Revista Lupa #2

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CIRCO URBANO

Dize-me o que comes, e te direi em quem acreditas Como a religião influi nos costumes alimentares | Ilustração Vânia Medeiros

centa que para eles, “a alimentação deve ser pautada pela necessidade e não pelo desejo”. Comer por fome e não por prazer, eles apregoam. Daí também a preferência por alimentos com pouco condimento. _ Ser naturista é um desejo e uma prerrogativa para os adventistas mais ricos. Sabe-se que manter o corpo saudável e seguir com mais intensidade uma dieta natural é um privilégio que não está ao alcance de todos, destaca a nutricionista. _ No judaísmo também estão presentes proibições alimentares e jejuns. Contudo, segundo o professor Antônio Marcos Wanderley, judeu praticante há seis anos, as normas alimentares não têm relação com a saúde, mas com a observância das leis religiosas. Nas palavras do Rabino Nilton Bonder, ao obedecer às regras, o observante deve sentir prazer. “Quem observa discerne e, portanto, não se restringe, agindo assim por escolha deliberada”. _ O judeu Wanderley demonstra prazer em seguir as regras alimentares da “Kashrut”, coletânea de leis judaicas. Diz que o Antigo Testamento proíbe a ingestão de carne de porco, de peixes de couro e aves de rapina. Para ele, a forma correta de obedecer às regras é comer apenas carne de peixe com escamas e peito de frango, não ingerir pão com fermento durante a Páscoa Judaica e

observar os jejuns. Também não come carne bovina porque sua religião condena a forma tradicional de abate. _ No judaísmo, as comidas são repletas de simbologia e as normas alimentares são uma forma de atrelar o passado e o futuro de um povo. Na Páscoa, por exemplo, come-se pão sem fermento para lembrar a fuga do povo hebreu do Egito, quando os pães foram assados às pressas, sem fermentar. _ A culinária traz o sentimento de pertencimento a uma religião, a um grupo. Este sentido é dado, inclusive, pela etimologia da palavra companheiro, que vem do latim, cum panem ou “aqueles que compartilham o pão”. Selecionar e preparar as comidas, portanto, é um ato de coesão social e que nos difere dos outros animais.

Questão de Crença Para o Islamismo e o Judaísmo, os animais devem ser abatidos com um único corte no pescoço, para evitar sofrimento. O sangue deve ser escoado do corpo e nunca consumido. No Islamismo, esta técnica é chamada de halal e no judaísmo, kosher.

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_ A religião, como a cultura, influencia o modo de vida de seus adeptos e isto inclui os hábitos alimentares. Alimentarse é muito mais do que ingerir comida; é um ato cultural repleto de significados e presente, também, nas práticas religiosas. _ O ser humano é o único animal que desenvolveu a culinária, o que significa lavar, cozinhar e combinar ingredientes. A escolha dos alimentos e o ritual de preparo é complexo, por isso, cada cultura possui um sistema alimentar cheio de regras e proibições. _ As diversas religiões possuem uma série de restrições alimentares e também de prescrições do que são “boas” iguarias. Para o Islamismo, as normas de alimentação estão relacionadas à saúde, elevação espiritual e caridade. É o que explica o Sheik nigeriano Abdul Ahmad, do Centro Cultural Islâmico, em Salvador. _ Ele diz que no Alcorão estão presentes as revelações de Deus sobre quais são os alimentos próprios e os impróprios para o consumo. “Deus é o criador, ele sabe quais são as criaturas boas para a nossa saúde. Ele disse para não comer carne de porco e a ciência mostra que nesta carne há uma bactéria que não morre mesmo que a carne seja cozida” afirma. _ Para os islâmicos, alimentar-se conforme as regras de Alá significa também não comer por um período. O Sheik Ahmad explica que o mês do jejum (Ramadã), o mês nove no calendário islâmico, é bom para a saúde do corpo, para a reflexão espiritual e para conhecer a situação das pessoas carentes de comida. Durante esse período come-se apenas após o pôr-do-sol e até o sol raiar. Para ele, o Ramadã estimula a solidariedade, que é um dos cinco mandamentos de sua religião. _ A Igreja Adventista do Sétimo Dia prega uma alimentação natural. “Para os adventistas, o alimento é um meio para a conquista e a manipulação da saúde do corpo, que é o templo do Espírito Santo, instrumento físico a serviço de Deus”, afirma a nutricionista Sandra Pacheco, que pesquisou os hábitos alimentares dos adventistas das Igrejas da Pituba e de Itapuã. _ Por este motivo, os adeptos desta religião preferem comer frutas, verduras e carboidratos complexos. Pacheco acres-

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Texto Tais Vivas


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