Teorias da Comunicação (Mauro Wolf)

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constituído pelo público - ou melhor, pelas opiniões que os jornalistas têm acerca do público - e os limites dessa referência, são um dos aspectos mais interessantes e menos aprofundados da temática do newsmaking e não só (ver 1.9.3.). Do ponto de vista dos valores/notícia, esta categoria também se liga às anteriores, como o demonstra claramente o exemplo seguinte: na pesquisa que Schlesinger fez sobre a BBC, a propósito da «clareza» da linguagem (que se inclui no valor/notícia da «qualidade», ver 3.4.2.), há um jornalista que afirma: «achámos uma forma de simplificar a descrição do conceito "déficit da balança de pagamentos" e que é "a diferença entre o que compramos e o que vendemos ao estrangeiro". Como foi adoptada esta expressão? Houve alguém que a pensou, nós ouvimo-la e considerámo-la boa. Quando temos de a utilizar, perguntamos a nós próprios: "Como era a frase que usámos da outra vez?" e encontramo-la. A expressão perpetua-se, tornase acessível. É a frase que se aproxima mais daquilo que pensamos que as pessoas compreendem. Não é propriamente exacta mas é a melhor, tendo em conta que é dita: não se pode reler o texto até se compreender o que ele diz como, pelo contrário, se pode fazer com os jornais» (Schlesinger, 1978a, 126) [itálico meu]. No que diz respeito à especificação do critério em questão, Golding e Elliott (1979) inscrevem nele os critérios da «estrutura narrativa», da capacidade de atracção do material filmado que acompanha a notícia, do entretenimento e da importância da notícia. Gans (1979), por sua vez, distingue três categorias: a. as notícias que permitem uma identificação por parte do espectador; b. as notícias-de-serviço; c. as chamadas non-burdening stories, isto é, notícias ligeiras, que não oprimam o espectador, nem com demasiados pormenores, nem com histórias deprimentes ou sem interesse. Existe, depois, o aspecto da «protecção», ou seja, a não noticiabilidade de factos ou pormenores de acontecimentos cuja cobertura informativa (se presume) que provocaria traumas ou ansiedade no público ou feriria a sua sensibilidade ou os seus gostos. 3.4.5. Critérios relativos à concorrência Segundo Gans, a situação de competição dá origem a três tendências que, por sua vez, se reflectem sobre alguns dos valores/notícia, reforçando-os. Antes do mais, há órgãos de informação rivais que «ainda, tentam fazer "caixas", em prejuízo dos concorrentes; no entanto, dado que os mass media têm correspondentes, virtualmente, nos mesmos locais, a possibilidade de chegarem com uma notícia primeiro do que aqueles que, outrora, "fechavam o jornal enquanto estava a imprimir" diminuiu. Pelo contrário, os mass media competem na obtenção de exclusivos, na invenção de novas rubricas e na feitura de pequenas "caixas" sobre os pormenores» (Gans, 1979, 177). Em consequência deste facto, acentuam-se, indubitavelmente, os impulsos para a fragmentação, para centrar a cobertura informativa nas personalidades de elite e para todos os outros factores co-responsáveis pela distorção informativa que pretere uma visão, articulada e global, da realidade social. A segunda tendência consiste no facto de a competição gerar expectativas recíprocas, no sentido em que pode acontecer que unia notícia seja seleccionada porque se espera que os mass media concorrentes façam o mesmo. Finalmente, «as expectativas recíprocas transformam-se num laço comum: desencorajam as inovações na selecção das notícias, que poderiam suscitar objecções por parte dos níveis hierárquicos superiores, o que, por sua vez, contribui para a semelhança das coberturas informativas entre noticiários ou jornais concorrentes» (Gans, 1979, 177). A competição tem também como consequência o contribuir para o estabelecimento dos parâmetros profissionais, dos modelos de referência. Na situação americana, esta função é desempenhada pelo New York Times e pelo Washington Post. «O Times é considerado como o protótipo dos standards profissionais [...]. Quando há redactores e chefes de redacção que não têm a certeza quanto à decisão a tomar acerca da selecção de uma notícia, vão verificar se, quando e como o Times fez a cobertura da história [...]. Quando os jornalistas, de televisão e não só, utilizam o Times desta forma, presumem que o Times aplica apenas critérios substantivos e qualitativos e não se interessa pelas considerações relativas ao meio de comunicação, ao formato e ao público. Por vezes, os jornalistas admitem que tal pressuposto é discutível, mas sentem a sua exigência porque não têm necessidade de acreditar que [...] existem avaliações profissionais que transcendem as das redacções e dos órgãos de informação» (Gans, 1979, 181). Trata-se de um aspecto muito significativo que ajuda a explicar a viscosidade de uma certa forma de fazer informação e a dificuldade de instaurar e generalizar «ideologias da notícia» diferentes da que, actualmente, está em voga. Para concluir este parágrafo, há que precisar ainda um aspecto: nem todos os valores/notícia são importantes de igual modo, «nem, todos são relevantes para cada notícia. Se o fossem, os jornalistas não poderiam executar o seu trabalho, porque não teriam tempo para os tomar a todos em consideração [...]. Alguns são, praticamente, sempre relevantes, mas o número e a combinação pertinente para as notícias


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