O Poder do Mito

Page 31

O PODER DO MITO _____________________________________ também foi morta. Uma única criatur a olha de frente esse terrível monstro, uma garotinha com uma flor. Essas são as duas figuras que você acaba de mencionar – a simples, inocente e infantil, e a ameaça terrífica. Você tem aí o problema dos tempos modernos. MOYERS: O poeta Yeats achava que estamos vivendo o último dos grandes ciclos cristãos. Seu poema “A segunda vinda” diz: “Girando e girando na volta que se amplia/O falcão não pode ouvir o falcoeiro;/As coisas se desmancham, o centro não pode reter;/A anarquia solta se espalha sobre o mundo,/A onda de sangue escurecido se desatou e por toda a parte/A cerimônia da inocência naufragou”. Que é que você vê caindo “na direção de Belém, para nascer”? CAMPBELL: Não sei o que vem por aí, não mais do que Yeats sabia, mas o final de um ciclo e início de outro é sempre um tempo de sofrimento e turbulência. A ameaça que sentimos, que todos sentem... bem, temos essa noção do Armagedon que se aproxima, não é mesmo? MOYERS: “Eu me tornei a Morte, o Destruidor de mundos”, disse Oppenheimer quando viu explodir a primeira bomba atômica. Mas você não acha que será o nosso fim, acha? CAMPBELL: Não será o fim. Talvez venha a ser o fim da vida neste planeta, mas isso não é o fim do universo. É só uma explosão à toa, comparada a todas as explosões que estão ocorrendo em todos os sóis do universo. O universo é um punhado de explosivas fornalhas atômicas, como o nosso sol. Portanto, esta é só uma pequena imitação da coisa toda. MOYERS: Você imagina que em alguma parte existam criaturas imprimindo à sua jornada transitória a espécie de significação que nossos mitos e grandes histórias imprimem? CAMPBELL: Não. Quando você se dá conta de que, se a temperatura subir cinqüenta graus e permanecer aí, a vida não existirá nesta terra, e se baixar, digamos, cem graus e permanecer lá, não haverá vida nesta terra; quando você se dá conta de como é delicado esse equilíbrio, como é importante a quantidade de água... bem, quando se pensa em todos os acidentes ambientais que propiciaram a vida, como é possível supor que a vida conhecida por nós exista em qualquer outra partícula do universo, não importa quantos satélites haja ao redor das estrelas? MOYERS: Esta frágil vida sempre existe sob a provação do terror e a possibilidade de sua extinção. E a imagem da boneca de pano justaposta à de um truculento Rambo não coincide com o que sabemos da vida através da mitologia?

– 31 –


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.