XXV Simpósio Nacional de História

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85 85. Sensibilidade moderna e valores em mutação na literatura e nas artes Antonio Herculano Lopes – Fundação Casa de Rui Barbosa (herculano@rb.gov.br) Claudia de Oliveira – Fundação Casa de Rui Barbosa (olive.clau@gmail.com) Séculos da noção de pertencer a uma era “moderna” criaram na história das sociedades ocidentais uma verdadeira tradição do novo, apurando o sentimento de se viver num universo instável, em constante mutação. Tal sentimento no campo dos valores éticos costuma ser fonte de angústia, ao retirar dos indivíduos as referências que deveriam garantir-lhes alguma estabilidade nas relações sociais. As letras e as artes têm sido campo privilegiado para a expressão dos sentimentos ambivalentes que acompanham a percepção da mudança constante e da falta de terreno sólido. Este Simpósio Temático se propõe a reunir trabalhos que se debrucem sobre as diversas linguagens artísticas como fonte de interpretação histórica a partir das sensibilidades diante do que é percebido como “tempos modernos”.

Resumos das comunicações Nome: Aldair Smith Menezes E-mail: aldairsmith@uol.com.br Instituição: Universidade Federal de Sergipe Título: “Os desvalidos”: imagens do sertão nordestino Esta comunicação tem como objetivo descortinar como as imagens do sertão presentes na obra “Os Desvalidos”, do escritor sergipano Francisco José Costa Dantas aludem discussões sobre o imaginário social a respeito do sertão e dos sertanejos. Imagens que revelam quadros sócios de memória apropriados para fabricar lembranças. O romance esculpe uma narrativa sobre o sertão entre o final do século XIX e a primeira metade do século XX, apresentando as angústias, os dilemas e as perspectivas de homens e mulheres premidos por uma modernidade inconclusa e excludente. A partir da história do personagem Coriolano, homem simples de caráter forte e valores firmes, o narrador desvela um momento peculiar da história do sertão nordestino marcado pela seca, pela miséria e pelo cangaço. Nome: Amina Maria Figueroa Vergara E-mail: aminaverg@gmail.com Instituição: Universidade de São Paulo Título: A United Fruit Company e a Guatemala de Miguel Ángel Asturias Em fins do século XIX um jovem empresário estadunidense fundou uma empresa exportadora de bananas na República da Costa Rica: a United Fruit Company. A empresa obteve grandes lucros durante as duas primeiras décadas do século XX, se repartiu em várias pequenas empresas após a crise de 1929, retomando fôlego na década de 1950. Minha exposição pretende mostrar uma das possibilidades de interpretação da realidade e aproximação da verdade sobre a história da United Fruit Company na Guatemala. Utilizando-me da trilogia bananeira: Viento fuerte (1949), El Papa verde (1954) e Los ojos de los enterrados (1960) do escritor guatemalteco – laureado com o Prêmio Nobel de Literatura de 1967 – Miguel Ángel Asturias, como fonte histórica e da interconexão entre o discurso literário e o discurso histórico, como metodologia, minha intenção é mostrar a interpretação de Asturias sobre a ação desta multinacional em seu país. Nome: André Luiz de Araújo E-mail: andreharaj@gmail.com Instituição: PUC-SP Título: Farnese: uma história do corpo na arte contemporânea (19641976) Este trabalho aqui apresentado trata-se de uma notícia de pesquisa e, tem como preocupação analisar alguns aspectos históricos das relações entre arte contemporânea e representações do corpo (conceito estético, políticas corporais, poética e transformações na sensibilidade), na obra do artista plástico brasileiro Farnese de Andrade entre os anos de 1964 a 1976. Contudo, vale lembrar que, essa perspectiva de procedimentos de estudos adotados submete-se aqui ao fio condutor de uma história. O principal objetivo desta pesquisa é enfocar questões que despertam interesse nos domínios da história do corpo & cultura: a problematização da arte no contexto da ditadura no Brasil que se agrega na obra de arte sua dimensão política; a subjetividade em obra: Farnese, artista contemporâneo; a figura humana no cerne da obra de arte e o corpo paradoxal: entre o orgânico e morto, entre o totalitário e dilacerado. Dessa forma, buscaremos a historicidade contida em suas representações e sensibilidades, considerando múltiplos fatores que, nas décadas de 1960 e 1970, estabelecem complexos de relações: transformações da consciência, poética da obra, constantes metamorfoses do corpo e o aviso explícito da arte sobre a crise do humanismo ocidental.

Nome: Andreza Santos Cruz Maynard E-mail: andreza_scruz@hotmail.com Instituição: Faculdade São Luís de França Título: A misteriosa chama: memórias do fascismo na obra de Umberto Eco Esta comunicação se debruça sobre o romance “A misteriosa chama da Rainha Loana” (2004), do escritor italiano Umberto Eco. O texto narra o drama de Yambo, um livreiro que perde a memória em um acidente e tenta, a todo custo, recuperá-la. A partir das tentativas do protagonista em acessar os “palácios” e “cavernas” da memória, Eco apresenta ao leitor indícios da vida italiana sob os auspícios do fascismo. Trata-se de um texto que oferece uma instigante bricolagem entre campos do saber como a história, a filosofia, a literatura e mesmo a psicanálise. Apresentado como “romance ilustrado”, o livro possui uma estrutura gráfica recheada de imagens de revistas, livros, cartazes, etiquetas e outros objetos existentes nos tempos de predomínio do fascismo italiano. A obra revela o orgulho em ter Benito Mussolini como o Duce, as canções dos jovens balillas, as dificuldades encontradas quando a Itália entrou em declínio militar e passou a perder uma derrota após a outra. O romance é permeado por diferentes fontes que funcionam como catalisadores da memória de Yambo. Através da obra, é possível identificar aspectos da vida européia nos anos 1930 e 1940. Eco oferece elementos para refletir sobre os tempos de apologia ao regime que se proclamava totalitário. Nome: Anita Prado Koneski E-mail: anitapk@uol.com.br Instituição: Universidade do Estado de Santa Catarina Título: Corpo visual e corpo performático: experiência das artes Podemos perceber que a produção artística no transcurso do período que compreendemos como moderno até nossa contemporaneidade tem um viés de investigação no corpo. Em Baudelaire vemos inaugurada a experiência do corpo, através do flâneur, pautada no “visual”, ou seja, no corpo como centro do mundo, mas que permanece no mesmo instante oculto ao mundo. Corpo que tudo vê, mas não quer ser tocado no qual o “visual”está atrelado ao ocultar-se. O flâneur que define o corpo moderno instala o indivíduo na condição de voyeur sendo que ele é anônimo, um número a mais na multidão. O flâneur tem uma vivência da intersubjetividade como distanciamento dos corpos. A caminhada nas sensibilidades e percepções realizadas nas artes leva-nos a pensar numa concepção de corpo não mais pautada no “visual”, mas numa concepção de corpo em “relação” em que o corpo é consciência da própria materialidade para a vida. Nas performances, por exemplo, o corpo caracteriza-se pela multiplicidade sensorial, inferindo uma transformação na nossa experiência com o corpo. O presente ensaio pretende pensar questões relacionadas a esta intersubjetividade fundada nas artes a partir do corpo “visual” e o corpo “relacional” ou performático e pontuar as questões pertinentes a esta proposta. Nome: Antonio Herculano Lopes E-mail: herculano@rb.gov.br Instituição: Fundação Casa de Rui Barbosa Título: Entre Rio e Paris, meu coração balança Na virada do século XIX para o XX, o Rio de Janeiro misturava brilho mundano, que procurava emular Paris, com forte dinamismo de uma cultura popular urbana, ambos estimulados pela nascente indústria do entretenimento. As vanguardas dos anos 20 elegeram esse momento como alvo de seu escárnio, caracterizando a intelectualidade da época como “prémoderna”. Há cerca de 20 anos, a crítica literária e artística e a produção historiográfica sobre o período começaram um processo de revisão da tábu-

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la rasa promovida pelo modernismo brasileiro. Meu estudo se associa a esse esforço, a partir de um autor relegado nas histórias literárias a uma menção genérica ao grupo dos parnasianos. Tomás Lopes foi diplomata e escritor, tendo deixado, ao morrer aos 33 anos, onze publicações, entre romance, poesia, contos, crônicas e livros de viagem. Seu olhar voltou-se para as elites cariocas do período e reflete uma sensibilidade que tanto celebra o fim nostalgicamente pressentido de uma civilização de refinados valores aristocráticos quanto lamenta a frivolidade da elite, que deveria ser a guardiã de tais valores; tanto celebra o advento dos novos tempos democráticos e, em particular, das mudanças no papel das mulheres quanto lamenta a vulgaridade do povo, que deveria ser o motor das mudanças. Nome: Beatriz Polidori Zechlinski E-mail: beatrizpz@uol.com.br Instituição: Universidade Federal do Paraná Título: O romance moderno e o “gosto feminino” – instabilidade no espaço letrado francês do século XVII Este trabalho é uma análise de dois textos publicados em 1694 e lidos na Academia Francesa: “Contra as mulheres” (“Contre les femmes”), de Nicolas Boileau, e “Apologia às mulheres” (“L’Apologie des femmes”), de Charles Perrault. No momento da produção desses textos acontecia uma desestabilização do espaço letrado francês em vista da atuação das mulheres como produtoras e consumidoras de literatura. A ascensão do romance – que na sua maior parte era escrito e lido por mulheres – foi o mote central de uma série de conflitos e embates no ambiente letrado da sociedade do Antigo Regime, porque ele trazia os sentimentos e as emoções para o centro dos seus interesses e era o propulsor de uma esfera pública para o debate literário. Boileau e Perrault discutem, nos textos analisados, os efeitos positivos e negativos do surgimento, a partir do romance, de um “julgamento feminino” da literatura ou de um “gosto feminino”. A análise desses textos, inserida em uma pesquisa mais ampla sobre escritoras francesas do século XVII, visa refletir sobre as questões de gênero que estavam no cerne de uma enorme ansiedade a respeito do rumo da civilização e dos valores franceses naquele período, já que o potencial de feminizar-se o gosto francês era percebido, por muitos, como uma ameaça. Nome: Claudia de Oliveira E-mail: olive.clau@gmail.com Instituição: Fundação Casa de Rui Barbosa Título: Miscigenação, raça e sexualidade no projeto cultural do Segundo Império e no modernismo Partindo de uma imagem alegórica sobre o Rio de Janeiro e seus habitantes, a comunicação apresenta uma reflexão sobre os temas da miscigenação, raça e sexualidade no projeto cultural do Segundo Império e no modernismo, tomando como fontes de análise as telas, A Carioca (1882), do pintor Pedro Américo, e A Negra (1923) e Abaporu (1928), da pintora Tarsila do Amaral. Nome: Eliezer Cardoso de Oliveira E-mail: ezi@uol.com.br Instituição: Universidade Estadual de Goiás Título: O real em tela: a sensibilidade da catástrofe nas obras de Siron Franco O objetivo desta comunicação é analisar a produção estética do artista goiano Siron Franco sobre o acidente com o Césio 137, ocorrido em Goiânia em 1987. Em seus quadros sobre o acidente, o autor utiliza materiais não-convencionais – ferro, chumbo, terra, etc. – que passam compor a pintura. Esse tipo de material demonstra uma sensibilidade específica de uma estética pós-moderna, na qual há uma tendência de se misturar elementos realistas – concretos – com os elementos simbólicos da pintura. Assim, enquanto na arte clássica, procura-se imitar a vida; na arte moderna, interpretá-la, na arte pós-moderna, procura-se fundir a vida com a arte. Essa “fome pelo real”, para utilizar uma expressão consagrada Slavoj Zizek, é maior nas obras sobre a catástrofe, pois nesse tipo de arte, a inspiração artística incide sobre um acontecimento real, abrindo perspectiva para que o autor utilize elementos concretos não-convencionais como forma de simbolicamente insuflar a sensibilidade do público. Nome: Elizabeth Ghedin Kammers E-mail: bettykammers@hotmail.com Instituição: Universidade do Estado de Santa Catarina Título: Santa Catarina em exposição: desenhos e pinturas de motivos catarinenses em tempos de modernidade Este trabalho tem como tema principal a primeira exposição de pinturas

e desenhos de motivos catarinenses realizada em dezembro de 1957 na cidade de Florianópolis. O objetivo da pesquisa foi analisar as obras dessa exposição partindo do princípio que elas estariam representando “motivos catarinenses” e que foram produzidas por integrantes do primeiro grupo de artistas modernos da cidade. A discussão teórica é centrada nas contradições de um modernismo sem modernização, característico dos países latino-americanos, onde identidades visuais modernas foram criadas inspiradas em tradições folclóricas e populares. As pinturas e desenhos analisados foram divididos em dois blocos: por um lado, identificados pela solução plástica inovadora com que representam antigos motivos ligados às tradições regionais, às vezes contrastadas com elementos da modernidade; e, por outro, pela abordagem do cotidiano da cidade, onde temas banais como vendedores ambulantes e até o vento sul ganham uma representação pictórica moderna. Nome: Elson de Assis Rabelo E-mail: elson_rabelo@hotmail.com Instituição: Universidade Federal do Vale do São Francisco Título: Literatura oral: a articulação do popular e a busca da experiência sensível A partir da apropriação de textos de literatura oral do escritor piauiense Fontes Ibiapina (1921-1986), propomos uma discussão em torno da articulação do “popular”, no âmbito do discurso ficcional e nos enunciados do folclore. Inseridos no conjunto da obra literária regionalista do autor, os textos, no entanto, são prefaciados com ênfase no caráter científico que caracterizaria o discurso do folclore. Nessas obras, o popular aparece como matéria de expressão, como lugar da experiência sensível inaugurada pela história e como força do argumento ficcional. A escritura de Fontes Ibiapina se entrecruzava com sua prática etnográfica, num projeto intelectual, estético e “científico”, que implicava a viagem, a observação e o registro das manifestações populares. É daí que se entende, nesses contos, um ingênuo “abuso da linguagem popular”, pela inserção de fragmentos, ditados e demais expressões que – ante a transformação dos espaços, das sociabilidades e das sensibilidades ocorridas desde os anos 1950 no Piauí – traduziriam um núcleo de experiência autêntica, permanentemente criador e renovador, ao passo que o “povo”, sujeito da cultura, ia sendo definido discursivamente de modo aristocrático e evolucionista. Nome: Fernanda Lopes Torres E-mail: fernandalopestorres@uol.com.br Instituição: PUC - Rio Título: Robert Smithson: um “artista moderno morrendo de modernismo” Pretendemos identificar aspectos do tempo histórico contemporâneo nas Câmeras Enantiomórficas (1965) e no texto Passeio a Passaic (1967) do artista norte-americano Robert Smithson. Esses trabalhos provocam sensação física de tempo proporcional ao aumento progressivo da diferença entre experiência e expectativa da era moderna (Koselleck). A partir das numerosas imagens que encurtam distâncias e aceleram o ritmo da vida cotidiana aumentando nossa sensação de transitoriedade, Smithson busca recriar a estrutura do tempo em espelhos câmeras onde espelhos são dispostos frente a frente; entre eles se situa o espectador, cujo olhar é redirecionado por imagens refratadas em sentidos opostos ao invés de se multiplicarem ao infinito numa única direção. Resulta um ponto cego, não um ponto de fuga, compatível com o fenômeno contemporâneo da não-contemporaneidade. Tal fenômeno é apresentado no relato de sua caminhada em Passaic: suas coordenadas espaciais, dadas por terminologia fotográfica, são convertidas em imagens que, como os reflexos das suas câmeras, refratam as ruínas às avessas daquele subúrbio abandonado - edificações que se erguem em ruínas antes mesmo de sua construção pela obsolescência planejada urbana correspondente à falta de prospecção bem detectada por nosso artista moderno. Nome: Francisco Francijesi Firmino E-mail: jesifirmino@gmail.com Instituição: Universidade Federal do Rio Grande do Norte Título: História e melancolia: a crise da identidade cearense em José Alcides Pinto (1960-1970) Este artigo trata dos discursos que, entre as décadas de 1960 e 1970, se propunham a enunciar a modernização do espaço cearense, centrando a análise nos romances que compõem a trilogia da maldição, de José Alcides Pinto. O Autor, através do uso da alegoria e da melancolia, envereda na tentativa de restaurar e salvar pela linguagem as formas de expressão do Ceará que acreditava estarem ruindo devido às ações tanto da igreja Ca-

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