ANTRO POSITIVO ED.03

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PoderíaMoS taMbéM afirMar MaiS exPreSSando (falando) do que coMunicando (dizendo, agindo). alguns revelam as lacunas (informações escondidas) sugerindo ao leitor/espectador o desenvolvimento de seu papel ativo na leitura, decodificação e compreensão do espetáculo. um trabalho de construção textual muito mais inspirado pela insinuação do que pela enunciação explícita. o outro elemento é a rubrica – ou didascália. de acordo com Patrice Pavis, no citado dicionário do teatro, “didascálias são as instruções dadas pelo autor aos seus atores (teatro grego, por exemplo), para interpretar o texto dramático”. Pode também ser chamado de paratexto (Pavis cita a opção de J.-m.thomasseau, para explicar sua diferença em relação ao texto secundário): trata-se do “texto impresso”, compreendendo título, lista de personagens, indicações cênicas de tempo e espaço, descrições de cenário, didascálias sobre o jogo do ator, como outros elementos (dedicatória, prefácio, nota introdutória). ocorre que o paratexto, que antes se escondia da cena, é muito frequentemente revelado, como material que é levado à cena, reforçando no jogo com o espectador a nomeação do aqui e agora teatral. Por exemplo, em história de amor, de Jean-luc lagarce, as rubricas são faladas pelos “personagens”. Note-se a exposição deliberada ao espectador das notações cênicas, o uso pleno da terceira pessoa, como narradora não dos próprios acontecimentos, mas, sobretudo,

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do próprio fato teatral

HiStÓria de aMor prÓlogo o primeiro homem. prólogo. o primeiro homem. uma noite, o Primeiro homem fica sozinho, se esquecem dele, não sabem o que ele faz, o que é feito dele. Foi feito dele. «que idade é que ele tem?» o Primeiro homem, uma noite… é a história de dois homens e uma mulher. A mulher. – ela, a mulher (eu), ela, ela ri delicadamente. talvez – não a distinguimos muito bem – talvez chore também, um pouco, é possível. o primeiro homem. – uma noite. uma noite, ele, o Primeiro homem. (é a história de dois homens e uma mulher.) ele, o Primeiro homem.

PercebaMoS que o PrÓlogo é lido PeloS PerforMerS. o efeito da leitura do Paratexto denuncia o teatro coMo teatro e não coMo ficção, e o eSPectador é coMo que convidado a Ser uM (co)atuante. Sob eSSe viéS, não é arriScado PenSarMoS, Por exeMPlo, que no teatro conteMPorâneo de draMaturgoS iMPortanteS, coMo o francêS jean-luc lagarce, o PaPel da rubrica é enunciado verbal Para o recePtor, revelando o que norMalMente é rePreSentado eM cena e não falado, dito. Marici Salomão é dramaturga, jornalista e curadora na área teatral; foi colaboradora do caderno2 do estado de s. paulo e da revista bravo!; coordena o curso de dramaturgia da sp escola de teatro e do SeSi-british council; jurada do prêmio Shell de teatro e curadora do projeto dramaturgias urgentes, do centro cultural banco do brasil.


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