SPTrans, o transporte por ônibus responde por cerca de 2/3 das viagens coletivas. Uma média de 6,5 milhões de pessoas embarcam diariamente nos 15 mil ônibus que circulam pela cidade. O Terminal Parque Dom Pedro II, ponto de partida da residência artística da Trupe Sinhá Zózima, é considerado o terminal mais movimentado da América Latina, por onde circulam diariamente quase 200 mil pessoas, atendendo principalmente as regiões Leste, Sudeste e Nordeste da cidade. O Terminal funciona 24 horas todos os 365 dias do ano. Não há feriado. Não há pausa. Trata-se de um fluxo-movimento constante, ação que não finda. Mais de 120 artistas e pesquisadores entraram no ônibus da Trupe para compartilhar seus trabalhos, suas inqui-


“Mais do que viabilizar deslocamentos, a São Paulo Transporte (SPTrans) tem a preocupação de humanizar o transporte e a relação das pessoas com a cidade. Por isto, considera que o terminal de ônibus é um espaço a ser compartilhado por múltiplas atividades que possam melhorar a qualidade de vida, o desenvolvimento humano e proporcionar bem-estar. A parceria experimental com a Trupe Sinhá Zózima vem ao encontro dessa disposição em valorizar a relação das pessoas com a cidade por meio da democratização e popularização do teatro. A ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro!, realizada no Terminal Parque Dom Pedro II, tem propiciado aos usuários novas experiências e a oportunidade de refletir sobre temas do cotidiano.”

Mauro Scarpinatti Assessoria de Marketing da SPTrans etações e suas utopias. E mais uma vez embarcaram por acreditar na ação, mas sem receber nenhum valor de ajuda de custos. Isso é sempre lembrado durante as avaliações sobre a participação (a Trupe sempre encaminha para seus convidados uma pesquisa para que avaliem como foi sua participação e envolvimento com o projeto). A possibilidade de investimento em infraestrutura e a verba para pagamento do trabalho realizado, com certeza, potencializariam a ação e permitiriam que mais parcerias fossem estabelecidas.

Durante seu processo de residência-resistência artística no Terminal Parque Dom Pedro II, a Trupe Sinhá Zózima, vem conquistando parceiros e ganhando visibilidade não apenas em âmbito nacional como internacional. Em maio de 2014, o projeto Arte Expressa, desenvolvido pela Trupe Sinhá Zózima foi um dos 14 selecionados na área de artes cênicas pelo Ministério da Cultura para participar do I Mercado de Indústrias Culturais dos Países do Sul (MicSul), na cidade de Mar Del Plata, Argentina. TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 27


Realizado pela Secretaria da Cultura da Argentina, o 1º MicSul foi uma iniciativa dos ministérios de Cultura de países da América do Sul (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela). O evento contou capacitações e encontros com artistas de países da América do Sul com intuito de promover rodadas de troca de experiências, discussão de políticas públicas para o campo das artes e criação de redes entre os países da região. O material apresentado pela Trupe Sinhá Zózima, durante o MicSul foi muito elogiado pelos participantes e possibilitou a abertura de contatos e início de parcerias com profissionais e grupos de outros Estados brasileiros e, principalmente, com grupos de outros países – interessados na pesquisa cênica, na apropriação do ônibus como espaço de atuação e na intervenção artística em terminais urbanos promovidas pela Trupe. Ainda em 2014, Anderson Maurício, ator, diretor e cofundador da Trupe Sinhá Zózima, foi um dos 10 nomes mais votados para a 2ª Edição do Prêmio Virada Sustentável. Foi levada em consideração a trajetória de cada pessoa, o con28 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

junto de seu trabalho e como suas ações geram impactos positivos para a cidade. Anderson foi o único nome indicado relacionado ao teatro. E sua indicação foi decorrente do trabalho desenvolvido pela Trupe Sinhá Zózima com o projeto Arte Expressa e, principalmente, com a ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro! Em janeiro de 2015, a Trupe embarca para o Chile, para participar do Festival Internacional Santiago a Mil – um dos eventos mais significativos das artes cênicas da América Latina. Oportunidade que surgiu por conta do trabalho desenvolvido pela Trupe ao longo do ano e pelo edital Conexão Cultura Brasil #Negócios. Para a Trupe Sinhá Zózima, residir artisticamente diz respeito a um encontro do artista com o povo e do povo com o artista. É criar em conjunto: reunir fazedores de arte e descobrir fazedores de arte. Por isso, residir, é ir ao encontro, é fazer arte, teatro, onde, a princípio, parece impossível, no local onde as pessoas estão, passam, caminham e vivem. É plantar o ninho onde reina o ferro frio. É buscar os minutos que se vão com o tempo.


A ocupação dos terminais de transporte público, as encenações e a apropriação do ônibus inserem a possibilidade de fruição artística e, gradativamente, a residência-resistência desperta nos participantes desse encontro a sua percepção como sujeitos sociais, como comunicadores e criadores de novas concepções de mundo. Como indicou o crítico e teórico Kil Abreu, ao refletir sobre o último trabalho da Trupe, contemplado pela 20º Edição da Lei de Fomento ao Teatro para a cidade de São Paulo, reve-

la-se “um teatro que nasce enraizado na cidade e a ela retorna, na direção dos cidadãos (não só os que “pagam” impostos como se costuma dizer naquele discurso que iguala cidadania e produto)”. Tudo se põe em movimento. Ao se aproximar do final de um ano da ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro! é possível constatar a necessidade de sua continuidade por conta da relação estabelecida com o público, da sinalização da SPTrans de um interesse por abrir o espaço de

“A vida social, econômica e cultural dos paulistanos está intimamente ligada à mobilidade urbana. A cidade depende de planejamento e estrutura para garantir a circulação das pessoas e dos produtos e a realização de serviços. Trabalhamos incessantemente para isto. A cidade passou a contar com mais de 400 km de faixas exclusivas, significando um ganho de aproximadamente 40 minutos/dia no tempo de circulação dos paulistanos. Simultaneamente, temos experimentado associar à rotina dos terminais atividades de interesse, como saúde, lazer, cultura e entretenimento. A Trupe Sinhá Zózima, com o apoio da Secretaria Municipal da Cultura, tem contribuído com este processo ao ampliar e democratizar o acesso aos bens culturais da nossa cidade por meio de um projeto inovador de teatro no interior de um ônibus, especialmente preparado para receber essa ação, no Terminal Pq. D. Pedro II. Mesmo em pequena escala, a iniciativa sintetiza a enorme diversidade e capacidade criativa de São Paulo.”

Jilmar Tatto Secretário Municipal de Transportes TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 29


outros terminais para ações como esta, pelo interesse de outros grupos de residirem em espaços com essa dinâmica, pela possibilidade de intercâmbio com grupos e representantes de outros países interessados no modelo e na potência do projeto artístico desenvolvido pela Trupe Sinhá Zózima. Nesse primeiro momento torna-se fundamental que a ação seja subsidiada para que se consolide e ganhe visibilidade permitindo, em um segundo momento, que outras formas de patrocínio e manutenção sejam conquistadas e estruturadas. Estas são as novas metas da Trupe Sinhá Zózima. Dessa forma, é possível definir essa utopia como desejo de mudança, um projeto que parte do inconformismo a uma realidade dada, buscando transformá-la. Quando se opta por um teatro que encontra vazões para a sua concretização na acepção de utopia, se opta também por um teatro que é agente transformador da realidade. Este teatro – acreditamos – contribui com a transformação da realidade onde está inserido, sobretudo, quando desvela outras versões desta realidade, quando abre uma fresta para a poesia e a imaginação. O chamamento 30 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

para o reencontro com o caráter poético do humano talvez seja a maior contribuição deste teatro, porque utopia não é sinônimo de fantasia, pelo contrário, é um projeto de mudança real.


Atividades realizadas em 2014

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Espetáculos da Trupe Sinhá Zózima

Janeiro Cordel do amor sem fim de Cláudia de Barral direção de Anderson Maurício com Trupe Sinhá Zózima: Anderson Maurício, Cleide Amorim, Junior Docini, Tatiane Lustoza, Priscila Reis e Tatiana Nunes Muniz

Cordel do amor sem fim, com Tatiane Lustoza | Trupe Sinhá Zózima 32 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Dentro é lugar longe, com Maria Alencar e Junior Docini | Trupe Sinhá Zózima_ foto Christiane Forcinito

Março Dentro é lugar longe de Rudinei Borges | direção de Anderson Maurício com Trupe Sinhá Zózima: Alessandra Della Santa, Junior Docini, Maria Alencar, Priscila Reis e Tatiane Lustoza TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 33


Toda Terça Tem Trabalho Tem Também Teatro Tem Trupe Sinhá Zózima no Terminal Parque Dom Pedro Tem ônibus Tem sempre Trabalha dor Sonhar, resistir, residir, encontrar, conversar e apresentar os espetáculos da Trupe Sinhá Zózima no Terminal Parque Dom Pedro II é plantar semente em terra seca e buscar água de poço escondido, no fundo do quintal baldio, onde se tinha tempo para colher memórias. É buscar água com a palma da mão para aguar a planta que espera um dia florescer. É, todos os dias, vigiar a terra esperando o broto brotar. É colher de quem está de passagem um instante, um olhar, uma palavra preciosa:

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- Este ônibus aqui no terminal é como se fosse um vaso de flores... (Ela sorriu e partiu). Uma senhora, dos 200 mil passageiros do Terminal Parque Dom Pedro II Somos jardineiros nestas ruas de asfalto negro onde ainda pode brota a flor. Somos abelhas clandestinas com a função de colher o néctar das flores e produzir o mel. Somos moradores resistentes do Terminal Parque Dom Pedro II que buscam o afeto, a possibilidade de transformação do espaço em lugar que guardamos na memória.

Anderson Maurício artista-pesquisador, diretor e cofundador da Trupe Sinhá Zózima


Dentro é lugar longe com Trupe Sinhá Zózima_ foto Christiane Forcinito TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 35


Cinebus – 1ª Mostra Teatro e Cinema em Movimento Fevereiro Curadoria de Luciana Ramin

Cinema em movimento O sacrifício de Julia Fake, 18’48’’, São Paulo – SP | direção Gabriel Netto e Luciana Ramin Plantar no Ferro Frio do Ônibus o Ninho, 38’, São Paulo – SP | direção Luciana Ramin

Memória em movimento Carro Yellow Submarine, 2’44’’, São Paulo – SP | direção Coletivo Ocupe Carrinho Ainda – Como Sementes e Joões, 18’21’’, São José do Rio Preto – SP | direção Jef Telles Estátuas Vivas, 13’40’’, São Paulo – SP | direção Mirrah Iañez Poltrona, 10’21’’, São Paulo – SP | direção Makson Lima 36 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

Cartão de Memória II, 3’55’’, São Paulo – SP | direção Daniela Pinheiro Carro Tartaruga, 2’16’’, São Paulo – SP | direção Coletivo Ocupe Carrinho

Sentimentos em movimento Carro Tatu Bola, 1’48’’, São Paulo – SP | direção Coletivo Ocupe Carrinho Casos de Novela, 2’37’’, Sorocaba – SP | direção Amadeu Gomes Pares, Parentes e Serpentes, 16’, Goiânia – GO | direção Bruno Farias Tonto!, 5’03’’, Barcelona – Espanha | direção Francesca Catricalá Cavalo, 15’23’’, São Paulo – SP | direção Joana Mariani O momento certo, 18’15’’, São Paulo – SP | direção Sérgio Pizza Gambier e


Dario José Julie, Agosto, Setembro, 8’, Goiânia – GO | direção Jarleo Barbosa Carro Boi, 2’11’’, São Paulo – SP | direção Coletivo Ocupe Carrinho

SP | direção Coletivo Ocupe Carrinho Carro Girafa, 2’26’’, São Paulo – SP | direção Coletivo Ocupe Carrinho

Sensações em movimento Carro Tamanduá, 2’25’’, Brasília – DF | direção Coletivo Ocupe Carrinho Escolhido a dedo, 15’, Mogi Mirim – SP | direção Luiz Dalbo Encosto, 7’, São Paulo – SP | direção Joel Caetano Inventovoceinventa, 21’12’’, São Paulo – SP e Pelotas – RS | direção Daniela Pinheiro Amores concretos, 8’50’’, São Paulo – SP | direção João Pirahy Toque de recolher, 2’, Mogi Mirim – SP | direção Luiz Dalbo Pássaros, 6’44’’, São Paulo – SP | direção Raoni Reis Verde-limão, 4’19’’, São Paulo – SP | direção Tons Terrosos Carro Camaleão, 3’19’’, São Paulo –

Cinebus – 1ª Mostra Teatro e Cinema em Movimento_ com Agrupamento Andar7 _foto Christiane Forcinito TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 37


Cinebus, O sacrifício de Julia Fake, direção Gabriel Netto e Luciana Ramin, com Luciana Ramin 38 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


“A primeira mostra Cinebus, da Trupe Sinhá Zózima, transformou o espaço do ônibus em uma sala de cinema. Os filmes exibidos partiam da aproximação entre cinema e teatro, proporcionando ao público o acesso a criações que traduziam temas documentais e ficcionais, diante da possibilidade de encontro e compartilhamento de processos artísticos.” Luciana Ramin Cineasta e atriz Curadora do Cinebus – 1ª Mostra Teatro e Cinema em Movimento

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EMBARCANDO COM HUMOR!!! ABRIL Cômicas com Clã Estúdio das Artes: Cida Almeida, Caio Franzolin, Caio Marinho, Gabriel Küster, Julia Pires, Juliana Oliveira e Paula Prai

Show da Polly com Cleide Amorim

Embarcando com humor - 1ª palhaçada experimental Eu transito com Cia. Asfalto de Poesia: Marcela Sampaio, Maria Silvia do Nascimento e Amanda Massaro

Iepe de Luis Alberto de Abreu | direção: Pedro Alcântara com Trupe TeMdona: André Félix, 40 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

Rodrigo Sampaio, Rosane drigues e Thais Irentti

Ro-

Palhaçaré com Ciclistas Bonequeiros/Cia. Catraca do Riso: Gustavo Guimarães Gonçalves, Isaur Marcos, Vinicio Queiroz, Fernanda Dantas


Cômicas, com Clã Estúdio das Artes _ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 41


Cômicas, com Clã Estúdio das Artes _ foto Priscila Reis 42 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


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Show da Polly, com Cleide Amorim_ foto Priscila Reis 44 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


“A ideia do show era mesmo a de desestressar, dar risada, fazer piada, não pensar em nada, só rir e se divertir. Penso que conseguimos! Com a participação dos meus colegas de trabalho, tudo deu certo. Enfim, foi mais uma experiência maravilhosa, pois, depois de um longo tempo, tirar o Show da Polly do palco, levar para um local mais intimista e com um caráter mais descompromissado, sendo feito na base do improviso, com erros e surpresas como num programa ao vivo, não foi só gratificante pelas risadas, mas foi muito desafiador.” Cleide Amorim Artista-pesquisadora da Trupe Sinhá Zózima e atriz responsável pela atividade Show da Polly

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Show da Polly, com Erica Rapu_ foto Priscila Reis 46 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Show da Polly, com Nycole Frazão_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 47


Embarcando com humor - 1ª palhaçada experimental Eu transito, com Amanda Massaro | Cia. Asfalto de Poesia _ foto Priscila Reis 48 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


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Embarcando com humor - 1ª palhaçada experimental Eu transito, com Marcela Sampaio | Cia. Asfalto de Poesia _ foto Priscila Reis 50 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


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Cômicas, com Clã Estúdio das Artes _ foto Priscila Reis 52 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Embarcando com humor - 1ª palhaçada experimental Eu transito, com Maria Silvia Do Nascimento | Cia. Asfalto de Poesia _ foto Priscila Reis

“Em parceria com a Trupe Sinhá Zózima realizamos a 1ª Mostra no Transporte Urbano em São Bernardo do Campo e a Mostra Arte Expressa no Expresso Tiradentes. É sempre maravilhoso estar no ônibus numa relação direta com as pessoas. Para a arte da palhaçada isso influencia diretamente na forma de atuar, favorecendo o improviso e instigando a pesquisa de uma nova gestualidade e movimentação cênica. O potencial revolucionário de ir até o público também é inspirador! Viramos a rotina de ponta cabeça e nariz vermelho!” Maria Silvia Do Nascimento atriz da atividade Embarcando com humor - 1ª palhaçada experimental Eu transito | Cia. Asfalto de Poesia TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 53


Iepe, com André Félix | Trupe TeMdona_ foto Priscila Reis 54 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Iepe, com Thais Irentti | Trupe TeMdona_ foto Priscila Reis

“Essa foi a primeira experiência, tanto do grupo como dos atores, de uma intervenção artística num coletivo. Embora a estrutura de nosso espetáculo permita intervenções e improvisos, foi ali que tivemos os maiores desafios de um público que interagia e vivenciava a história junto com os personagens. Eram pessoas que talvez nunca tiveram contato com um espetáculo de teatro. Elas se encantavam com cada fala, cada gesto.” Thais Irentti atriz do espetáculo Iepe | Trupe TeMdona TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 55


Iepe, com Trupe TeMdona_ foto Priscila Reis 56 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Palhaçaré, com Ciclistas Bonequeiros/ Cia Catraca do Riso_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 57


Palhaçaré, com Ciclistas Bonequeiros/Cia Catraca do Riso foto Priscila Reis 58 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Palhaçaré, com Ciclistas Bonequeiros/ Cia Catraca do Riso_ foto Priscila Reis

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Sarau no busão! MAIO Morte às Vassouras com Cláudia Canto e Intervenção de Vladi Victorelli

O coração da baleia com Cláudia Barral

(A) MASSA com Emerson Alcalde

Chão de Terra Batida com Rudinei Borges

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Chão de Terra Batida, com Tásia d´Paula lendo Rudinei Borges_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 61


Morte às Vassouras, com Cláudia Canto e Intervenção de Vladi Victorelli

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O Coração da Baleia, com Je Ane lendo Claudia Barral_ foto Priscila Reis

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Chão de Terra Batida, com Rudinei Borges_ foto Priscila Reis

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“O que mais moveu travessias em mim no encontro no ônibus da Trupe Sinhá Zózima foi a possibilidade de adentrar o silêncio do semblante das pessoas de um ponto de vista diferente, entrecruzadas pelo desaforo da cidade. Uma espécie de alegria brotava ali a partir da poesia que se estabelecia em falas e gestos e na alegria de poder contar. Poder dizer, naquele espaço, foi o que houve de mais precioso, de mais sagaz naquela noite: tudo se movia para as terras batidas do meu ventre.” Rudinei Borges dramaturgo responsável pelo sarau Chão de Terra Batida

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Cantoria JUNHO Psychodelic buss com DJ Diane Moon Fernandez

Nó Destes, No Destino com Henrique Rímoli e Monique Franco

Dobrando à esquina com Kairós Trio: Eric Cavalieri (contrabaixo), Gabriel Marotti (baterista) e Thiago Mota (guitarra)

O Canto das Águas com Priscila Reis, Trupe Sinhá Zózima e Grupo Ubacunhâ de Teatro

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Psychodelic buss, com DJ Diane Moon Fernandez _ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 67


Psychodelic buss, com DJ Diane Moon Fernandez foto Priscila Reis

“Nunca tinha me apresentado num ônibus urbano! Foi uma experiência legal, compartilhar com o público do Terminal Parque Dom Pedro II uma situação surreal e cheia de arte.” Diane Moon DJ responsável pela atividade Psychodelic buss 68 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


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O Canto das Águas, com Priscila Reis | Trupe Sinhá Zózima_ foto Diet Munhoz 70 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Nó destes, No Destino, com Henríque Rímole e Monique Franco_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 71


“Até o momento da apresentação nunca havíamos experimentado esse espaço para tocar e o mais interessante foi a pesquisa de espaços dentro do ônibus para montar a bateria, posicionar os amplificadores e nos posicionar. Isso sem falar da sonoridade que o ônibus nos proporcionou. A respeito do público, mesmo num dia em que o Brasil inteiro parou por algumas horas devido ao jogo da seleção brasileira na copa do mundo, tivemos um público interessante e interessado em coisas diferentes: uns que já acompanhavam o evento e outras, que assim como alguns de nós, foram lá pela primeira vez. Tudo isso conspirou a favor do nosso trabalho, pois temos como ponto de partida a busca dos espaços onde se faz música pela música.” Thiago Mota músico responsável pela atividade Dobrando à esquina | Kairós Trio 72 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Dobrando à Esquina, com Eric Cavalieri, Gabriel Marotti e Thiago Mota | Kairós Trio_ foto Jesú Severo TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 73


dança JUlho Dança da Indignação

Do que é feito o encontro?

com Cia Sansacroma: Gal Martins, Djalma Moura, Ciça Coutinho, Verônica Santos, Tatiane Martins e Junior Gadelha

com ...AVOA! Núcleo Artístico: André Simões, Edi Cardoso, Juliana Rosa, Luciana Bortoletto, Piéra Varin, Simone Lima e Gil Grossi

#solidãocompartilhada com Projeto Nau(frágil) e Núcleo de Dança Amoràterra: Ana Brandão, Aline Le Masson, Aline Binns, Camila de Sá, Leila Monsegur, Gabriel Pires, Lucas Lopes, Pamela Gope, Renata Brandolizi e Thiago Cohen

Ensaio sobre Celeiro com Coletivo Afro Sol: Raifha Monteiro, Ana Paula Quintino, Emerson Queiroz e Juliana Ferraz

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Do que é feito o encontro?, com Simone Lima | ...Avoa! Núcleo Artístico_ foto Priscila Reis


Dança da Indignação, com Verônica Santos | Cia Sansacroma_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 75


Dança da Indignação, com Cia Sansacroma_ foto Priscila Reis 76 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Dança da Indignação, com Djalma Moura | Cia Sansacroma_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 77


#solidãocompartilhada, com Projeto Nau(frágil) e Núcleo de Dança Amoràterra_ foto Priscila Reis

“Ter um espaço tão poroso e permeável de trocas e olhares sensível é de estrema neces[cidade]. Poder trocar com a Trupe e o ônibus/universo foi e é muito rico. O projeto é como um carinho, uma espécie de cura para o cinza rachado do concreto, sem ser dócil e sim doce, porém resistente e persistente no que lhe é mais significativo, o encontro.” Thiago Cohen

criador do Núcleo de Dança Amoràterra e responsável pela atividade #solidãocompartilhada 78 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


#solidãocompartilhada, com Projeto Nau(frágil) e Núcleo de Dança Amoràterra_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 79


Histórias de Onde eu Vim, com Giselda Pereira_ foto Priscila Reis

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“A Cia. de Arte Afro Sol nunca havia se apresentado em um espaço público de tanta movimentação como um terminal de ônibus. Porém o que mais foi gratificante para nós, foi a intervenção de alguns passageiros e moradores de rua que estavam presentes. Nossa dificuldade se deu em relação ao espaço físico do ônibus, por causa dos movimentos tão amplos como da dança africana, mas o calor da plateia tão próxima... foi impressionante ver dentro da bolinha do olho de cada um que estava assistindo. Enfim uma experiência ótima e calorosa!” Juliana Ferraz Ensaio sobre Celeiro, com Juliana Ferraz | Coletivo Afro Sol_ foto Priscila Reis

dançarina do Coletivo Afro Sol e responsável pela atividade Ensaio sobre celeiro TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 81


Do que é feito o encontro?, com Luciana Bortoletto | ...Avoa! Núcleo Artístico_ foto Priscila Reis

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“Nunca tinha tido essa experiência e foi uma possibilidade de experimentar um tipo de proximidade com as pessoas bastante forte. Realizar uma performance assim gera um tipo de fricção com aquele contexto, pois são movimentos muito diferentes, a de um terminal em relação a uma performance. Para nós, dialoga fortemente com a pesquisa que desenvolvemos, com a atuação que nos interessa. Cria outros espaços de relação.” Luciana Bortoletto cofundadora e diretora no ...AVOA! Núcleo Artístico e responsável pela atividade Do que é feito o encontro?

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Histórias Contadas AGOSTO Histórias de onde eu vim com Giselda Pereira

Conto porque me contaram com Vanessa Castro

Cabeças Trocadas com Andrea Cavinato, Juliana Bertolini e Helena Rosenthal

Um diálogo de coração para coração com Fabiana Rubira “Nunca havia me apresentado num ônibus. Foi uma experiência única. Romper esse tempo que engole, com as histórias da origem de todos nós, criar um intervalo de respiro, de pausa, de suspensão. Foi profundamente transformador.” Giselda Pereira contadora responsável pela atividade Histórias de onde eu vim 84 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Histórias de Onde eu Vim, com Giselda Pereira_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 85


Conto porque me contaram_ foto Priscila Reis 86 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


“Por mares nunca dantes navegados adentrei terça-feira passada (12/08/14) num ônibus parado viajei e viajamos!! No início tive medo, medo das águas, das correntezas, das ondas que talvez me tragariam... O mar me acalentou, o ônibus me embalou... As ondas me banharam, me limparam, conversaram comigo... Todos estávamos juntos!!! E vi no leme um rapaz lindo... Anderson... e vi na proa várias moças lindas... e a vi, minha salva-vidas, minha cuidadora, Dona Je... Dona Jeane... e vi tanta gente, tantas histórias, tantos sapatos, tantos trilhares... As palavras que me saltam são tão poucas para dizer o que sinto!!! Dizer que hoje e sempre quero ser passageira e condutora... que o primeiro passo foi dado... que o caminho foi apontado... que é lindo ouvir as pessoas falando ‘acabei de sair do teatro’ saindo do ônibus... de dialogar com cada história e de viajar com cada um.” Vanessa Castro contadora responsável pela atividade Conto porque me contaram

Conto porque me contaram, com Vanessa Castro_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 87


Cabeças Trocadas, com Juliana Bertolini_ foto Priscila Reis 88 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


“Nunca tinha apresentado nesse espaço e mais uma vez gostaria de agradecer pela maravilhosa oportunidade. Pelas características da proposta que desenvolvemos já tínhamos a experiência da proximidade com o público. No entanto, foi interessante observar o quanto a maior proximidade gera intimidade e contato. Foi muito importante essa préestreia do nosso espetáculo para experimentarmos e colhermos a reação do público, o espaço nos trouxe várias ideias para a continuidade.” Andrea Cavinato contadora e responsável pela atividade Cabeças Trocadas

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Cabeças Trocadas_ foto Priscila Reis

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Um diálogo de coração para coração, com Fabiana Rubira_ foto Jesú Severo 92 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

“A primeira vez que me apresentei num palco como contadora de estórias foi em 2006, no encontro internacional de contadores, chamado Boca do Céu. Antes de subirmos ao palco, o maravilhoso contador Giba Pedrosa pediu que contássemos algo inusitado que tivesse a ver com nossa infância. Ele era o mestre de cerimônias naquela noite e nos apresentaria, um a um, usando aquela informação. Eu estava absolutamente nervosa naquela noite, pois seria minha primeira vez no palco em um grande e importante evento. A única memória me surgiu foi: quando eu era bem pequenina, um dos momentos mais felizes da minha vidinha, era quando saía de ônibus com os meus pais. Meus pais nunca dirigiram, sempre saíamos de ônibus, mas para mim o ônibus era melhor que qualquer carro, pois sempre se podia conhecer novas pessoas, as janelas eram grandes, dava para ver melhor o mundo. E, na minha menina imaginação, de 4 ou 5 anos, o motorista de ônibus era um ser incrível, sempre levava a gente pro lugar que a gente queria, sem nem nos perguntar nada, ainda por cima vivia a vida passeando. Então, a primeira profissão que pensei ter na vida foi: motorista de ônibus. Antes de subir no palco naquela noite es-


cutei o Giba dizer bem gostoso e ritmado: ‘Toda menina quando pequenina quer ser bailarina... certo? Errado... Essa menina queria ser motorista de ônibus... bom ao longo dos anos ela mudou de ideia, mas hoje ela dirige um ônibus imaginário repleto de estórias e trouxe uma pra nós escutarmos aqui essa noite...’ E disse meu nome... Aquilo me soou estranho... Pensei: tanta coisa pra lembrar e fui me lembrar dessa bobeira... Mas, quando fui conhecer o trabalho da Trupe, enquanto voltava à noite rodando pelo centro velho de São Paulo, sempre tão lindo e tão feio, contemplando tudo daquela janela enorme, de uma perspectiva tão outra da do carro que dirijo há anos e anos, e sentindo uma estranha alegria de estar ali, lembrei-me desse fato e tudo fez muito sentido... Pensei no poder das palavras evocarem o que aconteceu, mas também, sobretudo, no poder que elas têm de fazer as coisas acontecerem... Por fim, na semana seguinte, após minha apresentação no ônibus, olhando as fotos do Jesú e depois de ter o lido texto de Rudinei Borges, Dentro é lugar longe, me vi assim: tão ‘menina de cabelos negros longos’ a cumprir meu ofício que é dizer, que é contar, que é transportar as pessoas

por viagens imaginárias, por essas paragens maravilhosas que existem dentro de nós...que continuam sempre maravilhosas mesmo quando estamos inseridos num contexto feio, habitando o coração do mundo dos desencantados... às vezes precisamos apenas de um motorista, um guia, que saiba nos levar aonde queremos ir sem nem mesmo dizermos uma única palavra... Foi isso que esse trabalho fabuloso de vocês me proporcionou... E, creio que é isso que vocês proporcionam a quem sobe naquele ônibus: ‘que viver é alumiação de raridade desmedida’... ‘não é para poucos’... ‘viver é multidão: é amanhar dentro das coisas canteiros de jacintos: é correr mundo adentro’... Quando criança, eu já sabia disso, mas agradeço-lhes demais por me fazerem lembrar...”

Fabiana Rubira contadora responsável pela atividade Um diálogo de coração para coração TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 93


#VoudeBus - Mobilidade SP Mostra de Intervenções Artísticas SETEMBRO Ônibus da Saúde Besteirológica com Grupo Operação de Riso: Kleber Brianez e Ligia Campos

e Reinaldo Soares (trompete)

Slam da Guilhermina

Motiva BUS

com Slam da Guilhermina: Emerson Alcalde (apresentador), Rodrigo Motta (apresentador e fotógrafo), Cristina Assunção (videomaker) e Uilian Chapéu (matemático)

com DJ Rodrigo Silva, Childs (grafite) e Maíra Contes (B-girl)

Improvisações nos espaços com Chaiss na Mala: Vinicius Chagas (saxofone), Fabio de Albuquerque (bate-ria de mala), Rob Ashtoffen (contrabaixo e saxofone), Eder Hendrix (guitarra) 94 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

Tropical Noir# Luciana mãos de banana no coletivo com Luciana Ramin e Agrupamento Andar7 (happening)

HELOISA no chão da sala com Celso Correia Lopes (diretor e autor), Roberta Giotto (ilustradora) e Júlia Ribas (atriz)


Ônibus da Saúde Besteirológica, com Kleber Brianez Grupo Operação do Riso_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 95


Ônibus da Saúde Besteirológica, com Kleber Brianez e Ligia Campos | Grupo Operação do Riso_ foto Priscila Reis

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“A ação é incrível! É democrática, acessível, abre mil possibilidades de encontros e trocas... Enfim, a cidade, as pessoas, ganham muito com isso.” Ligia Campos cofundadora do Grupo Operação de Riso e atriz responsável pela atividade Ônibus da Saúde Besteirológica

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“Muito bom e ousado, fico feliz por ter pessoas movendo a engrenagem da cultura fora do fim de semana. Já fiz isso e sei que é tenso.” Uilian – Chapéu matemático e responsável pela atividade Slam da Guilhermina 98 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Slam da Guilhermina, com Slam da Guilhermina_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 99


“Quando fomos convidados achei a ideia ótima e bem a nossa cara, justamente por ser em um elemento típico do espaço público, o famoso coletivo ou busão. Para tocar na rua a gente sempre pega ônibus. É um local familiar e, ao mesmo tempo, peculiar, porque nunca havíamos tocado de fato em um ônibus, ainda mais em movimento.”” Rob Ashtoffen cofundador do Chaiss na Mala e músico responsável pela atividade Improvisação nos espaços

Improvisações nos Espaços, com Rob Ashtoffen | Chaiss na Mala_ foto Priscila Reis 100 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Heloísa no Chão da Sala, com Roberta Giotto e Júlia Ribas_ foto: Priscila Reis

“É muito bacana ter um espaço como esse para nós artistas podermos experimentar e apresentar ao público nossa pesquisa. É engraçado o quanto temos carência desse tipo de abertura. A aventura de se trabalhar em um ônibus, é um episódio a parte. São muitos os fatores a serem considerados: o público é diferente, as instalações, o espaço físico, as intervenções externas... tudo, é muito diferente do que estamos acostumados. Mas vale muito a pena! É, sem dúvida, um espaço de vanguarda no fazer artístico, sem falar na abertura de possibilitar o poder da arte à um público que nem sempre tem a oportunidade de experimentar.” Roberta Giotto ilustradora responsável pela atividade HELOISA no chão da sala TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 101


Motiva Bus_ foto Priscila Reis

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Motiva Bus_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 105


conversações outubro e novembro A programação, incorporada a ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro!, faz parte do projeto Os minutos que se vão com o tempo: da imobilidade urbana ao direito à poesia, à cidade e à vida, contemplado pela 24º Edição da Lei de Fomento.

Passageiros em Trânsito com Andrea Paula dos Santos, do Núcleo de Estudos em História Oral (NEHO/ USP)

Lembranças de passageiros em trânsito com Andrea Paula dos

Santos, do Núcleo de Estudos em História Oral (NEHO/ USP)

Urbanismo, moradia e transporte com Raquel Rolnik

As vigas do heroísmo – reflexões sobre A Odisseia, de Homero com Gilberto Figueiredo Martins

A invenção do cotidiano de Michel de 106 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

Certeau com Rodrigo Morais Leite A poética do espaço de Gaston Bachelard com Marcos Ferreira Santos Transporte público e mobilidade com APĒ - Estudos em Mobilidade

Eldorado – os pequenos acontecimentos poéticos no cotidiano com Eduardo Okamoto

A Sociologia do Trabalho com Ruy Braga

Trupe Sinhá Zózima e seus movimentos de pesquisa com artistas-pes-

quisadores da Trupe Sinhá Zózima


“Falar da Trupe Sinhá Zózima nos remete a sonhos e poesia...esse grupo constrói há anos um trabalho vigoroso e potente, são pelejantes, desbravadores de universos áridos e inóspitos. Estão num lugar que toca o coração e no meu entender tecem dramaturgias delicadas e muito profundas. Um dos grandes desafios de fazer teatro de caráter público na cidade de São Paulo é estabelecer contato com a população, é cativar os expectadores e a Trupe Sinhá Zózima buscou um caminho muito singular. O ônibus como espaço cênico, o trajeto dos coletivos urbanos como palco e plateia, a viagem real se misturando a dramaturgia. A constante quebra de regras, modelos, lugares comuns. Possibilidades artísticas que tocam os transeuntes, os “usuários” dos transportes públicos da cidade, a cidade em movimento na cena, o transbordamento da relação artista e público. Fagulhas de epifanias coletivas. Tivemos uma aproximação maior com o trabalho da Trupe após terem seus projetos contemplados pelo Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a cidade de São Paulo da Secretaria Municipal de Cultura e pudemos acompanhar a entrega vertical que fazem a tudo aquilo que se propõe. A comemoração de 1 ano da ação Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro! é mais um exemplo disso e um privilégio para seus parceiros, poder públicos e tantos outros, que de alguma forma contribuem para que a Trupe Sinhá Zózima continue tão importante caminhada.”

Marisabel Lessi de Mello Diretora do Núcleo de Fomentos Culturais / Linguagens da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo

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Passageiros em Trânsito, com Andrea Paula dos Santos NEHO USP_ foto Priscila Reis 108 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


“O trabalho com a Trupe no primeiro dia das Conversações, no Terminal Parque Dom Pedro II, foi uma grande abertura! Cada pessoa que resolveu aceitar o convite e entrar ali para conversar dentro do ônibus foi desafiada a construir para si um encontro com o outro, aquele estranho que está ao nosso lado, tão próximo, mas com quem não conseguimos de fato conviver, compartilhar experiências... Sabemos que a dinâmica da megalópole é cruel e, ao não criarmos a abertura, com sinceridade, para falar e ouvir uns aos outros, acabamos por sofrer e perpetuar um dia a dia de violências cotidianas, mesmo sem perceber. Questionamo-nos: como não transformar uma proposta de troca de experiências em mais desigualdades ou em conversas vazias, sem significados que efetivamente nos movam e comovam? É por isso que esses encontros com os passageiros em trânsito que somos, as nossas conversações poéticas são tão necessárias se quisermos nos reinventar, construindo linguagens e conhecimentos muito importantes sobre nós mesmos e sobre o mundo em que vivemos. E foi assim que em duas Conversações seguidas, fizemos algo muito raro e especial por meio do exercício da oralidade. Praticamos atos corajosos de compartilhar nossas histórias de vida, buscando a difícil arte de não eliminar, mas sim dar reconhecimento e visibilidade, sobretudo, aprender com as diferenças que temos uns com os outros. Assumimos na conversa uma poética da diversidade cultural como a maior riqueza humana que todos podemos ser! O resultado é que dessa maneira, simultaneamente singela e complexa, fomos presenteados com saberes plurais, amizades novas e narrativas únicas que agora fazem parte das histórias especiais e singulares de cada um de nós... e que, certamente, serão mais e mais compartilhadas em aberturas para conversações infinitas dentro e fora daquele ônibus que, em 2014, esteve no Terminal Parque D. Pedro modificando para sempre o sentido do que entendemos por abertura, conversa, encontro e conexão em São Paulo.”

Andrea Paula dos Santos Oliveira Kamensky pesquisadora-fundadora no Núcleo de Estudos em História Oral da USP (NEHO-USP) e professora da Universidade Federal do ABC (UFABC) TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 109


A invenção do cotidiano de Michel de Certeau, com Rodrigo Morais Leite_ foto Priscila Reis 110 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


“Que dizer da experiência de ter participado do projeto Conversações? Poucas vezes me senti tão à vontade para comentar um determinado evento, pois é disso que se trata Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro!: um evento, um fenômeno de cunho realmente singular. Quem poderia imaginar que o Terminal Parque Dom Pedro II, salvo engano o maior da cidade de São Paulo, um dia abrigaria uma série de palestras, muitas das quais sobre assuntos considerados complexos, como literatura antiga e sociologia francesa?! Pois é exatamente esse o encanto, o charme do projeto, ao levar para um local inusitado, onde ninguém esperaria por um acontecimento dessa ordem, aquilo que se costuma designar genericamente de cultura. E o melhor: de graça e aberto ao público em geral. Mais interessante ainda é o fato de as conferências serem ministradas dentro de um ônibus estacionado na plataforma zero do terminal, isto é, na plataforma de entrada. Ao propor semelhante projeto, A Trupe Sinhá Zózima presta uma contribuição no mínimo expressiva à cidade onde está sediada. Não bastasse a louvável atitude de propor novas significações a um objeto normalmente associado ao desconforto da lida diária (o ônibus), ocupar uma parte do Terminal Parque Dom Pedro II e oferecer aos seus “frequentadores” um programa educativo é também um ato de resistência, ao fazer com que um local tido como “de passagem” torne-se um local “de convívio”. Não é necessário ser um especialista em urbanismo para perceber a importância disso no sentido de revitalizar certas regiões da cidade hoje consideradas degradadas, entre outros motivos devido ao fato de nelas as pessoas não se sentirem convidadas a permanecer. Por tudo isso, acredito que o projeto Conversações, que para muitos talvez soe como algo exótico, deveria ser observado como política séria de intervenção urbana, da qual não se pode prescindir quando o objetivo comum é a construção de uma São Paulo mais civilizada.”

Rodrigo Morais Leite Professor de Teoria Teatral da Escola Livre de Teatro de Santo André TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 111


A poética do espaço de Gaston Bachelard, com Marcos Ferreira Santos_ foto Priscila Reis 112 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

“Um ônibus antigo. Memórias revisitam a imaginação e cutucam grandes imagens que se descortinavam pelas janelas: aos nove anos de idade indo para o chão da fábrica na Santo André operária. Chance de conhecer mestres, de torno e de vida. Um chileno que falava de Neruda, Violeta Parra, mapuches e vinhos sob a moldura da cordilheira dos andes. Imagens que se impregnaram na alma de uma criança que foi longe atrás dos sonhos, da poesia e das imagens. Andarilho, correr mundo: natureza, povos tradicionais, a potência da palavra. O parque Dom Pedro não é o mesmo que conheci: espaço aberto e com poucas linhas de ônibus funcionando da extinta CMTC, em padrões bege e azul antigo. Palco do nascimento de vários poemas em escrita tortuosa no movimento sacolejante do ônibus. Obra faraônica agora cresceu com a cidade e seu labirinto (antes nostálgico e romântico) ficou um tanto feio, agressivo, perigoso: mais impessoal. O ritmo se acelerou ainda mais e já sem a garoa infinita umedecendo a alma citatina. A proximidade do quartel da 2ª. região do Exército também me abala a memória. As ruínas fantasmagóricas abandonadas


exalam pelas janelas, como bocas desdentadas, as almas de tantos que sofreram ali, conhecidos, amigos, parceiros. Muitos mortos dentro daquelas paredes surdas pelo poder opressor, naquele momento, reconhecível vestido de farda, botas e armas. Hoje ele se mimetiza no anonimato. Já não sabemos onde andam e andam por todos os lados. Descobrimos o ônibus do projeto na plataforma zero. Significativo. Um pequeno grupo de pessoas conversando, aguardando, é o sinal da proximidade. Do turbilhão de imagens-memória iniciamos a jornada da Trupe Sinhá Sózima com o ônibus parado. Recepção gentil e expectativas saltitando nos peitos contidos. Gente boa esperando ouvir. A voz embargada e com rouquidão atrapalha um pouco. Sempre me maravilhei com a poética do ouvir que nos exige uma poética potente da palavra viva. A voz obedece ao imperativo desta palavra viva. A tradição oral nos povos originários nos atesta a permanência desta potência que se insurge contra a palavra-informação morta já na garganta. Resolvo começar com um isqueiro aceso e luzes apagadas. Me vem in totum a obra

“A chama de uma vela”, última obra de Bachelard e suas confissões de um fazedor de livros à luz de uma vela. Se olho a página escrita, estudo. Se levanto os olhos para a chama: devaneio. Na ampulheta invertida da chama, o tempo escorre para o alto. Estranhamentos... Mas, a boa alma dos ouvidos cede à palavra poética. Viajamos juntos. Cumplicidade que se sente vibrando no ar. Conto sobre o camponês Bachelard, servidor dos correios e combatente no fronte contra o totalitarismo, bem como o tardio professor universitário. Revolucionário da ciência e investigador da imaginação material: água, ar, terra e fogo. Sem misticismos. Dialogamos com a experiência do corpo e com as imagens primordiais que nos acometem na infância ao descobrir, desmontar e reinventar o mundo. Antes de sermos mortificados e calados, racionalizados pelo sistema escolar e sua fábrica de inutilidades para a existência: preparação ao vestibular e talvez inclusão no mercado de trabalho. Ilusões contemporâneas. A viagem prossegue. Com o ônibus estacionado na mesma plataforma do início. Ninguém percebe. Transformamos, por TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 113


um breve instante (poético, lembraria o mestre), aquele espaço num lugar. Os espaços são domínio dos geômetras. O lugar é o espaço habitado: quando nos instalamos e cultivamos no espaço do instante, aqui e agora, as memórias que queremos para o amanhã. E que serão base para as “ladainhas da alma” que cantaremos sobre nossas memórias inventadas (como diria o outro mestre bachelardiano, Manoel de Barros) para as gentes novas (crianças, jovens, adultos ou terceira idade – não importa, pois não é um problema cronológico, mas de espírito). Repetiremos o mantra dos sonhos para lembrar às gentes novas a dívida que temos com aqueles que sonharam antes de nós. E assumirmos a herança e compromisso de sermos nós próprios. O andarilho pelos lugares – aquele que não viaja pelos espaços, mas habita as paisagens – se hospeda na alteridade. E parte novamente. A tarefa prazenteira, mas não menos difícil, é transformar o espaço em lugar. Questão de diálogo e de partilha das imagens-memórias em nossas insuperáveis solidões. Bachelard, mais de uma vez, reafirmaria: não me venham com vos114 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

sas solidões, pois a minha já basta, mas preciso das tuas imagens. E é preciso uma potência psíquica valiosa quando se ama as imagens e os conceitos. O teatro, sem dúvida, cumpre sua herança quando retorna ao cotidiano das ruas e dos movimentos topofílicos (que têm relações de amor e ódio com o lugar) e sai das clausuras do espetáculo. A palavra-gesto se cumpre em sua destinação de trupe.” Quando um rio começa um peixe Ele me rã Ele me árvore De tarde, um velho tocará sua flauta Para inverter os ocasos Manoel de Barros

Marcos Ferreira Santos folklorista, arte-educador e pedagogo. Integrante do Lab_Arte (USP)


Urbanismo, Moradia e Transporte, com Raquel Rolnik_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 115


Vigas do Heroísmo, com Gilberto Figueiredo Martins_ foto Priscila Reis 116 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Eldorado – os pequenos acontecimentos poéticos no cotidiano, com Eduardo Okamoto_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 117


Transporte público e mobilidade, com APĒ - Estudos em Mobilidade_ foto Priscila Reis 118 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


A Sociologia do Trabalho, com Ruy Braga_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 119


Urbanismo, Moradia e Transporte, com Raquel Rolnik_ foto Priscila Reis 120 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Claudia Barral durante atividade Passageiros em Trânsito_ foto Priscila Reis

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goiabeira dezembro Exposição multimídia em comemoração a um ano da ação Toda Terça Tem Trabalho Tem Também Teatro! no Terminal Urbano Parque Dom Pedro II

Goiabeira Tudo que eu não invento é falso. Manoel de Barros

E, assim, numa noite de terçafeira surgiu o convite para mostrar um pouco do que aconteceu no Toda Terça Tem Trabalho, Tem Também Teatro! de 2014. Foram tantas emoções! Em noite de poesia, o ônibus criou asas e voou pelas ruas de sampa! O busão também virou barco a vela com direito a marinheiro só! Teve palhaço com bicicleta alada, trompete que ri e bateria que anda, lavadeira de rio que viajou no tempo cantando e viajante da idade média pegando carona pro seu reino da ilusão. Teve noite que um grande rádio apareceu e o terminal remexeu sua ca122 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

traca. Ah! teve terça que fomos à Índia, África, Bahia, Pará e Ítaca! Dúvida? Veja com outros olhos o que na nossa terra pode nascer. Agradeço imensamente a oportunidade de fazer parte dessa história. E agradeço eternamente as pessoas que colaboraram pra que essa goiabeira nascesse aqui, no quintal da nossa casa.

Priscila Reis

curadora da exposição (fotos) atriz-pesquisadora e cofundadora da Trupe Sinhá Zózima


Os cipós mantêm-se enraizados no solo, mas passam a vida crescendo em direção à luz. O Toda Terça 2014 foi e continuará sendo cipó-raiz, crescendo nas rachaduras do concreto das plataformas do Terminal Parque Dom Pedro II. Um ônibus frutífero de arte; dança, teatro, música, poesia, humor e encontros. Encontros entre EU e TU! Encontros entre NÓS e ELES! Que a Trupe continue semeando arte e criando espaço para promover encontros entre gente, entre pessoas. O ônibus pode ser mais que transporte, pode ser casa, pode ser árvore. Pode ser poesia. Sigamos redescobrindo lugares e brincando com o tempo! Agradecida.

Maria Alencar

Exposição Goiabeira_ foto Paula Venâncio

curadora da exposição (instalação) atriz-pesquisadora da Trupe Sinhá Zózima TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 123


O que dizer sobre um ano de atividade cultural dentro de um terminal urbano de ônibus. Que desafio mais encantador. Paramos para ver todas as terças de 2014 artista e pesquisadores reiventando o ônibus com arte e outras possibilidades. Observamos para entrar em contato com uma das principais artérias de movimento de Sao Paulo. Uma veia que apenas era entendida como lugar de passagem e não de paragem. O desafio foi transformar o tempo em pausa... Cada trabalhador que participou trocou energia com o terminal e talvez passou a observá-lo de forma outra. Como se a cada dia do Toda Terça uma espécie de raiz crescesse, raiz funda, raiz forte, árvore nascente que logo daria frutos. E quantos frutos não deu?! Goiabeira é isso. Uma árvore semeada e germinada no duro concreto paulista. Com frutos deliciosos que encantou o público que participou/comeu. Realizar uma exposição como Goiabeiras é se deliciar com as imagens do que já foi. E é se encontrar com a memória que criamos no tempo e espaço do terminal Parque Dom Pedro II.

Junior Docini

curador da exposição (vídeo) ator-pesquisador da Trupe Sinhá Zózima 124 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Exposição Goiabeira, com os curadores Priscila Reis, Junior Docini e Maria Alencar_ foto Tatiana Nunes

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Agnaldo Lago_ foto Priscila Reis 126 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Exposição Goiabeira_ foto Priscila Reis TRUPE SINHÁ ZÓZIMA 127


Exposição Goiabeira, com Je ane_ foto Priscila Reis 128 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA


Exposição Goiabeira_ foto Priscila Reis

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Exposição Goiabeira_ foto Paula Venâncio

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Ficha técnica

2014 Coordenador Anderson Maurício

Equipe de apoio Cleide Amorim Maria Alencar Tatiana Nunes

Produção Geral Tatiane Lustoza

Motorista Wharley Frazão

Assistentes de Produção Érica Rapu Jeane Silva

Assessoria de imprensa e redação Paula Venâncio

Produção Conversações Thais Polimeni Audiovisual Junior Docini Priscila Reis 132 TRUPE SINHÁ ZÓZIMA

Fotografias Christiane Forcinito Danilo Dantas Diet Munhoz Jesú Severo Priscila Reis Rafael Marcos Jesus


Design gráfico Deborah Erê Desenhos Guilherme Kramer Roberta Giotto Deborah Erê Webmaster Danilo Peres

Contatos www.sinhazozima.com.br contato@sinhazozima.com.br 55 (11) 96292-0447 55 (11) 2584-2852

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Realização

ação

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PROJETO

Apoio Institucional


“conversações“ é apoiado por

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/sinhazozimaoficial WWW.sinhazozima.com.br

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