Uma Paixao para la do Normal

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Outubro de 2008

Uma Paixão para Lá do Normal: Como Agricultores e Investigadores Estão a Procurar Soluções para a Fome em África

www.cgiar.org

Uma Paixão para Lá do Normal Como Agricultores e Investigadores Estão a Procurar Soluções para a Fome em África

Por John Donnelly

Fotografias de Dominic Chavez


Os Membros do CGIAR África do Sul Alemanha Austrália Áustria Banco Africano de Desenvolvimento Banco Asiático de Desenvolvimento Banco Interamericano de Desenvolvimento Banco Mundial Bangladesh Bélgica Brasil

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Portugal Programa das Nações Unidas para o Ambiente Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Quénia Reino Unido República Árabe do Egipto República Árabe Síria República da Coreia

República Islâmica do Irão Roménia Suécia Suíça Tailândia Turquia Uganda


Uma Paixão Passion para Lá do Beyond Normal Normal Como Agricultores e Investigadores Estão a Procurar Soluções para a Fome em África How Farmers and Researchers are Finding Solutions to Africa’s Hunger

Por John Donnelly Fotografias de Dominic Chavez

Uma Paix ão para Lá do Normal . Introdução

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Indice Prefácio

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Introdução

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Histórias e Perfis: Benim Mandioca: Quem matou? À procura de um meio para derrotar as pragas

Ruanda A captação da água da chuva: “Queremos ajudar os agricultores a sair da pobreza” 34 Feijão-de-trepar: “Em toda a parte, todos os dias... feijão, feijão, feijão”

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Tanzânia Sistemas de sementes: Levar sementes 44 de um para centenas de campos

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Said Silim: “Como é que se pode retribuir à sociedade?”

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Nigéria Variedades NERICA: “Isto está a mudar as nossas vidas”

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Quénia Milho Resistente à Seca: “É urgente realizar este trabalho”

Malawi Lagoas de peixe: Criar peixes para alimentar órfãos

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Judith Harry: “Estou sempre a pensar no futuro”

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Solos: A magia da soja: Dar nova vida a solos esgotados

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Produtores de lacticínios: Levar o leite da Lulu ao Mercado

24

Moçambique Batata-doce: As maravilhas escondidas de uma raiz cor de laranja

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Uganda Josephine Okot: “O rosto delas diz tudo”

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Zimbabué Jemimah Njuki: “Há maneiras de escapar à pobreza”

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Biografias John Donnelly Dominic Chavez

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Agricultores dando início à colheita da batata-doce em Boane, Moçambique. { iv }

Uma Paix ão para Lá do Normal . Prefácio


Prefacio A agricultura enfrenta alterações drásticas na economia e no clima global, as quais têm enormes reflexos na subsistência de produtores e consumidores pobres. Pode-se argumentar que a África Subsariana é mais afectada por essas mudanças que outras regiões, porque tem recursos mais limitados para lidar com elas. A sua população já sofreu com o disparar dos preços dos cereais e provavelmente vai continuar a sofrer embates, a menos que se tomem fortes medidas para melhorar a produtividade e a capacidade de recuperação dos sistemas alimentares africanos. A crise dos preços alimentares, em conjunto com a ameaça iminente das alterações climáticas, veio renovar a chamada de atenção para uma questão que persegue os peritos agrícolas em África há muitos anos: como pode a região realizar uma Revolução Verde comparável à transformação da agricultura da Ásia nos anos 70? Muitas organizações, incluindo o Grupo Consultivo para a Investigação Agrícola Internacional (CGIAR), procuram respostas, conscientes, no entanto, de que há uma outra questão que é a que mais importa: Que pode ser feito neste momento para permitir que todos os povos de África possam gozar do direito humano básico a uma alimentação adequada — um direito reconhecido pelas 153 nações que assinaram o

Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais? Muito pode ser feito e, conforme se torna evidente através das extraordinárias histórias contadas nesta publicação, muito está a ser feito. Ainda que enfrentando muitas dificuldades, agricultores e investigadores por todo o continente estão a trabalhar com grande capacidade inventiva e persistência, e também com “uma paixão para lá do normal”, para encontrar meios para superar a fome e a pobreza. Estas experiências dão azo a optimismo quanto ao crescimento agrícola em África — um sentimento que é apoiado por recentes tendências. Após duas décadas de declínio da produção per capita, a agricultura da região, no seu todo, apresentou taxas de crescimento positivas ao longo dos últimos dez Uma Paix ão para Lá do Normal . Prefácio

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anos, “sugerindo que a estagnação da agricultura na África Subsariana pode ter chegado ao fim”, nas palavras do Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial 2008, publicado pelo Banco Mundial. Em larga medida, este crescimento tem resultado da expansão da área cultivada. No entanto, melhores variedades de culturas e outras tecnologias têm-se vindo a espalhar mais amplamente através de África, como indicam muitas das histórias neste volume. A investigação realizada em centros apoiados pelo CGIAR e pelos seus parceiros nacionais está a contribuir de modo significativo para esse progresso. Nenhuma outra organização está tão bem equipada e dotada de recursos para ajudar a resolver as muitas dificuldades da região, como as doenças e pragas tropicais, solos inférteis, barreiras comerciais e alterações climáticas. Em resultado de investigações feitas em colaboração, numerosas variedades melhoradas de culturas de alimentos básicos estão agora a ser semeadas em milhões de hectares na África Subsariana. A grande diversidade de culturas da região — por vezes encarada como obstáculo a um progresso rápido — pode agora ser vista como uma oportunidade para alargar o âmbito da inovação tecnológica e multiplicar as opções de progresso. A pesquisa complementar sobre a saúde das culturas — centrada em medidas como o controlo biológico e a resistência genética a moléstias e pragas — tem, repetidas vezes, protegido a agricultura africana de grandes devastações. Torna-se claro que estes trabalhos têm capacidade para oferecer potentes remédios para as crescentes pressões de doenças e pragas que se prevê resultarem das alterações climáticas. { vi }

Uma Paix ão para Lá do Normal . Prefácio

Pesquisas recentes, direccionadas para uma melhor gestão de recursos naturais, têm apresentado opções prometedoras para a inversão da degradação dos solos em África e para uma utilização mais eficiente da água. Ao proporcionar maneiras mais sustentáveis de fazer uso dos vastos recursos de terra e água da região, estas opções podem dar a África melhores condições para exercer uma gestão ambiental eficaz para benefício de toda a humanidade, potenciando simultaneamente a sua clara vantagem comparativa na agricultura. Com base no que foi recentemente alcançado, pode-se considerar que estão lançadas as bases tecnológicas para aquilo que o Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial 2008 refere como “uma revolução da produtividade, baseada nos pequenos proprietários”, a verificar-se na agricultura de África. A questão óbvia agora é qual a melhor forma de potenciar esta base, alargando-a aos tão diversos sistemas agrícolas da região. O relatório fornece uma espécie de plano de arquitectura do que refere como “países apoiados na agricultura”, que se encontram principalmente na África Subsariana e que formam um dos “três mundos da agricultura”. No contexto desse mundo, os alimentos básicos representam uma larga quota do total da produção agrícola. O desenvolvimento económico de África depende assim, em grande medida, da sua capacidade para produzir mais alimentos do que os que consome. Até 2015, a procura de alimentos na região deverá cifrar-se em cerca de USD 100 mil milhões, o dobro do montante de 2000. Para garantir que a sua produção alimentar mantenha o ritmo da procura interna, África tem de avançar em muitas frentes simultaneamente, e isto é talvez o que

sobretudo distingue o seu percurso de crescimento de produtividade em relação ao da Ásia. Bem conscientes da diferença, muitos peritos agrícolas de África acreditam que a região precisa de uma abordagem mais integrada à inovação tecnológica. Numa hora em que o CGIAR embarca em ambiciosas reformas, confiamos em que contribuirá com um sucesso ainda maior para a inovação na agricultura de África.

Katherine Sierra

Ren Wang

Monty Jones

Presidente CGIAR

Director CGIAR

Director Executivo Fórum para a Pesquisa Agrícola em África (FARA)


Costas curvadas, olhos na terra, Primitive Nyiramahane, à direita, e a sua amiga Conolate Musaimiyimana mondam os campos onde plantam milho e feijão-de-trepar, em Kadaho, Ruanda. Uma Paix ão para Lá do Normal . Prefácio

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Introdução


À comunidade rural de Matuba, Moçambique, chegaram investigadores apoiados pelo Grupo Consultivo para Pesquisa Agrícola Internacional (CGIAR), para inspeccionar um campo de ensaio. À sua espera estavam os representantes de uma empresa que queria investir muitas centenas de milhares de dólares no negócio das sementes. Os dois grupos fundiram-se naturalmente, rindo, partilhando histórias e depois falando sobre aquilo que os preocupava. Mas ao longe, na distância, por entre fileiras de trigo, uma segunda cena se estava a desenrolar, mansamente, quase invisivelmente. Várias pessoas pareciam caminhar de um lado para o outro sem destino por entre as leiras. Algumas assobiavam. Uma tocava uma campainha. A sua função, na realidade, era uma das menos atraentes tarefas da agricultura em África. Estavam a assustar os pássaros. Haverá quem diga que isso podia ser feito por espantalhos. Alguns dirão que contratar estas pessoas é um desperdício de dinheiro, mesmo com um salário de 2 dólares por dia. Mas aquela gente no campo nesse dia, todos eles africanos, não diriam isso. Cientistas e

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Uma Paix ão para Lá do Normal . Introdução

agricultores sabem que os espantalhos humanos desempenham um dos muitos papéis essenciais para que as colheitas atinjam a maturidade. “Se não fossem as pessoas para assustar os pássaros, eles estragariam a colheita e não se conseguiria cultivar o arroz, sorgo, trigo, cevada ou o milho painço”, explicou Wilson Leonardo, um cientista do Instituto Internacional de Investigação de Culturas para os Trópicos Semi-Áridos (ICRISAT). “Ao controlar os pássaros, elas acrescentam o valor do produto. A agricultura às vezes é complicada.” Complicado é por vezes, também, o relacionamento entre o investigador e o agricultor. Como dizia Leonardo, “Os agricultores contestam-nos sempre. Aprendemos coisas novas todos os dias.”


Há uma lição na recolha para este livro: ponha de parte, por um minuto, as suas noções preconcebidas durante a formação universitária, no trabalho de campo, nas discussões no escritório. Agora, entre num campo de cultivo. Imagine que é um investigador. Que vai então fazer? Começar a fazer perguntas. A quem as fazer? Você faz perguntas a quem está no campo, ao agricultor. E talvez queira dirigir-se também à pessoa que anda a espantar os pássaros. Este livro é sobre isso. É sobre investigadores que foram brilhantes no laboratório e que, no campo se mostram abertos a novas ideias, e sobre agricultores brilhantes no campo e de mente aberta em relação aos investigadores que apareceram a oferecer ajuda. É um livro sobre “a vantagem de fazer caminho juntos”, como disse Leonardo. E que conta também como as boas práticas na agricultura não se instalaram facilmente e, em muitos casos, foram precedidas por decepção e insucesso. Era preciso trabalho árduo e empenho. Tinha que haver motivação e determinação. Era preciso, como dizia a empresária ugandesa de sementes, Josephine Okot, “uma paixão para lá do normal”. As dez histórias e quatro perfis neste livro — relatado a partir de nove países espraiados desde o Benim, na África Ocidental, ao Malawi, na África Meridional — correspondem a algumas das mais importantes realizações devidas a essas paixões, em mais de três décadas de trabalho do CGIAR.

As fotografias que acompanham a história ilustram esse trabalho — desde as salas fechadas dos laboratórios, aos grandes campos abertos e aos caóticos mercados. Mas este livro deve também ser lido com sentido crítico, especialmente em termos de impacto. Alguns dos projectos — o mais importante dos quais talvez seja o controlo das pragas e moléstias da mandioca — têm tido grande sucesso em todo o continente. Outros, no entanto, ajudaram os agricultores apenas em certas regiões ou países. Pensei muitas vezes sobre isto. Seria por o projecto estar apenas no início? Terá sido cortado por falta de financiamento? Ou foi falta de visão? As respostas terão uma importância crucial nos meses e anos vindouros. Nesta época de alta de preços alimentares e de maior pressão sobre os agricultores para aumentarem o seu rendimento, o CGIAR vai obviamente tentar encontrar novas maneiras de intensificar as suas melhores iniciativas, incluindo algumas que aqui são descritas.

Quénia a permitir o comércio de leite cru dos pequenos lavradores; e como pesquisadores arquitectaram novos mercados para a batata-doce de polpa alaranjada de Moçambique — incluindo o pão de batata-doce laranja (rico em Vitamina A). A propósito, o pão laranja era óptimo, todos o saboreámos. Esperamos que estas histórias alimentem os vossos pensamentos em meses e anos futuros.

John Donnelly Setembro de 2008

Em muitos aspectos, este pequeno livro demarca-se claramente da maioria das muitas e importantes publicações do CG, como todos lhe chamam. Não é um douto tratado; não traz notas de rodapé no fim das páginas. Este livro é sobre a vida real, situações reais e pessoas reais que estão a tentar fazer a diferença. Não é só sobre sucessos do passado, mas também sobre desafios, que iam surgindo ao longo do tempo em que ali estivemos. E é por isso que vai saber aqui como os investigadores ajudaram uma aldeia no Malawi a lidar com o número crescente de órfãos da SIDA; como investigadores persuadiram políticos no

Uma Paix ão para Lá do Normal . Introdução

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Um CGIAR Mundial

Os Centros Apoiados pelo CGIAR Os 15 Centros apoiados pelo CGIAR são organizações autónomas, cada uma delas com os seus próprios estatutos, conselho de fiduciários, director-geral e quadro de funcionários. Os cientistas dos centros são recrutados no mundo inteiro. Centro de Arroz da África (WARDA) Cotonou, Benin www.warda.org Bioversity International Maccarese, Roma, Itália www.bioversityinternational.org Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT é a sua sigla em espanhol) Cali, Colômbia www.ciat.cgiar.org Centro Internacional de Investigação Florestal (CIFOR) Bogor, Indonésia www.cifor.cgiar.org

Centro Internacional de Melhoramento do Milho e do Trigo (CIMMYT é a sua sigla em espanhol) Texcoco, México www.cimmyt.org Centro Internacional da Batata (CIP é a sua sigla em espanhol) Lima, Peru www.cipotato.org Centro Internacional de Investigação Agrícola em Zonas Secas (ICARDA) Alepo, Síria www.icarda.org

Instituto Internacional das Culturas nas Zonas Tropicais Semi-Áridas (ICRISAT) Patancheru, Andhra Pradesh, Índia www.icrisat.org

Instituto Internacional de Investigação da Pecuária (ILRI) Nairobi, Quénia e Adis Ababa, Etiópia www.ilri.org

Instituto Internacional de Investigação da Política Alimentar (IFPRI) Washington, D.C., USA www.ifpri.org

Instituto Internacional de Investigação do Arroz (IRRI) Los Baños, Filipinas www.irri.org

Instituto Internacional de Agricultura Tropical (IITA) Ibadan, Nigéria www.iita.org

Centro Mundial Agro-florestal (ICRAF) Nairobi, Quénia www.worldagroforestrycentre.org Centro Mundial da Pesca (WorldFish Center) Penang, Malásia www.worldfishcenter.org

Instituto Internacional de Gestão dos Recursos Hídricos (IWMI) Colombo, Sri Lanka www.iwmi.cgiar.org Os indicadores de localidades são aproximativos e referem-se a cidades


Casos e perfis apresentados

A. Benim

e. Ruanda

B. Nigéria

A captação da água da chuva: “Queremos ajudar os agricultores a sair da pobreza” Feijão-de-trepar: “Em toda a parte, todos os dias... feijão, feijão, feijão”

Mandioca: Quem matou? À procura de um meio para derrotar as pragas Variedades NERICA: “Isto está a mudar as nossas vidas” c. Quénia

Milho Resistente à Seca: “É urgente realizar este trabalho” Solos: A magia da soja: Dar nova vida a solos esgotados Produtores de lacticínios: Levar o leite da Lulu ao Mercado d. Uganda

Josephine Okot: “O rosto delas diz tudo”

f. Tanzânia

Sistemas de sementes: Levar sementes de um para centenas de campos Said Silim: “Como é que se pode retribuir à sociedade?” g. Malawi

Lagoas de peixe: Criar peixes para alimentar órfãos Judith Harry: “Estou sempre a pensar no futuro” h. Moçambique

Batata-doce: As maravilhas escondidas de uma raiz cor de laranja I. Zimbabué

Jemimah Njuki: “Há maneiras de escapar à pobreza”

Os indicadores de localidades são aproximativos e referem-se a cidades



Benim


Mandioca: Quem matou? À procura de um meio para derrotar as pragas

OGOUKPATE, Benim – O velho parecia um duende. As pernas finas eram tão curtas que, sentado na cadeira, mal chegavam ao chão. Os olhos brilhavam. E quando sorria as pessoas sorriam também para ele. Mas quando lhe falaram nas pragas que haviam destruído as raízes de mandioca duas gerações atrás, ele franziu a cara com horror e agitou os braços à frente, como se estivesse a afastar um espírito maligno. Tinha sido muito mau. As origens do problema eram duas; a cochonilha e o ácaro verde da mandioca, que foram inadvertidamente trazidos para África como passageiros clandestinos de materiais para plantas vindos da América do Sul no princípio dos anos 70. Na década seguinte, as pragas espalharam-se por todo o vasto cinturão da mandioca no continente, estendendo-se da África Ocidental até à África Meridional. Nos princípios da década de 80, só a cochonilha estava a causar a perda de até 80 por cento das raízes e das folhas da planta, que são consumidas como legumes em muitos países. Para muitos dos 200 milhões de africanos que dependem da mandioca como produto base da sua alimentação, a infestação causou grande perturbação económica e arruinou as famílias pobres. Aqui, em Ogoukpate, as pessoas dependiam do mercado da mandioca para prover às suas necessidades básicas. Sem essa receita, os aldeões deitavam a mão qualquer trabalho que aparecesse.

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Cortaram as refeições. Uma sensação de temor invadiu as suas vidas. “As pequenas quantidades de mandioca que costumávamos ter para vender, pois agora, já nada tínhamos” contou Alphonse Ogoule-Okpe, o velho que andaria na casa dos 60. “Sofremos muito. Ah, tanto que nós sofremos.” Mas depois, primeiro por volta de meados da década de 80 e depois, de novo, uma década mais tarde, as plantas da mandioca ressurgiram. As raízes comestíveis tornaram-se mais fortes e os caules e folhas já não estavam cobertas por aquele pêlo esbranquiçado característico das infestações de cochonilha. Gradualmente, ao longo dos 15 a 20 anos seguintes, por toda a África, sucedeu-se o mesmo, centenas de milhares de vezes em aldeias como esta. Poucos sabiam por quê. Seria um acto de Deus? Um capricho da natureza?


Usando รณculos equipados com lentes especiais, o investigador do IITA Alexis Onzo examina uma planta de mandioca para detectar sinais de pragas, em Ogoukpate, Benim. Uma Paix รฃo para Lรก do Normal . BENIM

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Não. Foi o resultado do aprofundar de pesquisas pelos cientistas do Instituto Internacional de Agricultura Tropical (IITA), do Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT) e de vários outros parceiros, incluindo programas nacionais em toda a África. Uma equipa de investigadores, liderada pelo entomologista Hans Herren (que recebeu o Prémio Mundial da Alimentação 1995 por este trabalho) descobriu as pragas e em seguida concentrou-se em responder a uma questão chave: o que é que mantinha a cochonilha e o ácaro verde sob controlo na América do Sul? Através de trabalho em vários países da América do Sul e intensivos testes de laboratório, os investigadores identificaram vários parasitas e predadores — alguns demasiado pequenos para serem vistos a olho nu. Os cientistas do IITA testaram vários deles, até que, através do método de tentativa e erro, descobriram a perfeita Nemésis: a vespa Encyrtidae para a cochonilha e o ácaro fitoseídeo no caso do ácaro verde. “Em ambos os casos, não foi fácil encontrar o parasita e predador ideal” disse Rachid Hanna, um entomologista e especialista em biocontrolo do IITA, baseado no Benim. “Mas uma vez que o conseguimos e os introduzimos, espalharam-se rapidamente de moto próprio e através de uma libertação continuada. Tinham que se adaptar a uma grande variedade de ambientes e sustentar-se a partir de uma gama de recursos. Tinham que ter a capacidade de localizar a praga à distância e distinguir a mandioca de outras plantas. E não podiam fazer mal a mais nada. Em ambos os casos os dois inimigos naturais produziam efeitos apenas na mandioca.” No entanto, eram ainda muitos os cépticos. Muitos parceiros desligaram-se de uma decisão tão importante como a libertação dos inimigos naturais candidatos; 25 países africanos tinham formado comités para lidar com o problema da mandioca. Braima D. James, coordenador do Programa para

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Gestão Integrada de Pragas alargado a todo o sistema, do CGIAR, lembrou-se que alguns políticos destacados se tinham mostrado alarmados com os perigos de introduzir dezenas de milhar de vespas estrangeiras nos seus países, para lutar contra a cochonilha. “Tive que convencer as autoridades que estas vespas não ferram,” recordou James, rindo. “E é verdade que não. Mas custou a habituar as pessoas à ideia. Foram precisos poucos anos para ambos os programas de controlo apresentarem resultados espectaculares. Os estudos indicam que os danos causados pela cochonilha baixaram 95 por cento e os do ácaro verde 50 por cento. Um estudo revelou que as poupanças económicas situaram-se entre USD 7 e USD 20 mil milhões no caso do controlo da cochonilha; e um outro estudo, na Nigéria, Gana e Benim, calculou que, só nesses países, a poupança devida ao controlo do ácaro verde terá sido de USD 2 mil milhões. No centro de pesquisa do IITA em Cotonou, Benim, os cientistas continuam a estudar os inimigos naturais da mandioca. Ainda têm muitas perguntas sobre o porquê dos predadores darem tão bons resultados. E acreditam que o seu trabalho ao microscópio e nos campos de mandioca ajudará outros esforços para controlar as pragas das colheitas. É evidente que as pragas nunca desaparecem por completo. A mandioca ainda tem a sua quota. Uma delas é a forma muito virulenta do mosaico africano da mandioca, que é disseminado por uma mosca branca e estacas infectadas. Instalou-se ao longo da zona oriental de África e partes da central e meridional, e chegou já a áreas do Médio Oriente. Uma das vias de ataque que o IITA está a utilizar para combater o vírus, nada tem a ver com a introdução de inimigos naturais: está a desenvolver variedades da mandioca que sejam resistentes à moléstia.

Hanna, a entomologista do IITA, e Alexis Onzo, um especialista em ácaros do IITA, amarraram uns 300 pés de mandioca sobre o tejadilho do seu jipe, uma bela manhã em meados de 2008, e foram até duas aldeias no sudeste do Benim — o género de presente que o IITA tem vindo a dar a agricultores ao longo dos anos. Na vizinha Nigéria, por exemplo 60 por cento da mandioca cultivada provém de variedades de alto rendimento. Um dos pontos de paragem foi Ogoukpate, onde o velho Alphonse lhes deu as boas vindas à sombra de uma ficus gigante. Esta área tem um significado especial para o IITA; foi a poucos quilómetros daqui que se fez a primeira libertação em África do ácaro fitoseídeo, o predador do ácaro verde, em Outubro 1993. A aldeia de cerca de 130 pessoas, que não tinha carros, tinha quatro motocicletas, onde não havia electricidade nem aparelhos de televisão a menos de 5 quilómetros, dependia grandemente da mandioca. Alphonse disse aos seus visitantes que as colheitas de mandioca vinham a decrescer — aparentemente devido a solos esgotados. Ele e outros vieram pedir ajuda aos cientistas. Hanna disse-lhes que as novas variedades de mandioca “lutariam contra as doenças e atrairiam os predadores do ácaro verde”. Cada pé, disse ela, podia render cinco plantas. Os aldeões fizeram fila para vir apertar as mãos dos cientistas e agradecer. Eles não sabiam da antiga história da libertação dos inimigos naturais da mandioca, a cochonilha e o ácaro verde. Mas os pés das plantas à sua frente eram algo de tangível, uma nova fonte de esperança.


O velho Alphonse Ogoule-Okpe, à direita, conta como a cochonilha da mandioca destruiu o sustento dos aldeões há um quarto de século, em Ogoukpate, Benim.

Trabalhadores da Gavi Industry recebem a mandioca e transformam-na em farinha em Ita-Bolonia, Benim.

Rachid Hanna, cientista do IITA, inspecciona uma folha de mandioca num campo experimental do IITA em Cotizou, Benim.

Um jovem em Ogoukpate, Benim, leva consigo um presente de investigadores do IITA: novos pés de mandioca para plantar nos campos dos aldeões.

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NigĂŠria


Variedades NERICA “Isto está a mudar as nossas vidas”

OGBESE, Nigéria — Os homens ceifavam com as catanas uma ilha de ervas altas. O suor manchava as suas camisas. No calor do meio-dia, a sua tarefa era simples: espantar os ratos.

Os ratos, que tinham encontrado abrigo seguro no capim, faziam raides nocturnos aos campos de arroz em redor, comendo os grãos. A tarefa era bastante desagradável — um trabalhador tinha inadvertidamente atingido um ninho de vespas e o resultado fora o previsível caos e dor — mas os homens tinham obviamente boas razões para proteger a colheita. Ali cresce uma variedade do Novo Arroz para África, designado por NERICA, desenvolvido e criado por cientistas no Centro do Arroz para África (WARDA). É uma das novas variedades de cultura a serem introduzidas em África com maior sucesso no último quarto de século, e os agricultores nesta região sudoeste da Nigéria pedem sempre mais. “Isto está a mudar as nossas vidas em muitos aspectos — como nos deslocamos, como nos vestimos, como aprendemos”, disse-nos Sunday Olajolumo, de 57 anos, director da Cooperativa de Agricultores Anuoluwapo, um grupo de 26 agricultores que plantaram 69 hectares da variedade NERICA em 2008, contra 30 hectares em 2007. “Devido a este novo arroz, pude comprar uma

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motorizada, comprar roupa para a minha família e pagar as taxas escolares das crianças.” Cientistas do centro, liderados pelo produtor Monty Jones, começaram a cruzar o arroz asiático com o africano, no início da década de 90, desenvolvendo as variedades NERICA. O arroz africano, embora de baixa produtividade, tem várias virtudes: resistência às pragas, crescimento precoce, boa cobertura da terra para reduzir as ervas daninhas e uma boa tolerância à seca e à salinidade. O arroz asiático produz colheitas de espantar. Os investigadores começaram por criar variedades NERICA para os planaltos, que produziam colheitas muito mais elevadas que o arroz africano, mantinham a resistência às pragas e amadureciam em 150 a 170 dias. As variedades NERICA permitem aos agricultores vender as colheitas mais cedo (e muitas vezes a preços mais elevados) bem como plantar outra cultura de curta duração, como o feijão de soja ou batatas, após a colheita do arroz. Em 2001, os países africanos tinham já aprovado variedades NERICA para produção e os resultados positivos começaram a verificar-se logo a partir da


Em Ogbese, Nigéria, a agricultora Fadile Ojo caminha cuidadosamente por um campo com arroz NERICA que já lhe chega à barriga da perna, cerca de um mês antes da colheita. Uma Paix ão para Lá do Normal . Nigéria

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primeira época. No Uganda, que introduziu NERICA em 2002, as novas variedades renderam 2,2 toneladas por hectare, em média, e alguns agricultores relataram mesmo ter obtido até 5 toneladas. Por toda a África, a média da colheita de arroz de planalto era, havia muito, de 1 tonelada por hectare. O Burkina Faso registou, em poucos anos, um aumento de 102 por cento nas colheitas de arroz, em resultado directo das novas variedades. E aqui na Nigéria, a produção de arroz aumentou todos os anos, desde a introdução das variedades NERICA. Em reconhecimento destes resultados, Jones, um cidadão da Serra Leoa, ganhou em 2004 o Prémio Mundial da Alimentação. Mas nem só os cientistas foram responsáveis pelo sucesso das novas variedades. As organizações nacionais de agricultura tinham que as aprovar. Os lavradores tinham de ser convencidos. “É um sistema evolutivo,” disse Mande Semon, um produtor de arroz do Centro do Arroz para África, baseado na Nigéria, que trabalhou com o Dr. Jones nas variedades NERICA. “Os programas nacionais são parte integrante do processo e os agricultores participam directamente na escolha das variedades que pretendem.” A aprovação das novas variedades chegou em boa altura. O consumo de arroz em África ultrapassou em muito a produção local, obrigando muitos países a importar arroz da Ásia. Mas esta procura tem um custo. O aumento das importações representa um aumento de custos, especialmente a partir da crise alimentar global de 2008, que fez subir em muito o preço do arroz.

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Uma Paix ão para Lá do Normal . Nigéria

A Nigéria, que tem vindo a aumentar o consumo do arroz 6 por cento ao ano, espera produzir o suficiente para as necessidades domésticas e deixar de importar arroz. Em 2006, importou 2 milhões de toneladas da Ásia, com um custo de USD 700 milhões. Olupomi Ajayi, coordenador da delegação do Centro na Nigéria, acredita que o país vai conseguir. Em primeiro lugar, a Nigéria tem suficiente terra arável e uma variedade de ecossistemas que permitem a cultura do arroz. E em segundo, ele tem esperança que o país permita em breve o cultivo de novas variedades NERICA para as terras baixas, o que irá aumentar a produção de arroz nos vastos vales do interior. Depois da aprovação dessas variedades, disse, “aí é que esperamos ver uma revolução”. Mas no estado de Ekiti, já está a decorrer uma mini-Revolução Verde. Um estudo de 2006 concluiu que quase 97 por cento dos produtores de arroz de Ekiti estavam a utilizar variedades NERICA, um número espantoso, dado que tinham sido introduzidas apenas três anos antes. Em Ogbese, dúzias de agricultores disseram que as novas variedades não só produziam maiores colheitas, mas que tinham uma protecção contra os pássaros, que frequentemente roubavam grande quantidade de grãos de outras variedades. A razão principal é que a “bandeira” NERICA — o caule mais alto da planta — vai até muito mais acima dos grãos do que em outras variedades, afastando os pássaros. Os agricultores acreditam que vêm aí melhores dias. A Cooperativa de Agricultores Anuoluwapo decidiu,

em 2008, investir 8 500 dólares no pagamento de entrada de um tractor; o governo federal contribuiu com USD 17 000, deixando os lavradores com um empréstimo de 17 000 dólares. Com um novo tractor, Sunday, o director da cooperativa, diz que o grupo espera poder plantar 200 hectares no próximo ano — mais do triplo da actual área de cultivo. Janet Olatunji, uma de três mulheres agricultoras da cooperativa, plantou um hectare de arroz em 2007. Daí, obteve um lucro de USD 1 200. O conjunto de todas as suas outras culturas rendeu metade desse valor. Em 2008, plantou três hectares e espera vir a semear muito mais no futuro. “Quando experimentei a primeira vez, estava céptica,” disse Olatunji, no meio do seu campo de arroz. “Mas depois, vi como Deus é grande. O arroz teve muito bons resultados. Acho que agora posso fazer ainda melhor. Talvez algum dia as coisas corram tão bem que eu venha a ter um Range Rover para dar a volta à minha quinta.” Ela e alguns dos outros agricultores riram. Mas eles sabem que na era de NERICA muitas coisas, até mesmo um Range Rover, se tornaram agora possíveis.


Mercy Oladi Meji, 32 anos, à esquerda, plantou dois hectares com uma variedade NERICA em Ogbese, Nigéria, e lamenta não ter podido plantar mais. “Os outros tiveram muito bons resultados”, disse Mercy.

Preciosas sementes de arroz: uma taça com uma variedade NERICA.

Na esperança de afugentar os ratos do capim alto, um agricultor em Ogbese, Nigeria, corta o mato junto ao seu campo de arroz NERICA. Durante a noite, os ratos vêm comer as sementes. Uma Paix ão para Lá do Normal . Nigéria

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QuĂŠnia


Milho Resistente a Seca “É realmente urgente realizar este trabalho”

KIBOKO, Quénia — Havia nele um ar tenso. Movia-se com um propósito através dos campos de milho como se não tivesse tempo para lidar com todos os problemas que povoavam a sua mente. Dan Makumbi, produtor de milho há 15 anos, parou finalmente junto de fileiras de pés de milho de aspecto viçoso. “Este campo ainda está com um ar alegre,” disse Makumbi, rolando o caule entre os dedos. “Ainda está a receber água. Mas não vai durar muito.” O presságio era agoirento — para o milho, mas não para as legiões de plantadores de milho de África. Esta é uma estação experimental do Centro Internacional de Melhoramento do Milho e do Trigo (CIMMYT), que testa aqui 3 000 variedades de milho todos os anos. Mesmo após milhares de testes feitos anualmente, Makumbi e os seus colegas não estão satisfeitos — nem lá perto. Os testes experimentam novas variedades de milho em condições de seca, que periodicamente mas imprevisivelmente ocorrem em grandes áreas da África Oriental, Ocidental e Meridional. O plano de Makumbi era de cortar a água imediatamente antes do estádio de floração, a fase mais crítica para o desenvolvimento da planta, e depois monitorizar as diferentes variedades para ver quais continuariam a produzir milho, mesmo depois de o solo secar.

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O milho é talvez a cultura mais identificada com África, cultivada em praticamente todas as aldeias onde haja solo arável. Só no sul da África, é o alimento básico, cultivado em mais de 12 milhões de hectares. Mas é também muito vulnerável a períodos de seca e, em épocas com pouca ou nenhuma chuva, os lavradores que dele dependem para alimentar as suas famílias ou realizar receitas, têm sofrido terrivelmente. Em meados da década de 90 os cientistas, liderados por Marianne Banziger, do CIMMYT, começaram a fazer experiências com variedades com tolerância à seca, na África Meridional. No espaço de uma década, o trabalho dos investigadores em busca de novas variedades de milho começou a apresentar resultados espectaculares. Em alguns campos, o novo milho de sequeiro produziu 40 por cento mais que as variedades anteriores. Curiosamente, muitos agricultores verificaram que o impacto era ainda maior: as variedades resistentes à seca, em anos de baixa pluviosidade, continuavam a produzir enquanto outras o não faziam.


Num campo a muitos quilómetros da aldeia mais próxima, Kiboko, no Quénia, a trabalhadora rural Miunda Tuti arranca espigas de milho dos caules secos. A variedade resistente à seca produziu uma colheita elevada apesar das fracas chuvas. Uma Paix ão para Lá do Normal . Quénia

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“O que é realmente gratificante é falar com os agricultores,” disse Banziger, directora do programa global para o milho do CIMMYT, a quem muitos agricultores chamam “Mamã Milho”, pelo que tem contribuído para as suas plantações. “As novas variedades representam a diferença entre ter alguma colheita e nenhuma. Se houver alguma produção, tem-se algo para comer, algo para vender, pode-se mandar os filhos à escola. No Malawi, dizem que o milho é vida — é grande assim sua importância.” Algumas dessas variedades proliferaram rapidamente e tornaram-se, entre as variedades mais frequentemente comercializadas, as mais usadas pelas organizações não-governamentais para a ajuda em sementes, em zonas com tendência de seca. Na aldeia de Muisuni, no sudeste do Quénia, perto de Kiboko, os agricultores disseram que tinham começado há pouco a usar as variedades de milho resistentes à seca. Bastou uma estação seca para os transformar em ardentes apoiantes. “Esta nova variedade aguenta o sol quente”, disse Virginia Nthambi, de 22 anos, mãe de duas crianças pequenas, enquanto caminhava ao longo de fileiras de plantas de milho verde. Apontou para um campo adjacente, com filas de pés secos. “Vêem a diferença? Está bem à vista”, disse. “Quando há seca, aqueles pés além secam completamente. E estes aqui mantêm-se verdes.” Nthambi estava a cultivar as novas variedades para vender para semente. George Muthama, um representante da Freshco Seed Company, referiu que esperava poder comprar-lhe 150 sacos de sementes, cada saco com 100 quilos. Esses sacos,

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disse, conteriam sementes suficientes para plantar 1 500 hectares de milho. “A procura é enorme”, afirmou, “Venderemos tudo.” Nos campos experimentais de milho de Kiboko, onde o pico nevado do Monte Kilimanjaro, na Tanzânia se avista a sudoeste em dias claros, Makumbi, o produtor, observou os trabalhadores a cruzarem cuidadosamente plantas de milho. Numa das fileiras, os trabalhadores colocavam sacos de papel castanho sobre as bandeiras, agitavam o saco e a bandeira e a seguir colocavam o saco — já cheio de pólen — sobre uma espiga de uma outra planta. A seguir punham um saco plástico em torno da espiga para garantir que nenhuma outra planta a pudesse polinizar. Dorcus Gemenet, 29 anos, uma jovem cultivadora do Instituto Queniano de Pesquisa Agrícola, superintendia o trabalho. Uma parte importante do projecto para o milho resistente à seca envolve o treino de cientistas que trabalham em programas nacionais de pesquisa, o que desenvolve capacidades em toda a África nas mais avançadas técnicas de cultivo. “Cresci numa aldeia e sei o que essa gente sofre quando não chove”, comentou Gemenet. “O país é seco na sua maior parte, em mais de 80 por cento está classificado como árido. O trabalho que pudermos fazer pelo milho vai verdadeiramente tocar a vida das pessoas.” Em meados de 2008, muitas zonas do Quénia sofriam de condições de seca. “Em muitas áreas as explorações tinham um ar verdadeiramente patético”, contou ela. “O clima está a mudar e precisamos de ter estas variedades que acompanhem a mudança. Por isso, precisaremos sempre de novas variedades.”

Esse aguilhão à investigação é contínuo, a força por detrás do trabalho de Banziger, a vivacidade nos passos de Makumbi. Os criadores do milho têm obtido sucessos, mas sabem que têm potencial para fazer muito mais. “Temos à nossa frente uma tarefa de respeito”, comentou Banziger. “Vai haver um aumento de procura do milho — um aumento de 3 a 5 por cento ao ano ao longo de uma série de anos, em resultado do crescimento da população, do crescimento económico em África e na Ásia, do facto de as pessoas terem maiores recursos e se alimentarem com mais carne. Junte a isto a mudança climática e vamos precisar de muitos truques para nos mantermos à frente na corrida. O melhoramento da resistência do milho à seca será absolutamente crucial.” Para Gemenet, a jovem cultivadora queniana, o incentivo para levar a pesquisa ao campo vem também de outra fonte: é que esse milho cria uma rede de segurança para os agricultores — gente como os seus próprios pais, no oeste do Quénia. “É realmente urgente realizar este trabalho”, disse. “Estamos a desenvolver variedades que podem ser a única opção da maioria das pessoas pobres nas províncias. Pessoas que não podem pagar um sistema de irrigação. Que apenas esperam a chuva. E se a chuva não vem, temos que ter uma variedade de milho que ainda assim produza.”


Diferentes variedades de milho resistente à seca são postas a secar ao sol no Instituto de Pesquisa Agrícola do Quénia (KARI), em Kiboko, Quénia. Numa mesa de luz, um cientista do KARI examina bagos de milho que foram tirados de variedades de plantas resistentes à seca.

Num campo experimental do CIMMYT em Kiboko, no Quénia, Amoshe Omar verifica o progresso de uma variedade de milho tolerante à seca. Os trabalhadores colocam sacos de papel sobre as espigas de milho de modo a evitar a polinização cruzada. Uma Paix ão para Lá do Normal . Quénia

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Solos

A magia da soja: Dar nova vida a solos esgotados

ESHIVANZE, Quénia – A crosta da terra é aqui tão fina que escorre por entre dedos. Não há aqui ricos torrões negros. E a chuva não é a culpada; esta parte do Quénia tem abundância de chuva. Em vez disso, a sobrepopulação e o implacável retalhar da terra agrícola em pedaços cada vez mais pequenos, com o passar de cada geração, significa que em cada lote o cultivo nunca abranda e, pelo contrário, se intensifica. O solo, outrora fértil, está a tornar-se estéril pela sobreexploração Ali Watiti Rapando bem o sabe. A sua quinta, outrora do seu pai, há décadas que é lavrada para cultivar milho painço, mandioca e milho. Mas as receitas têm estado a tornar-se mais magras em cada época, fazendo-o recear que não poderá continuar a manter as suas duas mulheres e 10 filhos. Watiti imaginou assim um plano de sobrevivência baseado em dois princípios: diversificaria as suas actividades de modo a procurar novas maneiras de ganhar dinheiro, e iria ter com os investigadores agrícolas para aprender modos de melhorar a sua exploração. Lançou-se na apicultura. Plantou cana-de-açúcar. Arranjou 50 galinhas e largou-as à solta na quinta. E foi então que descobriu uma verdadeira pérola: o feijão de soja.

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O feijão de soja não era muito popular na zona ocidental do Quénia. Era uma novidade, um desconhecido. No entanto, em anos recentes e por toda a África, esta cultura começou a ganhar terreno entre os agricultores, particularmente na Nigéria e no Zimbabué. Nos últimos anos, em Eshivanze, investigadores do Instituto de Fertilidade e Biologia do Solo Tropical do Centro Internacional para a Agricultura Tropical (TSBFCIAT) começaram a mostrar a Watiti e aos agricultores seus vizinhos as vantagens que poderiam ter com esta cultura. Apresentaram três razões principais: é nutritivo e uma boa fonte de proteína; podem realizar dinheiro vendendo produtos de soja no mercado; e, talvez a melhor de todas, as plantas da soja captam nitrogénio no ar e transferem-no para o solo. Quando a planta da soja morre, deixa mais nitrogénio no solo do que havia antes.


Nesta quinta em Eshivanze, Quénia, propriedade de Ali Waiti Rapando, a dieta destas crianças melhorou espectacularmente desde que ele começou a plantar feijão de soja – por conselho dos cientistas do CIAT. Falando dos cientistas, Rapando diz: “Temos amor por eles.” Uma Paix ão para Lá do Normal . Quénia

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O feijão de soja trouxe vida à terra de Watiti. Após um só plantio da soja lado a lado com o milho, a sua produção de milho triplicou.

não têm espaço suficiente. Por isso, tudo o que plantam para ajudar o solo tem que lhes trazer outros benefícios também.”

“É extraordinário,” disse Watiti, 52 anos, sentado no seu pátio junto a um monte de espigas de milho branco a secar ao sol. “Nós gostamos mesmo dos investigadores — não, na verdade, nós amamo-los. Sem as informações deles não nos safávamos. A mim, deram-me os conhecimentos técnicos para melhorar a fertilidade do solo.”

Em primeiro lugar, foi preciso convencer os agricultores de que o feijão de soja poderia fazer parte da sua dieta alimentar. Margaret Musambi, técnica de extensão do Ministério da Agricultura do Quénia, mostrou-lhes como transformar os feijões de soja em leite de soja, iogurte de soja, bebida de soja, fritos de soja, salsichas de soja e até almôndegas de soja. Destacou também o potencial da soja como um novo rendimento para as famílias e como fonte de proteínas para os membros seropositivos de um grupo de apoio para VIH, na cidade de Mumias, no oeste do Quénia.

Recuperar os solos cansados de África tem sido um dos principais objectivos do trabalho do CGIAR, incluindo a importante pesquisa efectuada pelo Centro Internacional de Agro-Silvicultura (ICRAF) e pelo Instituto Internacional de Pesquisa Agrícola para os Trópicos Semi-Áridos (ICRISAT). Além disso, duas importantes organizações beneficentes — a Fundação Bill & Melinda Gates e a Fundação Rockefeller — criaram recentemente a Aliança para uma Revolução Verde em África, que colocou a fertilidade dos solos no topo da sua agenda. Os cientistas do CGIAR descobriram, por exemplo, que vários arbustos forrageiros podem também contribuir com nutrientes para o solo, além de fornecerem alimento nutritivo para os animais. Esse tipo de duplo objectivo foi o que tornou a soja atractiva para os agricultores. “Para os agricultores, se se quer fazer qualquer coisa pela fertilidade do solo, tem de se começar por falar do feijão de soja”, disse Jonas N. Chianu, um cientista da área socioeconómica do TSBF-CIAT, baseado em Nairobi. “Aqui, os agricultores têm muito pouca terra. Muitos não têm árvores porque

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Musambi referiu que se sente particularmente satisfeita com os benefícios obtidos pelos membros do grupo de seropositivos. “Estas pessoas estão a tornar-se tão saudáveis,” disse Musambi. “A medicação está a ajudá-los e o feijão de soja também. É verdade. Quando se come soja fica-se mais contente.” Para Chianu, o cientista, o feijão de soja também inspira sonhos. “Quando leio sobre o desenvolvimento da soja no Brasil e na Argentina, estala-me a cabeça”, disse. “O feijão de soja chegou ao Brasil em 1950. E ao Quénia, chegou em 1904. O Brasil é hoje em dia o segundo maior produtor. No Brasil, a dimensão média das explorações é de 800 hectares. No Quénia, estamos a lidar com uma multidão de pequenos agricultores. Essa é que é a diferença.” Várias fábricas do Quénia importam feijão de soja porque os agricultores locais não produzem o

suficiente. Chianu calcula a procura anual no Quénia em 150 000 toneladas; em 2008, os agricultores produziram 7 500 toneladas. Para dar resposta à procura ele calcula que seriam necessários 300 000 pequenos proprietários quenianos a cultivar soja em cerca de meio hectare cada. Ele compreende que isto pode parecer inatingível, mas refere a África Ocidental, onde mais de 500 000 agricultores, na Nigéria, Costa do Marfim e Gana, estão a produzir feijão de soja. Quase todos iniciaram a cultura da soja nos últimos 15 anos. Chianu mostrou-se particularmente entusiasmado com o potencial da soja no significativo melhoramento das colheitas de milho e outras. “Temos que procurar o que mais podemos fazer por estes agricultores,” afirmou. “Eles precisam de uma cultura para comercialização. Precisam de colheitas mais abundantes.” Watiti, o agricultor da zona ocidental do Quénia acrescenta que isso é verdade, sempre, e ainda mais em tempos de crise aguda — como o período de violência que assolou o país a seguir às contestadas eleições presidenciais do final de 2007. Por causa da agitação, Watiti e outros agricultores não conseguiram acesso às lojas de adubos. Tiveram que se remediar com fertilizantes naturais, como o estrume e resíduos de plantas de soja. “Dei graças pelo meu feijão de soja durante os distúrbios”, afirmou. “Muitos agricultores que não tinham cultivado a soja tiveram maus resultados. Mas porque eu tinha a soja, as minhas colheitas não foram assim tão más. Tive muita sorte.”


Feijão de soja em Sidada, Quénia.

Após uma manhã de trabalho ao sol, Hadija Auma Hassan, ao fundo à direita, sai acompanhada da família do seu campo de soja em Eshibanze, Quénia. Uma Paix ão para Lá do Normal . Quénia

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Produtores de lacticinios Levar o leite da Lulu ao mercado

NGECHA, Quénia — Às primeiras luzes da manhã os lavradores, embrulhados em roupas quentes contra o frio da madrugada, começaram a aparecer na estrada de terra batida. Subiam e desciam os montes, numa parada constante, todos transportando bilhas de leite. Os pássaros canoros chilreavam. Quem tinha sapatos deixava no ar o som dos passos no saibro. Eram os únicos sons. Parecia uma evocação de outras eras, mas na realidade a cena representava algo de relativamente recente — e algo de bom para os lavradores, para os 30 000 comerciantes informais de leite e para as legiões de bebedores de leite do Quénia. Os agricultores iam levar o seu leite a um ponto de recolha em Ngecha, uma aldeia nos arredores da capital, Nairobi, onde a sua cooperativa vendia o leite a uma rede de vendedores informais e para uma empresa de lacticínios, que o iria pasteurizar. Escassos anos antes, este negócio simples não poderia ter acontecido. Os vendedores informais, por quem passam mais de quatro-quintos de todo o leite vendido no Quénia, eram proibidos e continuamente perseguidos pela polícia, obrigando-os a trabalhar às escondidas. Alguns eram presos; outros escapavam aos lavradores sem lhes pagarem; e alguns acabavam com leite estragado. Os quenianos, que bebem uma média de 100 litros de leite por ano, nunca tinham a certeza da qualidade do seu leite.

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A ajuda chegou de um quadrante inesperado: cientistas. Investigadores do Instituto Internacional de Investigação Pecuária (ILRI), baseados em Nairobi, juntamente com colegas do Ministério de Desenvolvimento Pecuário do Quénia e do Instituto Agrícola do Quénia, formaram o Projecto de Lacticínios de Pequenos Produtores em 1997. Ao longo dos oito anos seguintes, o trabalho do grupo deu origem a cenários como o de Ngecha. Primeiro, a pesquisa do ILRI demonstrou que o leite cru vendido pelos comerciantes informais não era perigoso para a saúde pública, desde que agricultores e vendedores observassem práticas higiénicas. Os parceiros imaginaram então um sistema em que formadores ensinariam aos vendedores a melhor maneira de manusear e testar o leite. Em contrapartida, os vendedores receberiam licenças para a venda de leite. No entanto, os reguladores opuseram-se à ideia. Queriam que todo o leite fosse pasteurizado.


Todas as manhãs, logo pelo nascer do sol, em Ngecha, Quénia, uma aldeia próxima de Nairobi, os compradores de leite vêm comprar leite fresco aos agricultores vizinhos. Uma Paix ão para Lá do Normal . Quénia

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“Tivemos algumas brigas com o ILRI por causa disto”, confessou Machira Gichohi, directora do Conselho para os Lacticínios do Quénia. “Mas por fim concordámos que este sistema de dar formação aos vendedores informais era a melhor maneira de ir em frente.” Gichohi disse que o ponto de viragem foi a pesquisa do ILRI, demonstrando que o leite cru é seguro, especialmente se houver salvaguardas no produtor e pelos vendedores. A pesquisa identificou múltiplos beneficiários — pelo menos USD 33,5 milhões por ano para a economia do Quénia, sendo que mais de metade desse montante vai para os 800 000 pequenos proprietários cujas famílias dependem dos rendimentos dos lacticínios. Os vendedores informais não só criaram concorrência no mercado, mas em geral oferecem ao produtor preços mais elevados. Por outro lado, vendem o leite não pasteurizado aos consumidores a preço mais baixo, por vezes a metade do preço do pasteurizado. Esta pesquisa ajudou ainda, indirectamente, a incentivar a reforma dos mercados informais do leite em toda a região. No Ruanda, Uganda e Tanzânia, os mercados informais representam mais de 90 por cento de todo o leite vendido e os reguladores tomaram medidas, em anos recentes, para supervisionar o sector informal — mas não para o impedir. Eles sabiam que os dados do Quénia provavam que o leite não pasteurizado é seguro quando adequadamente manuseado. A agricultora de Ngechi, Margaret Nungari, de 52 anos, beneficiou grandemente com o sistema. Nungari, uma mãe sozinha e com quatro filhos, contou que anteriormente tinha tido más experiências com os vendedores, que não lhe pagavam o leite. Mas isso acabou depois de eles passarem a ser licenciados.

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“Os meus filhos foram educados com dinheiro do leite”, disse ela, passeando ao longo de leiras de cenouras, couves e espinafres na sua quinta, que tem apenas 0,8 hectares. E acrescentou que os investigadores também a tinham ajudado de outras formas. Por exemplo, ensinaram-lhe a alimentação adequada para as vacas, incluindo dar-lhes capim elefante Napier, e doses de ração comprada, logo após as vacas parirem. Contou que a produção de uma das vacas subiu de 8 para 25 litros por dia. “Antes, eu tinha que trabalhar muito e ganhava ... pouco”, comentou. “Agora, trabalho menos e ganho mais.” Joseph Kibunja, 55 anos, um agricultor vizinho, disse que a investigação o ajudou de outros modos. Contou que os cientistas lhe tinham recomendado misturar o excremento das galinhas na alimentação das vacas. Kibunja tem actualmente 400 galinhas; as suas cinco vacas — Lulu, Nyagaki, Genesis, Suzie e Beauty — comem ração e erva misturada com excremento e, segundo ele, as vacas produzem agora mais leite. Depois de ouvir Kibunja, Francis Wanyoike, um investigador do ILRI que estuda os mercados de animais de quinta, afirma que as explorações precisam desta integração. “Esta quinta é um excelente exemplo — lacticínios, aves e horticultura, todos interagindo muito bem.” Kibunja disse que a regulamentação do mercado informal do leite foi um grande progresso para os agricultores. “Ao valorizar os comerciantes informais do leite, criou-se concorrência”, afirmou. “Agora podemos obter um preço melhor para o nosso leite.” O sistema não deixa de ter as suas falhas. Alguns vendedores recusaram-se a cumprir o processo de

licenciamento. O governo está a ponderar a hipótese de criar um nome de marca para o leite dos vendedores licenciados, esperando que assim criem uma preferência junto dos consumidores. De qualquer modo, este novo modo de fazer as coisas está a dar muito bons resultados. Tudo começa com alguém com a formadora Teresia Wanjiku Kamau. “Eu dou formação aos vendedores, ao longo de vários dias, sobre o modo de manusear o leite em segurança”, explicou. “Isso implica também ensinar o manuseamento do leite ao produtor. Também os ensinei a fazer testes ao leite, o que veio melhorar a qualidade.” Esta formação tem ajudado vendedores, como Gabriel Karanja, 53 anos e pai de oito crianças, que agora vende 90 litros de leite por dia, quando antes eram apenas cinco ou seis litros por dia, no tempo em que o seu trabalho era ilegal. “Agora é tudo muito diferente”, disse ele. “Já não tenho medo de nada. Dantes era como se fosse um ladrão na minha própria terra. Agora vendemos o leite livremente.” Os consumidores parecem satisfeitos. Mohamed Shuria, 38 anos, compra dois litros de leite por dia a Karanja. Disse que tem tanta confiança no vendedor que, “quando o nosso filho mais novo deixou de ter o leite da mãe, eu pedi ao Sr. Karanja leite da vaca que ele próprio tem, para alimentar o meu rapaz.” Karanja abre um largo sorriso, recordando o pedido de Shuria. “Esta pesquisa tem-me ajudado muito,” comentou mais tarde. “Quatro dos meus filhos já fizeram a escola secundária. O rendimento do leite é que me permitiu isto — o leite e os investigadores.”


Estas vacas, na quinta de Muchina, em Gitangu, Quénia, produzem leite que é vendido a comerciantes informais — uma combinação que foi em parte conseguida pelos cientistas do ILRI.

Na Cooperativa Agropecuária de Limuru, rapazes carregam leite fresco na caixa de uma camioneta em Ngecha, Quénia.

Maragaret Nlungari faz uma festa à sua vaca, pois o dinheiro do leite permitiu que os filhos frequentassem a escola em Gitangou, Quénia.

Ajudado pelo seu burro, um agricultor transporta cerca de 25 quilos de leite para um ponto de recolha local, em Ngecha, Quénia.

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Uganda


Josephine Okot KAMPALA, Uganda — Josephine Okot tem conquistado os mais extraordinários desafios. O pai morreu quando tinha seis anos. Uma guerra civil rebentou perto da sua cidade natal no norte do Uganda quando tinha 19 anos — e não mais parou durante 20 anos. E, aos 37, lançou aqui uma empresa de sementes, lutando para abrir caminho numa indústria dominada pelos homens.

“O rosto delas diz tudo”

Mas, quatro anos depois de iniciar o negócio, viu-se perante um obstáculo que finalmente parecia esgotar as suas energias: o elevado custo dos empréstimos bancários. Sentada no seu pequeno escritório na Victoria Seeds Ltd., Okot disse que queria continuar a expandir a empresa — tinha já atingido um volume de negócios de 2 milhões de dólares — mas os bancos estavam a dar cabo do seu negócio. “Sabe qual é o juro que estão a cobrar?” pergunta. “22 a 24 porcento!” Além disso, acrescentou, os investidores em capital de risco querem 16 por cento dos seus lucros. Ainda assim Okot, 41 anos, não aceita derrota. Não faz parte do seu carácter. Significaria abandonar centenas de pessoas a quem muito estima. Mas representa enfrentar mais uma luta, numa lista que já vai longa. Nasceu em Gulu, a filha do meio entre sete. A mãe, professora, criou-os a todos sozinha. “Não era

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assim muito estranho,” lembra Okot. “A maioria dos meus amigos não tinha pai — muitos haviam sido mortos por um regime brutal. Enquanto crescia, fui observando que as mulheres trabalhavam muito e que tudo era muito duro para elas. Se casam, todos os seus bens ficam a pertencer aos maridos. Na velhice, tudo é controlado pelos filhos homens.” Okot, solteira e sem filhos, diz que era uma “vida de injustiças.” Mas depois descobriu uma maneira de melhorar a vida: iniciar um negócio que desse aos agricultores mais vulneráveis algo que eles pudessem vender — sementes, o factor mais importante na agricultura. Através de formação e aconselhamento do Programa Género e Diversidade do CGIAR, ela criou a empresa e começou a ensinar aos pequenos proprietários agrícolas como gerir operações produtivas. A seguir, comprou-lhes sementes. Em meados de 2008, tinha 41 empregados a tempo inteiro e mais 39 em part-time (70 por cento dos quais mulheres) e comprava as sementes a cerca de 800 reprodutores (a grande maioria dos


quais mulheres). Pelo seu trabalho, foi uma das duas pessoas escolhidas para o prestigiado prémio Yara 2007, para uma Revolução Verde em África. Levou a sua mãe, Rose Ethel, à cerimónia da entrega dos prémios em Oslo. “Ela ficou muito feliz,” conta Okot. “Quando voltou ao Uganda as amigas tratavam-na como se ela fosse a mãe do Salvador!” Riu-se, saboreando a satisfação de ter dado algo em retorno a sua mãe — tal como o tem feito a outras mulheres rurais. “Quando vejo estas mulheres produtoras, o rosto delas ... diz tudo”, afirma Okot. “Todas elas estão a mandar filhos à escola com o dinheiro ganho com as sementes. Algumas até já construíram casas com ele.” Apesar dos altos juros bancários, Okot construiu recentemente uma nova fábrica de sementes em Gulu. Tem esperança que ela fomente o incremento agrícola. “Tenho mesmo é que continuar a lutar”, remata ela. “Pode ser difícil — a menos que se tenha uma paixão por aquilo que vai além do normal.”

A filosofia da empresária do comércio de sementes, Josephine Okot é: “Tenho que continuar a lutar.” Uma Paix ão para Lá do Normal . UGANDA

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Ruanda


Captacao da Agua da Chuva Queremos ajudar os agricultores a sair da pobreza

NTARAMA, Ruanda — Os agricultores mostravam-se cépticos. Quem é que fazia cultivo durante a estação seca? Ninguém, na vizinhança, nem nenhum dos seus antepassados. Mas os cientistas vinham agora dizer que sim, que podiam — desde que fizessem uma pequena albufeira para guardar as águas da estação das chuvas. Sessenta e dois agricultores deste pequeno país da África Central concordaram em tentar — vieram trabalhadores cavar buracos e instalaram bombas e os agricultores semearam hortaliças. E ficaram surpreendidos. As hortaliças, bem irrigadas, produziam colheitas elevadas — e os agricultores ainda tinham restos de água para oferecer aos seus vizinhos, um gesto de boa vontade e um investimento para bons negócios. “Não se vêem muitos legumes ou frutos nesta área, porque é tão seca”, explicou Aimé Marie Kayigwisagye, 27 anos, mãe de uma criança, junto ao seu novo pequeno lago, forrado a plástico preto para reter a água. “Mas nesta estação seca, eu tive couves. O que nunca acontecera antes. Plantei tomates depois das couves neste mesmo lote de terra e veja o que está a acontecer.” Em volta dos seus pés jaziam gordos tomates — vermelhos, alaranjados e ainda verdes. Noutro

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Uma Paix ão para Lá do Normal . Ruanda

campo, papaieiras tinham suculentos frutos em crescimento e floresciam mangueiras anãs ainda a uma estação de distância da época de produção. Kayigwisagye comentou que nos próximos tempos iria ter na horta um excedente de tomate, que tencionava vender no mercado, numa altura em que quase ninguém na zona tinha colheitas de legumes frescos. As couves, que normalmente eram a USD 0,10 por cabeça, venderam-se pelo dobro no mercado. Os tomates, que na estação se vendem por 0,75 o quilo, valiam agora USD 1.10. Kasigwisagye referiu que o que ganhou com os legumes lhe permitiu comprar coisas que nunca antes tivera em casa. Coisas tão simples como o açúcar. “Ponho açúcar no chá”, disse ela, quase a desculpar-se. “E na verdade gosto muito.”


Desde que construiu uma albufeira para recolher a รกgua das chuvas, a agricultora Edith Nyiramana diz que conseguiu elevar muito o valor nutricional dos alimentos que os seus filhos consomem em in Ntarama, Ruanda. Uma Paix รฃo para Lรก do Normal . Ruanda

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O governo do Ruanda apoiou o projecto, de captação de água da chuva, no valor de USD 300 000, que foi em parte dirigido por cientistas do Centro Internacional de Agro-Silvicultura ( (ICRAF). Os investigadores do ICRAF prestaram apoio técnico e formação, supervisionaram o uso das albufeiras e ajudaram os agricultores a plantar novas mangueiras e papaieiras. “Este projecto ajuda os agricultores de diversas formas”, explicou David Kagoro, director de operações do ICRAF no Ruanda. “Ao recolher a água da chuva, protege-se o solo do arrastamento e criam-se reservas para uso na irrigação de culturas. Os agricultores podem assim ter colheitas mesmo em condições de seca.” O projecto, que foi completado em 2007, teve tanto sucesso que o governo lançou, quase imediatamente, um projecto de USD 200 milhões a aplicar durante a próxima década. O governo garantiu rapidamente cerca de metade do financiamento. A intenção é de construir 190 lagos ou pequenas represas; cada uma poderá irrigar cerca de 100 hectares de terra. O projecto supervisionado pelo ICRAF tinha, em comparação, capacidade para irrigar cerca de meio hectare por cada pequena albufeira. “O primeiro projecto teve muito sucesso”, disse Oda Gasinzigwa, do Ministério da Agricultura e Recursos Animais, que ajudou a coordenar a iniciativa. “No princípio, os nossos agricultores não percebiam o que se ia passar. Não conseguiam imaginar o plantio de legumes durante a estação seca. Agora, com esta segurança da água, eles estão a acalentar novos sonhos.” O projecto do Ruanda é apenas uma de várias iniciativas para a captação de água, lançadas pelos Centros apoiado pelo CGIAR. Muitos dos projectos mais ambiciosos foram realizados pelo Instituto Internacional de Gestão da Água (IWMI), incluindo os

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trabalhos em vários projectos de captação de água em algumas das maiores bacias hidrográficas de África — Nilo na África Oriental, Níger na África Ocidental e o Limpopo na África Meridional. O ICRAF, trabalhando em conjugação com o IWMI, tem tido também vários êxitos em partes da Etiópia e do Quénia. No sul do Quénia, por exemplo, um projecto que construiu 80 tanques para captação de água da chuva, trouxe múltiplos benefícios aos agricultores, numa comunidade Masai. Mais importante ainda, os tanques eliminaram a necessidade de ir buscar longe a água, poupando às mulheres uma média de três horas de caminho por dia que eram dedicadas a ir buscar água. Outros benefícios: a saúde das mulheres, que deixou de ser prejudicada por longas caminhadas com cântaros de 20 litros; e também a sua segurança, pois deixaram de enfrentar os esporádicos ataques de animais selvagens, incluindo leopardos e búfalos, nas suas caminhadas de madrugada para ir buscar água. Maimbo Mabanga Malesu, coordenador de programas do ICRAF para a África Oriental e Meridional e Índia, afirmou que o projecto precisa de ser substancialmente incrementado. “A maioria dos governos está a aproveitar menos de 5 por cento do potencial para captação de água da chuva”, afirmou Malesu. “Há uma premente necessidade de investimento em termos de conhecimento, competências e infra-estruturas, para aproveitar este potencial.” Em Ntarama, cerca de 20 quilómetros a sul da capital, Kigali, o impacto das albufeiras revela-se grande. Vários aldeões estão a considerar instalar o seu próprio reservatório. “O problema é conseguir o equipamento — e também arranjar o dinheiro”, disse Jean Pierre

Mbonigaba, de 38 anos. Cada reservatório custa USD 1 000 em materiais. “Vê-se uma tão grande melhoria na vida das pessoas por causa das albufeiras. As famílias consomem mais legumes. Comprar sabão, era demasiado caro — mas as pessoas com albufeiras podem fazê-lo. Há um grande interesse em instalar mais.” Ali perto, Edith Nyiramana, de 33 anos, contou que a sua horta tinha, até agora, aumentado muito o valor nutricional das refeições da família. Tem três filhos e está também a criar três órfãos cujos pais morreram no genocídio de 1994, que causou a morte de cerca de 1 milhão de pessoas. “Colhi cebolas, cenouras, beringelas e tomates”, contou. Ter tudo isto em casa melhorou muito a variedade de alimentos para dar às crianças, o que me torna muito feliz.” Kogoro, o investigador do ICRAF, afirma que o projecto deu resultados muito rápidos. Bastaram poucos meses da estação seca para os agricultores verificarem os benefícios. “O governo aqui tem apoiado muito — e eles não querem esperar. Querem seguir em frente rapidamente”, disse. “Estas albufeiras produziram legumes e frutos que ninguém antes via. É um trabalho realmente importante. Queremos ajudar os agricultores a sair da pobreza e isso é o que este projecto está a fazer.”


Aime Marie Kayigwisagye, 27 anos, plantou couves e tomates durante a estação seca, em Ntarama, Ruanda — o que só se tornou possível graças ao seu novo lago de água da chuva. Uma Paix ão para Lá do Normal . Ruanda

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Feijao-de-trepar

“Em toda a parte, todos os dias... feijão, feijão, feijão”

CYANIKA, Ruanda – Para um ruandês, uma refeição sem feijão não é realmente uma refeição. Um agricultor que não plante feijoeiros é visto como um tolo, até mesmo irresponsável – afinal, como há-de ele, ou ela, pôr feijão na mesa duas vezes ao dia? Os naturais deste pequeno país da África Central gostam tanto de feijão que consomem, em média, 60 quilos por ano – o mais elevado consumo de todo o mundo. Deste modo, quando um agente de extensão agrícola trouxe sementes de feijão-de-trepar de alta produtividade a esta comunidade montanhosa e intensamente cultivada, em 1996, os aldeões viram nele o portador de uma oferenda preciosa. “Antes disso, eu plantava feijão arbustivo e feijão-de-trepar”, disse Augustin Shiragahinda, de 51 anos, chefe de uma associação local de agricultores. “Mas, depois de aquele agente vir cá, passei só para feijão-de-trepar. Como não havia de o fazer, depois de ver as novas plantas e a quantidade de feijões que produziam?” O feijão-de-trepar teve a sua primeira grande oportunidade aqui em meados da década de 80. Desde então, os cientistas do Centro Internacional para a Agricultura Tropical (CIAT) têm ajudado muito a disseminar os feijões de estaca em 18 países de África. Em muitos locais, nem foi preciso grande promoção de vendas; o

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produto falava por si só, produzindo três ou quatro vezes a colheita do feijão arbustivo. “Quando trazemos novas variedades de feijão-detrepar para um local, disse-nos um lavrador que é como se Deus nos tivesse enviado”, contou Robin Buruchara, um patologista de plantas e coordenador do CIAT para a África Subsariana. “É como nas cidades: quanto não se tem terra que chegue, constrói-se em altura. Quando não temos terra suficiente para o feijão, plantamos feijão-de-trepar.” Há mais de três décadas que o CGIAR procura modos de obter variedades de feijoeiro de mais elevada produtividade. O CIAT, um dos 15 Centros apoiados pelo grupo, não só introduziu feião-detrepar em África, como também fez pesquisas inovadoras para lutar contra a podridão radicular que afectou gravemente as culturas no Ruanda, na parte ocidental do Quénia e ainda noutros países. Outro Centro do CGIAR, o Centro Internacional de


Nas belas colinas do Ruanda ocidental, perto de Cyanika, um agricultor caminha junto a montes plantados recentemente com feijoeiros-de-trepar, que produzem três a quatro vezes mais que as espécies arbustivas. Uma Paix ão para Lá do Normal . Ruanda

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Investigação Agrícola em Áreas Secas (ICARDA) introduziu a fava e novas variedades de lentilhas em algumas das mais pobres e mais flageladas áreas de seca da África Oriental; estudos mostram que a fava, que consegue obter preços mais elevados nos mercados que outros tipos de feijão, ajudou a reduzir a pobreza em 12 por cento no Sudão e 3 por cento na Etiópia. Em toda a África, o feijão é uma cultura essencial a muitas famílias. No Ruanda, esta afirmação só peca por defeito. As razões deste amor ao feijão são numerosas: tem sabor agradável; é uma fonte de proteína importante; os feijoeiros não necessitam de fertilizantes dispendiosos; e não há falta de ruandeses para comprar o feijão nos mercados. Além disso, muitos dizem simplesmente que é o seu alimento tradicional — por outras palavras, é o que as mães lhes serviam desde que começavam a gatinhar. No entanto, secas periódicas e a infestação de pragas reduzem consideravelmente a produção de tempo a tempo. E depois, o genocídio de 1994, que dizimou cerca de 1 milhão de pessoas, mudou tudo nesta terra — desde a estrutura do poder, à interacção social e aos modos de vida. Para os agricultores, a principal preocupação depois do genocídio, foi tentar arrancar de novo o seu sustento à terra. E um grande problema era que o stock de germoplasma do país — as traves mestras para criar novas variedades — fora praticamente eliminado. Os lavradores tinham sementes, mas a maioria de fraca qualidade. Em 1995, cientistas do CIAT entraram rapidamente em acção para começar a trazer para o Ruanda sementes e materiais de qualidade. Recolheram germoplasma de feijão melhorado, conservado por redes de feijão na África Oriental e Central. Trouxeram novo germoplasma da América Latina.

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Quando o agente de extensão chegou a Cyanika, que fica situada nas proximidades do Parque Nacional dos Vulcões, no noroeste do Ruanda, levava consigo sementes que provinham de outras paragens, talvez até do longínquo México. Shiragahinda, o líder da associação de agricultores, lembra-se bem desse tempo. Disse que quase toda a gente na sua cooperativa tinha imediatamente mudado para o feião-de-trepar, e os resultados positivos tinham surgido rapidamente. Antes de 1994, os seus feijoeiros arbustivos produziam 400 quilos por acre (0,4 hectare); agora, os seus feijoeiros-de-trepar produzem 1,5 toneladas, quase o quádruplo da produtividade. Com os lucros do feijão, Shiragahinda, como muitos outros aqui, está a melhorar a sua vida. Está a construir uma nova casa (dando a antiga ao filho), comprou duas vacas (que produzem 18 litros de leite por dia, sendo 15 litros para o mercado e três para consumo doméstico) e paga as taxas escolares dos seus oito filhos. Na vizinha aldeia de Cyuve, os agricultores também construíram as suas vidas com base no feijão. Emmanuel Serukata, de 71 anos, emergiu das traseiras da sua casa de cinco divisões, onde centenas de caules secos de feião-de-trepar repousam encostados a dois lados da estrutura. “Ele tem feijões por todo o lado!” diz Mukishi M. Pyndji, um patologista de plantas do CIAT e coordenador da Rede de Investigação de Feijão da África Central e Oriental (ECABREN). “É verdade, sabe? No Ruanda não há vida sem feijão.” “Por toda a parte, todos os dias”, acrescentou Felicite Nsanzabera, do programa de feijoeiros para o Ruanda do Instituto Nacional de Pesquisa Agrícola (ISAR), que caminhava a seu lado.

“Feijão, feijão, feijão,” replicou Pyndji. Ambos riram com vontade. Nsanzabera quebrou uma vagem entre os dedos, revelando uns lindos feijões salpicados de vermelho — tecnicamente conhecidos como RWV-296, um dos feijões-detrepar de mais elevada produção do país. “Os agricultores fazem assim quando vêem uma boa variedade,” gracejou, abrindo outra vagem e fingindo enfiar as sementes no bolso da camisa. “É assim que se multiplicam por todo o país.” Serukata, o lavrador, conta que o feijão o ajudou, a ele e a sua mulher Alphonsine, a comprar duas cabras e a pôr dois filhos na escola secundária. Explicou que têm utilizado várias das variedades do ISAR, que permitiram aumentar em muito a produção. Mas para muitos agricultores, a alegria de receber mais dinheiro pelas suas colheitas só é comparável com o prazer de comer feijão ao almoço e ao jantar. Em Cyanika, Shiragahinda, o lavrador, diz que faz duas refeições por dia à base de feijão desde que a sua memória alcança. ``Bom, talvez tenha falhado o feijão numas poucas refeições antes da colheita, durante uma seca nos anos 90”, comenta. Sentada a seu lado sua mulher, Janine Nyirabakwiye, interpõe rapidamente: “Não, nessa altura não falhaste nenhuma.” “Bem, eu… parece-me...” “Nunca,” disse ela. “Tu nunca viveste um dia sem feijão.” E o casal riu, reconhecendo assim a importância deste esteio nas suas vidas.


Um agricultor mostra uma haste de feijoeiro-de-trepar, exibindo a sua rica produção.

Emmanuel Serukata, 71 anos, diz que o feijão-de-trepar possibilitou que ele e sua mulher comprassem duas cabras e tivessem mantido dois filhos na escola secundária. Uma Paix ão para Lá do Normal . Ruanda

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Tanzania


Sistemas de sementes Levar sementes de um para centenas de campos

MKONOO, Tanzânia — Tudo começou com um agricultor e uma mão cheia de sementes de grão-de-bico.

Há quase meio século, um agricultor recebeu essas sementes da Índia e, vendo que elas produziram um monte de grãos-de-bico, passou sementes a cinco outros agricultores. Esses, por sua vez passaram-nas a 20 e os 20 a 50 e em breve o grão-de-bico era a grande voga nesta região do norte da Tanzânia, perto da famosa reserva natural de Serengeti. A região de Arusha tornou-se a capital do grão-de-bico e os lavradores usavam os seus lucros para comprar tractores, construir casas e pagar para mondar os campos de cultura. Mas esta maneira informal de montar um sistema de distribuição de sementes, embora magnífica na sua simplicidade, não afastava um problema: as moléstias. Em cada estação, surgiam moléstias como o fusário, que evoluiu e encontrou novas maneiras de atacar o que se tinha tornado numa variedade local de grão-de-bico. As culturas literalmente murchavam. Grupos de agricultores horrorizados viraram-se para os peritos — reprodutores apoiados pelo CGIAR, que tinham desenvolvido variedades resistentes a moléstias e pragas. Mas os cientistas tinham por sua vez um problema: tinham capacidade para criar a melhor semente do mundo, mas como fazê-la chegar aos agricultores?

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Resolver este problema era o mais importante. É difícil subestimar o valor das sementes. Em tempos de desastres naturais, dizem os velhos experientes de África, os agricultores salvam em primeiro lugar a família e em segundo as sementes. As sementes são algo de tão importante que os bancos de sementes de todo o mundo enviaram, em princípios de 2008 e com pompa e circunstância, centenas de milhar de variedades para um cofre-forte de sementes subterrâneo; esse cofre-forte foi escavado nas profundezas de uma montanha no Círculo Polar Árctico — os peritos queriam um local tão frio e remoto quanto possível para assegurar a sobrevivência das sementes a toda a espécie de ameaças. O historial de países que instalaram sistemas de sementes e do apoio de doadores de sementes em situações de emergência não é brilhante. Ainda assim, tem havido alguns casos de sucesso e, dada a sua importância, os cientistas estão a utilizá-los como base. Na Tanzânia, e em vários outros países africanos, os investigadores ajudaram a montar sistemas de sementes que permitem uma distribuição alargada daquilo a que chamam sementes de origem — sementes cuidadosamente


Num campo de ensaio de guandu do ICRISAT, em Sakila, Tanzânia, Mary Zakaria, à esquerda, e Elishilia Mollel examinam as diferentes variedades na esperança de escolher a que lhes dê a maior produção. Uma Paix ão para Lá do Normal . Tanzânia

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produzidas por reprodutores, que as passam a agricultores ou a empresas para multiplicação. Em muitos destes novos sistemas de sementes, os cientistas ofereceram as sementes aos agricultores contra uma promessa: eles dariam pelo menos a mesma quantidade de semente a outros agricultores após a sua primeira colheita. De certo modo, eles estariam a seguir o exemplo daquele lavrador que plantou as primeiras sementes de grão-de-bico em Mkonoo. Vários Centros do CGIAR — o Instituto Internacional de Pesquisa Agrícola para os Trópicos Semi-Áridos (ICRISAT), o Centro Internacional de Melhoramento do Milho e do Trigo (CIMMYT) e o Centro Internacional para a Agricultura Tropical (CIAT) entre eles — dedicaram mais de duas décadas a investigar e ajudar a instalar sistemas de sementes por toda a África. O ICRISAT, por exemplo iniciou um fundo rotativo no Malawi em 1999, no qual as receitas da venda de sementes são reinjectadas para préfinanciar a produção da estação seguinte. Estudos indicam que o fundo tem tido resultados sustentáveis: 80 por cento dos agricultores, em duas regiões do Malawi, tiveram acesso a semente de CG7, uma variedade melhorada de amendoim, quando foi lançada e, desde então, começaram a adoptar uma variedade mais recente, com melhor resistência às moléstias (Nsinjiro). Também em Moçambique, investigadores do ICRISAT ajudaram a montar um sistema de sementes completo — chegando mesmo a assegurar o financiamento para uma fábrica de processamento de sementes e a aceitar dirigir temporariamente a fábrica enquanto se desenvolviam conhecimentos a nível local para que outros pudessem assumir a direcção. Na aldeia de Leonde, cerca de 200 quilómetros a norte da capital, Maputo, cientistas do ICRISAT

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têm estado também a trabalhar com uma empresa agrícola, a Mocfer Indústrias Alimentares (MIA), para testar novas variedades de grão-de-bico e de feijão-guandu, na esperança de ajudar a indústria a montar um negócio de sementes com estas culturas. “É a primeira vez que tentamos criar feijão-guandu no sul do país,” refere Wilson Leonardo, um especialista de sementes do ICRISAT baseado em Maputo, inspeccionando um campo experimental com viçosas plantas de guandu. “Estou bem contente com o bom comportamento das plantas. Os agricultores daqui ainda não confiam muito nesta cultura, de modo que, se queremos mudar as coisas, temos de lhes provar que podem ganhar dinheiro com ela.” Também presente, Lorena Pedro Francisco, técnica de investigação do MIA, referiu que a parceria entre o ICRISAT e o Instituto de Investigação Agrária de Moçambique ( IIAM) tem ajudado muito a empresa. “Ajudaram-nos a escolher as melhores variedades”. Richard Jones, director adjunto regional do ICRISAT para a África Oriental e Meridional referiu que este tipo de relacionamentos, ainda que distante dos laboratórios, pode ter uma importância crítica no desenvolvimento de um sistema de sementes em cadeia — elos que são estabelecidos entre cientistas, produtores, agricultores reprodutores e compradores. “Queremos encontrar oportunidades em cada país”, afirmou Jones num dia de Agosto de 2008, rodeado por um campo de grão-de-bico em Mkonoo. “Se olharmos para o Malawi, onde isto se processa já há vários anos, vemos os benefícios das estratégias de incrementação.” Em Mkonoo, Godson Laisser, de 65 anos, pai de oito filhos e agricultor há 45 anos, disse que quando os investigadores trouxeram, em épocas recentes,

novas variedades de grão-de-bico para talhões experimentais, ele e os outros quiseram as sementes o mais depressa possível. “Eram muito melhores que as sementes antigas”, disse. Mas os cientistas trouxeram mais que sementes. Ensinaram também as famílias a preparar diversas receitas com o grão-de-bico (batatas fritas às rodelas, passadas por farinha de grão-de-bico, são uma das preferidas) e ajudaram-nas a formar uma associação. “Formar a associação juntou-nos e ajudou-nos a conseguir um bom preço para o grão-de-bico” , disse Laisser. “Deixámos de vender individualmente.” A iniciativa está a correr tão bem que a associação de produtores de grão-de-bico de Mkonoo está a pensar vender sementes do outro lado da fronteira, no Quénia. Jones disse que os agricultores são bons empreendedores — uma característica que ajuda a construir um sistema de sementes. “Temos tido bons resultados com estas novas variedades,” disse Laisser. “Mas esperamos vir a ter resultados ainda melhores.”


O agricultor Elishilia Mollel levanta um ramo de guandu em Sakila, Tanzânia. Cabras caminham junto a um campo de ensaio de grão-de-bico do ICRISAT em Mkonoo, Tanzânia.

Uma mulher rural caminha através de um campo de grão-de-bico em Mkonoo, Tanzânia, equilibrando água à cabeça, transportando uma bacia com legumes e ainda vigiando uma cabrinha. Uma Paix ão para Lá do Normal . Tanzânia

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Said Silim SAKILA, Tanzânia — Em 1990, com 40 anos de idade, Said N. Silim pode olhar para trás, para a sua vida, e ver muita coisa realizada, especialmente atendendo às dificuldades da sua infância. Cresceu no norte rural do Uganda, um de nove filhos. Quando era ainda muito jovem, seu pai, que era comerciante, morreu.

“Como é que se pode retribuir à sociedade?”

Silim acreditava que a única forma de escapar à pobreza era através dos livros e por isso trabalhou para cumprir todo o sistema educativo, concentrando-se na agricultura e licenciando-se na Universidade Makerera, em Kampala, e na Universidade de Cartum, no Sudão, e, finalmente, obtendo o doutoramento em fisiologia das culturas na Universidade de Nottingham, no Reino Unido. Foi essa educação que lhe permitiu obter bons empregos: primeiro como fisiologista e agrónomo do Centro Internacional de Pesquisa Agrícola em Áreas Secas (ICARDA), baseado na Síria; e mais tarde, nos finais de 1989, foi enviado para a Índia pelo Instituto Internacional de Pesquisa Agrícola para os Trópicos Semi-Áridos (ICRISAT).

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processo que trouxe Silim e a sua família de volta a África, onde ele sentia que podia dar algo de volta. E fê-lo, realmente. Quase duas décadas depois, Silim é o director regional para a África Oriental e Meridional do ICRISAT, com base em Nairobi, superintendendo o trabalho de 37 cientistas no Quénia, Malawi, Moçambique e Zimbabué. Como gestor, tem ajudado a formar um quadro de cientistas africanos e a impulsionar programas para dar maior poder económico às mulheres agricultoras.

Mas um dia, no ano a seguir, Amna, a sua filha de cinco anos perguntou-lhe: “Pai, como é que se pode retribuir à sociedade?”

Mas o seu trabalho de pesquisa tem atraído maior atenção. Silim foi um dos primeiros cientistas em campo a reconhecer, na África, que as temperaturas estavam a tornar-se mais elevadas em muitas áreas do continente. Já desde 1994, três anos apenas após o seu regresso a África, que ele estuda os impactos das mudanças climáticas nas culturas.

Aparentemente, ela tinha-o ouvido falar sobre o seu desejo de fazer qualquer coisa mais. A questão deu-lhe pausa — e ajudou a iniciar um

Examinou as complexas interligações entre temperatura, floração das culturas, elevação e duração da luz solar, utilizando a cultura do


feijão-guandu — um alimento popular no Sudeste Asiático que se usa numa preparação culinária chamada “dal”. Silim debruçou-se sobre os padrões de chuva na zona oriental do Quénia e no norte da Tanzânia. “Os padrões estavam a sofrer alterações consideráveis”, explicou. “As durações tornavam-se mais curtas. Nesse tempo, ainda ninguém falava de alteração climática. Mas já então eu comecei a ver que era preciso direccionarmos diferentes variedades para meios ambientais diferentes. Precisávamos de ter um conjunto de variedades que pudessem ser adaptadas às alterações de temperaturas e pluviosidade.” Silim e a sua equipa de cientistas reuniram germoplasma do feijão-guandu de diferentes zonas da região. Desenvolveram diferentes variedades apropriadas a condições locais — bem como a necessidades locais. Aqui, no norte da Tanzânia, por exemplo, muitos agricultores plantam o feijão-guandu ao lado do milho. Querem uma variedade que floresça depois de colherem o milho, e não antes. Num campo de demonstração em Sakila, Silim caminha por entre as plantas do feijão-guandu, que se elevam acima da sua cabeça. Ele tinha ajudado a criar duas das variedades. Portanto, este era o seu campo, e os agricultores diziam-lhe que queriam as suas sementes. “O impacto aí está”, disse ele mais tarde. “Mas uma das coisas que eu digo às pessoas é que o sucesso é feito de 10 por cento de inteligência e 90 por cento de esforço. Eu não sou inteligente. Sou é trabalhador.” Há muitos anos, a filha do Dr. Said N. Silim perguntou-lhe: “Pai, como que é se pode retribuir à sociedade?” Desde então, ele diz que tem passado os anos a dar-lhe uma resposta através das suas acções. Uma Paix ão para Lá do Normal . Tanzânia

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Malawi


Lagoas de peixe Criar peixes para alimentar órfãos

CHIUNDA, Malawi — Nesta aldeia verdejante, de árvores e arbustos em flor, bordejada a oeste pelas majestosas Montanhas de Zomba, as bicicletas eram a primeira indicação de que algo corria bem. Não era tanto pelo estado das bicicletas: muitas delas tinham a tinta esfolada e guarda-lamas amolgados. Era pela quantidade delas. Eram dezenas as pessoas na estrada. E nesta zona rural do sul do Malawi, cerca de uma hora a norte de Blantyre, isto era invulgar. Ter uma bicicleta significa que há dinheiro suficiente para alimentar as crianças, comprar-lhes roupas e pagar as taxas escolares — o que aqui representa um grande esforço. A razão desta relativa riqueza está bem à vista ao longo da estrada: uma série de 47 lagoas de criação de peixe, propriedade de 32 agricultores. São eles que servem de principal fonte de rendimento e nutrição para a maioria dos 225 habitantes de Chiunda. “Devido a nossas lagoas de peixes, todas estas pessoas compraram bicicletas e a maioria de nós tem telemóveis”, explicou Agnes Kanyema, uma professora reformada de 59 anos. “Dois de nós até têm televisão em casa! Mas o mais importante é que já não passamos fome e não temos que mandar os rapazes para a cidade para arranjar trabalho. Arranjam emprego aqui e é melhor para eles.”

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O sucesso da criação de peixes, aqui e em várias dezenas de outras aldeias, nasceu de uma ideia dos investigadores do WorldFish Center. Em 2003, estudaram os esforços anteriores para criar estas lagoas, compreenderam por que tinham falhado os outros projectos e decidiram que poderiam fazer muito melhor. Descobriram que as lagoas de peixe existentes no Malawi rendiam uma média de uma tonelada de peixe por hectare por ano, em comparação com 20 toneladas por hectare e por ano na Ásia. Estabeleceram três princípios básicos: um, demonstrar aos agricultores que uma safra de peixe pode fazer parte integrante das suas operações, incluindo ser uma nova fonte de fertilizante e de irrigação para as culturas. Dois, tornar o projecto sustentável, entregando 1 000 pequenos peixes a cada agricultor, que passaria por sua vez 1 000 pequenos peixes a outros agricultores, após o repovoamento. E três, mostrar aos agricultores que o peixe é não só


Na aldeia de Mawila, Malawi, estes rapazes apanharam uma rede cheia de peixes — que exibem com orgulho. Uma Paix ão para Lá do Normal . MALAWI

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uma excelente fonte nutritiva para eles próprios, mas que pode também render um preço elevado no mercado se aprenderem a criar peixes de grande dimensão, através de alimentação adequada. Encontraram então um parceiro — World Vision, uma organização humanitária internacional — e definiram quem seriam os primeiros beneficiados: os afectados pela epidemia de SIDA, em particular as legiões de órfãos que dela resultaram. Os cientistas do WorldFish viram no programa uma nova forma de dar benefícios económicos e de saúde aos que sofrem de SIDA.

Mawila, estabeleceram uma quota de 300 kwachas (USD 2,25) e começaram a ajudar-se uns aos outros.

fazer carvão, o que provoca erosão e reduz o abastecimento de água.

É trabalho duro cavar as lagoas, que têm um metro de profundidade e ocupam uma área de cerca de 200 metros quadrados. Mas as pessoas aqui, como em outros lugares, juntaram-se para cavar uns para os outros.

“As pessoas compreendem agora como é importante conservar as florestas da montanha”, explica.

“Tínhamos 30 membros a cavar juntos e eles conseguiram abrir três lagoas em duas semanas”, recorda Kanyema, à porta de sua casa. “Trabalhamos desde manhã ao sol-pôr. As mulheres cozinham e os homens cavam.”

“A questão principal, para nós, era fornecer proteínas de alta qualidade às famílias”, explicou o Dr. Daniel Jamu, director regional do WorldFish para África Oriental e Meridional. “Mas era também importante conseguirmos aumentar a produção das lagoas, de modo a que ajudassem as famílias afectadas pelo VIH a ganhar dinheiro.”

A ajuda não termina aí. “Um dia, houve uma enorme chuvada. Uma das minhas lagoas ficou danificada”, recorda. “Quando as pessoas viram o meu problema vieram em grande número e todos juntos reparámos a lagoa.”

Os resultados positivos surgiram rapidamente: em cerca de três anos, em média, duplicou o rendimento de 1 200 famílias afectadas pelo VIH e pela SIDA no Malawi, além de ter aumentado consideravelmente o consumo de peixe e vegetais entre as pessoas das comunidades rurais.

Asan Chiunda, o chefe da aldeia que tem o seu nome, estava junto de uma das suas lagoas, que tinha acabado de esvaziar. Dois rapazes estavam a revolver a lama rica com as suas pás; mais tarde, levariam este solo rico em nutrientes para os campos de milho do chefe. Devido à fertilização e melhor irrigação, alguns agricultores estão agora a ter três colheitas de milho por ano, em vez de duas.

As famílias aumentaram o consumo de peixe fresco 150 por cento, elevando assim a ingestão de proteínas, cálcio, vitamina A e micronutrientes. Em 2005, o Banco Mundial citou o sucesso do programa, atribuindo-lhe um prémio Development Marketplace no valor de USD 20 000 por ter criado uma solução inovadora para problemas prementes, sociais e económicos. Em Chiunda, o projecto não só ajudou a dieta alimentar e os recursos das famílias, como também teve um papel importante em aproximar as pessoas. Os aldeões formaram o Clube de Aquacultores de

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“A aldeia está a mudar por causa destas lagoas de peixes”, disse o chefe. “Agora as pessoas têm dinheiro. Têm comida que baste. Alguns até têm telhados novos de zinco!” Mas os aldeões sabem que têm que vigiar de perto as lagoas, em especial monitorizar a fonte da água, que vem das vizinhas montanhas de Zomba. Joseph Nagoli, um investigador analista sénior do WorldFish, disse que os aldeões estão agora a tentar que ninguém corte árvores para

Um outro problema é a vida dura que os aldeões têm de enfrentar. Kanyema, a antiga professora, estava a preparar, no dia seguinte, o funeral de uma mulher chamada Mariana, que morrera de uma doença relacionada com a SIDA na vizinha aldeia de Kapito. Kanyema relatou que a mulher, que não era casada, tinha deixado quatro órfãos. Todos eles se tinham vindo instalar em casa de um parente na aldeia de Chiunda. “Faremos o que pudermos por aquelas crianças”, disse ela. “Agora vamos ter que nos reunir e ver como podemos ajudar. Mas sabemos que os podemos ajudar — por causa dos peixes.”


Um agricultor repara uma fuga no seu lago de peixes em Mawila, Malawi.

Um rapaz prepara-se para a pesca em Mawila, Malawi; o peixe tornou-se uma importante fonte de proteínas na dieta dos aldeões.

Aconchegados nas mãos, um rapazinho mostra os peixes que apanhou em Mawila e que lhe servirão de jantar.

Em Mawila, os agricultores apanham o peixe com longas redes que arrastam pelos lagos, ajudados por rapazes que puxam as redes para o outro lado. Uma Paix ão para Lá do Normal . MALAWI

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Judith Harry Mkanda, Malawi — Judith Harry estava rodeada de mulheres. No seu campo, na aldeia de Mkanda, na zona ocidental do Malawi, a sua mãe, a filha e duas mulheres da aldeia torciam pacientemente os amendoins para os libertar da planta. No pátio em frente, junto à estrada de barro vermelho, conversavam mulheres, discutindo os preços das culturas no mercado. Mas no interior da casa de tijolo havia um homem solitário – o marido de Judith, que ajudava a atar fardos de tabaco.

“Estou sempre a pensar no futuro.”

Quando lhe perguntam sobre a ajuda dele, Judith sorri. “Não lhe dêem demasiados créditos”, diz ela. “Casámos só há um mês. Faço isto sozinha há anos.” Desde o tempo em que era uma adolescente, quando deixou a escola para sustentar a sua família e também quando nasceu a sua filha, Judith esteve geralmente só. Mas, mesmo com a sua forte vontade de vencer, a sua progressão só se realizou em finais dos anos 90, quando conheceu investigadores do Instituto Internacional de Pesquisa Agrícola para os Trópicos Semi-Áridos (ICRISAT). Os cientistas deram-lhe a conhecer novas variedades de amendoim, incluindo uma, resistente à seca, chamada CG-7. Judith e uns poucos outros agricultores, sentindo que era uma oportunidade, adoptaram-na, embora muitos dos seus vizinhos continuassem a semear as variedades tradicionais.

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“Judith gosta de correr riscos”, afirma Harliex Chimutu, um homem de negócios da NASFAM, uma organização nacional de agricultores. “Sempre que aparece uma inovação ela está pronta a experimentá-la.” A variedade CG-7 prosperou nos seus campos. Em 2002, ela se tornou a maior produtora de amendoim na Associação Mchinji da NASFAM, colhendo mais de 4 000 quilos desta cultura. Nesse ano, os 15 000 membros da associação elegeram-na como presidente. Tinha apenas 28 anos, era uma mãe solteira sustentando não só a sua filha, como dois órfãos e a sua mãe. Cinco anos antes, Judith nada tinha. Agora, não só liderava uma vasta organização agrícola e batia outros agricultores em volume de produção, como ainda a sua imagem foi escolhida para comercializar os pacotes de


amendoins vendidos para a Europa. Judith tinha-se tornado no rosto do amendoim do Malawi para o mundo. Ela atribui o mérito aos investigadores do ICRISAT. Depois de lhe mostrarem novas variedades de amendoim, ensinaram-lhe também a compreender os mercados e como obter informações actualizadas sobre o preço das culturas. Essa formação deu-lhe uma nova capacidade de negociação e conhecimentos. “Aprendemos com eles novas maneiras de cultivar”, disse. “E eles ajudaram-nos a obter melhores preços para o amendoim.” Numa área dos 11 hectares de terras de cultura, sua mãe, Esther Banda, de 68 anos, espanta-se com as mudanças na agricultura desde o tempo em que era jovem. Agora, disse ela, as mulheres têm uma oportunidade de progredir. “Nos velhos tempos, não se podia falar livremente”, recorda Esther. “O sucesso dela não me surpreende, porque agora podemos mais facilmente organizar-nos.” A filha afirma que a mudança resulta de uma série de factores. Mas acima de tudo, disse Judith, um agricultor tem que ter paixão pelo seu trabalho. “Eu adoro a agricultura’’, disse ela, caminhando através dos campos de milho, tabaco, amendoins, abóboras e mandioca. “Adoro tudo aquilo que ela representa. E estou sempre a pensar no futuro.’’

Judith Harry, um agricultora-empresária que planta amendoim, diz que aprendeu “novas maneiras de produzir” com os investigadores do ICRISAT.

Que virá então a seguir? Judith, 33 anos, tem resposta imediata. “Refinar amendoim para fazer óleo alimentar’’, afirma. “E depois vendê-lo. Ouvi dizer que há um bom mercado.” Uma Paix ão para Lá do Normal . MALAWI

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Moรงambique


Batata-doce

As maravilhas secretas de uma raiz cor de laranja

BOANE, Moçambique — Os agricultores cavam o chão poeirento até ao horizonte, aqui, uns escassos quilómetros a sul de Maputo, a capital. Um canal leva água para irrigar as culturas. E no calor do meio-dia as pessoas procuram a companhia umas das outras, à sombra larga das copas das mangueiras. Mas as primeiras impressões enganam, em Boane. Recentemente, houve grandes mudanças e um dos improváveis factores é uma raiz cor de laranja, profundamente enterrada na terra — a batata-doce.

Um grupo de investigadores do Centro Internacional da Batata, no Peru, tem vindo a promover um mais intenso cultivo da batata-doce em toda a África, devido ao seu potencial de mercado e benefícios nutricionais. A batata-doce de polpa cor de laranja contém elevadas quantidades de vitamina A; a deficiência desta vitamina — e cerca de 71 por cento das crianças com menos de 5 anos têm-na, em Moçambique — pode impedir o desenvolvimento, enfraquecer o sistema imune, aumentar a mortalidade e dar origem a uma condição que leva à cegueira. Após as inundações de 2000 em Moçambique, que devastaram explorações agrícolas em largas faixas do país e desorganizaram os sistemas de fornecimento de sementes, formal e informal, os investigadores tomaram o desastre como uma oportunidade. Com tantos agricultores a terem que começar de novo, os investigadores promoveram algo também novo: a batata-doce,

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que anteriormente era produzida apenas em pequenas quantidades. Em Boane, os investigadores apresentaram aos agricultores dúzias de variedades para teste. A cooperativa de agricultores, que consiste em 38 famílias, ficou convencida. “Foi fácil persuadir-nos”, contou Alfredo Chavanguane, de 60 anos, secretário da cooperativa. “Se virmos onde é cultivada, podemos ver como se comporta bem. Dantes, produzíamos sobretudo milho. Mas compreendemos que podíamos fazer as duas coisas. Acho que a batata-doce vai mesmo revolucionar a agricultara por aqui.” Mas o sucesso da batata-doce, aqui e em muitas comunidades de Moçambique e de outros países africanos, não foi fácil. Os investigadores conceberam uma estratégia multifacetada.


Num animado mercado em Bobole, Moรงambique, uma vendedeira oferece um produto muito apreciado: a batata-doce de polpa alaranjada.

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Primeiro, cientistas do CIP e do Instituto Internacional de Agricultura Tropical (IITA) entraram no domínio do marketing social, numa tentativa de descobrir maneiras de promover a batata-doce junto da generalidade da população. Maria Isabel Andrade, de 50 anos, uma produtora de batata-doce e especialista em sementes do CIP, baseada no Maputo, assumiu para a campanha um título não oficial: cheerleader da batata-doce. Laranja tornou-se a cor da sua vida. Encomendou milhares de t-shirts e saias traçadas cor de laranja para brindes. Coordenou campanhas de publicidade em jornais e na rádio sobre a batata-doce de polpa laranja. Contratou um artista para pintar murais mostrando seres humanos com forma de batatadoce a trabalhar sorridentes nos campos. Pintou seu armário de arquivo cor de laranja. E até arranjou um Toyota Land Cruiser em brilhante cor de laranja. “Sabe, tem que se acreditar naquilo que se faz”, disse ela, à guisa de explicação. “É assim que as pessoas alinham connosco.” Os cientistas do CIP dedicaram-se também a documentar os benefícios da batata-doce para as crianças das famílias que estavam a fazer a cultura. Segundo um estudo conduzido por Jan Low, líder regional do CIP para a África Subsariana, baseado em Nairobi, os investigadores concluíram que, num período de dois anos, na província da Zambézia, na zona central de Moçambique, o esforço para educar os pais sobre os benefícios nutricionais desta cultura tinham dado bons resultados. A batata-doce tem não só betacaroteno, o precursor da vitamina A, mas é também uma boa fonte de vitamina C, manganês, cobre, fibra dietética, vitamina B6, potássio e ferro. As crianças que viviam em famílias a quem foram explicados os benefícios da batata-doce consumiam oito vezes mais vitamina A que as de

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lares que não receberam esses ensinamentos. No final do estudo, a prevalência de crianças emaciadas e com peso inferior ao próprio da idade era substancialmente mais elevada no grupo que não tinha sido encorajado a consumir batata-doce — 6 por cento foram diagnosticadas como emaciadas, em comparação com 3 por cento no grupo educado, e 34 por cento estavam abaixo do peso para a idade, em comparação com 24 por cento no grupo que recebeu formação. Seguidamente, com uma doação da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional, e do governo de Moçambique, o CIP e o IITA distribuíram 813 568 estacas de batata-doce para plantio, entre 2000 e 2007, a famílias por todo o país. Quase 500 hectares foram plantados para semente, resultando em 2,9 milhões de quilos de estacas. Utilizaram também as verbas para dar formação aos agricultores sobre os usos múltiplos da batata-doce, incluindo pão, farinha, biscoitos, batatas fritas, sobremesas e bolos. E há também quem coma as folhas. Na Padaria Aliança, do Maputo, os donos resolveram começar a cozer pão de batata-doce após uma especialista de extensão, Cheila Martins, os ter persuadido de que os clientes gostariam. Após vários projectos de pão de batata-doce nos distritos do planalto de Moçambique, Martins conseguiu convencer 10 padarias de vários pontos do país a alinharem também. Os padeiros da Aliança, tal como os outros, usaram polpa da batata-doce e não farinha pois, conforme Andrade lhes tinha explicado, a polpa contém mais vitamina A que a farinha processada da polpa alaranjada. “Este pão é mais uma opção para as pessoas daqui — e talvez uma opção mais barata dada a subida do preço da farinha de trigo”, disse Victor Miguel, um dos donos da padaria.

No primeiro dia, venderam-se 90 pãezinhos de batata-doce em poucos minutos. “O sabor é muito bom”, comentou o padeiro Elias Manhique, de 35 anos. “E é um pão muito prático. Nem precisa de juntar manteiga ou compota. Come-se assim mesmo, por ser tão bom.” Na aldeia de Boane, estes comentários são uma boa notícia. As padarias representam um outro mercado para as suas batatas-doces. A cooperativa local vai plantar 5 hectares de batata-doce em 2008, o dobro do ano anterior. A batata-doce, a par dos tomates de alta produção, das couves, pimentos e pepinos, ajudou a elevar o nível de vida dos membros da cooperativa. Continuam longe de ser ricos — nenhum deles possui automóvel — mas os seus horizontes alargaram. Em anos anteriores, só duas pessoas, de entre as famílias da cooperativa, faziam estudos universitários, mas agora há seis jovens adultos a prepararem-se para o ensino superior. Há um benefício directamente atribuível à batatadoce: ela tornou-se um elemento importante da dieta alimentar das crianças. “Estou a começar a dar batata-doce ao meu bebé”, contou Deolinda Charles, de 32 anos, que transportava, enrolado às costas, o seu bebé de quatro meses, Carlos. “Os investigadores disseram-me que o ajudará a crescer forte, que teria ali uma fonte de vitamina A. E isso dá-me uma grande satisfação.”


Na aldeia de Boane, Moçambique, Alice Machava, à direita, ajuda a colher batatas-doces, que contribuíram para melhorar as finanças da sua cooperativa de agricultores.

Maria Isabel Andrade, uma cientista do CIP, diz que a batata-doce oferece muitos benefícios e que até as usa para fazer pão.

A batata-doce pode ser uma importante fonte de vitamina A para as crianças. Deolinda Chad, à esquerda, diz que está a começar a dar batata-doce ao seu bebé, Carlos. Uma Paix ão para Lá do Normal . Moçambique

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ZimbabuĂŠ


Jemimah Njuki Jemimah Njuki lembra-se bem da mulher no Malawi que deu ao filho o nome de um legume.

“Há maneiras de escapar à pobreza”

Chamou-o Nyemba, que em Chichewa quer dizer feijão. O motivo da mãe era simples: depois do projecto de Njuki a ter ajudado a encontrar melhores mercados para o seu feijão, o nível de vida da mulher melhorara muito — tanto, que ela queria assinalá-lo de cada vez que chamasse o filho. “Ela disse que tudo tinha mudado para ela”, recorda Njuki, baseada no Zimbabué. “Quando fizemos a primeira reunião de mulheres agricultoras, ela não foi porque não tinha nada para vestir. Mas, depois de começar a ter melhores preços pelo seu feijão, ela veio à reunião com uma blusa branca, saia, sapatos — era uma pessoa transformada.” Njuki, 36 anos, fez um doutoramento em estudos para o desenvolvimento e o seu trabalho baseia-se nos campos, com os agricultores. O tempo que passou como cientista social, trabalhando para o Centro Internacional para a Agricultura Tropical (CIAT) deu-lhe uma perspectiva de proximidade à terra. Tem estado a trabalhar na iniciativa Facilitar a Inovação Rural (ERI), que, em apenas seis anos, já se espalhou a 10 países e tem ajudado milhares de grupos de agricultores, através de parcerias com organizações nacionais de pesquisa e desenvolvimento.

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Uma Paix ão para Lá do Normal . Zimbabué

O seu objectivo principal tem sido ensinar aos agricultores, particularmente às mulheres, como procurar novos mercados e participar na pesquisa e desenvolvimento. “É necessário criar capacidades nos agricultores, de modo que eles possam ir procurar mercados”, explica ela durante uma visita à África do Sul. “Eles têm que se organizar e produzir aquilo de que o mercado precisa.” Njuki mencionou um grupo de criadores de porcos no Malawi, que recebeu formação através do programa. “Eram muito ambiciosos”, recorda. “Foram aos supermercados, foram a uma fábrica de carnes de suíno, e por fim falaram com ONGs. Ficaram a saber que as ONGs queriam comprar leitões para fornecer a outros agricultores. Nunca considerámos a hipótese de vender para ONGs mas é isso mesmo que eles estão a fazer.” Há ainda a acrescentar, referiu ela, que as ONGs agora contratam criadores de porcos experientes para ensinar aos noviços como devem criar os suínos — por um salário que é igual aos lucros que obtêm da venda dos leitões. Os agricultores estão agora a realizar mais de USD 1 000 por ano,


o que é aproximadamente o triplo dos seus rendimentos anteriores. Njuki foi a sétima de oito crianças nascidas numa família de agricultores numa aldeia do centro do Quénia. “Não vivíamos muito mal, mas também não éramos ricos”, contou ela. Acrescentou que a experiência de crescer no meio da pobreza a tornou mais sensível aos que pouco têm — especialmente outras mulheres agricultoras. Elas estimulam a sua motivação. “Quando vou a uma aldeia e vejo a pobreza por lá, eu sei que elas não têm que viver assim”, disse. “Há maneiras de escapar à pobreza. Se pusermos dinheiro nas mãos das mulheres, esse dinheiro fará muito para melhorar a vida da família. As crianças, especialmente as raparigas, têm a oportunidade para ir à escola. Esse é que é o modo de melhorarem as suas vidas.”

A Drª Jemimah Njuki, uma cientista social baseada no Zimbabué, diz que a maneira de melhorar a vida nas aldeias é “pôr dinheiro nas mãos das mulheres” .

Uma Paix ão para Lá do Normal . ZImbabué

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Biografias John Donnelly John Donnelly é um escritor que vive em Washington, D.C., especializado em questões relacionadas com o desenvolvimento internacional, que vão desde as práticas agrícolas no mundo em desenvolvimento, à saúde global. É actualmente vice-presidente e editor chefe na Burness Communications em Bethesda, Maryland. De 1999 a princípios de 2008, trabalhou como repórter para o The Boston Globe. Trabalhou seis anos na redacção do jornal em Washington e durante três anos em África, abrindo ali a sua primeira redacção no continente. Antes de entrar para o Globe, esteve durante quatro anos em Jerusalém e no Cairo, fazendo a cobertura do Médio Oriente para o grupo Knight Ridder e o Miami Herald. O seu trabalho tem-lhe merecido numerosos prémios, incluindo pela sua participação na cobertura, para o Miami Herald, da passagem do Furacão Andrew por Miami, que viria a receber um Prémio Pulitzer; e prémios individuais do Global Health Council, RESULTS, InterAction e da American Society of Tropical Medicine and Hygiene. Foi membro da Fundação da Família Kaiser em 2007-2008. É casado com Laura Hambleton, e o casal vive com os seus três filhos em Chevy Chase, Maryland.

Dominic Chavez Dominic Chavez tem vindo a cobrir, desde 1991, um vasto número de assuntos nacionais e internacionais, como fotógrafo freelancer. De 1997 a 2008, foi fotógrafo da redacção do jornal The Boston Globe. Tem feito a cobertura desde as linhas da frente do Iraque e do Afeganistão às ruas desfeitas pela guerra em Angola. Captou os efeitos da contínua guerra da droga na Colômbia e nos EUA e documentou muitos dos problemas de saúde com que se defrontam as nações de África. Actualmente, concentra a sua atenção nas questões de saúde a nível nacional e global. Tem recebido numerosas distinções pelo seu trabalho, incluindo o título de Fotógrafo do Ano, em 2000, atribuído pela Associação de Fotógrafos de Imprensa de Boston (BPPA), e o primeiro lugar na competição internacional Imagens do Ano (Pictures of the Year) pelo seu trabalho durante a guerra no Iraque em 2004. Chavez vive em Chelsea, Massachusetts, com sua mulher, Silvia Lopez Chavez.

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Uma Paix ão para Lá do Normal . Biografias


Os Membros do CGIAR África do Sul Alemanha Austrália Áustria Banco Africano de Desenvolvimento Banco Asiático de Desenvolvimento Banco Interamericano de Desenvolvimento Banco Mundial Bangladesh Bélgica Brasil

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Outubro de 2008

Uma Paixão para Lá do Normal: Como Agricultores e Investigadores Estão a Procurar Soluções para a Fome em África

www.cgiar.org

Uma Paixão para Lá do Normal Como Agricultores e Investigadores Estão a Procurar Soluções para a Fome em África

Por John Donnelly

Fotografias de Dominic Chavez


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