Edição 463 (out/2016)

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ANO 34 - Nº 463 PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 Produzido por alunos de Jornalismo da ECA-USP

FELIPE SATURNINO

Redemoinho de incertezas cerca a reforma do Ensino Médio

EM PAUTA p.3

CIÊNCIA

ENTREVISTA

ICMC investe em projeto contra o zika vírus

Pesquisador discute efeitos das eleições municipais nos campi

Cem anos de Paulo Emílio: importância e história do famoso crítico de cinema

p.13

p.14

p.10

ESPORTES

UNIVERSIDADE

Para estudar, mães se ajudam na criação de filhos no Crusp

Clínica de esporte ensina esgrima no Cepeusp p.12

MAJO CAMPO

p.8 e 9 UNIVERSIDADE

Estudantes dividem experiências sobre intercâmbio p.5

CULTURA


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DIÁLOGOS

PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 JORNAL DO CAMPUS

EDITORIAL

Surpresas que ficam OMBUDSMAN

Debate em debate MATHEUS PICHONELLI*

ESPAÇO DO LEITOR

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ESALQ USP, POR @_CRIS_RENATA

A diversidade seguiu em pauta na última edição do Jornal do Campus. Ponto para equipe, que na quinzena anterior já havia colocado o dedo na ferida com uma bela e extensa entrevista com uma estudante transexual. Dessa vez o destaque é sobre a presença de mulheres em cargos da direção na USP – assustador pensar que em São Carlos, Lorena, Pirassununga e São Sebastião não há uma representante sequer. Ou que na Faculdade de Medicina jamais uma mulher ocupou o posto. O debate sobre representatividade é uma batalha árdua, mas ganha força em muitos campos (da política à propaganda na TV) e, como se pode perceber pelos relatos das profissionais ouvidas na reportagem, é bom que a universidade esteja sensível a isso. Gosto também do esforço para compreender a estratégia dos movimentos estudantis da USP em relação ao impeachment e ao governo Temer, mas o título, pouco chamativo, não condiz com o tema da reportagem – apenas na linha-fina temos mais clareza de que a pauta é mais específica e menos atemporal do que parece. A reportagem, aliás, devia estar mais próxima do relato sobre a proibição de debates políticos na universidade – uma situação quase kafkiana onde as ideias deveriam circular livremente. Trata-se de mais um capítulo da despolitização da sociedade que, uma vez consolidada, é confundida e traduzida como “rejeição” ao sistema político. Na entrevista sobre os rankings universitários, senti falta de aspas no título principal – como está, parece que se trata da opinião do autor. Do mais, achei que na edição havia textos demais para alguns assuntos, o que pode cansar o leitor, como o debate das catracas. O tema é importante (e muito). Justamente por isso, a informação visual, com uma boa sequencia de fotos, seria fundamental para dimensionar e compreender melhor a questão.

“PAUSA NOS 15 KM PARA REGISTRAR QUE A POLUIÇÃO , PELO MENOS, PODE GARANTIR UMA BOA IMAGEM”, POR @WANDERLEIOLIVER USP RIBEIRÃO PRETO

*Matheus Pichonelli mantém uma coluna de cultura e comportamento na CartaCapital e escreve sobre política no Yahoo Brasil

A vida é mesmo uma caixinha de surpresas. Duas semanas atrás, quando a equipe do JC dava início aos trabalhos desta edição, foi decidido que seria abordado algo sobre as eleições, mas elas não seriam o carro-chefe da edição; até porque não teríamos um candidato eleito na Prefeitura de São Paulo (onde fica o maior campus da USP), apenas o desenho do segundo turno. Jornalista não prevê o futuro, pois a cidade já tem um futuro prefeito, decidido, por incrível que pareça, no primeiro turno. Pouco mais de 3 milhões de paulistanos optaram por João Doria. Se estamos falando de opção e escolha, vamos ao que preparamos para esta edição, pois a reforma do Ensino Médio, que promete dar mais liberdade de escolha dos alunos, também pegou todo mundo de surpresa. O JC vai mostrar, nesta edição, pontos da Medida que propõe a reestruturação de grade dos secundaristas. E já que é para escolher um início, comecemos pelo fim. As histórias (fictícias) de Opinião, que narram a reforma da educação, vão nos ajudar a entender como as mudanças propostas pelo Governo Federal podem atingir os estudantes e professores dentro da sala de aula e os possíveis impactos que elas trarão para a vida desses jovens e adolescentes. Como toda prática passa pela teoria, Em Pauta traz a opinião de docentes e especialistas da USP sobre a proposta de flexibilização do ensino e as polêmicas da MP 746. Cultura conta a história de Antonio Malta, artista formado pela FAU que vai expor obras na 32ª Bienal de Artes de São Paulo, e traz também a presença de mexicanos na Orquestra Sinfônica da USP. E nossos colegas do interior estão voando em Ciência, pesquisadores de São Carlos receberam um incentivo financeiro para um projeto que combate a epidemia do zika. Por fim, a Universidade sofre com os cortes de bolsas de financiamento de pesquisas e com a interrupção do Serviço de Aconselhamento Psicológico. As mães da Universidade também sofrem - sofrem por elas e por seus filhos - com o corte de vagas na creche e a falta de infraestrutura dos apartamentos do Crusp. Em tempos conturbados, a Universidade sedia o primeiro Encontro de Estudos da Paz. Em Esportes, informações sobre uma clínica em que os participantes poderão aprender e conhecer a esgrima no Cepeusp. E para não dizer que eu não falei das flores, esta edição traz uma Entrevista com Eduardo Leão Marques, coordenador do Centro de Estudos da Metrópole; o professor fala sobre os impactos das eleições na Universidade. Este é o desenho da edição 463 do Jornal do Campus.

SIGA E PARTICIPE!

/jornaldocampus JORNAL DO CAMPUS - Nº 462 TIRAGEM: 8 MIL Universidade de São Paulo - Reitor: Marco Antonio Zago. Vice-Reitor: Vahan Agopyan. Escola de Comunicações e Artes - Diretora: Margarida Maria Krohling Kunsch. Vice-Diretor: Eduardo Monteiro. Departamento de Jornalismo e Editoração - Chefe: Dennis de Oliveira. Chefe Suplente: Ciro Marcondes Filho. Responsáveis: Alexandre Barbosa, Luciano Guimarães e Wagner Souza e Silva. Estagiária PAE: Marcelle Souza. Redação - Secretária de Redação: Carla Monteiro. Editora de Arte: Natalie Majolo. Editor de Fotografia: Alexandre Amaral. Ilustração: Natalie Majolo (Tuxa). Editoria Online: - Editor: Leonardo Mastelini. Repórter: Flávio Ismerim. Entrevista - Editora: Victória Ferreira Del Pintor. Repórter: Aline Naomi. Universidade - Editores: Vitor Andrade, Carolina Tiemi e Larissa Lopes. Repórteres: Marina Morais Caporrino, Bianka Vieira, André Calderolli, Victória de Santi, Rafael Oliveira, Helena Mega. Em Pauta - Editora: Bianca Kirklewski. Repórter: Felipe Carvalho. Cultura - Editora: Bruna Martins. Repórteres: Lidia Capitani e Luiza Queiroz. Editoria de Esportes - Editora: Isabella Schreen. Repórteres: Victor Matioli e Liz Dórea. Ciência - Editora: Juliana Brocanelli. Repórteres: Ethel Rudnitzki e Carolina Ingizza. Opinião - Editora: Giovanna Wolf Tadini. Repórter: Luiza Missi. Fotógrafa: Maria José Campo. Endereço: Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 433, bloco A, sala 19, Cidade Universitária, São Paulo, SP, CEP 05508-900. Telefone: (11) 3091-4211. Fax: (11) 38141324. Impressão: Gráfica Atlântica. O Jornal do Campus é produzido pelos alunos do 4° semestre do curso de Jornalismo Matutino, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso II.


EM PAUTA

JORNAL DO CAMPUS PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016

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Incertezas marcam a reforma do Ensino Médio Uspianos têm dúvidas sobre objetivos da reforma; ex-ministro critica medida que instituiu mudanças FELIPE SATURNINO

O governo Michel Temer editou a Medida Provisória (MP) 746 para realizar a reforma do ensino médio no dia 22 de setembro. Para alguns especialistas em educação da USP, como Renato Janine Ribeiro, ex-ministro da Educação, e Reynaldo Fernandes, ex-presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira), a mudança na etapa média do ensino básico gera incerteza. Segundo ambos, não há garantia de que alunos poderão escolher entre todos os campos de conhecimento — uma das propostas da reforma —, pois as escolas estão desobrigadas a oferecer as cinco formações (linguagens, matemática, ciências naturais, ciências humanas e formação técnica). Um agravante foi a forma de implementação das mudanças, através de medida provisória, sem ampla discussão com a sociedade e movimentos da educação. “A MP impediu o debate e foi igualmente ruim porque era um dos raros casos em que o Congresso tinha uma comissão especial para tratar do assunto”, afirma Janine Ribeiro. “A reforma não ficou clara”, diz Fernandes, docente da Faculdade de Economia e Administração de Ribeirão Preto (FEA-RP). O texto da MP prevê o aumento progressivo da carga horária para 1400 horas anuais (a meta é chegar ao ensino integral), a reformulação do currículo e a opção de o aluno escolher entre cinco formações após cursar um ano e meio de matérias obrigatórias. Segundo Fernandes, a proposta é errática, tanto nas alterações quanto nos objetivos. “Uma questão é que nós não sabemos o que será de comum no currículo”, afirma ele, já que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), de acordo com o MEC, estará pronta apenas em 2017. Sem a BNCC, não é possível saber se matérias como Filosofia, Sociologia, Artes e Educação Física continuarão vigentes. Pela má repercussão do público, o governo Temer incluiu na MP, no

dia 23 de setembro, a permanência das disciplinas até ao menos o segundo ano posterior à definição da Base. A medida tem valor imediato e as suas disposições legais entraram em vigor logo após o decreto, mas deve ser votada em até 120 dias no Congresso para que não seja descartada. “Essa indefinição mata”, diz a vice-coordenadora do Núcleo de Pesquisa sobre Políticas Públicas (NUPPs/USP) e professora, Elizabeth Balbachevsky. “Mas eu não sou a favor de encher a área básica de disciplinas. Acredito que a sociologia e as artes têm todas as condições de lutar pelo seu público”, afirma. Forma e conteúdo A evasão foi uma das razões apresentadas pelo governo para implementar o ensino integral, mas, para Fernandes, a elevação da carga horária talvez não seja a cura. “A evasão está no atraso, no repetente, então, como aumentar horas na escola vai diminuí-la?”, indaga. A possibilidade de alunos optarem por determinadas disciplinas em seu currículo também pode ser tiro pela culatra caso a secretaria estadual de educação não ofereça todas as alternativas. Pelo conteúdo da MP, as mudanças serão aplicadas a nível estadual e as escolas serão obrigadas a oferecer o mínimo de dois campos. “Quem vai decidir pela disciplina, afinal, será o aluno ou o secretário estadual de educação?”, diz. Ministro da Educação de Dilma Rousseff durante cinco meses em 2015, Renato Janine Ribeiro afirma que não haverá tantas alternativas como o governo assegura. “Das cinco opções de campo, a escola talvez forneça uma ou duas, e isto pode ser um problema”, sugere. Para Janine Ribeiro, a MP decorre de um governo que busca acelerar as coisas sem fazer emendas constitucionais, votadas em dois turnos nas duas casas do Congresso e aprovadas em caso de obtenção de três quintos de votos de deputados e senadores. Na última quinta-feira, 29, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edison Fachin, demandou explicações ao presidente acerca da medida após entrada de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) feita pelo PSOL. Agora, Temer tem até 9 de outubro para

remeter resposta ao plenário da Suprema Corte explicando a decisão tomada. Discordante do ex-ministro, Balbachevsky crê que o uso de medida do tipo não é negativo nem impede o debate ou contribuições da sociedade. “Apenas coloca um prazo para isso acontecer”, afirma. “Com a adoção deste

“Uma questão é que nós não sabemos o que será de comum no currículo.” — Reynaldo Fernandes, ex-presidente do Inep e professor da FEA-RP

formato, o MEC consegue que essa discussão aconteça agora e termine em tempo hábil para que seja implementada com a urgência que tem.” Quando se especializar Vinicius Soares de Oliveira, estudante do 5º ano de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), confessa a frustração de perder possíveis locais de trabalho. Segundo ele, professores formados em Filosofia, Educação Física ou Sociologia sentem o mesmo pelas alterações no ensino médio, antecipando a permissão que a MP cede para pessoas lecionarem em áreas em que não possuem nenhum diploma. “A i n d a assim, existe consenso de que a reforma deva existir, e ela vai ao encontro de que o aluno deve ter mais liberdade”, diz Soares. Embora a MP 746 seja considerada flexibilizadora e atribuidora de autonomia ao estudante, para ele isto pode significar uma especialização precoce. “Numa nação, cidade ou sociedade, a gente perde muito se conhecimentos sociológicos ou filosóficos não existem na vida das pessoas”, argumenta. Isto, para Fernandes, é a dicussão real por que passa a reforma: o momento em que se inicia a especialização do aluno. “E acho que ela não deva ocorrer muito cedo”, observa. O ideal e os defeitos O ensino integral é outro componente importante na apresentação e discussão da proposta. “De modo geral, pessoas que lidam com educação são favoráveis a ele”, diz Janine Ribeiro. Por outro lado, o professor de Ética e Filosofia da USP julga que as estruturas das escolas não são capazes de suportar a carga horária decorrente, necessitando de investimentos para a execução da ideia. “Ensino integral é um ideal a ser perseguido, mas exige dinheiro para existir”, explica Fernandes. Para Balbachevsky, no geral, o projeto editado oferece boas respostas para autonomia, liberdade do aluno e

formação técnica para a possibilidade de que o estudante inclua, em sua grade, “a aquisição de habilidades específicas que lhe permitirão entrar para o mercado de trabalho com uma especialização”. Para Janine Ribeiro, a reforma não é toda ruim, mas tem uma série de defeitos. “O que eu digo mesmo”, afirma o ex-ministro, “é que é melhor discutir isto do que o Escola Sem Partido”. Formação ampla ou vestibular Embora divergentes sobre a forma de implementação e as propostas da reforma, as fontes desta reportagem concordam que uma alteração no ensino médio é necessária. Os problemas desta etapa do ensino básico, para Janine Ribeiro, vão da mudança na estrutura do currículo até ao aumento de salários a professores. Em sua opinião, os estudantes não são atraídos pelas disciplinas regulares e os docentes não possuem boa formação nem são motivados a dar aula em razão dos baixos salários, restando um impasse nas duas pontas da educação, o ensino e a aprendizagem. Segundo o MEC, o piso salarial nacional dos professores, calculado pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) no último ano foi elevado em 13,01% atingindo R$ 1.917,78. “Também é preciso que o aluno saia desta fase do ensino básico com uma formação completa, e que o ensino médio não seja um pré-vestibular”, enfatiza. O currículo do ensino médio, diz ele, não pode estar voltado para outra coisa a não ser para si próprio. Soares, discente e professor que lecionou por dois anos da rede de ensino privado, observa que esse ideal de formação ampla, contemplando diversas áreas do conhecimento, fica de escanteio com o prazo mínimo de grade curricular regular ou obrigatória estipulado na reforma. “Em um ano e meio de disciplinas obrigatórias, eu creio que nem poderia ser ensinado o básico de história”, prevê.


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UNIVERSIDADE

PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 JORNAL DO CAMPUS

O que está fazendo falta na sua graduação? Alunos de diversas áreas e campi expõem o que mais sentem falta na grade curricular MARINA M. CAPORRINO

O Jornal do Campus conversou com diversos uspianos, estudantes de todas as áreas do conhecimento e de diversos campi, para saber como se sentem em relação às matérias da grade. Na pesquisa, 89,7% dos alunos sentem falta de disciplinas que não configuram em suas grades. Essa carência varia entre diversos assuntos, mas a área que a maioria sente falta é a de humanas (43,1%). Mesmo entre os alunos que institutos de ciências humanas esse é um cenário comum. Muitos sentem falta de matérias como História, Filosofia e Literatura. Para Cláudia Galian, professora de Currículo e Avaliação na Faculdade de Educação, garantir que os cursos tenham interdisciplinaridade não é tão simples assim, “a abordagem interdisciplinar só pode acontecer quando se conta com uma base de conhecimentos ligados às disciplinas. Avançar para isso é importante na medida em que favorece o desenvolvimento de perspectivas

relacionais na compreensão do mundo”, explica Cláudia. Além de disciplinas de humanas, os alunos também sentem falta de matérias que abordem política, economia e atualidades, tanto no âmbito nacional, quanto no internacional. A falta de debate sobre o que está acontecendo no Brasil e no mundo gera desconforto entre a maior parte dos alunos entrevistados. Vitor Neves, aluno do primeiro ano de Economia da FEA, comenta, por exemplo, que sente falta de disciplinas que abordem temas como agronegócio, sustentabilidade e negócios sociais. Há, também, a expectativa por disciplinas que envolvam as novas tecnologias e as relacionem com a área estudada. Nesse aspecto, as reclamações variam desde aprender a mexer em equipamentos específicos, até aprender a usar devidamente programas como o Excel. Essa lacuna na grade currícular pode ser interpretada como algo negativo para a formação do profissional. Cláudia evidencia que seguir as

De acordo com pesquisa feita com estudantes da Universidade, as aulas que mais fazem falta são:

43,1%:

ciências humanas;

15,5%:

política, economia e atualidades;

13,7%:

novas tecnologias;

27,5%: outros;

10,3%:

nenhuma aula

tendências do mundo é importante para a reflexão e formação do profissional: “isso significa que os elementos disponíveis para a leitura do mundo – incluindo aí as tendências tecnológicas e a rápida circulação de informações sobre temas atuais –, devem ser não só seguidos ou utilizados para resolver problemas práticos, mas devem ser objeto de reflexão”. Apesar da falta de contato com outras disciplinas, a maior parte dos alunos entrevistados frequenta outros institutos, por conta de desde cursos extracurriculares, até por causa de alimentação. Um ponto de debate e reclamações é a interdisciplinaridade. A USP exige que seus alunos cumpram certo número de créditos em disciplinas optativas – que varia de curso para curso – para assegurar que os alunos saiam de seus institutos e se envolvam com disciplinas de outras áreas. Isso não só aumenta as opções para os estudantes, como configura-se em mais um diferencial que a USP possui. Porém, ela ainda não parece ser suficiente.

Extensão Outro ponto ouvido na pesquisa foi o conhecimento ou não de projetos de extensão. Cerca de metade dos entrevistados demonstraram não saber o que é um projeto de extensão e não conheciam projetos dentro dos próprios institutos. De acordo com o artigo 207 da Constituição Federal, as universidades públicas devem atender igualmente a três princípios: ensino, pesquisa e extensão. A Pró-Reitoria de Cultura e Extensão (PRCEU), determina que “as atividades de cultura e extensão universitária são concebidas como processo educativo, cultural e científico que integra o ensino e a pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre a Universidade e a sociedade”. Nessa determinação, são considerados projetos de extensão atividades extra-acadêmicas que busquem não apenas levar conhecimento produzido dentro da Universidade para fora dela, mas também promover interação entre os alunos e experiências fora da sala de aula.

Reitoria fecha acordo com consultoria privada BIANKA VIEIRA

desta edição; já o contato feito com a Ultrapar foi encaminhado pela própria empresa para a Reitoria, que afirmou estar centralizando toda a comunicação do projeto e limitou-se à reprodução de seu comunicado. Discussão De acordo com César Minto, presidente em exercício da Adusp, as tramitações foram realizadas sob desconhecimento da comunidade acadêmica, fator suficiente para causar desconfiança em relação aos reais propósitos do USP do Futuro. “Toda e qualquer iniciativa que envolva contratos com a USP deve ser discutidas com a comunidade acadêmica e a sociedade, não apenas com poucos ou muitos ‘ex-alunos’”,

afirma Minto. “No que se refere à contratação de qualquer consultoria, causa estranheza o fato de a Reitoria desprezar o recurso a suas próprias unidades, cuja abrangência temática é das mais maiores no país, sendo que há pessoal especializado e competente em todas as áreas de conhecimento”, assegura. Por considerar insuficiente todo o conteúdo relacionado ao projeto divulgado até agora, a Adusp encaminhou novo ofício pela a complementação de dados e informações. Respaldado pela Lei de Acesso à Informação (lei 12.527/2011, artigo 7º, inciso IV), o documento estabelece o prazo de até vinte dias para nova resposta por parte dos órgãos oficiais da universidade. LUIZA MISSI

Em busca de novas soluções para a crise financeira, a USP acaba de anunciar parceria com a McKinsey & Company, empresa estadunidense de consultoria empresarial. Intitulada como “USP do Futuro”, a iniciativa foi apresentada pela Reitoria como um projeto promovido por ex-alunos em nome do desenvolvimento de novo modelo de captação de recursos e de gestão administrativa e financeira para a Universidade. O comunicado, no entanto, veio a público somente no dia 20 de setembro, após uma série de denúncias feitas pela Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo (Adusp), a qual pede a suspensão imediata do projeto USP do Futuro por completo. Em seu primeiro pronunciamento oficial, a Reitoria desmentiu a informação divulgada pela Adusp de que a consultoria estaria viabilizando um esquema de cobrança de mensalidade para os cursos. De acordo com notas emitidas pela Associação de Docentes, a declaração respalda-se em uma denúncia anônima recebida e divulgada no dia 19 do mesmo mês. O projeto que chega a público neste momento, entretanto, encontra-se em tramitação desde o dia 28 de junho deste ano, conforme mostra o Termo de Doação assinado entre a USP e a Comunitas (organização es-

pecializada em investimentos sociais com apoio de iniciativas privadas), que é apresentada como viabilizadora administrativa e financeira da parceria com a consultoria americana. Por sua vez, o Acordo de Cooperação com McKinsey & Company, também divulgado nesta última semana, tem sua assinatura datada de 11 de agosto. De acordo com os documentos, a execução do USP do Futuro deve acontecer em quatro fases — avaliação; estratégia; frente orçamentária e de gestão; desenho e validação do projeto — durante os dez meses previstos em contrato, que poderão ser prorrogados dentro do prazo de cinco anos. Além da cláusula de confidencialidade para quaisquer tipos de informação, documentos e rotinas, o documento destaca que todo o custo será arcado pela Comunitas, apresentada como responsável exclusiva pela contratação e respectivo pagamento da consultoria. Por outro lado, apesar do Termo de Doação ter sido firmado apenas com a Comunitas, em audiência realizada com o governador Geraldo Alckmin no dia 5 de setembro, também compareceram membros-líderes de empresas como Natura, Cosan, Itaú e Ultrapar Participações. Em contato com as assessorias da Natura, Cosan e Itaú, o Jornal do Campus não obteve respostas até o fechamento

“Toda e qualquer iniciativa que envolva contratos entre a USP deve ser discutida com a comunidade acadêmica e a sociedade.” — César Minto, líder da Adusp


UNIVERSIDADE

JORNAL DO CAMPUS PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016

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Vale a pena fazer intercâmbio pela USP? Estrangeiro no Brasil e brasileiros no exterior contam sobre a experiência de estudar fora RAFAEL OLIVEIRA

Em 2001, no primeiro ano deste século, apenas dois alunos da USP rumaram para o exterior em intercâmbios vinculados à Universidade. Um do Instituto de Química (IQ) e um da Escola Politécnica (Poli); um para a França e um para a Alemanha. Mais de dez anos depois, em 2014, no auge dos intercâmbios, a USP enviou 3448 estudantes para o exterior e recebeu um total de 1782 estrangeiros. Os dados, disponibilizados pela Agência USP de Cooperação Acadêmica Nacional e Internacional (Aucani), refletem a popularização dos intercâmbios e o crescente número de bolsas e programwas de incentivos à formação acadêmica no exterior, como o Ciência Sem Fronteiras, criado pelo governo federal em 2011. Simultaneamente, as estatísticas demonstram tendência de queda na quantidade de estudantes indo para o exterior a partir do ano passado, em consonância com os cortes em programas de bolsas e a crise corrente da Universidade. A despeito da redução de vagas, muitos alunos da USP ainda sonham em estudar fora do país. Para entender o que motiva os estudantes a deixarem suas casas rumo ao exterior – e compreender, também, o que faz com que estrangeiros se aventurem em terras brasileiras –, o Jornal do Campus conversou com os que já foram e com os que estão experimentando um intercâmbio pela universidade. Porquê estudar fora Pedro Ivo Toscano trocou a Faculdade de Economia e Administração (FEA) pela Kedge Business Scho-

ol of Marseille no segundo semestre de 2014. Aos 23 anos, o então estudante de contabilidade foi para o exterior sem bolsas de estudo, mas com a expectativa de desenvolver línguas e de conhecer novas culturas; voltou para o Brasil com muito mais. Passado o choque cultural inicial – o feano morava com 200 outros estudantes no alojamento da faculdade –, o convívio em terras francesas tornou-se mais fácil e Toscano desenvolveu-se tanto pessoal quanto profissionalmente, ganhando em capacidade de lidar com as diferenças e em independência. Além disso, as aulas mais voltadas para o marketing e a comunicação ajudaram o agora bacharel em contabilidade a focar em uma nova área de interesse, o que o motivou a começar, neste ano, o bacharelado em Relações Públicas, curso da ECA. No mesmo período que Toscano, mas no país vizinho, Cesar Mamede experimentava seu primeiro intercâmbio, na University of Bremen. Nos quatro meses que passou na cidade alemã – três deles com bolsa conseguida com a faculdade estrangeira – não só teve a oportunidade de conhecer mais profundamente um outro país, como conseguiu dar uma pausa na rotina de estudos no Brasil, que, após mais de dois anos de graduação, já eram maçantes. Tomou gosto pela coisa e no ano seguinte deixou novamente a Escola Politécnica, dessa vez rumo à Sydney. Em terras australianas, Mamede não só vivenciou a mistura de culturas do país da Oceania, como também teve a oportunidade de estudar em uma dinâmica melhor. “As aulas são muito melhores, uma car-

ga horária menor, as matérias são mais bem pensadas, além das condições oferecidas pela faculdade para o aprendizado. É muito mais fácil estudar lá, pela acessibilidade e estrutura da faculdade”, explica. Além disso, o período na University of New South Wales – bancado pelo Ciência Sem Fronteiras – proporcionou ao estudante de engenharia química um “enorme” crescimento pessoal e as “melhores experiências” que já teve em sua vida. Experiência Se Toscana e Mamede já retornaram de seus intercâmbios, Carolina Pulice está vivendo a experiência durante este semestre. Em Lyon há apenas um mês, a estudante de jornalismo ainda está assistindo a suas primeiras aulas, mas já sofre com as expectativas. “Um dos grandes problemas é conciliar as expectativas dos outros com as minhas. A gente chega aqui querendo fazer um milhão de coisas, mas, ou por questões financeiras, ou porque tem que estudar, acabamos deixando de fazer várias coisas”, explica. Apesar do receio de não conseguir aproveitar o que o intercâmbio tem para oferecer, a estudante acredita que as aulas em um idioma diferente, assim como as novas experiências acadêmicas já são o suficiente para fazer o semestre na França valer a pena.

que realizaram intercâmbios na cidade. Morando na Vila Madalena, Hafner aproveita o tempo livre entre as aulas da FEA e as de português para aproveitar a abertura e a receptividade dos brasileiros, os points da cidade – ele cita a Praça Roosevelt e o Parque Ibirapuera – e comidas brasileiras, como o açaí.

“Um dos grandes problemas é conciliar as expectativas dos outros com as minhas. A gente chega aqui querendo fazer um milhão de coisas, mas, por inúmeros motivos, acabamos deixando de fazer várias” — Carolina Pulice, estudante de jornalismo

Estrangeiro no Brasil Beat Hafner trocou a University of St. Gallen – na região nordeste da Suíça – pela FEA no início deste semestre. Aos 22 anos, o suíço veio para o Brasil por indicação de um colega suíço-brasileiro que morara em São Paulo e de outros dois amigos

Mobilidade Internacional 3500 3150 2800 2450 2100

ALUNOS DA USP NO EXTERIOR

1750

ALUNOS DO EXTERIOR NA USP

1400 1050 FONTE: MUNDUS

350

2016

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2001

NATALIE MAJOLO

700

Campeãs A Escola Politécnica, desde os primeiros anos em que o intercâmbio passou a ser parte da realidade uspiana, é a campeã de envios: nos últimos quatros anos, cerca de 20% dos intercambistas brasileiros da USP eram estudantes da Poli. A Escola de Engenharia de São Carlos, a vice-campeã, representa aproximadamente 15% dos intercambistas durante o mesmo período. Além das duas, a Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos de Pirassununga (FZEA), a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), a Escola de Comunicações e Artes (ECA), a Faculdade de Direito (FD), a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), a Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) e a Escola de Engenharia de Lorena (EEL) se destacam entre os institutos que mais enviam intercambistas. Já entre as que mais recebem estudantes do exterior, a Poli, a ECA, a FEA e a FFLCH despontam como as principais instituições hospedeiras. Em relação aos países que mais recebem os brasileiros, a França é a grande campeã: só neste ano, 522 brasileiros desembarcaram no país para estudar. Além do país gaulês, o lusófono Portugal, os Estados Unidos, a Austrália, a Alemanha, a Espanha e a Inglaterra vêm hospedando estudantes da USP nos últimos anos. A Universidade, simultaneamente, recebe grande quantidades de latino-americanos – especialmente de Colômbia, México e Peru –, e de europeus – com destaque para os franceses, os alemães, os espanhóis e os portugueses. A reportagem do JC contatou a Aucani para compreender o funcionamento dos intercâmbios e entender os motivos que levaram à redução das bolsas e, consequentemente, da ida e vinda de alunos. O órgão informou que o aluno interessado deve acompanhar as oportunidades publicadas no site usp.br/internationaloffice e se inscrever nos editais na área pública do sistema corporativo Mundus. Até o fechamento desta edição, entretanto, a Aucani não respondeu aos questionamentos do JC acerca da distribuição das vagas entre as faculdades e a queda do número de intercambistas.


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UNIVERSIDADE

PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 JORNAL DO CAMPUS

Cortes de bolsa afetam pós-graduandos Cenário econômico difícil e falta de transparência dificultam a permanência estudantil na pós

Capes Desde 2013, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), fundação do Ministério da Educação (MEC), não reajusta o valor das suas bolsas de mestrado e doutorado (respectivamente, de R$ 1.500 e de R$ 2.200). O mesmo acontece para as bolsas oferecidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). Em 2015, a Coordenação reduziu em 75% a verba de custeio disponível no Programa de Apoio à Pós-Graduação (Proap), após o anúncio do governo federal de que R$ 9,42 bilhões seriam cortados do orçamento do MEC. Esse

tipo de recurso é destinado para participação de pesquisadores em eventos científicos e em viagens de pesquisa de campo. Em março deste ano, 7.408 bolsas ociosas de quatro Programas da Capes foram bloqueadas, sendo que 3.929 já retornaram ao sistema. A Associação dxs Pós-Graduandxs Helenira ‘Preta’ Rezende (APG-USP/Capital) informa que, na USP, 750 dessas bolsas bloqueadas teriam sido reavaliadas da condição de ociosas e devolvidas à Universidade. A Pró-Reitoria de Pós-Graduação, no entanto, não informou os números exatos. No ano passado, das 92.146 bolsas de estudo no país, a Capes forneceu 3.217 bolsas de mestrado e 4.597 bolsas de doutorado para a USP. Falta de transparência Com maior demanda, as bolsas de mestrado são insuficientes na pós. Ana Paulo Bueno, mestranda do Prolam (Programa de Pós-Graduação Interunidades em Integração da América Latina da USP), não foi indicada para receber o auxílio da Capes para o qual se aplicou. Ela é mãe e está desempregada.

“Quero uma comprovação: por que eu não posso ter bolsa?”, diz a estudante. A sua principal reclamação deve-se à falta de transparência nos critérios de seleção dos bolsistas: sem uma classificação ou nota, espera até hoje uma justificativa para entender porque não foi selecionada, assim como outras mães que acabam desistindo da pós-graduação.

Sem verba de apoio, Ana Paula conta que precisou mudar o seu projeto de pesquisa porque não conseguiria complementar os estudos em outro país da América Latina, como propõe o Prolam. Frente a critérios questionáveis e pouco transparentes, uma possibilidade é recorrer ao Ministério Público para questionar os resultados das classificações.

PÓS-GRADUAÇÃO NA USP 14.130

no mestrado

30.039 matriculados

15.909 no doutorado

Fapesp

CNPq + Capes

Corte de 77% nas bolsas de mestrado

não há reajuste no valor das bolsas para a pós-graduação

Investidos R$ 25,8 milhões a menos na pós-graduação

NATALIE MAJOLO

O Relatório de Atividades 2015 da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), divulgado no dia 14 de setembro, indicou uma queda de 6% em sua receita no último ano. Paralelamente, órgãos federais que financiam a produção científica no país vêm sofrendo cortes por conta da menor arrecadação tributária nos últimos anos. No caso da Fapesp, quase 80% da verba é composta pelo repasse equivalente a 1% do valor recolhido pelos impostos estaduais. Desde 2013, o valor destinado a bolsas de mestrado oferecidas pela Fundação diminuiu em 77%. Entre os anos de 2014 e 2015, a redução nos investimentos em bolsas de mestrado e doutorado foi de R$ 25,8 milhões. O relatório também aponta que a USP é a instituição que mais recebeu recursos da Fapesp em 2015: um total de R$ 576,3 milhões, que corresponderam a 48,5% do desembolso total feito pela Fundação e que foram destinados aos 10.729 projetos que ela apoiou na Universidade.

Porém, com critérios de seleção mais exigentes, houve uma redução de 14% na quantidade de novas bolsas fornecidas. Em 2014, foram 6.364 e, em 2015, 5.448 — o menor número desde 2010. Os pré-requisitos chegam a incluir a publicação de livros e artigos acadêmicos de alta qualificação durante a graduação, quando são bastante restritos.

FONTE: Fiquem Sabendo / Capes

HELENA MEGA

com o corte de R$ 9,42 bilhões na educação pelo governo federal em maio de 2015, a verba de custeio foi reduzida em 75%

Primeiro EBEP é sediado no campus O Encontro Brasileiro de Estudos da Paz reuniu dezenas de pesquisadores na semana da paz

VICTÓRIA DE SANTI

No dia 21 de setembro é comemorado o Dia Internacional da Paz, instituído pela ONU na década de 1980. E de 22 a 23 de setembro deste ano, a USP sediou o Primeiro Encontro Brasileiro de Estudos da Paz (EBEP), no Instituto de Relações Internacionais (IRI). Ana Maura Tomesani, doutoranda no Instituto, foi uma das organizadoras do evento que teve apoio do IRI, do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da USP e do Programa Santiago Dantas. Ela explica

que o evento é realizado por uma rede de pesquisa em paz, a PCECS (Rede de Pesquisa em Paz, Conflitos e Estudos Críticos de Segurança), e foi inicialmente planejado para permitir que os membros da rede se conhecessem. “Era para ser uma coisa pequena, quase como um seminário, mas foi crescendo -porque a rede também foi crescendo”, diz. E conforme isso acontecia, o evento tornou-se aberto ao público. Tomesani explica que “a USP era o lugar ideal por conta da localidade,” já que viriam participantes de diversas partes do

Abertura do Encontro com a organizadora Ana Paula Tomesani

país — do nordeste ao sul —, e ter a sede num local mais central facilitaria os voos. A Rede de Pesquisa em Paz, Conflitos e Estudos Críticos de Segurança, que existe há pouco mais de um ano, reúne cerca de oitenta pesquisadores de todo o Brasil, e surgiu informalmente como um meio de diversos estudiosos dessa mesma área se comunicarem e colaborarem com os trabalhos uns dos outros. Ramon Blanco, professor na Unila (Universidade Federal da Integração Latino-Americana), explica que “[a Rede] começou como algo virtual, troca de emails e foi materializado um blog com algumas discussões.” Camila Braga, do Departamento de Ciências Políticas da USP, acompanha e faz parte da Rede desde o seu início e conta que o evento foi pensado como forma de expansão de conhecimento sobre esses estudos Brasil afora. “Nós, como pesquisadores de estudos da paz, somos vários e variados, e estamos por todo o Brasil, mas a gente se conhece muito pouco”. De alunos da graduação a pesquisadores pós-graduados e pessoas que de-

VICTÓRIA DE SANTI

VICTÓRIA DE SANTI

senvolvem trabalhos na área, a intenção da Rede é estabelecer um círculo de diálogo. De acordo com Camila, “existem inúmeros projetos que nós não conhecemos, e a ideia [do evento] era divulgar e abrir esse grupo para que todos fizessem parte.” Durante o primeiro dia de evento, papers de pesquisadores da Rede foram o tema em uma roda de debates organizada de maneira diferente, na qual todos os participantes têm acesso ao material e não há apresentação prévia de cada paper; um debatedor apresenta os pontos centrais e faz a pri-

meira crítica, depois o debate é aberto. Houve ainda a apresentação do seminário do professor Stefano Guzzini, palestrante internacional da Uppsala University. As reuniões na manhã do segundo dia foram fechadas aos membros da PCECS para discussões internas. A segunda edição do EBEP, que será a anual, acontecerá na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), também na semana da paz, em setembro. O endereço virtual do blog é http://pcecs.blogspot.com.br/, e através dele os novos pesquisadores e interessados podem participar da Rede.


UNIVERSIDADE

JORNAL DO CAMPUS PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016

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Atendimento psicológico passa por revisão Questões administrativas causam paralisação no IP, mas outros serviços seguem funcionando VICTÓRIA DE SANTI MARINA MORAIS CAPORRINO

O Jornal do Campus procurou a coordenadora do Centro Escola do Instituto de Psicologia (CEIP), Maria da Conceição Coropos Uvaldo, para saber sobre o Serviço de Aconselhamento Psicológico (SAP), que recentemente parou de funcionar, e entender como o CEIP funciona. Conceição explica que o serviço, que voltará em março, foi paralisado por questões administrativas da coordenação e está sendo reformulado. “Este serviço não está funcionando porque são três psicólogas trabalhando lá. Uma saiu de licença maternidade, e a outra saiu para fazer o pós-doutorado”. Com uma única coordenadora, não foi possível seguir com os atendimentos normalmente. O SAP se encaixa no grupo dos serviços que atendiam por ordem de chegada, voltado para pessoas da região Oeste da cidade e alunos USP. Nas quartas-feiras pela manhã, bastava se direcionar ao bloco D do IP e inscrever-se em um caderno na mesa central. A partir das 9h, os nomes eram chamados para o atendimento que poderia ser individual ou em grupo, a depender da quantidade de pessoas na manhã. Conceição explicou que existem diversos atendimentos diferentes no local e que funcionam de maneira autônoma. “Nós temos uma série de atendimentos independentes. Aqui é um Centro Escola, então os atendimentos são estágios dos nossos alunos e são vinculados a disciplinas”. Os serviços atendem demandas diferentes dentro e fora da comunidade USP, de orientação profissional para pré-vestibulandos (que acontece mais próximo da data em que ocorre o vestibular da Fuvest) ao atendimento de crianças. Mas nem todos funcionam da mesma maneira. Alguns serviços abrem inscrições, outros atendem por ordem de chegada. O que determina a forma de funcionamento são as condições internas. “Cada serviço tem autonomia para abrir um certo número de vagas que é ditado pela quantidade de alunos inscritos nas disciplinas”, afirma. Além disso, com a reformulação, uma prática que ocorria esporadicamente nos atendimentos locais, que era o encaminhamento de alunos para psicólogos que voluntariamente aceitavam acolhê-los por um valor de consulta mais baixo que o de mercado, não ocorrerá mais. “Não podemos fazer nenhum encaminhamento externo, é lei. Isto era uma coisa episódica, um número muito pequeno, mas com a situação atual da rede pública esse número aumentou”.

São Paulo Centro Escola do Instituto de Psicologia Atendimento para alunos e a comunidade Cada serviço tem seu dia e horário de atendimento. Informações por telefone. Bloco D do Instituto de Psicologia da USP Telefone: (11) 3091-5015

E quem atende os estudantes da Psicologia?

Ribeirão Preto Centro de Orientação Psicológica Integrada Atendimento para os estudantes Funcionamento: 2ª a 6ª feira, das 08h00 às 11h30 e das 13h00 às 17h00. Rua Clóvis Vieira, casa 32 Campus Ribeirão Preto Telefone: (16) 3315.3494 Email: copi.pc@usp.br Centro de Psicologia Aplicada Para toda a comunidade, inclusive crianças Funcionamento: segunda a sexta-feira, das 08h00 às 17h00. Av. Bandeirantes, 3900 Monte Alegre - Ribeirão Preto Telefone: (16) 3315.3722 / 4835 Email: psicologia@listas.ffclrp.usp.br

O CEIP, assim como qualquer serviço público, é regido pelo código penal que, no Título XI: dos crimes contra a administração pública, proíbe que se indique aos pacientes serviços de terceiros. “Nós somos uma escola pública, e não podemos, em hipótese alguma, encaminhar para serviços particulares, somente os públicos”. Conceição pontua que, no entanto, a situação da área psicológica na rede pública é complicada, pois “os serviços de saúde não têm psicoterapia como um procedimento normal. O Hospital Dia é para atendimentos mais graves e psicoterapia não faz parte dos atendimentos da rede”. E mesmo dentro da USP não são encontrados serviços de apoio. “Quando a gente tem urgências psiquiátricas, a gente tenta o HU primeiro, mas em geral a gente vai para o Pronto-Socorro da Lapa que tem o PS Psiquiátrico”, explica Conceição. O Hospital Universitário oferece atendimentos psiquiátricos, mas são consultas marcadas previamente através do site. Conceição ressalta que todos os demais atendimentos oferecidos pelo Centro Escola do Instituto de Psicologia seguem funcionando normalmente. O site do instituto está sendo modernizado, então as informações de horários e dias podem ser obtidas através do telefone da central do CEIP, veja no box sobre os atendimentos no campus da capital e em Ribeirão Preto.

O Conselho Federal de Psicologia (CFP), em suas diretrizes, não determina que os cursos de graduação em psicologia devam oferecer terapia aos seus alunos. No caso do IP, o atendimento psicológico para os próprios estudantes não é uma prática existente. Denise Harumi, estudante de psicologia, conta que quando os alunos sentem necessidade, procuram uma indicação de terapia por fora. “Para as estudantes da psicologia, temos uma lista de profissionais que se dispõem a atender por um preço mais baixo, pois nós não podemos ser atendidos pelas equipes do CEIP, por motivos óbvios. Nunca ouvi que isso não era suficiente”, relata. Na FFCLRP (em Ribeirão Preto), por outro lado, a situação é diferente. Lá, os alunos de psicologia podem usufruir de um atendimento na própria instituição, porém, feito pelos próprios alunos. Ou seja, há grandes possibilidades de um aluno ser atendido por um veterano, o que não é ideal, por conta dos vínculos estabelecidos. Essa falta de demanda por atendimento psicológico gratuito dentro do próprio IP tem uma justificativa. Segundo Conceição, os alunos não precisavam dessa gratuidade pois podiam arcar com a terapia do próprio bolso: “Não é uma ideia [fornecer atendimento psicológico aos alunos do próprio instituto] porque nunca houve esse pedido dos nossos alunos. A renda da psicologia sempre foi uma das mais altas da USP, só perdia para a Medicina”, conta. Segundo um levantamento dos últimos 5 anos feito pelo JC com dados disponibilizados pela Fuvest, o perfil dos candidatos ao curso de Psicologia em São Paulo é de classe média. Em todos os anos analisados, a maior porcentagem de candidatos possuia renda familiar entre 3 e 5 salários mínimos e havia cursado o Ensino Médio em escola particular. Esse cenário, porém, está mudando e não apenas entre os alunos do IP, mas entre os alunos da USP como um todo. “A individualização do sofrimento e o sentimento de que é a única pessoa que não está bem na universidade tem sido comum na grande parte

dos cursos que tivemos contato.”, conta Denise ao JC. Ela ressalta, também, que o aumento da procura pelos serviços se deve ao fato de que, atualmente, as pessoas falam mais sobre seus problemas psicológicos, “hoje, em 2016, se a gente percebe mais o sofrimento psíquico de estudantes, é porque se fala mais sobre isso”. Além disso, Conceição fala que dentro do próprio IP o cenário tem se modificado nos últimos anos, graças à uma mudança no perfil dos ingressantes. O uso de meios como o Enem já impacta, mesmo que de forma tímida, o perfil dos alunos da Psicologia. “A mudança do perfil é mais recente. A psicologia é a unidade que mais ofereceu vagas pelo Enem (30%). Nosso aluno aqui nunca precisou do atendimento. Eles queriam o encaminhamento para quem pudesse atender, ou atender por um valor mais baixo. A gente tinha um perfil socioeconômico muito alto, que está mudando, e isso faz com que a gente repense as nossas práticas. Hoje, o nosso aluno talvez não possa [arcar com o pagamento de terapia fora da faculdade]”, afirma. Nesse sentido, a reformulação de programas pode trazer benefícios para quem precisa dentro da USP. Porém, essa mudança de perfil e os impactos que ela tem sobre a necessidade de atendimento psicológico ainda é ignorada no âmbito mais amplo, já que a Universidade ainda não sabe como lidar com casos assim ou simplesmente os ignora. Não à toa, surge o sentimento de solidão entre os alunos que precisam desse acolhimento. Por outro lado, muitos grupos e alunos dentro da USP têm usado os espaços da faculdade e as redes sociais para expor esses pontos, como foi o caso da iniciativa “FAU nãoénormal”. “A desnaturalização das diversas formas de opressão tem se manifestado em diversos espaços, pelos gritos de reivindicação de direitos, de reconhecimento da diversidade, e de democratização. E uma das consequências disso é o ‘surgimento de demanda’ — o que a gente pode chamar de ‘dar voz ao sofrimento coletivo’”, conclui Denise.


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UNIVERSIDADE

PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 JORNAL DO CAMPUS

UNIVERSIDADE

JORNAL DO CAMPUS PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016

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USP carece de recursos para a garantir a permanência de estudantes com filhos tipo de situação que vinha acontecendo em relação às pautas das mães. Para participar do evento, por exemplo, eu tinha deixado a Frida na ‘minicreche’, onde já havia mais de sete crianças naquele momento”, conta. “A primeira questão para as mães é a da creche, o direito ao ensino para as nossas crianças e para nós mesmas”.

LARISSA LOPES

uma cozinha e uma lavanderia de uso coletivo das mães e um espaço de recreação para as crianças, que é protegido com cerca, material que falta no restante do Conjunto Residencial, que possui seis andares de escada com vãos sem proteção alguma. Em agosto, Stella participou de um debate com o USP Mulheres sobre os avanços e os desafios da desigualdade de gênero e a aplicação da Lei Maria da Penha dentro da Universidade. “Nessa mesa eu pude dar um relato do

Obras em anfiteatro são retomadas A princípio, prédio planejado para as artes ficará pronto em junho de 2017 das grandes obras foram paralisadas. A reforma do anfiteatro estava entre elas, e o contrato foi rescindido naquele ano. Nesse mesmo plano, a SEF colocou como prioridade a conclusão das obras da primeira parte do Centro de Difusão Internacional (CDI I) para que seu auditório fosse usado para abrigar os eventos que, antes de 2012, eram realizados no Camargo Guarnieri. A primeira parte do Centro, localizado em frente à Escola de Comunicações e Artes (ECA), foi concluída no final de 2015. As obras da segunda parte (CDI II) foram retomadas em outubro de 2015 e têm como previsão de conclusão junho de 2017. Entre o segundo semestre de 2013 e o primeiro de 2014, alguns dos eventos foram realizados na Tenda provisória na Praça do Relógio e, durante todo o período em que o anfiteatro esteve fechado, auditórios de diversos institutos têm sido utilizados. O assessor da

PRCEU explica que, assim, não houve prejuízos para as atividades promovidas pela Pró-Reitoria, “a Osusp faz suas apresentações na Sala São Paulo e ensaios e apresentações no campus no auditório do CDI, sem qualquer tipo de problema ou restrição. Os outros órgãos, como Tusp e Cinusp, por exemplo, também têm seus espaços normalmente funcionando independentemente do Camargo Guarnieri”. A previsão é de que, em junho de 2017, quando as obras no Anfiteatro forem concluídas, o prédio volte a abrigar as apresentações. Apesar de não ser essencial para as atividades, que funcionam normalmente sem o Camargo Guarnieri, a assesoria da PRCEU explica que “existe uma proposta para o futuro Camargo Guarnieri de ter ali um novo espaço qualificado para atividades artísticas e culturais, ou seja, trata-se de planejamento de longo prazo para atender a demandas que certamente surgirão no futuro”.

Bloco A Auditório Camargo Guarnieri

NATALIE MAJOLO

No início do semestre, as obras no Anfiteatro Camargo Guarnieri, localizado entre os blocos A e C do Crusp, foram retomadas depois de ficarem paralisadas por mais de dois anos. O prédio foi fechado para reforma e ampliação em fevereiro de 2012, e a previsão é de que permaneça fechado até junho de 2017. Em entrevista ao Jornal do Campus em 2012, Juliana Maria Costa, chefe da Divisão de Ação Cultural da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária (PRCEU), explicou que a Universidade não tinha espaço semelhante ao do projeto do Anfiteatro. O objetivo é que, depois das obras, o prédio seja elevado a Núcleo das Artes, integrando o espaço físico de vários outros órgãos da PRCEU. Espera-se que o futuro Núcleo das Artes abrigue órgãos artísticos como a Orquestra Sinfônica da USP (Osusp) e o Coral da USP. A assessoria da Pró-Reitoria explica

que as propostas de utilização do espaço permanecem as mesmas das apresentadas em 2012. Inicialmente, as obras começariam no segundo semestre de 2011 e durariam aproximadamente um ano, mas no segundo semestre de 2012 ainda não haviam sido iniciadas, pois o projeto passava pelo processo de escolha da empresa para a realização da obra. Depois de iniciadas em agosto de 2013, as obras foram interrompidas em 2014. A Superintendência de Espaço Físico (SEF) é a responsável pelas obras na Universidade e divulgou o plano de obras para o período compreendido entre 2015 e 2017. Nele, a ordem de início para a obra foi dada no dia primeiro de julho e o prazo previsto para conclusão é 25 de junho de 2017. Em resposta sobre os atrasos na obra, a assessoria da USP explicou que, em fevereiro de 2014, como medida para o restabelecimento financeiro da Universidade, muitas

Perspectivas No último ano, foram cortadas 114 vagas da creche da Universidade com o objetivo de diminuir os gastos da instituição. No entanto, o custo delas em 2015 foi de R$1,8 milhão, o que equivale a 0,04% do orçamento da Universidade de São Paulo, um valor insignificante para ser poupado. Para Vera Soares, assessora do escritório USP Mulheres, a questão das creches envolve professoras, alunas e funcionárias. “Sua existência foi fruto de grande mobilização da comunidade universitária no final dos anos 1970 e até hoje é um importante equipamento da política de

Outras dificuldades Além da falta de creches, há também falta de bolsas e de uma melhor estrutura de acesso à saúde na Universidade. Roseleine, como estudante de Pós-Graduação, não conta com auxílio alimentação, apenas tem direito a uma bolsa emergencial, que vale por apenas três meses. Nos restaurantes universitários, suas crianças dividem o prato com ela, com exceção da mais velha, que conseguiu vaga na Escola de Aplicação da Faculdade de Educação e, portanto, tem direito ao bandejão. Outro aspecto é a ausência de farmácias dentro do Campus e o atendimento pediátrico do Hospital Universitário, que só funciona até as 19h. Em relação às atividades culturais, a SAS organiza no Dia das Crianças e no Natal uma confraternização com as mães e seus filhos, mas algumas ainda sentem falta de ações mais frequentes.

ALEXANDRE AMARAL

ANDRÉ CALDEROLLI

— Vera Soares, assessora do USP Mulheres

permanência para as estudantes, que se tornou referência nacional para a formação de profissionais e para a construção de atendimento às crianças”, conta. “Esse [fechamento de vagas] é um problema que a comunidade tem que trabalhar e reivindicar, devido à importância da creche na Universidade de São Paulo.” Em relação ao Crusp, a assessoria da Reitoria diz que “não há previsão de que [o aumento de vaga] se efetive”. Uma das soluções sugeridas pelos estudantes seria ampliação do Crusp para os blocos K e L, que “desde a sua construção, são utilizados por setores da Administração Central da Universidade”.

MAJO CAMPO

Por volta das dezessete horas, Frida já tinha tomado dois banhos, trocado de roupa quatro vezes e dado um susto na mãe ao engasgar com uma fruta. Faz parte da rotina de Stella Theodoro, estudante da licenciatura em Letras que quer seguir carreira no ensino público e tem convivido com vários obstáculos da maternidade no contexto uspiano. Para Stella, a falta de vagas na creche e de apartamentos apro-

priados no Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo (Crusp) são as principais barreiras para cursar o final de sua graduação tranquilamente. Das 1.692 vagas abertas em 2015, apenas 12 apartamentos são adaptados para a realidade materna. Eles ficam localizadas no corredor térreo do Bloco A e possuem dois quartos, um banheiro e uma sala, enquanto que o restante dos apartamentos é dividido em três quartos, um banheiro e uma sala. Há também

“O fechamento de vagas é um problema que a comunidade tem que trabalhar e reivindicar, devido à importância da creche na Universidade de São Paulo.”

Crusp. Dificilmente você vai encontrar um corredor inteiro que interage junto”. Dois amparos essenciais para a resistência das mães na Universidade são a Roda Nove Luas, que surgiu com um grupo de grávidas para discutir maternidade e feminismo, e a creche improvisada ao fundo do corredor do Bloco A, onde Stella deixou Frida para participar do debate com o USP Mulheres. Segundo Celma — uma das principais responsáveis pelo espaço onde as mães se revezam para cuidar dos filhos umas das outras enquanto alguma precisa trabalhar ou estudar—, o corredor já tinha uma estrutura com cercado de madeira construída pelo antigo morador do apartamento. Mesmo que o improviso seja de grande ajuda, Celma lembra que o espaço não suprime a necessidade de um espaço regular para as crianças. “Não é bem uma creche, a gente só usa o espaço para se ajudar”.

LIZ DÓREA

Em um corredor do Crusp, mães colaboram para cuidar de crianças enquanto outras estudam

Vagas restritas Os critérios de seleção para os apartamentos reservados a pais e mães seguem os mesmos parâmetros dos demais moradores do Crusp. Além de comprovar a falta de renda, para conseguir uma das doze vagas apropriadas para mães no Crusp as assistentes sociais levam em consideração se a criança vive em situação de risco. Andreia Rodrigues, estudante do último ano da licenciatura de Matemática no Instituto de Matemática e Estatística (IME), convivia com uma vizinha com doenças psiquiátricas no Crusp e, enquanto ainda estava grávida, chegou a ser fisicamente ameaçada pela mulher, fato que foi relevante para ser escolhida para ocupar um dos quartos reservados no térreo do Bloco A. “Eu não tenho o que reclamar das assistentes sociais. Elas fazem tudo o que está no alcance delas. Se pudessem fazer mais, acho que fariam”, afirma Andreia, que também recebeu apoio das assistentes para conseguir uma vaga na creche da Uni-

versidade para seu filho. “A creche me ajuda em tudo e é uma referência nacional. É uma pena o que está acontecendo com ela. Lá, você pode deixar seu filho e saber que ele está seguro, você pode trabalhar e estudar sossegada”, relata a aluna, que estuda no período matutino, deixa o filho na creche pela manhã e só o busca no final da tarde. “Se não fosse a creche provavelmente eu teria abandonado o curso”, confessa. Em contrapartida, Celma Reis, estudante do quinto ano da licenciatura em Geociências e Educação Ambiental do Instituto de Geociências (IGc), não conseguiu a vaga na creche e luta contra o prazo do término do curso. “A dificuldade agora é estar sem creche e com criança, além de toda a pressão para terminar o curso”, diz Celma, que tenta cumprir com o plano de estudos definido no início da sua graduação para assegurar sua vaga no Conjunto Residencial. Mesmo se conseguisse a vaga na creche, Celma ainda passaria dificuldade para conciliar a criação de Caio com suas atividades na faculdade, pois a creche funciona em período diurno e a mãe estuda no período noturno. “Não tenho opção, sempre tenho que arrumar alguém para cuidar do meu filho”. Roseleine Bonini, mestranda de estudos comparados e literatura moçambicana na FFLCH é uma das mães que moram nos apartamentos do andar térreo e ajuda as colegas. “O mais interessante daqui é que as mães acabam formando uma rede de apoio, uma ajuda a outra na medida do possível. Isso é uma interação que não existe muito no

MAJO CAMPO

MAJO CAM´PO

Falta de farmárcia, de atendimento médico 24h, de atividades culturais e de vagas na creche e no Crusp são algumas reivindicações das mães, que improvisaram uma creche para continuar os estudos

Anfiteatro faz parte de projetos arquitetônicos destinados a realização de eventos e promoção das artes


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CIÊNCIA

PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 JORNAL DO CAMPUS

ICMC cria armadilha contra Aedes aegypti O projeto pode ser uma alternativa para o combate do zika vírus e de outras doenças e pragas ETHEL RUDNITZKI

Sabe aquele zumbido irritante de mosquito que perturba o sono nas noites de verão? Ele pode ser a solução para o combate ao zika vírus. Uma armadilha para mosquitos, em especial o Aedes aegypti, baseada na identificação de batidas de asas por frequência sonora foi idealizada no Instituto de Ciências Matemáticas e Computação, (ICMC) na USP São Carlos. O projeto recebeu US$ 500.000 (quinhentos mil dólares) da Usaid (agência de desenvolvimento internacional do governo dos Estados Unidos) para combate à epidemia de zika. Cada espécie e tipo de mosquito tem um batimento de asas específico e é com base nisso que a armadilha do ICMC identifica os insetos que estão por perto. A invenção funciona a partir de um sensor, constituído por uma fonte de luz, um conjunto de fototransistores e um circuito projetado para filtrar, amplificar, armazenar e classificar os sinais capturados. “Quando um inseto cruza o feixe de luz, a sombra do inseto causa variações que são capturadas pelos fototransistores, gerando um sinal. Esse sinal contém informações que permitem reconhecer as espécies, como a frequência de batida de asas.” explica o professor Gustavo Enrique Batista, coordenador do projeto. “O sinal é enviado para a placa de circuito e, por meio de técnicas de aprendizado de máquina, ele é classificado e a espécie do inseto é identificada.” O sensor ainda é acoplado a um mecanismo de captura de insetos. O sistema completo funciona atraindo o mosquito, identificando-o pelo sensor e capturando apenas as espécies

“Existe risco de haver epidemia de zika em escala mundial, e diversos países do mundo estão procurando por tecnologias inovadoras que possam ajudar a evitar esta epidemia.”

— Gustavo Batista,

coordenador da pesquisda do ICMC

desejadas. A atração do inseto é feita a partir de substâncias chamativas, como o dióxido de carbono. Em seguida, o mosquito passa pelo sensor e, se for Aedes ou outro mosquito para ser combatido, ele será “sugado” por um ventilador até um adesivo que o imobiliza. A armadilha tem o tamanho de uma pessoa em pé, podendo capturar milhares de insetos. O objetivo do sistema é reconhecer áreas com mais ou menos presença de certas espécies de insetos. “A armadilha é uma ferramenta que permite o monitoramento de espécies em tempo-real. Esse tipo de informação é a chave para um controle local, racional e efetivo de insetos”, explica Batista. Assim, programado para identificar o Aedes aegypti, o sistema deve informar as áreas de maior proliferação do vetor, de forma que o combate a ele e a prevenção das doenças que transmite sejam mais eficiente. Por exemplo, sabendo as áreas com maior população do mosquito, inseticidas serão usados apenas onde necessário, evitando o uso em larga escala que pode gerar população de insetos mais resistentes, além de eliminar espécies benéficas e poluir o meio ambiente. Além disso, a equipe de pesquisadores responsáveis pelo projeto garante que, apesar de a armadilha ter como fim a captura e combate dos mosquitos, isso não causará dano ao meio ambiente. “Nossa pesquisa visa controlar espécies que são invasivas. Portanto, erradicá-las tem provavelmente impacto ambiental zero, pois elas não fazem parte do nosso ecossistema.” Para tornar o monitoramento do mosquito ainda mais

abrangente, os pesquisadores envolvidos pretendem criar um aplicativo. O objetivo é que o recurso receba, via bluetooth, as informações dos sensores e as disponibilize para que as pessoas possam ficar atentas aos locais com maior população do vetor e contribuir para o combate e prevenção. “A ideia do aplicativo é promover uma interação entre o usuário e a armadilha, mas o papel do aplicativo vai além. Ele também irá reunir informações climáticas e assim poderá alertar os usuários da necessidade de um controle redobrado após períodos chuvosos, evitando que a população de mosquitos aumente.” O projeto como um todo ainda deve levar mais alguns anos, pois, como explica o coordenador, “existem diversas espécies de insetos de interesse em saúde pública, agricultura e pecuária que ainda não foram estudadas”. Porém, algumas aplicações comerciais podem ser aplicadas antes do projeto chegar a seu fim, especialmente para o combate do Aedes aegypti como por exemplo, o pesquisador Vinícius Souza, também do ICMC, que tem um projeto de comercialização da armadilha para esse fim dentro dos próximos anos. Combate ao zika A epidemia de zika está se alastrando rapidamente, assustando com a possibilidade de causar microcefalia e outros problemas de desenvolvimento fetal. Em fevereiro deste ano, a Organização Mundial da Saúde decretou estado de emergência internacional relacionado à expansão dos casos de zika. Já foram registrados casos por toda a América Latina e o vírus já chegou nos Estados Unidos, daí

o interesse da Usaid no projeto do ICMC. “Existe um risco de haver uma epidemia de zika em escala mundial, e diversos países do mundo estão procurando por tecnologias inovadoras que possam ajudar a evitar esta epidemia”, alerta o professor Batista. Mesmo dentro da USP, outros projetos buscam a erradicação do vírus da zika. Uma vacina foi desenvolvida pelo Instituto Butantã, pelo Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, em parceria com um grupo de Harvard, e está em fase de testes. A Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz (Esalq) também se envolveu, lançando um concurso de combate ao Aedes aegypti. Outros 40 grupos de pesquisa no estado de São Paulo, envolvendo o ICB, e as faculdades de Medicina, de Ciências Farmacêuticas, e de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP se dedicam a erradicar a epidemia, com financiamento da FAPESP. Além do zika, da dengue e da febre amarela, doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, o sensor desenvolvido pelo ICMC pode contribuir no controle de vetores de outras doenças, como a malária, e de pragas agrícolas. Ademais, o projeto contempla diversas áreas de estudo, apesar de se concentrar na matemática e computação, incluindo pesquisadores das áreas de entomologia (área da biologia especializada em insetos), agronomia e ecologia. Por isso, antes mesmo do incentivo da Usaid, o projeto já havia recebido financiamento da FAPESP e do Google. Parece que o zumbido irritante dos insetos não serve apenas para nos acordar à noite, não é mesmo?

No Brasil, já foram

170 mil casos registrados

Outros países que registraram transmissão de zika:

FONTE: CENTRO DE CONTROLE DE DOENÇAS E PREVENÇÃO

Oceania

Papua Nova Guiné, Samoa, Tonga, Nova Caledônia, Fiji, Ilhas Marshal, Micronésia

África

Cabo Verde

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O inseto é atraído para a armadilha por substâncias com odor atrativo. Como é o caso do CO2 para fêmeas de mosquito.

O mosquito já transmitiu o vírus zika por quase todas as

Américas

2

O mosquito é puxado para dentro da armadilha por um fluxo de ar gerado por um mini ventilador.

4

O sinal emitido pelo mosquito vai para um circuito que identifica a espécie do inseto.

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Dentro da armadilha, o inseto atravessa o sensor de luz, emitindo variação de sinal de suas batidas de asas.

Caso seja da espécie desejada, o mosquito é levado pelo fluxo de ar até uma parede adesiva, que o captura.

NATALIE MAJOLO

Como a armadilha pode combater a epidemia de zika


CIÊNCIA

JORNAL DO CAMPUS PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016

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FFLCH disponibiliza Guia Bibliográfico Lista de leituras ideais para várias áreas das humanidades é feita por professores da unidade CAROLINA INGIZZA

Foi pensando em criar uma lista de livros ideais para a biblioteca de seus alunos que os professores Sérgio Adorno e João Roberto Gomes de Faria tiveram a ideia para a criação do Guia Bibliográfico da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH). Disponibilizada em setembro no site da unidade, a compilação tem como objetivo oferecer orientação para quem deseja se iniciar nos estudos sobre autores e temas pesquisados pelos docentes da faculdade. O Guia conta hoje com 48 temas disponíveis e abrange os mais diversos assuntos dentro das humanidades, tais como “holocausto”, “Goethe”, “contracultura” e “filosofia da física quântica”. A perspectiva é a de que a lista continue a crescer conforme os mais de 400 professores da faculdade forem enviando suas contribuições. “Logo serão incluídos alguns textos já prometidos por colegas que não puderam entregá-los quando o Guia foi lançado”, comenta o professor João Roberto de Faria, organizador do projeto. Ele conta que a inspiração para o Guia surgiu numa conver-

sa com o professor Sérgio Adorno, quando eram vice-diretor e diretor da FFLCH, respectivamente. Pensando sobre o livro “Biblioteca Ideal”, de Bernard Pivot, em que o leitor é orientado a ler algumas obras para a sua formação humanística, os professores questionaram a possibilidade de organizarem algo semelhante para os estudantes da faculdade. Como modelo, também decidiram usar um texto de Antonio Candido, intitulado “Dez livros para conhecer o Brasil”, em que o autor comenta e indica uma bibliografia de história, sociologia e antropologia. Público alvo Cada professor foi convidado a escrever sobre sua especialidade e teve total liberdade para selecionar textos. A professora Maria Sílvia Betti, que indicou conteúdos sobre “teatro norte-americano no Brasil”, diz que a proposta de construção do Guia foi feita e amplamente divulgada pelo professor Faria no segundo semestre de 2015. Na visão dela, a compilação não é algo dirigido a pessoas que se encontram em processo de formação universitária, mas àqueles que “não necessariamente têm liga-

ções institucionais com as diferentes áreas e que desejam ter referências úteis e significativas para iniciar-se.” Já para Faria, o público alvo original do Guia eram os alunos da faculdade, tanto os da graduação quanto os da pós-graduação. “É claro que o Guia poderá ter outros leitores, pois a página da Faculdade pode ser acessada livremente, o que o torna ainda mais importante”, afirma o docente. No entanto, o objetivo do projeto foi buscar maneiras de ajudar na formação interdisciplinar de um estudante da FFLCH que, por exemplo, não consegue cursar determinada disciplina de outro curso, mas que ainda assim quer se iniciar no assunto. Os alunos da faculdade ouvidos pelo JC, por sua vez, gostaram da iniciativa, apesar de acharem que ela poderia ser ampliada e acrescentar mais conteúdos. Thales Carpi, estudante do quarto semestre de história, por exemplo, diz que teve uma boa impressão do projeto ao descobri-lo pelo e-mail institucional do departamento e espera que o Guia ajude com o diálogo com os docentes. “O estudante

que deseja fazer pesquisa pode recorrer ao Guia antes de ir ao professor. Depois de ler os livros indicados, é possível ver se deseja estudar aquele determinado assunto, se suas hipóteses e objetivos possuem relevância e, o mais importante, adquire-se um referencial teórico para poder dialogar com um docente sobre uma possível pesquisa”. Já para Adriana Matos, estudante do quarto ano de Ciências Sociais, o Guia pode ajudar a minimizar algumas de suas frustrações com o curso. Ela sente falta de mais disciplinas sobre pensamento político e social brasileiro e também de outras com um viés mais filosófico. “Na primeira frustração, o guia deu uma ajuda, me dando algumas indicações sobre esses assuntos para que eu possa buscar por mim mesma esse complemento para a formação. Já para a segunda, não deu nenhuma ajuda ainda, mas espero que com as próximas colaborações venha algo sobre isso”. O Guia Bibliográfico já está disponível online no site da FFLCH e pode ser acessado através do link http://fflch.usp.br/ guiabibliografico.

Startup de ex-alunos da USP vence competição Projeto de retinógrafo portátil acoplado a um smartphone conquista júri do IF no Falling Walls Lab

Modelo de retinógrafo portátil – equipamento médico utilizado para capturar imagens do fundo do olho - vence a competição Falling Walls Lab, realizada no Instituto de Física (IF) da USP no dia 19 de setembro. Dentre os 94 inscritos e 14 finalistas, se destacou o projeto de José Augusto Stuchi, que apresentava propostas inovadoras nos aspectos ópticos e tecnológicos do equipamento oftalmológico mostrado, em consonância com o que pedia o evento. Com apenas três minutos para apresentar o projeto em inglês, os competidores tiveram que buscar maneiras de atrair o júri. A apresentação de Stuchi, que representava a startup Phelcom Technologies (criada por ele, Flavio Pascoal Vieira e Diego Lencione, todos ex-alunos da USP), procurou mostrar tanto as características acadêmicas e quanto as de negócio, bem como destacar o impacto social do equipamento desenvolvido. “Como a gente montou a apresentação sem saber o viés da banca, tentamos

englobar os dois aspectos”, conta o engenheiro de computação. O aparelho Um retinógrafo padrão é um equipamento médico de mesa e é de alto custo, na faixa de 70 a 80 mil dólares, com manutenção feita somente por países como a Alemanha e o Japão. Segundo relata Stuchi, por do preço, o aparelho falta em muitos lugares do país, e por isso a Phelcom decidiu pensar em maneiras de baratear o custo e facilitar o acesso da população a esse tipo de exame. “A nossa ideia é propor um novo modelo de negócio, queremos alugar o equipamento ou então que o médico pague por uso, num modelo de hardware/softaware as a service, em que você disponibiliza o aparelho como um serviço”, explica Stuchi. Com o desenvolvimento do retinógrafo portátil acoplado ao smartphone, o custo do equipamento ficaria muito abaixo do preço atual de mercado. Além disso, por conta de uma física óptica reduzida, que cabe na palma da mão, e de novos softwares, o aparelho pode ser móvel

e operado por técnicos, o que o permite atingir áreas em que não há a presença de médicos especialistas. O celular acoplado possibilita que as imagens em alta resolução sejam colocadas na nuvem e analisadas a distância. Isso pode ser muito útil para o país, já que o Censo Oftalmológico de 2014 mostrou que no Brasil 85% das cidades não possuem um oftalmologista. Marcelo Munhoz, presidente da Comissão de Cultura e Extensão, conta que apesar da grande diversidade de projetos apresentados, durante o intervalo de apuração era comentado entre a platéia o quão expressiva tinha sido a apresentação do retinógrafo. O evento O Falling Walls Lab é um fórum internacional no qual estudantes, pesquisadores e profissionais de mercado expõem ideias e projetos que podem impactar positivamente a sociedade. Realizado pela entidade sem fins lucrativos The Falling Walls Foundation, o evento teve sua 4ª edição brasileira realizada pela primeira vez na USP. Os dois primeiros colocados nessa etapa

MARIANE ROCCELO

CAROLINA INGIZZA

Os primeiros colocados da etapa brasileira do Falling Walls Lab nacional, o projeto do retinógrafo e a pesquisa de Diogo Biagi sobre utilização de células-tronco em testes de medicamento, ganharam uma viagem para Berlim para participar da etapa internacional da competição. Neste ano, a etapa brasileira foi organizada em conjunto pela A.T Kearney, pelo Centro Alemão de Ciência e Inovação – São Paulo (DWIH-SP) e pelo IF. A parceria com o instituto ocorreu por iniciativa deste, que entendeu a competição como uma boa oportunidade de

incentivar os alunos e as pesquisas. Para Marcos Martins, diretor da Física, o evento é importante por levar o conhecimento acadêmico para fora da universidade, mas também por aumentar a interlocução com a sociedade. “Por ser uma oportunidade de expor nossos alunos a projetos inovadores e à convivência com pesquisadores atuantes e inspiradores, que procuram dar visibilidade a seus projetos, esse tipo de contato é benéfico aos estudantes”, afirma.


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ESPORTES

PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 JORNAL DO CAMPUS

Reforma do ensino afeta Educação Física Tanto a carreira quanto a prática da atividade na escola são desvalorizadas na MP 746/2016

Michel Temer, recém saído do cargo de vice, mal sentava na cadeira da presidência quando anunciou, com força de lei, a Medida Provisória 746/2016 de reforma do Ensino Médio. Era 22 de setembro. Para além de alterar a composição do currículo obrigatório da educação básica, flexibilizar a exigência de graduação para os professores, o texto ainda retira a obrigatoriedade das disciplinas de Educação Física, Filosofia, Sociologia e Artes. Estudioso das ações pedagógicas na área, o professor doutor em Educação, Marcos Neira, explica a importância dessa disciplina na trajetória escolar. “A Educação Física é uma matéria cuja função principal é tematizar as práticas corporais na escola”, afirma. “Ao longo da sua história, a humanidade vem produzindo brincadeiras, danças, lutas, esportes e ginásticas. Os diferentes grupos têm, nessas experiências, um registro de identidade cultural. É uma dos meios pelos quais os

grupos humanos expressam seus valores e seus modos de entender o mundo. É por isso que a disciplina existe na escola.” Não à toa, Henrique Franco, estudante de licenciatura em Educação Física na USP, afirma carregar uma identidade fortemente amparada pelo esporte, cujas linguagens impulsionaram seu interesse por coisas que se conectam com a saúde e a felicidade. Para ele, a possível aprovação da MP pode ser interpretada como uma ameaça ao futuro dos professores de sua carreira, além daqueles que lecionam Filosofia, Sociologia e Artes. O fim da institucionalidade dessas matérias, sugere, deve favorecer o fortalecimento da lógica tecnicista do ensino médio. “A situação dessas disciplinas, que já sofriam preconceito na sociedade, vai se agravar ainda mais”, defende. “Estudantes no ensino médio já trabalham ou estão com a cabeça nas matérias prioritárias para o vestibular. Sem obrigatoriedade, poucas escolas vão contratar um professor

LIZ DÓREA

LIZ DÓREA

de Educação Física. A baixa procura e o grande números de profissionais ociosos vai gerar disputas pelas poucas vagas.” Fernanda Carvalho, formada em 2010 pela EEFE/USP, atua na rede pública desde 2011 e também se opõe à medida. Em sua perspectiva, uma mudança tão profunda deveria ser amplamente debatida antes de galgar a realidade. Sobretudo, quando uma dos artigos da reforma relativiza a relevância pedagógica do professor. “Excluir disciplinas importantes

para a formação do cidadão é um absurdo”, exclama ela. Não bastasse isso, Fernanda ainda denuncia o artigo que legitima a prática da docência apenas por notório saber. “Um professor graduado estudou didática, psicologia e, com grande frequência, tem dificuldades na sala de aula. Fico imaginando a relação entre uma pessoa sem essa bagagem teórica e os alunos. Acredito que não será das melhores”, reflete. A ausência Fernanda ainda argumenta que o fim da obriga-

toriedade da Educação Física nas escolas deve gerar uma incompletude na formação social da juventude. “Existem questões trabalhadas pelas modalidades esportivas, como padrões de beleza, saúde e alimentação saudável, que não serão incorporadas ao conteúdo de outras disciplinas. Para ela, esse rombo se preenchia de valores transmitidos pelo esporte. “As práticas corporais que a educação física proporciona são importantes para o adolescente conhecer a si mesmo, seus limites, se relacionar bem com os outros, respeitar o adversário, saber ganhar e perder, cooperar, competir.” Sobre o fim da institucionalidade das disciplinas citadas, Neira é categórico. “Se o EM já começa amputando as oportunidades de alguns, o efeito vai ser muito nocivo, e a educação pública vai se afastar ainda mais da privada”, analisa. “É óbvio que a medida quer antecipar a profissionalização e transformar o ensino médio numa etapa instrumental. Assim, esses jovens se incorporarão mais rápido ao mercado de trabalho.”

Clínicas são aposta para incentivar o esporte Esgrima olímpica e paralímpica são inclusas na agenda de modalidades oferecidas pelo Prodhe VICTOR MATIOLI

No dia 10 de outubro, o Prodhe (Programa de Desenvolvimento Humano pelo esporte) realizará mais uma edição das oficinas Clínicas de Esporte: Pedagogia das modalidades esportivas. Desta vez, a modalidade escolhida foi a Esgrima Olímpica e Paralímpica. As inscrições para a Clínica podem ser realizadas pelo site www. cepe.usp.br e custam R$30,00. Desde 2015, o Prodhe realiza sistematicamente estas atividades no Centro de Práticas Esportivas da USP (Cepeusp). As clínicas são uma ação direta do programa que visa complementar a formação de educadores com enfoque no esporte. O Prodhe tem promovido, em seus 21 anos de existência, projetos que contemplam crianças e adolescentes diretamente, mas também ações de cunho pedagógico para profissionais da área da educação, como é o caso das clínicas. Estas atividades, que são realizadas mensalmente, trazem abordagens heterodoxas das modalidades esportivas mais conhecidas, mas também cedem espaço para esportes geralmente menos difundidos. Para tanto, o Prodhe articula parcerias com instituições representativas destas modalidades ou entidades de apoio

ao esporte. A próxima Clínica de Esporte, por exemplo, foi elaborada em conjunto com a Associação Brasileira de Esgrimistas (ABE), e apresentará oficinas de Esgrima Olímpica e Paralímpica. Marcos Vinicius, educador do Cepeusp e organizador das clínicas, explica que a relação com a ABE começou em 2015, quando alguns membros da Associação participaram de uma feira esportiva no Campus da Capital. “Tivemos uma resposta muito positiva da ABE, que se ofereceu para ministrar algumas oficinas. Articulamos, então, uma clínica focada na esgrima para o mês de outubro”, aponta o educador. Dois ex-atletas e professores da modalidade representarão a Associação na atividade: Régis Trois e Marcos de Faria. Maria Júlia Herklotz, representante da ABE que viabilizou a realização das oficinas, ressalta que a finalidade deste tipo de colaboração em eventos é “divulgar um pouco da teoria, história e regulamento da esgrima Olímpica e Paralímpica para professores e alunos de Educação física”. Ela afirma que a modalidade é carente de professores e monitores, e os poucos que existem geralmente se dedicam ao esporte de alto desempenho. “Acreditamos que um dos cami-

nhos para difundir o esporte é aumentar a mão de obra apta a trabalhar com ele, principalmente na iniciação e trabalho de base”, comenta. “O objetivo, até pela pequena carga horária, é fornecer um primeiro estímulo aos educadores. É ampliar a cultura esportiva destes professores e mostrar que é possível desenvolver a modalidade com os mais diversos públicos”, afirma Marcos Vinicius sobre a Clínica deste mês. Ele explica que as atividades serão divididas em uma parte teórica, mais curta, e uma parte prática mais elaborada, que tratará dos principais movimentos de ataque e defesa. Vinicius aponta também que serão realizadas duas clínicas separadas para as categorias Olímpica e Paralímpica, de manhã e à tarde respectivamente. A Esgrima em cadeira de rodas brasileira conquistou a medalha de ouro nos Jogos Paralímpicos de 2012 com o paratleta Jovane Guissone. Vinicius reitera a importância de incluir o paradesporto nas discussões sobre educação. Sobre a conquista nas Paralimpíadas de Londres, Maria Júlia Herklotz aponta que foi “algo conquistado com um trabalho sério. Temos muito a aprender com o Comitê Para-

“Acreditamos que um dos caminhos para difundir o esporte é aumentar a mão de obra apta a trabalhar com ele, principalmente na iniciação e trabalho de base” - Maria Júlia Herklotz, representante da ABE

límpico e todos crescem com esta parceria”. Esta será a primeira Clínica oferecida com a participação de uma modalidade paralímpica, mas o Prodhe deve organizar um seminário em novembro para discutir tanto os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016. Apesar de já ter realizado clínicas sobre esportes bastante conhecidos, como o atletismo, o Prodhe não esconde sua preferência pelas modalidades menos difundidas. Neste ano, já foram realizadas atividades sobre Golfe, Kin-Ball, Rugby, Hóquei de piso e Hóquei sobre grama, Rollerski e Slackline. Em novembro, após a Clínica de Esgrima, será realizada uma edição dedicada ao Mini Basquete. Segundo Vinicius, a finalidade destas escolhas é possibilitar que outras entidades possam ser divulgadas durante os eventos. As Clínicas de Esporte sobre Esgrima Olímpica e Paralímpica acontecerão dia 10 de outubro, no Centro de Práticas Esportivas, com taxa de investimento de R$30,00. As inscrições devem ser feitas separadamente para cada uma das duas atividades através do site do Cepeusp (www.cepe. usp.br) e têm prazo indefinido para encerramento. Mais informações sobre os eventos podem ser obtidas no próprio site ou pelo telefone (11) 3091-3361.


ENTREVISTA

JORNAL DO CAMPUS PRIMEIRA QUIZENA | OUTUBRO 2016

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Eleições municipais: os efeitos nos campi Professor da FFLCH comenta resultado das urnas e o futuro impacto na comunidade uspiana ALINE NAOMI

No último domingo, cerca de 144 milhões de eleitores em 5.568 cidades foram às urnas para votar nos candidatos a prefeito e a vereador. Em alguns municípios, como São Paulo, a decisão foi tomada logo no primeiro turno. Já em outras localidades, como Ribeirão Preto, a disputa avançou para o segundo turno, a ser realizado dia 30 de outubro. Para debater os impactos das eleições municipais na Universidade e analisar a situação da capital paulista, onde fica o maior colégio eleitoral do país, com 8,8 milhões de eleitores, e o maior dos campi da USP, o Jornal do Campus conversou com Eduardo Leão Marques, professor livre-docente do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e vice-diretor e coordenador do Centro de Estudos da Metrópole (CEM). JC: Como as eleições municipais afetam a Universidade? O resultado das eleições altera o funcionamento da cidade inteira, inclusive das pessoas que estudam e trabalham na Universidade, portanto tem impacto direto nela. As questões da acessibilidade, da qualidade de vida, da quantidade de tempo livre das pessoas e também das condições de trabalho e de estudo sofrem impactos diretos. Então há uma relação forte, mas de forma indireta com a Prefeitura. Já a Câmara Municipal produz as leis relativas ao funcionamento da cidade, então também tem efeito nela como um todo e, portanto, na Universidade. Ao influenciar a cidade inteira, a eleição do prefeito e dos vereadores influencia toda a cidade e sua organização.

A gestão de Fernando Haddad focou a questão da mobilidade urbana. Como foi o impacto de sua gestão em São Paulo? A gestão de Haddad teve uma importância estruturante para a cidade de São Paulo por três prioridades feitas ao longo da gestão. Primeiro, a questão da mobilidade urbana e dos transportes públicos, um tema que há muito tempo era citado genericamente e, pela primeira vez, houve uma introdução na agenda pública de uma série de iniciativas para transformar a maneira como o transporte público acontece na cidade. Foi o principal legado dessa gestão. Um segundo elemento importante, que tem efeito a longo prazo, é o planejamento. A cidade sofreu uma revisão geral de seus instrumentos de planejamento. Evidentemente, cada coisa depende de como a nova gestão vai tratá-las, se vai dar

continuidade a elas ou não. Já houve o caso do Plano Diretor de 2003, que não foi implementado pela gestão que sucedeu a gestão que o tinha feito e, portanto, ele virou uma letra morta. O plano atual foi aprovado e há a Lei de Zoneamento. Então existe uma nova regulamentação sobre o usos da cidade e a estrutura dela, que deve ser organizada em torno do transporte público e da mudança das densidades relativas de parte da cidade para torná-la mais compacta, na linha do que as discussões urbanísticas mais avançadas sugerem. O terceiro elemento foi trazer para o debate, com certa centralidade, a questão do espaço público, de ganhar de volta o espaço da cidade. São três legados importantes, mas que dependem do que o novo prefeito irá fazer. Como fica essa questão do espaço público dentro da Universidade? Essa é uma questão muito importante. É uma resposta dúbia, porque ao mesmo tempo que o espaço da Universidade é público, já que ela é pública, o espaço é prioritariamente da própria instituição, envolvendo sua própria comunidade, ou seja, estudantes, funcionários e professores. Esses dois usos têm que ser mediados. Já existe uma série de usos tradicionais, como o uso da estrutura da Universi-

dade para andar de bicicleta ou treinar e também para passear. Qual é o efeito destas eleições para o futuro de São Paulo? Os eleitores paulistanos fizeram uma escolha clara, tanto que houve uma vitória de primeiro turno, mas é difícil entender qual é o conteúdo dessa escolha. Não se sabe direito as propostas do candidato vencedor, que são muito genéricas, como priorizar a educação e a saúde, mas não está claro como isso será feito. O candidato vencedor não tem atuações prévias no Executivo que nos permitam imaginar qual é o conhecimento dele sobre a máquina pública e a produção de políticas públicas. A candidatura se apresentou como uma apolítica, que atende a uma utopia contemporânea da despolitização da política, que é totalmente impossível, mas que é produto de um desencanto das pessoas em geral. Essa utopia está associada a um certo elogio ao gerencialismo, como se gerenciar a política de uma cidade pudesse prescindir da negociação e discussão com grupos e fosse uma atividade empresarial de alocação de recursos de forma eficiente. O efeito disso para a cidade de São Paulo pode ser muito danoso, porque o gerencialismo não existe como uma forma melhor ou pior de gerenciar as coisas, e nem como algo apolítico e neutro.

ALINE NAOMI

O que cabe à Prefeitura da cidade e à Prefeitura do Campus? Em um campus universitário, todos os serviços urbanos são providos pela universidade e não pela cidade. Nesse sentido, a Prefeitura do Campus toma conta e provê os serviços urbanos dentro do campus, o que inclui a iluminação pú-

blica e os ônibus, e várias dessas coisas são feitas em interface com os sistemas municipais. Por exemplo, os ônibus são os mesmos do restante da cidade e eles entram aqui, mas há um acordo que regula o tipo de transporte que acontece dentro da Universidade. A mesma coisa acontece com o policiamento: há um acordo, no caso com o governo do estado, para especificar o tipo de policiamento a ser feito dentro do campus.


14 CULTURA

PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 JORNAL DO CAMPUS

Um século do legado de Paulo Emílio De grande importância para cinema nacional, ex-professor da ECA completa centenário em 2016 ACERVO DA CINEMATECA BRASILEIRA

LIDIA CAPITANI

Crítico de cinema. Historiador. Militante. Escritor. Professor. 100 anos de legado incomparável para o cinema, para a cultura, para o Brasil. Paulo Emílio Sales Gomes foi todas essas coisas e mais um pouco. Engajado nas causas políticas, amante da sétima arte, professor universitário e escritor compulsivo, Paulo Emílio é lembrado por muitas de suas ideias e projetos, tais que não caberiam num simples artigo de meia folha. De início, pode-se ressaltar seu lado militante político que começou muito cedo. Participou da Juventude Comunista e foi preso em 1935 por Getúlio Vargas, após a Intentona Comunista. Conseguiu fugir e se exilou na França por um período. Quando voltou para o Brasil, ingressou na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Em 1941, com colegas da faculdade, fundou a revista “Clima”, que abordava assuntos como teatro, literatura, artes plásticas e cinema, na qual começou a escrever suas primeiras críticas cinematográficas. Paulo Emílio foi fundador da Cinemateca Brasileira, uma dura batalha de dez anos à qual o crítico se dedicou com afinco. Tal empreendimento originou o ensaio “Cinema: trajetória no subdesen-

volvimento”, que influenciou muitos jovens cineastas do “Cinema Novo”, como Glauber Rocha, David Neves, Paulo César Saraceni e Cacá Diegues, a pensar e produzir cinema no país de forma diferente. Nos anos 70, Paulo Emílio entrou numa fase “jacobina”, como costumava dizer, em que defendia o cinema brasileiro por vezes com atitudes e frases polêmicas, como “assistir ao pior filme brasileiro vale mais do que ver o melhor filme estrangeiro”. Tanto que, quando professor, incentivava os alunos a apresentarem seminários sobre qualquer filme nacional em cartaz, inclusive os pornográficos como os famosos pornochanchadas. Por tais polêmicas, em 1974 a

reitoria da USP se recusava a renovar seu contrato, claramente por pressão política. Além de crítico, Paulo Emílio era escritor de ficção. Escreveu duas obras em vida e publicou uma póstuma. A primeira foi lançada em Paris, em 1957: uma biografia do cineasta Jean Vigo (1905-34), recebida com bastante sucesso. A segunda foi “Humberto Mauro, Cataguases, Cinearte” (Perspectiva, 1972), resultado da sua tese de doutorado na FFLCH. E, por fim, a obra de publicação póstuma e única de ficção “Três Mulheres de Três PPPs”, de 1977, composta por três novelas, “Duas vezes com Helena”, “Ermengarda com H” e “Duas vezes Ela”.

“Assistir ao pior filme brasileiro vale mais do que ver o melhor filme estrangeiro.” — Paulo Emílio, crítico de cinema brasileiro

Paulo Emílio morreu aos 60 anos de um ataque cardíaco fulminante, em 9 de setembro de 1977. Porém, seu legado continua vivo e pulsante no meio acadêmico, nas livrarias e nas salas de cinema. A academia nunca irá esquecer de sua importância, principalmente a Universidade de Brasília, na qual fundou o curso de Cinema, em 1965, e a Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, na qual foi um professor renomado e querido por muitos. Nas livrarias, é possível encontrar novas edições de seus livros: a editora Companhia das Letras relançou em 2015 seu clássico de ficção e outra obra que reúne diversos ensaios críticos chamada “O Cinema no Séculos”, ambos sob a curadoria de Carlos Augusto Calil, professor da ECA e ex-aluno do consagrado crítico. Sua memória permanece viva também nas salas de cinema, como patrono da Cinemateca Brasileira e homenageado na sala de cinema da USP, o CINUSP Paulo Emílio. Como forma de celebrar o centenário desta grande figura, a Cinemateca em parceria com o CINUSP e o CINESESC, organizou uma mostra no mês de setembro, formada de obras nacionais analisadas pelo crítico, além de seminários e cursos sobre cinema brasileiro.

Ex-uspiano expõe na 32ª Bienal de SP Formado pela FAU, Antonio Malta comenta sobre sua carreira e participação no evento deste ano LIDIA CAPITANI

LIDIA CAPITANI

A 32ª Bienal de Artes de São Paulo está aberta até 11 de dezembro no Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Parque Ibirapuera, sob o tema Incerteza Viva. O evento conta com 340 obras de 81 artistas, nacionais e internacionais, dentre eles, Antonio Malta Campos, formado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

(FAU). Em entrevista, Antonio conversou com o Jornal do Campus sobre sua carreira, arte contemporânea e sua participação na edição deste ano. Antonio Malta Campos tem diploma de arquiteto pela USP, chegou a atuar na área durante os anos 90, porém sua paixão pelas artes plásticas vem de muito antes e persistiu no decorrer de todos esses anos. “Eu tive uma fase im-

Antonio Malta, artista contemporâneo, em seu estúdio situado no Campos Elíseos, São Paulo.

portante que foi o Colégio Equipe, onde estudei e conheci a maioria dos meus amigos e colegas artistas da minha geração”. Sua formação artística foi então completada pela FAU: “Acho que a FAU me deu uma formação que não é só de arte, ela é mais ampla, inclui a história da arquitetura, da arte e da tecnologia, tudo isso de uma forma integrada”. Além disso, Antonio conviveu por um tempo com o artista Sérgio Fingermann, formado na mesma faculdade, e aprendeu a fazer gravura em metal. Porém, ele se considera um autodidata: “Eu compro livro, leio o tempo todo, estou sempre estudando”. Na Bienal, Antonio está com uma série de obras expostas, algumas da série intitulada “Misturinhas” e outras quatro obras grandes. A série começou a ser feita em 2000 e é um trabalho experimental, segundo o artista. “Começou como um trabalho bem despretensioso e continua sendo. Eu paro de pensar e faço o que vier, e o que acontecer, aconteceu. Então tem colagem, tem pintura, tem coisa escrita, é um trabalho total-

mente experimental” explica. As misturinhas são uma série com mais de 500 obras, porém apenas 249 estão expostas na Bienal, e de forma cronológica. “É um trabalho que percorre 15 anos, com experiências e fases variadas. Se você pegar um pequeno grupo, vai ver que naquela época eu fazia pinturas coloridinhas, depois colagens, depois voltei a fazer pinturas, depois desenhos e assim por diante”. As obras grandes não fazem parte das Misturinhas, mas a experiência com a série proporcionou uma maior liberdade para experimentar nas telas maiores. “As pinturas grandes demandam muito tempo e planejamento, então é um trabalho que às vezes tende a te restringir e ficar só numa fórmula, e a experiência das misturinhas me permitiu ver que nas pinturas eu poderia experimentar bastante”. A Bienal reúne artistas de arte contemporânea, movimento que propõe o questionamento sobre o próprio conceito e as definições de arte, tanto que o tema desta edição busca elucidar a incerteza que ronda o movimento artístico.


CULTURA

JORNAL DO CAMPUS PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016

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OSUSP celebra independência mexicana Orquestra apresenta repertório que busca colaborar com integração cultural latino-americana LUIZA QUEIROZ

A Orquestra Sinfônica da USP (OSUSP) contou com dois convidados mexicanos para as apresentações de outubro de 2016: Jesus Medina foi o regente da temporada e Miguel Ángel Villanueva realizou os solos de flauta. As apresentações, patrocinadas pela Embaixada Mexicana do Brasil, tiveram como objetivo celebrar a data de independência do México com as obras apresentadas pelos convidados – todas até então inéditas no Brasil, com exceção de Suíte Mexicana. A OSUSP apresentou-se gratuitamente no auditório do Centro de Difusão Internacional na USP, e também no último sábado, 1º de outubro, na Sala São Paulo. A data oficial de independência do México é 15 de setembro – porém, devido ao calendário da Orquestra, os convidados se apresentaram duas semanas depois, em outubro. Mas, mesmo com o adiamento, a independência do país ainda foi o tema central da temporada e, por isso, o repertório da orquestra buscou trazer elementos centrais da cultura e da música tradicional do México. As obras são de autoria de dois compositores, ambos ainda vivos: Eduardo Gamboa e Eduardo Angulo. As apresentações foram divididas em duas partes, com três músicas na primeira e duas músicas na última. A primeira música tocada nas apresentações foi Fanfarra

para Metais e Percussões, uma obra “espetacular, muito boa para abrir o programa”, segundo Medina. Em seguida, o concerto continuou com a obra Jarabe, que também é o nome de um gênero musical mexicano, tradicional do centro do país. “É um estilo muito divertido, muito alegre. O ritmo é um pouco difícil, mas a Orquestra está tocando muito bem”, afirma o regente. Ambas foram compostas por Gamboa, e integraram a primeira parte do concerto. Já a última música da primeira parte, Concerto Nº2 para Flauta e Orquestra, foi composta por Angulo para o flautista Miguel Ángel Villanueva. “Este é um concerto que tem elementos do folclore mexicano mas não com caráter folclorista, é um pouco mais refinado” explica o flautista. “É um concerto que tem como nome Vozes da Natureza e é uma das 8 obras que o compositor escreveu para mim, para flauta e orquestra. Nos últimos anos, tenho me encarregado de trabalhar com diferentes compositores com o objetivo de gerar repertório mexicano para a flauta como um instrumento solista”. A segunda parte iniciou-se com Pacífico, canção composta há 26 anos por Eduardo Angulo. O nome da obra tem dois significados: o primeiro refere-se ao nascimento de um sobrinho do compositor, e por isso a música contém passagens que remetem à calma e à tranquilidade de uma criança recém-nascida. O segundo, em contraste, é referência ao

Oceano Pacífico, e por isso a obra contém também passagens mais intensas, que representam a imponência do oceano. Em seguida, o programa encerrou-se com a canção Suíte Mexicana, que pode ser considerada uma síntese dos principais estilos musicais do México. É composta por 5 partes, e cada uma é um ritmo tradicional do México: estão presentes o jarabe colimenho, a serenata, o huapango (um ritmo mais típico da costa do país), o vals (duas músicas muito populares no México são do gênero Vals: Sandunga e Cielito Lindo; ambas estão presentes em Suite Mexicana) e a polca, ou polka (música da região norte do país). Para o flautista Villanueva, a execução das obras com a orquestra da USP não foi difícil, mesmo com as diferenças rítmicas entre as canções brasileiras e mexicanas. Enquanto a música do México tem origem espanhola, árabe e indígena, no Brasil a cultura negra tem uma influência muito forte nos estilos musicais. Villanueva afirma, entretanto, que a flauta é um instrumento muito presente nos dois países, por ser bastante versátil, e que a orquestra conseguiu incorporar o instrumento mesmo nunca tendo tocado essas canções: “O nível [da OSUSP] permitiu que trabalhássemos a música e a apresentássemos ao público da melhor maneira possível, porque todo o programa é feito de estreias, então essas músicas nunca haviam sido tocadas no Brasil”.

“É importante termos ações que nos aproximem dos outros países da América Latina.” — Eduardo Monteiro, diretor da OSUSP

Além dos convidados mexicanos, a temporada atual da orquestra sinfônica da USP conta também com dois pianistas russos e um violinista húngaro. “Convidar maestros e solistas estrangeiros é um hábito frequente e saudável em todas as orquestras. É sempre muito enriquecedor tocar com diferentes músicos, e esses convidados também são determinantes para estimular o interesse do público”, afirma Eduardo Monteiro, diretor da OSUSP. Além da diversidade, Monteiro explica que a presença de convidados estrangeiros na orquestra permite criar uma aproximação cultural maior com outros países, e em especial com os latino-americanos. “Procuramos montar uma temporada que seja variada tanto no que se refere ao repertório quanto aos solistas e maestros convidados. Além disso, julgamos importante termos ações que nos aproximem dos outros países da América Latina”. Para Medina, a própria música latino-americana representa essa integração entre os países, já que, apesar das particularidades e dos ritmos próprios de cada nação, existem traços culturais comuns a todos os povos latinos. “Há uma proximidade muito grande entre México e Brasil, o ritmo, as pessoas. Somos todos latinos, por isso há algo que sempre nos une”, afirma. “A rítmica, o sabor, as percussões, é algo muito próprio de todos os latinos, e eu acredito que o público desfruta muito de todos os concertos”. LUIZA QUEIROZ

Regente Jesus Medina e flautista Miguel Ángel Villanueva, junto com a Orquestra Sinfônica da USP, em ensaio no dia anterior à apresentação na Sala São Paulo.


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CRÔNICA

PRIMEIRA QUINZENA | OUTUBRO 2016 JORNAL DO CAMPUS

LUIZA MISSI

. Ela entrou no no escritório o h al ab tr u se isória nº 746 prepara para a Medida Prov al qu do Fernanda se anda ir rt a pa ucação. Fern em 2017, ano reforma da ed a a, oel sc “e m ensino médio o co – e, za. Dig r implantada cias da nature ên o ci nã de is ea começou a se pa ár guir a ceu: seus s 14 anos, se o que aconte va am re sc nh ti de escolheu, ao e ue o qu porq a de um term ou linguagens lheu” por falt umanidades h prego no futu as ra em pa m e bo ss fo um a a el ri e ui qu o conseg queriam profissiofizesse, ela nã ão técnica e o aç m se or e, “f qu da l iro certeza de as ia para a ta no médio inte de suas amig assem o ensi ss pa as el lo ro. Nenhuma e pe r m qu ar po is não queria iam a trabalh ores nal” – seus pa não começar as el o. Suas melh e çã qu ta já gi co o, ic de cn ra té fo o rs tava . Por num cu tão isso já es atéria favorita uns anos. En ria ser sua m tó is uma h u de ce menos mais ar re es rmou, pa de ciências, ap Quando se fo . za as. re at tu notas eram as ex na s da foi boa na ra as ciências l, ela sempre na da fi a A ri . isso, ela foi pa tó ia is ar h nh ra, da prestar enge fia, da literatu so físilo fi em da escolha lógica s or h rá correr at pre foi mel ou m nt se te a El o, . h in po No curs raspando, nha tem a jeito. Não ti fortes, passou nh os ti nt o po nã us as arte. M a de conou em se ímica. Apost numa empres a qu h a, al ic ab át tr e em oj acha ca, mat u diploma. H prego. E não Conseguiu se liz em seu em fe é se mas passou. o? ar m ns es pe oém ca parou para uito pior, nã sultoria. Nun e que está m nt ge m te – clamar que possa re

Elena nã o conhe ce Ferna ano e na nda, ape mesma sar das d cidade. A em que uas tere família d Fernand m nascid e Elena a estudo período o no me n ã u o . N consegu integral, a verdad smo ia pagar e, agora a família Até entã o colégio q u d e e o, todos e E la le n p a r ecisava consegu contava aos 14 a estudar iria paga m com a nos e aju em r ainda m certeza daria a p era o ún d e e n q os coisa u a g e a e ico jeito r la a s s. c o c o m ntas. Sab eçaria a . Era, no todo mu iam que trabalha passado ndo de s r n , ã p o o rque a ta era o ide urpresa. Elena nã l da Med al, mas De repe o poderia n id te a Provis , só tinh trabalha um emp ória peg a ensino r de dia. rego, e q ou médio in Deram u uando v de casa. tegral. m jeito: oltasse d E assim a a m e ãe arrum scola, a ela fez. C roupas, menina aria mais uidou do limpou cuidaria s irmãos a casa. F casa. Su das tare menore ez de tu a forma fas s, fez as do, só n tura foi jantas, la ão conse importa um alívio v g va. Arru ou as u iu fazer para tod mou seu suas liçõ pela sua os: agor emprego e s cabeça. a de poderia , finalm Seu segu focar no “formaç ente. A fa ndo grau q ão técnic u e culdade completo a e profi nem pas (com dip ssional” sou ) já basta loma qu e atestav va para ajudar e a m casa.

ILUSTRAÇÃO: NATALIE MAJOLO

Marcelo dá aula desde que se formou em filosofi a, em 2003. Já foi professor do fundament al I (dava aula de “Convi vên cia ”), do fundamental II (aulas de “Ética e cid adania”), de cursinho (a aul a qu e os alunos sempre matavam para estudar física, química…). Até qu e des cob riu o que realmente gosta de fazer: dar aulas no Ensino Médio . Ele ado rava acompanhar o crescimento dos alunos nos anos mais tur bulentos de suas vidas. Sua maior felicidade era ver alunos que no prime iro ano desprezavam a filosofia se formarem bon s debatedores e cidadã os ainda melhores. Quer dizer, até a reforma, cla ro. A partir de 2017, ele só deu aula para quem já se interessava pelo ass unto. Os debates já não eram os mesmos – isso quando existiam. O col égio em que ele trabalhav a na época optou por não incluir filosofia em seu currículo. Em sua procur a por um novo emprego, até encontrou escolas qu e valorizavam a filosofi a. Mas também encontro vários outros candidato u s para as vagas de profes sor . Candidatos que não tinham o diploma de lice nciatura, mas afirmava m ter “notório saber” sobre o assunto. Candida tos que aceitaram fazer o mesmo trabalho que fazia, mas por um salári ele o menor que o dele. De pois de um tempo, Ma decidiu voltar a dar aul rce lo as no ensino fundament al. Mas também já não a mesma coisa: ao invés era de Ética e Cidadania, ago ra ele precisava ensina r desde os sofistas até Fou cault para as crianças.


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