CLB - Euclides da Cunha

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da ou sentido, pós-desastre “natural” ou “humano”, pouco importa, do que resultado agônico de uma catástrofe “em presença” (sendo evidente que tal balanço deva se matizar em se tratando das respectivas prosas narrativas, já que em O Ateneu e Os sertões diferentes dramas humanos são igualmente enquadrados com tintas fortes da eloqüência). No que toca às artes visuais, a tentativa de contraponto, sobretudo em Pompéia, que foi desenhista e caricaturista refinado (lamentavelmente, os desenhos em cores que fez com cuidado especial para ilustrar suas Canções perderam-se de todo, o mesmo acontecendo com algumas peças de escultura que criara), faz ressaltar a impertinência da estilização própria dos desenhos expressionistas, em particular a xilogravura21. Afastado, pois, o risco de rótulo que seria, ademais, anacrônico, pode-se compreender tal aproximação a partir da matriz comum do supernaturalismo do final do século XIX, tendência que atualiza traços do romantismo na cultura cientificista da época, sobretudo em torno à degradação e finitude dos seres vivos, que repercutirá tanto nos artistas e escritores finisseculares quanto em certas vanguardas claramente tributárias da revolta romântica, como o expressionismo e o surrealismo. Feitas as ressalvas, vale recuperar dois poemas homônimos – “Fim do mundo” (“Weltende”) – de autoria de dois representantes significativos da literatura expressionista alemã, a escritora Else Lasker-Schüler (1869-1945), nascida na mesma década que Pompéia e Euclides, e Jakob van Hoddis (18871942), da geração seguinte. No poema de Lasker-Schüler, datado de 1905, o fim do mundo projeta-se do choro disperso, da vida tragicamente compartilhada “como em ataúdes”, de uma saudade difusa que anuncia o reconhecimento melancólico da morte, para um lugar secreto a que o eu lírico convoca seu amor à união e ao beijo plenos, plasmados no desejo críptico de clandestinidade e desaparição: Há um choro no mundo, Como se o bom Deus chegasse ao final, E a nuvem plúmbea cai ao fundo, Em peso sepulcral.

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