O Poder do Mito

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O PODER DO MITO _____________________________________ mesmo cada vez maior, até que chega um momento em que se dá conta de que é, ao mesmo tempo, mortal e imortal, macho e fêmea. MOYERS: Você acha que chegou a existir um lugar como o Jardim do Éden? CAMPBELL: Claro que não. O Jardim do Éden é uma metáfora para aquela inocência que desconhece o tempo, desconhece os opostos e vem a ser o centro primordial a partir do qual a consciência se dá conta das mudanças. MOYERS: Mas se existe na idéia do Éden essa inocência, o que acontece com ela? Não está ela abalada, dominada e corrompida pelo medo? CAMPBELL: É isso mesmo. Há uma história maravilhosa sobre o deus da Identidade, que disse: “Eu sou”. E assim que disse “Eu sou”, teve medo. MOYERS: Por quê? CAMPBELL: Porque passou a ser uma entidade, no tempo. Então pensou: “De que eu poderia ter medo, se sou a única coisa que existe?” E assim que o disse, sentiu se solitário, e quis que houvesse outro, ali, e então sentiu desejo. Aí cindiu se, dividiu se em dois, tornou se macho e fêmea, e originou se o mundo. Medo é a primeira experiência do feto no útero. Há um psiquiatra checoslovaco, Stanislav Grof, vivendo agora na Califórnia, que por muitos anos tratou pessoas com LSD. E descobriu que muitos reviviam a experiência do nascimento e, nesse reviver, o primeiro estágio era o do feto no útero, sem nenhuma consciência de “eu” ou de ser. Então, imediatamente antes do nascimento, começa o ritmo do útero e aí surge o terror! Medo é a primeira coisa, a coisa que diz “eu”. Então advém o terrível estágio de nascer, a difícil passagem através do canal do nascimento, e então... meu Deus, a luz! Você pode imaginar isso? Não é desconcertante que isso repita exatamente o que o mito narra – que a Identidade disse “Eu sou”, e imediatamente sentiu medo? E aí, quando se deu conta de que estava só, sentiu desejo de outro e se tornou dois. E a irrupção, no mundo, da luz e dos pares de opostos. MOYERS: O que diz o mito a respeito de termos tantas coisas em comum, muitas dessas histórias contendo elementos semelhantes – o fruto proibido, a mulher? Por exemplo, esses mitos, essas histórias da criação, contêm um “não farás”. O homem e a mulher se rebelam contra essa proibição e se afastam, por sua conta. Depois de ler sobre essas coisas durante

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