10 Saúde Bucal do Diabético

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Saúde Bucal no Paciente Diabético O paciente diabético apresenta quadro que exige cuidados e inclusive pode vir a ser diagnosticado no consultório odontológico. Capítulos 1. Introdução

Atualizado e Ilustrado 2. Complicações do Diabetes mellitus

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3. Abordagem Coletiva

5. Por que substituir as próteses?

6. Referências e Créditos

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1. Introdução !

4. Abordagem Individual

uma vez que não há controle da processo, incluindo 4 classes clínicas: filtragem

glomerular

feita

O termo diabetes vem do ADH.

pelo DM tipo 1, DM tipo 2, outros tipos específicos de DM e DM gestacional. Existem ainda outras categorias

grego e quer dizer “sifão” ou ! O diabetes mellitus (DM) é “manter as pernas afastadas”. O forma epidêmica de diabetes, referidas como pré-diabetes, as quais termo faz alusão à presença da caracterizada principalmente por não são entidades clínicas, mas de risco para o poliúria, ou seja, ao fato de que o poliúria e hiperglicemia. Estima-se fatores líquido produzido pelo metabolismo que no Brasil existam 8 milhões de desenvolvimento de DM e de corpóreo é em grande quantidade e indivíduos com DM, e que esta doenças cardiovasculares. passa rapidamente pelo rins, provoque impacto considerável na ! O DM tipo I é o resultado de originando a urina, a qual no taxa de mortalidade brasileira, bem uma destruição das células beta passado era eliminada com o como custo oneroso ao serviço pancreáticas com conseqüente indivíduo em pé e de pernas público de saúde devido à sua deficiência de insulina. Na maioria afastadas (Rezende, 2007). cronicidade e aos seus meios de dos casos essa destruição é de O diabetes pode ser do tipo controle (SBD, 2006). O uma gama insipidus e mellitus. O diabetes compreende !

DM natureza auto-imune, mas existem de situações

em

que

essa

auto-

metabólicos cuja imunidade não é evidente, sendo insipidus é originário da deficiência distúrbios de ADH (hormônio antidiurético) ou característica em comum é a então de natureza idiopática. O tipo pela insensibilidade dos rins a esse hiperglicemia. Em geral, ocorre I corresponde a 5-10% dos casos de hormônio, o qual é produzido pela deficiência de insulina, o que gera DM. adeno-hipófise. Caracteriza-se por aumento das taxas de glicose no ! O DM tipo II caracteriza-se poliúria, sede excessiva e polidipsia. sangue. por defeitos na ação e na secreção da Os líquidos corpóreos passam pelos ! A classificação aceita pela insulina. O indíviduo pode rins e são eliminados rapidamente OMS e pela Associação Americana apresentar taxa de insulina sob a forma de urina bem líquida, de Diabetes considera a etiologia do insuficiente em relação à carga da Caderno de Atenção Básica no 17 - Saúde Bucal - Ministério da Saúde

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glicose ou incapacidade hipertensão arterial sistêmica. As diminuição dos tecidos periféricos em doenças

vasculares,

como

da

angiogênese;

o

a paciente com DM exibe menor

responder à insulina, tornando-se ateroesclerose, são a principal causa migração de células endoteliais no resistentes à ela. Na maioria das de morte dos pacientes diabéticos do local lesionado, o que leva à menor situações, são observados os dois tipo 2, principalmente devido às n e o v a s c u l a r i z a ç ã o

e,

fenômenos no indivíduo.

no

!

nefropatias, à hipertensão arterial conseqüentemente,

Outros tipos específicos de

( g l i c o c o r t i c ó i d e s , evento de grande incidência nos

interferon alfa, hormônio tireoidiano pacientes etc.)

ou

a

infecções

atraso

sistêmica e às dislipidemias (Gross, processo reparativo;

Nehme, 1999). A retinopatia DM incluem indivíduos que diabética acomete cerca de 40% dos apresentam defeitos genéticos nas pacientes diabéticos e é a principal células beta pancreáticas e alterações causa de cegueira em pacientes com p a n c re á t i c a s ( p a n c re a t i t e s , 24 a 72 anos de idade portadores neoplasias, acromegalia), bem como DM tipo 2. pode ser secundária a administração de medicamentos ou agentes O pé diabético constitui também um químicos

a

com

(rubéola provocando

diabetes

tipo

2,

hospitalizações

presença de microangiopatias, caracterizadas por lesão endotelial freqüente provocada por proteínas glicadas, bem como por depósito protéico

na

parede

vascular

(arterioloesclerose); diminuição migração

da

diferenciação

de

endoteliócitos

e

fibroblastos, e

células

osteoprogenitoras e, freqüentes e amputações. A grande conseqüentemente, menor produção maioria (85%) dos casos graves que ! O DM gestacional é a forma de colágeno, de vasos sanguíneos e levam à hospitalização é originária semelhante ao DM tipo 2, contudo é de tecido ósseo (Graves et al., 2006). de úlceras superficiais associadas à diagnosticado durante a gestação. diminuição de sensibilidade por Quanto a maior possibilidade de Não exclui a possibilidade de a neuropatia diabética e a pequenos bacteremia e septicemia, tem sido paciente já ser portadora traumas (Gross, Nehme, 1999). observado que focos infecciosos na previamente à gravidez. Em geral, cavidade oral, principalmente após o parto a paciente torna-se De interesse odontológico, em periodontopatias, provocam normoglicêmica, porém relatos têm termos locais, deve-se atentar alterações sistêmicas importantes, demonstrado um risco de especificamente às alterações no com aumento de citocinas e fatores desenvolvimento de DM tipo 2 no processo reparativo do portador de de crescimento, indicativos de prazo de 5 a 16 anos após o parto DM, bem como ao risco de resposta inflamatória geral, os quais (SBD, 2006). bacteremia e septicemia derivados contribuem para o desenvolvimento de focos infecciosos na cavidade de doenças vasculares (Graves et al., oral. 2006). A bacteremia derivada do congênita, citomegalovírus etc.).

2. Complicações do Diabetes mellitus

Quanto ao processo reparativo patógenos do periodonto prejudicado (Brem, Tomic-Canic, contribuem para a resistência à 2007), observa-se:

As

complicações

do

diabetes

mellitus (DM) podem ser agudas ou crônicas. As agudas incluem o coma

intensa liberação de fatores próinflamatórios, derivados de estresse

oxidativo intenso; isso leva a por cetoacidose ou o coma por aumento da intensidade hipoglicemia. As crônicas são inflamatória, o que desrregula o caracterizadas por micro e binômio inflamação-reparação; macroangiopatias, retinopatia

insulina e à destruição das células beta

pancreáticas.

inflamatórios

na

Assim,

focos

cavidade

oral

constituem fator de risco para o desenvolvimento de respostas inflamatórias que podem contribuir para complicações crônicas em nível sistêmico.

diabética, nefropatias diabética e Caderno de Atenção Básica no 17 - Saúde Bucal - Ministério da Saúde

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Como manifestações orais do DM destaca- eficácia do tratamento. A tabela abaixo relaciona os se, além da periodontite severa, acúmulo de valores de HG com o de glicemia; valores acima de 7% placa bacteriana, gengivite, sensação de boca seca com indicam a necessidade de uma revisão do esquema xerostomia (devido a comprometimento das glândulas terapêutico em vigor, uma vez que o paciente passa a salivares, bem como a desidratação decorrente da ficar exposto a complicações, tais como cardiopatias, hiperglicemia) e infecções recorrentes por Candida.

nefropatias e retinopatias.

3. Glicemia e pressão arterial no diabetes mellitus

Nível de HG Glicemia média (mg/ Nível de HG Glicemia média (mg/

!

(%)

Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, são

três os critérios para o diagnóstico de DM:

dl)

(%) 100

9

240

6

135

10

275

7

170

11

310

8

205

12

345

sintomas de poliúria, polidipsia e perda ponderal, Adaptado de SBD, 2006. com glicemia casual acima de 200 mg/dl;

glicemia de jejum ≥ 126mg/dl (7 milimois);

!

dl)

5

A hipertensão arterial freqüentemente está

glicemia de 2 horas pós-sobrecarga de 75g de glicose associada ao DM. No DM tipo 1 a pressão começa a se elevar 3 anos após o início da microalbuminúria, a qual acima de 200mg/dl. é derivada da nefropatia em estágios iniciais; já no DM ! A Tabela abaixo resume os valores de glicemia tipo 2 40% dos pacientes já estão hipertensos por aceitos como identificadores de DM. ocasião do diagnóstico de diabetes (SBD, 2006). A •

Categoria Glicemia normal

Jejum* < 100

2 horas após 75 g

Tolerância à glicose > 100 e < 126

≥ 140 a < 200

diminuída Diabetes mellitus

≥ 200

≥ 126

Casual**

de glicose < 140

hipertensão pode predispor à nefropatia diabética, bem como a doenças cardiovasculares importantes. Para prevenir essas complicações, é necessário manter a pressão do paciente em níveis mais baixos que os

≥ 200 (sintomas

usuais. Assim, níveis de pressão arterial inferiores a

clássicos)***

130/80 mmHg devem mantidos; havendo proteinúria e

*O jejum é definido como a falta de ingestão calórica por no mínimo 8 horas; **glicemia plasmática casual é aquela

insuficiência renal, a pressão deve se aproximar de 120/75 mmHg. (Veja mais informações sobre

realizada a qualquer hora do dia, sem se observar o intervalo desde a última refeição; ***os sintomas clássicos de DM incluem poliúria, polidipsia e perda não-explicada de peso.

hipertensão arterial).e desenvolvimento de DM tipo 2

Nota: O diagnóstico de DM deve sempre ser confirmado pela repetição do teste em outro dia, a menos que haja hiperglicemia inequívoca com descompensação metabólica aguda ou sintomas óbvios de DM. Adaptado de SBD, 2006.

no prazo de 5 a 16 anos após o parto (SBD, 2006).

4. Tratamento odontológico do paciente diabético !

!

É recomendado também o teste para detecção

dos níveis de hemoglobina glicada (HG). Esse teste evidencia os níveis médios de glicemia que o paciente

O tratamento odontológico do paciente com

diabetes mellitus (DM) deve prever, em primeira instância, a pesquisa quanto a glicemia do paciente e ao regime terapêutico instituído, principalmente quanto

aos hábitos nutricionais recomendados e às medicações. tinha 2 ou 3 meses da data de realização do teste de HG, O objetivo maior é não provocar episódios de tendo grande utilidade no controle glicêmico e na Caderno de Atenção Básica no 17 - Saúde Bucal - Ministério da Saúde

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hipoglicemia decorrentes da ausência de lembrado, além disso, que procedimentos cirúrgicos e ingestão de alimentos devido a dificuldades anesthesia de alimentação (McKenna, 2006). !

pós-procedimentos

provocam

alterações

hormonais

que

odontológicos estimulam a gluconeogênese e a glicogenólise, acarretando aumento dos níveis de glicose no sangue

Como plano de tratamento, é recomendável a

(Bergman, 2007).

remoção de focos infecciosos o mais rapidamente !

A

prescrição

de

anti-inflamatórios

não-

possível. Tem sido evidenciado que bactérias da esteroidais (AINEs) deve ser compartilhada com o cavidade oral, particularmente da doença periodontal, médico, uma vez que é sabida a interferência dessas provocam aumento de fator de necrose tumoral α no drogas sobre as de controle da glicemia. Algumas plasma sanguíneo, o qual parece contribuir para a drogas que potencializam a ação hipoglicemiante são resistência à insulina (Engebretson et al., 2007). Assim, AINEs,

beta-bloqueadores,

antifúngicos

e

um paciente com DM e infecções crônicas bucais antidepressivos cíclicos. Algumas drogas que diminuem possivelmente apresenta resistência à insulina e, uma a ação hipoglicemiante são corticóides, estrógenos, vez tratado, deve ser submetido novamente a avaliação bloqueadores de cálcio e rifampicina. médica, para adequação da terapêutica hipoglicemiante. !

É recomendável instituir medida terapêutica

preventiva contra doenças periodontais, já que a

5. Referências e Créditos

severidade das infecções de bactérias periodontopatogênicas e a perda óssea alveolar são Bergman SA. Perioperative management of the diabetic patient. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol mais acentuados no DM (Graves et al., 2006). Endod. 2007 Jun;103(6):731-7.

!

Quanto aos atos cirúrgicos, se o paciente está

com a glicemia controlada e não será submetido a Brem H, Tomic-Canic M. Cellular and molecular basis of wound healing in diabetes. anestesia geral, estes devem ser realizados no período da manhã, após a ingestão dos medicamentos J Clin Invest. 2007 May;117(5):1219-22. hipoglicemiantes orais. A conduta pós-operatória deve Engebretson S, Chertog R, Nichols A, Hey-Hadavi J, ser a de rotina, sem a necessidade de antibioticoterapia Celenti R, Grbic J. Plasma levels of tumour necrosis profilática. Já para os pacientes com DM tipo 1 e que factor-alpha in patients with chronic periodontitis and serão submetidos a cirurgia oral menor sem anestesia type 2 diabetes. J Clin Periodontol. 2007 Jan;34(1):18-24. geral, é necessária a pesquisa quanto ao regime de Graves DT, Liu R, Alikhani M, Al-Mashat H, Trackman hipoglicemiantes do paciente (Bergman, 2007); o contato PC. Diabetes-enhanced inflammation and apoptosis-com o médico é fundamental, uma vez que é impact on periodontal pathology. J Dent Res. 2006 Jan; recomendável a administração de metade da dose diária 85(1):15-21. de insulina no período da manhã previamente à cirurgia. Se o paciente está com a glicemia entre 100 e Gross JL, Nehme M. Detecção e tratamento das 200 mg/dl, o ato cirúrgico pode ser realizado; para complicações crônicas do diabetes melito: Consenso da valores acima de 200 mg/dl, a administração de Sociedade Brasileira de Diabetes e Conselho Brasileiro insulina é necessária previamente à cirurgia, reduzindo de Oftalmologia. Rev Ass Med Brasil 1999; 45(3): 279-84. os valores para 150 mg/dl (Bergman, 2007). No pósRezende. Diabetes. http://usuarios.cultura.com.br/ operatório, o controle da glicemia em intervalo de até 4 jmrezende/diabetes.htm horas é importante (Bergman, 2007). Em pacientes com controle desfavorável da glicemia, antibioticoterapia SBD. Sociedade Brasileira de Diabetes. Tratamento e profilática deve ser realizada (McKenna, 2006). Deve ser acompanhamento do diabetes mellitus. Diretrizes da

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Sociedade Brasileira de Diabetes, 2006.

Atualização do Caderno de Atenção Básica em Saúde Bucal (link do original) – 2012: Profa. Luciana Corrêa – FOUSP Profa. Marina Helena C. Gallotini de Magalhães FOUSP

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