Fragmentos: artefatos populares, o olhar de lina bo bardi

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Centro Cultural Solar Ferrão Março 2009

Frag men tos: arte fatos popu lares, o olhar de Lina Bo Bardi


Fragmentos: artefatos populares, o olhar de Lina Bo Bardi

Um dia, a arquiteta italiana Lina Bo Bardi (1914-1992), responsável pelo projeto de reforma do Solar do Unhão e primeira diretora do Museu de Arte Moderna da Bahia, sonhou com a implementação de um Museu de Arte Popular em Salvador. Um local que permitisse o diálogo entre o conhecimento acadêmico e o de mestres artesãos, para a formação de um desenho original e brasileiro. Para isso, trabalhou durante cerca de uma década, entre os anos 1950 e 1960, coletando peças pelo Nordeste brasileiro, reunindo um acervo de quase duas mil obras. Seu sonho foi interrompido pela ditadura, pelas mudanças dos governos, pelo esquecimento e pelo preconceito em torno da produção de arte popular. Seu acervo foi sendo perdido, dilapidado e, o restante, encarcerado em caixotes e escondido do público. Quase meio século depois, a exposição Fragmentos: Artefatos Populares, o Olhar de Lina Bo Bardi – que tem este nome justamente por expor as cerca de 800 peças remanescentes do acervo reunido pela arquiteta – é realizada por iniciativa da Diretoria de Museus do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural. Nossa intenção é preencher uma lacuna, valorizando a cultura popular e o legado deixado por Lina. Peças aparentemente comuns ganham uma importância ímpar pela seleção contemporânea de Lina Bardi e pelo valor estético, artístico, histórico, cultural e político desta mostra.


A expografia de André Vainer, colaborador de Lina por muitos anos, é simples, sem recortes, escondendo a complexidade de apresentar praticamente a totalidade do acervo em um espaço não convencional, como o Solar Ferrão. Interfere o mínimo na fruição das obras, que foram dispostas em um palcoarquibancada. Esta exposição, mais do que mostrar as peças que restaram da coleção de Lina Bo Bardi, possibilita a reinterpretação de conceitos sobre a arte popular a partir do olhar da arquiteta. Lina Bo Bardi representava a vanguarda de sua época e, desde os anos 1950, percebeu a originalidade do povo brasileiro. Ela tinha uma visão diferenciada, pois considerava as peças do seu acervo como algo

contemporâneo, objetos de design, diferente do pensamento que reinava na época, contaminado pelos vícios e preconceitos acadêmicos europeus. Lina anteviu a necessidade de hibridização do acadêmico com o popular, que hoje é tão presente no design contemporâneo brasileiro. Com esta exposição – que é mais uma interrogação, do que uma afirmação – esperamos colocar em pauta a discussão acerca desta produção, provocar debates e estimular novos estudos. Queremos resgatar e manter vivo o sonho de Lina, de valorização da cultura popular a partir de uma perspectiva contemporânea.

Daniel Rangel Diretor de Museus do IPAC



As exposições de Lina Bo Bardi Os objetos expostos aqui são a parte do grande acervo reunido pela arquiteta Lina Bo Bardi (1914-1992) que resistiu ao tempo, sob a guarda de pesquisadores, museólogos e instituições durante mais de 40 anos. A coleção original teria cerca de 2 mil objetos. Ela foi montada durante um período de intensa pesquisa e levantamento antropológico feitos por Lina Bo Bardi em viagens pelo Nordeste do Brasil, no fim dos anos 1950 e início dos anos 1960. Afastado do público por tão longo tempo, o acervo atual, de mais de 800 objetos, pode agora ser visto, analisado e pesquisado nesta mostra, não à toa batizada Fragmentos. O conjunto amplo de ex-votos, santos, objetos de candomblé, bichos e utensílios de madeira, objetos de barro, pilões e peças feitas de material reciclado e de lixo foi recolhido por Lina Bo Bardi em feiras, mercados e lojas de material Carrancas de madeira natural e madeira policromada, do Vale do Rio São Francisco. Foto de Armin Guthman


religioso em várias comunidades, núcleos rurais e cidades dos Estados da Bahia, de Pernambuco e do Ceará. As viagens e os locais de produção foram mapeados com o auxílio de dois grandes colaboradores da arquiteta naquele período: Livio Xavier, diretor do Museu de Arte da Universidade do Ceará (mauc), e Francisco Brennand, um dos fundadores do Movimento de Cultura Popular, no Recife, Pernambuco. Fixada na Bahia entre 1958 e 1964, Lina Bo Bardi participou ativamente do que se chamou posteriormente de modernismo baiano, época de grande efervescência cultural e da vivência real de um projeto de participação popular tanto de instituições ligadas ao governo federal como aos governos regionais e grupos de intelectuais e artistas independentes. Na Bahia, a universidade foi pólo aglutinador. No nível regional, a criação da Sudene – Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste – sinalizava a intenção de atuação objetiva do Estado na economia e na produção. Comandada pelo economista Celso Furtado, a Sudene chegou a criar a Artene, que se baseava no levantamento das condições da

população ligada à produção de objetos e utensílios com o intuito de financiamento para a capacitação e o aumento do nível de renda. Exposições

Os objetos deste acervo foram expostos pela primeira vez na mostra Bahia no Ibirapuera, aberta em 21 de setembro de 1959, durante a 5-a Bienal Internacional de São Paulo, organizada por Lina e por Martim Gonçalves. Foram reexpostos e reinterpretados em grandes mostras como a Exposição Nordeste, que se iniciou em 3 de novembro de 1963, no Solar do Unhão, em Salvador; a exposição A Mão do Povo Brasileiro, de 1969, no Museu de Arte de São Paulo (masp), e a seção dedicada ao “Brasil Manual”, na exposição Design no Brasil, História e Realidade, de 1982, no Sesc Pompéia, em São Paulo. A Exposição Nordeste também viajou e desembarcou em Roma, Itália, em março de 1965, para uma mostra que foi suspensa às vésperas da inauguração pela representação diplomática brasileira, por ordem da ditadura militar do Brasil. Em todas estas ocasiões, a concepção expositiva de Lina trouxe para o espaço do museu uma espécie de imersão


provocada e calculada no ambiente das feiras, casas e armazéns populares. Caixotes de madeira, varais, peças dispostas em profusão, sem identificações particularizadas e sem a distância habitual que permitiria vislumbrar todos os seus volumes, afirmavam a ausência de romantismo que caracterizou a visão de Lina Bo Bardi sobre a cultura. Ausência de romantismo que não significa absolutamente ausência de poética. A profusão de objetos e a justaposição aparentemente caótica tinham o sentido de não particularizar e “elevar” cada objeto do plano cotidiano, e sim aludir à própria riqueza do uso e ao depoimento de cultura que cada objeto encerra. A beleza, ligada à simplicidade e ao engenho da resolução dos programas de uso, foi vista e destacada de forma a combater a mistificação folclorizante. O que se mostrava naquelas exposições e também aqui não é um conjunto de obras de arte. Não são únicos, com individualidade a ser cultuada. Não são tampouco peças de artesanato, segundo a concepção de Lina Bo Bardi. Para a arquiteta, a palavra “artesanato” só fazia sentido no contexto da história Ex-votos de madeira de Umburama, de Monte Santo, Bahia. Foto de Armin Guthman


Estudos para projeto da exposição Bahia no Ibirapuera, 1959, 5-ª Bienal Internacional de Arte, São Paulo, arquivo Lina Bo Bardi Estudos para a exposição A Mão do Povo Brasileiro, 1969,

Masp, São Paulo.


pré-industrial européia, sendo indissociável da forma de produção típica das corporações de ofício que tiveram auge no fim da Idade Média. No Brasil, pensava a arquiteta, apesar da “aparência artesanal”, essa produção era decorrente da miséria da população, e não das condições econômicas que gerariam o modelo de produção de um capitalismo tardio. Nas palavras de Lina, estes objetos são “fatos populares, produtos para atender as necessidades da existência, de vidas que se desenvolvem em condições precárias, de miséria”. Lina considerava-os exemplos de trabalho pré-artesanal. Como objetos-depoimento da identidade cultural do Nordeste, a arquiteta vislumbrou seu uso como a base para desenvolver um Centro de Estudos e Trabalho Artesanal e uma escola de desenho industrial, que produziria projetos para a indústria. Na escola, haveria troca de experiência entre os estudantes de arquitetura e design e os artesãos. Tratava-se, evidentemente, de um projeto político. Lina, que chegara ao Brasil em 1946 e se fixara em São Paulo com o marido, Pietro Maria Bardi, teve duas temporadas de atuação na Bahia.

A primeira, entre 1958 e 1964, teve como marcos o projeto do Museu de Arte Moderna (mam), nas instalações provisórias no foyer do Teatro Castro Alves, com um intenso programa de exposições, os projetos do Museu de Arte Popular e do Solar do Unhão. Seus projetos do museu-escola e o do fomento ao design brasileiro naquela estrutura foram interrompidos em 1964, quando foi afastada do museu por motivos políticos. Em sua segunda temporada na Bahia, entre 1986 e 1990, a arquiteta fez importante plano de recuperação para o centro histórico de Salvador, em que defendia a preservação da “alma popular” da cidade – a idéia principal era manter a população residente –, a recuperação da Ladeira da Misericórdia, com o bar Coati; o Belvedere da Sé; o projeto Barroquinha; a Casa do Benin; a Casa do Olodum e o Teatro Gregório de Mattos. Com projeto do arquiteto André Vainer, colaborador de Lina, a mostra Fragmentos devolve ao público o acervo e revela o olhar e as reflexões agudas da arquiteta, contribuições fundamentais para quem quer pensar o design e a cultura popular brasileira. Mara Gama



Ex-votos sobre tablado de madeira de pinho na exposi巽達o A M達o do Povo Brasileiro, 1969, Masp, S達o Paulo, arquivo Lina Bo Bardi.


Exposição Nordeste Solar do Unhão, Salvador, Bahia, 1963 Esta exposição que inaugura o Museu de Arte Popular do Unhão deveria chamar-se Civilização do Nordeste. Civilização. Procurando tirar da palavra o sentido áulico-retórico que a acompanha. Civilização é o aspecto prático da cultura, é a vida dos homens em todos os instantes. Esta exposição procura apresentar uma civilização pensada em todos os detalhes, estudada tecnicamente (mesmo se a palavra “técnico” define aqui um trabalho primitivo), desde a iluminação às colheres de cozinha, às colchas, às roupas, bules, brinquedos, móveis, armas. É a procura desesperada e raivosamente positiva de homens que não querem ser “demitidos”, que reclamam seu direito à vida. Uma luta de cada instante para não afundar no desespero, uma afirmação de beleza conseguida com o rigor que somente a presença constante de uma realidade pode dar. Matéria prima: o lixo. Lâmpadas queimadas, recortes de tecidos, latas de lubrificantes, caixas

velhas e jornais. Cada objeto risca o limite do “nada” da miséria. Esse limite e a contínua e martelada presença do “útil” e “necessário” é que constituem o valor desta produção, sua poética das coisas humanas não gratuitas, não criadas pela mera fantasia. É neste sentido de moderna realidade que apresentamos criticamente esta exposição. Como exemplo de simplificação direta de formas cheias de eletricidade vital. Formas de desenho artesanal e industrial. Insistimos na identidade objeto artesanal-padrão industrial baseada na produção técnica ligada à realidade dos materiais e não à abstração formal folclóricocoreográfica. Chamamos este Museu de Arte Popular e não de Folclore por ser o folclore uma herança estática e regressiva, cujo aspecto é amparado paternalisticamente pelos responsáveis pela cultura, ao passo que arte popular (usamos a palavra “arte” não somente no sentido artístico mas também no de fazer tecnicamente), define a atitude progressiva da cultura popular ligada a problemas reais.


Esta exposição quer ser um convite para os jovens considerarem o problema da simplificação (não da indigência), no mundo de hoje; caminho necessário para encontrar dentro do humanismo técnico uma poética. Esta exposição é uma acusação. Acusação de um mundo que não quer renunciar à condição humana apesar do esquecimento e da indiferença. É uma acusação não humilde, que contrapõe às degradadoras condições impostas pelos homens, um esforço desesperado de cultura. Texto de Lina Bo Bardi para a Exposição Nordeste, que inaugurou o Museu de Arte Popular, no Solar do Unhão, em Salvador, Bahia, em 1963.

Imagens da Exposição Nordeste no Solar do Unhão, 1963, Salvador, Bahia, arquivo Lina Bo Bardi.


Espaço do Educador Fragmentos: Artefatos Populares, o Olhar de Lina Bo Bardi é um valoroso espaço físico e imaginário, de incontáveis possibilidades pedagógicas. O universo do povo nordestino aqui reunido nos oferece condições de compreender a arte enquanto atividade humana essencialmente amarrada à vida e esteticamente comprometida em satisfazer as necessidades de existência das matrizes étnicas que formam as nossas raízes: a indígena, a portuguesa e a africana. Composta de peças que traduzem os “saberes” e “fazeres” do patrimônio cultural do povo nordestino, a coleção nos remete à histórica relação da arte popular com os recursos naturais. São elas ex-votos, cerâmicas figurativas e utilitárias de forte influência indígena, peças de imaginária católica e africana, além de carrancas e amuletos talhados na madeira e procedentes das mitologias que encantam o Nordeste. Nossa formação cultural é construída cotidianamente por meio de nosso olhar, de nossas experiências estéticas. “Aproveitei ao máximo a experiência de cinco anos no Nordeste, a lição da experiência popular, não como romantismo folclórico, mas como experiência da simplificação.” As palavras de Lina Bo

Bardi ajudam-nos a entender que visitar sua coleção é não somente conhecer uma arte que se produziu pelas mãos anônimas de artistas do povo. Revisitar o passado também é repensálo, ressignificá-lo e, especialmente, fazer do futuro motivo de indagações, promovendo a criticidade tão urgente nas abordagens educativas. A arte é talvez, pelo seu idioma universal, a única maneira possível de nos aproximar em comunidade, de nos humanizar, de ampliar nossa sensibilidade. Possíveis abordagens pedagógicas:

Questões ambientais de apropriação dos recursos naturais; n Aspectos sociogeográficos do Nordeste brasileiro; n Mitologias do território nordestino e diversidade cultural; n A Relação entre Folclore e Cultura Popular; n Tradições religiosas e étnicas; n Estilização das peças em exposição; n Patrimônio material e imaterial; n Resgate de saberes e tradições orais; n Arte acadêmica x arte popular: existe diferenciação? n

Núcleo de Arte e Educação DIMUS


earn a unique importance because of the contemporary selection made by Lina Bardi One day, Italian architect and made by Lina Bardi and also Lina Bo Bardi (1914-1992), because of the aesthetic, artistic, responsible for the Solar do Unhão restoration project, and historical, cultural and political value of this exhibition. first director of the Museum The expography of André of Modern Art of Bahia, Vainer, a former collaborator dreamed of creating a Popular with Lina, is simple, Art Museum in Salvador. A uncomplicated, hiding the place that allowed the dialogue between the academic knowledge complexity of presenting almost the entire collection in an and the masters of craftwork, for the formation of an original unconventional space, such as the Solar Ferrão. It interferes and brazilian design. For such, minimally with the fruition of she worked during almost a the works, which are disposed decade, between the 1950’s on a stage–bleachers. This and 1960’s, collecting pieces exhibition, more than showing throughout Northeastern Brazil, gathering a collection of the pieces that remain from Lina Bo Bardi’s collection, almost 2,000 works. enables the reinterpretation of Her dream was interrupted popular art concepts from her by the dictatorship, the point of view. shift of administrations, by Lina Bo Bardi represented forgetfulness and prejudice the avant-garde of her time, about popular art production. and since the 1950’s she Her collection was gradually noticed the Brazilian people’s lost, dilapidated, and the originality. She had a personal remaining was put into crates insight, since she considered her and hidden from the public. collection’s pieces as something Almost half a century later, contemporary, objects of the exhibition Fragments: design, differently from her Popular Artifacts, the Eye period’s thinking, contaminated of Lina Bo Bardi – so called by European academic vices and exactly because it shows the prejudices. Lina has foreseen 800 pieces remaining from the hybridization of popular the architect’s collection – is with academic, which today is accomplished through an so much present in Brazilian initiative of the Directory of Museums of the Institute of the contemporary design. With this exhibition – which Artistic and Cultural Patrimony of Bahia (IPAC). Our intention is rather an interrogation than an affirmation –, we hope is to fill a gap, highlighting the to raise a discussion on this popular culture and the legacy production, to provoke debates that Lina has left. and to stimulate new studies. We Apparently common pieces Fragments: Popular Artifacts, the Eye of Lina Bo Bardi

want to retrieve Lina’s dream, of valuing popular culture from a contemporary perspective. Daniel Rangel Director of Museum of IPAC Lina Bo Bardi’s exhibitions

The pieces here exposed are part of the large collection gathered by architect Lina Bo Bardi which resisted to time, under the guard of researchers, museologists and institutions, for more than 40 years. The original collection would count around 2,000 items. It was formed during a period of intense research and anthropological survey by Lina Bo Bardi in journeys through Northeastern Brazil, in the late 1950’s and early 1960’s. Away from the public for such a long time, the present collection, with over 800 pieces, may now be seen, analyzed and researched through this exhibition, not by chance called Fragments. This extensive set of votive offerings, saints’ images, candomble [African religion] objects, wooden animals and utensils, terra-cotta pieces, mortars and objects made of recycled material and waste – more than 800 items – were collected by Bo Bardi in street markets and religious article shops in different communities, rural centers and towns all over the states of Bahia, Pernambuco and Ceara. The journeys and the sites of production were mapped with the


help of two constant collaborators with Lina in that period: Livio Xavier, director of the University of Ceara Art Museum, and Francisco Brennand, one of the founders of the Popular Culture Movement in Recife (Pernambuco). Established in Bahia between 1958 and 1964, Lina Bo Bardi had an active part in what was later called Bahian modernism, a period of great cultural vigor and of the real experience of a popular participation project, as much by institutions linked to the federal administration as by regional governments and groups of independent thinkers and artists. In Bahia, the university was a pole of attraction. At the regional level, the creation of Sudene – a federal agency for the Northeast’s development – signaled the state’s intention of acting objectively on popular economy and production. Commanded by economist Celso Furtado, Sudene had created Artene, based on a survey of rural and urban populations regarding the production of objects and utensils, with the specific intent of financing capacitation and raising income standards. Exhibitions

The pieces of this collection were shown for the first time in the exhibition Bahia at Ibirapuera, opened in September 21, 1959, during the 5th São Paulo International Biennial, organized by Lina Bo Bardi with Martim Gonçalves. They were shown again, and reinterpreted,

in large shows such as the Northeast Exhibition, started in November 3, 1963, at the Solar do Unhão in Salvador; the exhibition The Brazilian People’s Hands, in 1969, at the Sao Paulo Art Museum, and the section dedicated to “Handmade Brazil”, in the exhibition Design in Brazil, History and Reality, in 1982, at Sesc Pompéia, São Paulo. The Northeast Exhibition has also traveled and disembarked in Rome, Italy, in March 1965, for a show that was canceled before its opening by the Brazilian diplomatic representation, by order of the military dictatorship in Brazil. In each of those occasions, Lina Bo Bardi’s exhibition concept has brought to the museum’s space a type of provoked immersion, modeled on the ambiance of street markets, popular homes and stores. Wooden crates, clotheslines, pieces disposed in great number, without particular identification, and without the normal distance that would allow to neatly apprehend their volumes, all of it defined the absence of romanticism that characterized Lina’s view on culture. An absence of romanticism that absolutely doesn’t mean the absence of poetics. The profusion of objects and their apparently random juxtaposition were intended not to particularize and “elevate” each object from their daily plan, but rather to refer to the very richness of their use and the cultural statement that each object encloses.

Beauty, associated to simplicity and the ingenuity of the resolution of utility programs, were seen and enhanced so as to fight the folkloristic mystification. What was shown in those exhibitions, and is also here, is not a set of artworks. They are not unique, with an individuality to be worshipped. Neither they are craftworks, according to Lina’s conception. To the architect, the word “craftwork” only made sense in the context of European pre-industrial history, being inseparable from the typical production forms of trade corporations, which had their apogee in the Middle Ages. In Brazil, the architect thought, despite its “crafts look”, that production was a result of the population’s poverty, and not of the economic conditions that would generate the production model of a belated capitalism. In Lina’s words, those objects are “popular facts, ready to attend to the needs of existence, of lives that develop in precarious, miserable conditions”. They are “natural survivals in small scale, as a trade legacy”. Lina considered them examples of a pre-craft work. As objects-statements of the Northeastern cultural identity, the architect had also glimpsed their use as the necessary basis to develop a center of studies and craftworks and an industrial design school, which would generate projects for the industry.


In that school, there would be contact among architecture and design students and artisans, with the exchange of experience. It was, certainly, a political project. Lina, who arrived in Brazil in 1946 and had established in São Paulo with her husband, Pietro Maria Bardi, spent two working periods in Bahia. The first one, from 1958 to 1964, had as its landmarks the Museum of Modern Art project, in the temporary facilities of the Castro Alves Theater foyer, with an intense program of exhibitions; the Popular Art Museum project; and the Solar do Unhão project. Her projects of a schoolmuseum and of fomenting Brazilian design in that structure were interrupted in 1964, when she was dismissed from the museum for political reasons. In the second season Lina Bo Bardi spent in Bahia, between 1986 and 1990, the architect made an important recovery project for the Salvador historical center, in which she advocated the preservation of the city’s “popular soul” – the main idea was to maintain its dwellers –, the restoration of the Misericordia Lane, with the Coati bar; the Belvedere da Se; the Barroquinha project; the Benin House; the Olodum house and the Gregorio de Mattos Theater. With a design by architect Andre Vainer, a collaborator with Lina Bo Bardi, the show Fragments returns now to the public the artifacts collection and reveals the architect’s perception and her

human things, not created from mere fantasy. It is in this sense of moderns reality that we critically present this exhibition, as an exemple oft the direct simplification of forms filled with Mara Gama a vital electricity. Forms of both Northeastern Civilization craft and industrial designs. We This exhibiton that inaugurated insisted on the craftsmanshipthe Unhão Popular Art Museum industrail design identity of should have been called the object based upon technical Northeastern Civilization. production connected to the Civilization. Attempting to reality of the materials, and not remove from word the courtlyon the folklore-choreographic rhetorical meaning that goes with abstraction. it. Civilization is the practical We called it a Popular Art aspect of culture, it is mankind’s Museum rather than one of life at all times. This exhibition Folklore as folklore is a static and tries to present a civilization regressive heritage, paternalistically thought out in all its details, supported by those responsible for studied technically, (even if the culture, whereas popular art (we word “technical” here defines a use the world art not just in primitive work) from lighting the artistic sense, but also in that to kitchen spoons, to quilts, of making things technically) clothing, teapots, toys, furniture defines the progressive attitude and weapons. of popular culture connected to It is a desperate and angrily real problems. positive search by men who This exhibition tries to be have no wish to be “fired”, who an invitation to young people demand their right to life. A to consider the problem of constant fight to not descend into simplification (not of indigence), despair, an affirmation of beauty in today’s world; a necessary attained with the strictness that way to find, within the technical only the constant presence of humanism, a poetics. reality can provide. This exhibition is an The raw materials: garbage. accusation. Burned out lamp bulbs, An accusation of a World snippets of cloth, empty oil cans, that does not want to renounce old cartons and newspapers. Each its human condition in spite of object approaches the borderline forgetfulnesse and indifference. of the “nothing” of penury. It is It is not a humble accusation, this limit and the continuous and an counterpoints a desperate belabored presence of “useful effort of culture to the degrading and necessary”, that comprise conditions imposed by men. the value of this production, its poetry of non-gratuitous Lina Bo Bardi acute reflections, fundamental contributions to those who wish to think about design and Brazilian popular culture.


Governo do Estado State Government

Governo do Estado da Bahia Government of the State of Bahia Jaques Wagner Secretaria de Cultura do Estado da Bahia Secretary of Culture of the State of Bahia Márcio Meirelles Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia Institute of the Artistic and Cultural Patrimony of Bahia e Cultural da Bahia Frederico Mendonça Diretoria de Museus - dimus Directory of museums

Direção Direction Daniel Rangel Assessoria Técnica Technical Consultancy Magaly Nunesmaia Coordenação do Núcleo de Museologia Coordination Museology Nucleus Graça Lobo e Maria de Fátima Coordenação do Sistema de Museus Coordination Museums System Ana Cristina Coelho Coordenação do Núcleo de Arte e Educação Coordination Art-Education Nucleus Lanussi Pasquali Coordenação do Núcleo de Comunicação Coordination Communication Nucleus Ana Paula Vargas Coordenação do Núcleo Administrativo Coordination Administrative Nucleus Antonio Luiz e Marcelo Leal

Nesta página, tigelas de barro de Maragogipe, Bahia. Foto de Pierre Verger

Coordenação do Núcleo de Produção Coordination Production Nucleus Ítalo Armentano

Na capa, suporte de madeira usado no Solar do Unhão durante a Exposição Nordeste, 1963, Salvador, Bahia

Coordenação do Núcleo de Montagem Coordination Assembly Nucleus Guilherme Castro

Na contracapa, público visita a exposição

Secretária Executiva Executive Secretary Cyntia Neri

A Mão do Povo Brasileiro, 1969, no Masp, São Paulo


Fragmentos: artefatos populares, o olhar de Lina Bo Bardi Fragments: popular artifacts, the eye of Lina Bo Bardi

Coleção Lina Bo Bardi de arte popular Realização Accomplishment Diretoria de Museus do IPAC Concepção Geral Overall Concept André Vainer e Daniel Rangel Projeto da Exposição Exhibition Project André Vainer e Mariana Vilela Projeto de Iluminação Lightning Design Ricardo Heder Projeto Gráfico e Sinalização Signalling and Graphic Design Carla Castilho e Lia Assumpção Assistentes de Arte Art Assistants André Mariano e Marilia Ferrari Texto Text Mara Gama Tradução Translation Luiz Roberto M. Gonçalves Revisão Proofreading Todotipo Editorial / Fabio Pagotto Fotografias Images Acervo do Instituto Lina Bo Bardi Digitalização de Imgens Image Scans Photoimagem 5 Montagem Assembly Blade Cenografia e Design Coordenação Museológica Responsible Museologist Mary do Rio Restauro e Conservação Restoration Eubaldo Pereira Gomes, Marcos Antonio da Hora Brito , Maria Lúcia Hoisel (Tula), Roque Santana Carvalho, Yara Chamusca, Assessoria de Imprensa Press Relations Teté Martinho e Núcleo de Comunicação - DIMUS Produção Production Núcleo de Produção - DIMUS Co-produção Coproduction Aldente Comunicação e Eventos Agradecimentos Acknowledgments Anna Carboncini (Instituto Lina Bo Bardi), Marcelo Ferraz, Solange Farkas, Bob Wolfenson, Pasqualino Magnavita e Sante Escadaferri


Co-produção

Apoio

Realização


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