Os sete - andre vianco

Page 326

desesperado. — O lobo pegou ele! — gritou alguém. Mais gritos de pavor e de dor. Em geral, os gritos de dor vinham logo após um grito de pavor; eram bem discerníveis.

César tinha certeza de que a fera estava exterminando os soldados. Logo não sobraria ninguém para contar a história. Alcançou o soldado que permanecia estático, grudado a uma máquina de ferro que era uma verdadeira parede devido a seu tamanho. — Vamos sair daqui. Esse bicho é esperto demais. — disse César. — Sair? Tu tá louco, tchê? Tem gente morrendo aqui dentro! Vamos ajudá-los. — Desculpe, soldado, mas não vim aqui para morrer num galpão fechado... — Fique aqui! É uma ordem! César fechou a cara, perdendo o tom amigo. — Escute aqui, parceiro. Não sou militar, não sou soldado! Você ordene o diabo, mas eu vou rapar fora. Você é burro ou o quê? Não estamos caçando esse lobisomem aqui dentro. Ele é que está caçando a gente. — disse em sussurros, temendo ser ouvido pela fera. O soldado ainda digeria a resposta malcriada de seu protegido quando mais um grito ensandecido, com outro rugido da fera, encheu o galpão. Aquele teatro de horrores embasava o que o civil lhe dizia. Só não queria dar o braço a torcer. — Vamos recuar um pouco. — sugeriu o soldado. — Mas não vamos embora, pois temos de ajudar os outros. — Se a gente continuar com todas as nossas coisas no lugar, talvez a gente possa ajudar os outros. Se a gente demorar muito tempo aqui dentro, esse lobo vai ficar de barriga cheia em dois tempos. Outro grito invadiu os ouvidos dos dois. Antes, o som predominante era o dos coturnos contra o assoalho; agora pouco se ouvia o arrastar das botas. O som da respiração feroz do lobo ganhava cada vez maior volume. César ouvia a fera bem perto, talvez no próximo corredor. Seu coração disparou desesperado. Não haveria tempo para fugir; tinha caído na cilada da fera. Ergueu pela centésima vez a espingarda e engatilhou-a, pronta para o disparo. Mais um grito. Vinha de algum lugar pouquíssimos metros à frente, na escuridão. A lanterna do soldado acompanhante varreu o chão, revelando fartas marcas de sangue, como se alguém mutilado tivesse se arrastado por ali. O soldado ferido continuava gritando. A lanterna alcançou um corpo estendido no chão. César sentiu um calafrio percorrer cada fio de cabelo. Faltava uma perna àquele soldado. O soldado acompanhante acocorou-se ao lado do corpo e em seguida voltou-se para César, dando o diagnóstico: — Está morto. Entretanto, os gritos próximos continuavam.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.