Manual de Bioquímica com Correlações Clínicas

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CAPÍTULO 26 DIGESTÃO E ABSORÇÃO DE CONSTITUINTES NUTRICIONAIS BÁSICOS

Micelas de ácidos biliares contornam este problema para os lipídeos, por aumentarem sua concentração efetiva na camada não-misturada. O aumento na velocidade de transporte é quase proporcional ao aumento na concentração efetiva e pode ser 1000 vezes superior à de ácidos graxos individuais solubilizados, de acordo com as diferentes solubilidades em água dos ácidos graxos como micelas e como moléculas individuais. Esta relação entre fluxo e concentração efetiva permanece, porque a constante de difusão é só um pouco menor para micelas do que para moléculas de lipídeos em solução. Em ausência de ácidos biliares, a absorção de triacilgliceróis não pára completamente, mas a eficiência é drasticamente reduzida. Absorção residual depende da baixa solubilidade em água dos ácidos graxos livres e dos monoacilgliceróis. Lipídeos não-absorvidos chegam ao intestino inferior, onde uma pequena parte pode ser metabolizada por bactérias. A maior parte dos lipídeos não-absorvidos, entretanto, é excretada nas fezes (esteatorréia). Micelas também transportam colesterol e as vitaminas lipossolúveis A, D, E e K através das camadas fluidas não-misturadas. Secreção de ácidos biliares é essencial para sua absorção.

A Maior Parte dos Lipídeos Absorvidos É Incorporada a Quilomícrons Captação de lipídeos por células epiteliais intestinais ocorre por difusão através da membrana plasmática. Além disso, captação de ácidos graxos de cadeia longa é aumentada por um transportador (FATP4 ou SLC27A4) e de colesterol por um canal (proteína tipoC1 de Niemann-Pick ou NPC1L1) na membrana luminal. Esteróis também podem ser bombeados de volta para fora por um transportador ABC (ver p. 479) consistindo de dois meios-transportadores (ABCG5 e ABCG8) e uma parte do colesterol é realmente devolvida ao compartimento luminal. Exportação de esteróis por transportador ABC é particularmente importante para rejeitar esteróis de plantas; normalmente, esteróis de plantas não são encontrados no soro. Mutações com perda de função em qualquer dos meios-transportadores estão associadas com uma elevação no soro do esterol de planta sintosterol (fitosterolemia ou sitosterolemia). Absorção é virtualmente completa para ácidos graxos e monoacilgliceróis, que são ligeiramente solúveis em água. É menos eficiente para lipídeos insolúveis em água. Por exemplo, apenas 30-40% do colesterol da dieta é geralmente absorvido. Dentro das células epiteliais que fazem absorção, o destino dos ácidos graxos absorvidos depende do comprimento da cadeia. Ácidos graxos de cadeias curtas ou médias (≤10 átomos de carbono) ou seus monoacilgliceróis são ligados a uma proteína citosólica que liga ácido graxo (FAB intestinal o I-FABP) e são transporta-

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dos para o retículo endoplasmático, onde são convertidos em triacilgliceróis. Glicerol para este processo é derivado dos 2-monoacilgliceróis absorvidos e, em menor grau, da glicose. Colesterol é esterificado pela colesterol aciltransferase. Os triacilgliceróis recém-sintetizados e os colesteril ésteres formam glóbulos lipídicos aos quais fosfolipídeos e apolipoproteínas adsorvem. Os glóbulos são chamados quilomícrons porque podem crescer até vários micrômetros e diâmetro, e deixam o intestino pelos vasos linfáticos (quilo = linfa leitosa derivada do grego chylos, que significa suco). passam através da célula para o sangue portal, sem modificação. Ácidos graxos de cadeia longa (>12 átomos de carbono) são ligados a uma proteína citoplasmática de ligação a ácidos graxos (FABP intestinal ou I-FABP, intestinal fatty-acid binding protein) e são transportados para o retículo endoplasmático, onde são convertidos novamente em triacilgliceróis. Quilomícrons são sintetizados no lúmen do retículo endoplasmático, de onde migram pelo Golgi e depois para vesículas e para a membrana contraluminal. São liberados no espaço intercelular por fusão destas vesículas com a membrana plasmática. É interessante que quilomícrons não entram no espaço capilar e na veia porta, mas sim viajam pelos vasos linfáticos intestinais (ou lacteals) e o ducto torácico para o sistema venoso sistêmico. As apolipoproteínas intestinais são designadas por A-1 e B48 (ver Corr. Clín. 26.8); são diferentes daquelas do fígado, com funções semelhantes (ver p. 698). Enquanto ácidos graxos de cadeia média da dieta chegam ao fígado diretamente com o sangue portal, ácidos graxos de cadeia longa chegam primeiro ao tecido adiposo e ao músculo via circulação sistêmica, antes de entrarem em contato com o fígado. Células adiposas e musculares captam grandes quantidades de lipídeos da dieta para armazenamento ou metabolismo. Um atalho sem passar pelo fígado pode ter evoluído para proteger este órgão da sobrecarga lipídica após uma refeição. O manuseio diferencial de ácidos graxos de cadeia média e longa por células intestinais pode ser explorado para fornecer ao fígado nutrientes altamente calóricos, na forma de ácidos graxos. Ácidos graxos de cadeia curta e média têm cheiro e gosto rançoso, e não são muito palatáveis; entretanto, triacilgliceróis que contêm estes ácidos graxos são bastante palatáveis e podem ser usados como parte da dieta. Ácidos graxos de cadeia curta são produzidos fisiologicamente, particularmente no cólon, por bactérias, a partir de carboidratos residuais. Estes ácidos graxos são absorvidos no sangue portal.

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26.7 METABOLISMO DE ÁCIDOS BILIARES Química e Síntese de Ácidos Biliares Ácidos biliares são sintetizados em células do fígado (hepatócitos) a partir de colesterol, secretados na bile juntamente com fosfolipídeos, e modificados por enzimas bacterianas no lúmen intestinal.

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