Abrente nº66

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Joan Teran

Nº 66 Outubro, novembro e dezembro de 2012

Internacional

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CUP-AE: é a hora do povo

Comício central da CUP em Barcelona

O 25 de novembro decorrem eleiçons ao Parlamento da Comunidade Autónoma da Catalunha e, pola primeira vez, parecem umhas eleiçons que podem chegar a ser decisivas. A confluência de diferentes elementos da conjuntura catalá e internacional contribui para reforçar esta visom. Este artigo pretende repassar os principais elementos de conjuntura em que se realizassem estas eleiçons com a perspetiva da esquerda independentista catalá, resumir as motivaçons e os compromissos políticos que condicionárom a decisom da CUP de apresentar umha candidatura eleitoral nestas eleiçons e, em último lugar, aspira a abordar os principais reptos que a conjuntura atual apresenta para a consecuçom dos objetivos estratégicos do independentismo catalám de esquerda.

A reivindicaçom nacional no Principat de Catalunya

Desde o Onze de Setembre deste ano, a independência é vista como umha opçom real para umha parte muito importante – se nom maioritário– da sociedade do Principat. O que pode constituir umha surpresa para alguém que siga o debate político no Principat desde o início do processo de reforma estatutária em 2005 nom é a evoluçom do eleitorado em relaçom à questom da independência, mas o facto de que o Govern e o Parlament assumam a possibilidade de convocar umha consulta popular em relaçom a esta questom para, provavelmente, a próxima legislatura. Há vários elementos que reforçam a virtualidade desta possibilidade. Em primeiro lugar, desde 2006 a opçom independentista tivo um crescimento sustentado que se viu refletido tanto no seguimento das mobilizaçons populares como na evoluçom dos inquéritos oficiais. As hemerotecas dam fé do seguimento em massa das manifestaçons de 11 e 18 de fevereiro de 2006 em defesa do direito a decidir; de 1 de dezembro de 2007 em defesa das infraestrutura; das mais de 800.000 pessoas que participárom nas sucessivas ondas de consultas populares pela independência; da manifestaçom de resposta à sentença do Tribunal Constitucional contra o Estatuto de 10 de julho de 2010; e finalmente das últimas manifestaçons da Diada deste ano. Por outro lado, os inquéritos registárom um aumento progressivo das respostas favoráveis à independência no

caso de se convocar um referendo com só duas opçons: sim ou nom à independência. O contexto internacional, especialmente com o acordo dos governos británico e escocês para a realizaçom de um referendo de independência para a Escócia, contribui também para reforçar a crença em que isto pode ser possível também para a Catalunha. Porém, nom há que esquecer algumas questons que obrigam a relativizar um otimismo independentista que poderia impedir analisar a situaçom com suficiente profundidade. Em primeiro lugar, há que recordar o facto evidente de que Espanha nom permitirá (nem muito menos vai facilitar) nengum processo de secessom que poda afetar o seu território. Ao invés: usará todas as armas a seu alcance para o impedir ou o boicotar. Outra cousa é que o consiga. Outro elemento igualmente importante constitui-no o protagonismo de CiU em todo o processo. Embora a coligaçom regionalista baseie umha parte importante de sua força eleitoral no apoio que obtém de setores populares com aspiraçons soberanistas, a sua fidelidade política é para com os setores dominantes da sociedade catalá. Historicamente a contradiçom destes setores entre sua condiçom nacional catalá e seus interesses de classe sempre se resolveu a favor de umha aposta em a construçom do Estado espanhol. Hoje Mas parece representar a necessidade destes setores de abraçar e impulsionar a causa catalá para a orientar em favor dos seus interesses económicos e políticos. Por enquanto, soubo aproveitar a onda. Saberá dominar ao seu favor?

Pobreza, exclusom e cortes

A principal vitória do governo de Mas foi sem dúvida deixar em um segundo plano os graves problemas que sofre boa parte da sociedade catalá. Graças a umha gestom motivadora do Onze de Setembre, conseguiu vender um relato segundo o qual o seu governo cortou em educaçom, pensons e serviços sociais porque o trato fiscal injusto que a Catalunha recebe de Madrid os obrigou a fazê-lo. Mas o certo é que o conselheiro de previdência do governo de CiU era o chefe do patronato das clínicas privadas, e que entre CiU e PSC (com o consentimento cúmplice dos demais partidos) gerárom

umha rede clientelar arredor da sanidade pública que gera uns benefícios suculentos para uns poucos familiares e amigos destes partidos em prejuízo da saúde do povo. Que a política educativa dos sucessivos governos autonómicos (convergentes e “progressistas”) beneficiou de forma sistemática os centros privados e concertados, enquanto o sistema público afoga por falta de recursos. Que as políticas sociais fôrom as grandes vítimas dos cortes dos últimos anos, acompanhadas de umha política deliberada de estigmatizaçom quando nom de criminalizaçom da pobreza e da exclusom social. E que todo isso foi acompanhado de umha dura repressom contra os setores que questionárom estas políticas. Igual que a negaçom sistemática da vontade popular por parte do Estado espanhol tivo conseqüências na articulaçom de umha oposiçom popular ao modelo institucional vigente, as conseqüências das políticas antisociais ditadas pola Uniom Europeia e aplicadas polos sucessivos governos centrais e autonómicos acabárom por gerar uns destacados níveis de mobilizaçom popular. É neste contexto que há que analisar como em boa parte dos Països Cataláns o movimento indignado nom coalhou na forma de movimento de regeneraçom do Estado espanhol, pois na prática reforçou um tecido político e social previamente existente sem que poda ser assimilado polo sistema institucional, os partidos ou os sindicatos. Multiplicárom-se as assembleias populares polos direitos sociais e as plataformas de afetados por hipotecas ou em defesa dos serviços públicos. Estes setores protagonizárom as luitas contra os cortes sociais. Em momentos pontuais, como nas greves gerais ou em algumas greves setoriais do último ano, este tecido social e político conseguiu desbordar por momentos aos sindicatos oficiais do regime, convocando piquetes e manifestaçons cujo alcance recorda, tanto polo seu caráter de massas como pola sua combatividade, o de mobilizaçons da época da transiçom do franquismo a esta monarquia constitucional. Por outro lado, o descontentamento social sobre o qual se fundamentou esta tomada de consciência popular também gerou nos últimos anos o caldo de cultivo

necessário para o crescimento de opçons racistas que, revestindo do discurso e a estética da nova extrema-direita europeia, seguem a mesma direita espanhola fascista de sempre.

Sobre a história recente da CUP

É no enquadramento desta situaçom de umha verdadeira agitaçom política que vive o Principat de Catalunya que a CUP decidiu participar no processo eleitoral autonómico que culminará no próximo 25 de novembro. É necessário, chegados a este ponto, refletir sobre a história recente da CUP e da esquerda independentista catalá. Isso ajudará a entender melhor sua realidade atual e a medir melhor quais som as forças e suas perspetivas políticas face ao 25N. A CUP é ao mesmo tempo umha organizaçom de base municipalista e umha organizaçom com projeto nacional. Isso quer dizer que a CUP cresceu e se desenvolveu como umha organizaçom cuja base som suas assembleias e projetos locais, construídos a partir da articulaçom de redes de relacionamentos e de práticas críticas com o modelo social, económico e institucional vigente. Ante as eleiçons locais, estas redes cristalizam em candidaturas de unidade popular que entre princípios do ano 2000 e as últimas eleiçons autárquicas de 2011 foi estendendo-se, passando de menos de 10 candidaturas em 1999, até as mais de 80 atuais e que contam com pouco mais de 100 vereadores e com 4 governos locais no Principat de Catalunya. Mas este conjunto de projetos locais tem mais cousas em comum para além do municipalismo: compartilha um projeto de libertaçom nacional para os Països Cataláns em chave independentista, socialista, feminista e ecologista. Um projeto que cresceu ao mesmo tempo como resultado e como reflexo do trabalho e a luta da esquerda independentista. Um projeto que se constrói dia-a-dia mediante a autoorganizaçom do povo em todo o tipo de entidades, associaçons, plataformas e organizaçons, e que quer construir umha alternativa ao modelo económico, institucional e cultural dominante. Para avançar nesta tarefa, a CUP entende que as instituiçons do Estado podem ser também espaços para a confrontaçom política e

social, igual que já som as ruas dos nossos povos e cidades. É por isso que no seu momento se tinha proposto já a possibilidade de apresentar umha candidatura de unidade popular em eleiçons diferentes das municipais. Em 2004, a CUP participou nas eleiçons europeias com o objetivo de difundir e estender seu projeto, enquanto em 2009 desestimous a sua participaçom nas eleiçons ao Parlamento autónomo de Barcelona de novembro de 2010 fundamentalmente porque decidiu concentrar forças e energias nas eleiçons de 2011, estendendo sua organizaçom e reforçando seu relacionamento com as luitas populares. Do ponto de vista da CUP, o balanço dos últimos 3 anos é muito positivo: cresceu-se em número de assembleias e reforçou-se a presença territorial e institucional da CUP e da esquerda independentista. Na parte negativa do balanço organizativo há que resenhar duas caraterísticas fundamentalmente. Quanto a implantaçom, a CUP segue a ser umha organizaçom regional com um projeto nacional. Enquanto a esquerda independentista catalá é um movimento com implantaçom em todo o território nacional, nom se dérom ainda as condiçons para o desenvolvimento da CUP em partes importantes do Principat e na prática totalidade do País Valencià e as Illes Balears i Pitïuses, o qual tem consequências políticas importantes na focagem de determinados debates relacionados com a articulaçom e a vertebraçom dos Països Catalans. Do ponto de vista orgánico, e embora esta questom já tenha sido assumida pola CUP após o processo de debate que culminou na Assembleia Nacional de Reus de março deste mesmo ano, a CUP nom pudo desenvolver ainda os mecanismos e as soluçons organizativas e políticas que tenhem que fazer possível reproduzir os processos de construçom da unidade popular que se levam a cabo em povos e cidades a umha dimensom territorial superior. A convocatória eleitoral avançada de Artur Mas precipitou este processo. Joan Teran forma parte do Secretariado Nacional da CUP Nota de redaçom: A versom atualizada deste artigo, redigido após as eleiçons autonómicas que confirmárom a entrada da CUP no Parlament, pode consultar-se em www.primeiralinha.org


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