Catálogo Especial de Fim de Ano 2013

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JOSÉ BENTO DOS SANTOS

Uma das grandes parcerias no mundo do vinho foi a do senhor com o produtor francês Michel Chapoutier, uma das estrelas do norte do Rhône. O que o senhor aprendeu com Chapoutier e vice-versa? Michel Chapoutier é um entusiasta, um apaixonado, mas sobretudo um grande e profundo conhecedor do vinho e de sua produção. Produz alguns dos vinhos mais memoráveis que já bebi, e esta minha admiração pelo seu trabalho me levou a visitá-lo na altura da decisão de enveredar pela produção de um grande vinho. Não só me acarinhou, como me entusiasmou, motivou e me deu sábios conselhos, que pus em prática com o maior sucesso. Tentamos fazer ambos um vinhedo de Touriga Nacional na França, que a burocracia impediu. Mesmo assim, fiz uma proposta ao nosso Embaixador em Paris, que permitiu que o governo português lhe concedesse a condecoração de Comendador da Ordem de Mérito Agrícola. Curiosamente, dois anos depois, o ministro francês Michel Barnier conferia-me também o grau de Comendador da Ordem de Mérito Agrícola.

No Guia Vinhos de Portugal 2013, do respeitado crítico João Paulo Martins, o Quinta do Monte d’Oiro Madrigal 2011 foi selecionado entre os “melhores brancos do ano”. Este é, de fato, um dos grandes brancos lusos, sempre com muitos elogios da imprensa especializada. Não é comum um branco 100% Viognier português. Produzi-lo foi o seu maior desafio no mundo dos vinhos? Não sei se foi o maior desafio, mas que foi um desafio muito grande, foi. A Viognier nos países mais a sul tem maturações muito rápidas e precoces. Na França, em Condrieu, diz-se que a Viognier tem de ter 14 graus alcoólicos para se exprimir; mas se tiver mais de 14 graus já é uma “marmelada” de frutas. Como se sabe, não é fácil encontrar um Viognier do sul (mesmo no sul da própria França) com a finesse e o conteúdo dos Viognier de Condrieu. Além de uma agricultura cuidadosíssima, a determinação da maturação destas uvas é de um rigor extraordinário, fazendo-se uma vindima seletiva, cacho a cacho, com diferentes vinificações diárias, que são depois selecionadas para fermentação em inox e barricas de 400 litros (carvalho francês novo de tanoaria da Borgonha). Na assemblage final, antes do engarrafamento, temos vários tipos de “Viogniers”, o que permite a seleção ideal. É bom lembrar que, já por três vezes, o nosso Madrigal (100% Viognier) ganhou um concurso na França que elege os melhores vinhos estrangeiros de castas francesas.

O senhor é reconhecido como um dos maiores gastrônomos do seu país – é vice presidente da Academia Internacional de Gastronomia, membro de outras respeitadas instituições do gênero, autor de livros sobre o assunto e da coluna A Palavra do Gourmet publicada mensalmente na respeitada Revista de Vinhos. Por isso, é uma tentação lhe perguntar qual foi a mais fantástica e emocionante harmonização que já experimentou? E quais pratos indicaria para combinar com seus vinhos? Arriscaria um prato da cozinha brasileira? O aniversário da Academia Internacional de Gastronomia (onde estava presente uma grande representação da ABG – Academia Brasileira de Gastronomia) foi celebrado com um jantar no Plaza Athénée (do Chef Alain Ducasse), em Paris. Para esse jantar, tive a honra de propor e discutir o menu e os vinhos com o chef Santaigne e o sommelier Laurent Roucayrol. Foi servido um lavagante cozinhado no forno com um vinho tinto Châteauneauf du Pape. A ligação é ao mesmo tempo espantosa e sublime, sensual e carnuda (“o lavagante é carne”, no dizer de Laurent Roucayrol). Sobre a cozinha brasileira, ela é muito rica e diversificada, e tive oportunidade de apreciá-la na visita organizada no ano passado pela ABG. Pensando nos meus próprios vinhos, o Lybra branco fará as delícias do palato ao acompanhar os vossos maravilhosos pastéis; o Lybra tinto, ideal para servir com aquela divinal carne de porco do Mocotó. Já com

Nossa experiência com a adoção da agricultura orgânica é extremamente positiva, mas este recurso não é uma panaceia universal. Um terreno menos adequado para produzir grandes vinhos melhorará com a adoção da agricultura orgânica, mas nunca conseguirá chegar a ser grandioso. Por outro lado, um vinhedo com todo o potencial de um grande “terroir”, se não for cuidadosamente conduzido, não atingirá toda sua qualidade

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