Vox Objetiva 61

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ORDEM NA REDE | CONHEÇA AS REGRAS DO MARCO CIVIL NA INTERNET

Julho/14 • Edição 61 • Ano VI • Distribuição gratuita

MUSCULAÇÃO PRECOCE? Especialistas divergem sobre fitness na infância

DESAFIOS DA MOBILIDADE Brasileiros idealizam um transporte público de qualidade

O FATURAMENTO $ALVOU A PÁTRIA Receita de Belo Horizonte, Rio de janeiro e São Paulo na Copa superou as expectativas, mesmo com a derrota do Brasil


"Mulher virtuosa, aonde encontrar... Proverbios. 31"

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Editorial Um passo a mais Passadas as emoções e as decepções da Copa do Mundo, os brasileiros voltam os olhares para as eleições gerais de outubro. O cenário incerto e volátil em relação à política desafia os candidatos – especialmente os que disputam o comando do Palácio do Planalto.

Carlos Viana Editor Executivo carlos.viana@voxobjetiva.com.br

“... O povo que conhece o seu Deus se tornará forte e ativo.” (Daniel 11:32)

Quatro em cada dez eleitores estão insatisfeitos com os partidos e os rumos da nação, como mostram as pesquisas. Não é pouca gente. São aproximadamente 80 milhões de brasileiros mal-humorados e em busca de mudanças. Quais? Essas transformações vão ter que ser construídas com base nos acertos e nos fracassos das políticas públicas. Só os partidos ainda não perceberam que os brasileiros estão mudando cada vez mais rápido. Nós nos tornamos um povo mais exigente e mais estudado. Estas eleições vão ter quase 3 milhões a mais de eleitores com nível superior em comparação com as eleições de 2010, como revelam os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O número de pessoas que vão às urnas com ensino médio completo aumentou 5,9 milhões, subindo de 13,1% para 16,6% do total de votantes. A proporção de eleitores com ensino médio incompleto teve um incremento de 1,8 milhão de pessoas. O número representa um acréscimo de votantes de 18,9% para 19,2% na comparação com o pleito de 2010. A Copa do Mundo deixou um bom legado cívico. O brasileiro aprendeu que reclamar faz bem. A atitude assusta e exige comprometimento dos governantes. Ainda que alguns desses compromissos sejam honrados, a indignação permanece. Os investimentos para garantir a tranquilidade dos estrangeiros nos estádios deveriam ter sido direcionados para a população. É o povo que sustenta uma máquina pública cara, ineficiente e marcada por denúncias de corrupção. Essa certeza está bem clara e presente na cabeça dos brasileiros.

A Vox Objetiva é uma publicação mensal da Vox Domini Editora Ltda. Rua Tupis, 204, sala 218, Centro, Belo Horizonte - MG CEP: 30190-060

Vivemos em um Brasil muito diferente daquele mostrado nas campanhas publicitárias. Essa constatação gerou um sentimento coletivo que está muito bem guardado no coração verde e amarelo. Trata-se de uma resposta silenciosa, de aprendizado, a ser declarada no momento certo. Esse é o silêncio de quem sabe que a hora certa está por vir. Nada melhor do que as eleições para que um novo tempo seja escrito na história de um povo por meio do exercício do voto livre e soberano. Nosso aprendizado pode até ser lento nas urnas, mas não pode ser impedido de se tornar realidade na vida do país.

Editor adjunto: Lucas Alvarenga l Diagramação e arte: Felipe Pereira | Capa: Felipe Pereira | Foto de capa: Felipe Pereira Estagiária: Daniela Rebello l Reportagem: André Martins, Bárbara Caldeira, Daniela Rebello, Érica Fernandes, Leo Pinheiro, Lucas Alvarenga, Paula Rangel, Tati Barros, Thalvanes Guimarães | Correspondentes: Greice Rodrigues - Estados Unidos, Ilana Rehavia - Reino Unido | Diretoria Comercial: Solange Viana | Anúncios: comercial@voxobjetiva.com.br / (31) 2514-0990 | Atendimento: jornalismo@voxobjetiva.com.br (31) 2514-0990 | Revisão: Versão Final Tiragem: 30 mil exemplares | voxobjetiva.com.br

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olhar bh

A poesia em curva e flor - Praรงa da Liberdade Foto: Daniela Rebello |5


sUMÁRIO Fabio Rodrigues Pozzebom/ ABr

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Midia Ninja

Alexandre Breveglieri

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verbo

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LUIZ CLÁUDIO COSTA Ex-presidente do Inep avalia os avanços da educação brasileira nas últimas décadas e discute os desafios do setor

podium

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metropolis

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IMOBILIDADE URBANA Brasileiros querem transporte público de mais qualidade, mas governo incentiva a compra de automóveis

SALDO POSITIVO Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo vencem os atrasos e colhem os frutos da Copa do Mundo no Brasil

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Mundial de futebol reacende com torcedores e médicos a discussão sobre o limite da emoção na hora de torcer arquibancadas

Salutaris

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capa

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À FLOR DA PELE

'BRINCADEIRA DE CRIANÇA’? Especialistas debatem o momento adequado para que os pais coloquem crianças e pré-adolescentes nas academias

vanguarda

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marco civil Entra em vigor a lei que regulamenta o uso da internet no Brasil. Conheça melhor essa legislação pioneira


Jefersson Bernardes/ Vipcomm

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Guirrilha Fitness

femme

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A ARTE DO JEQUITINHONHA Artesanato faz Mary Arantes ganhar projeção mundial com o design de acessórios

kultur

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UM GIGANTE EM LOUVOR Mercado fonográfico evangélico mostra força em tempos de vendas em baixa

Artigos

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Luiza Vilarroel

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Meteorologia • Ruibran dos Reis Os cuidados com o meio ambiente

justiça • Robson Sávio Copa, educação, mídia e eleições

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PSICOLOGIA • Maria Angélica Falci

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IMOBILIÁRIO • Kênio Pereira

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TRINCA DE NOTÁVEIS Três sugestões de livros de João Ubaldo Ribeiro, Rubem Alves e Ariano Suassuna

Amaury Texeira

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'Barco furado'

Modelo de contrato favorece erros

crônica • Joanita Gontijo Confiar: sempre a melhor opção

Gastronomia

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RECEITA – Chef Ilmar de Jesus

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VINHOS – Julia Grossi

Mineirinho Valente Uva Bonarda |7


verbo

‘Educação não é uma corrida de 100 metros’ Ex-presidente do Inep discute os avanços e os desafios do ensino no Brasil Lucas Alvarenga

c

om a conquista da Copa do Mundo no Brasil, os olhos da mídia se voltaram para a Alemanha. O país foi conclamado pelos quatro cantos como um exemplo a ser seguido pelo Brasil, dentro e fora das quatro linhas. Mas na educação, alemães e brasileiros vivem um dilema similar. Entre os germanos há 7,5 milhões de adultos entre 18 e 64 anos analfabetos funcionais, como aponta uma pesquisa da Universidade de Hamburgo. Isso representa 9,15% da população alemã. No Brasil, o número de analfabetos com 15 anos ou mais é de 35 milhões. A quantidade equivale a 17,4% da população brasileira. A informação é do Ministério da Educação (MEC).

A universalização do acesso ao ensino foi o grande legado da educação básica nos últimos 11 anos. Mas ainda é preciso incluir quase 3 milhões de crianças e jovens por meio do ensino, diminuir a evasão e a distorção de série/idade. Como atingir essa meta?

"É inegável que o Brasil tem um atraso histórico na educação. Mas o país tem se esforçado para avançar com qualidade e investir ainda mais no ensino"

Mas entre os alemães, o analfabetismo funcional se deve a uma política que prioriza os melhores alunos e oferece poucas chances aos mais fracos. No Brasil, a questão é histórica e estrutural. Mesmo com a evolução do ensino nos últimos anos, o déficit na educação continua. O país investe em cada aluno de 6 a 15 anos pouco mais da metade do valor recomendado pela Organização para a Cooperação de Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Para discutir os desafios da educação brasileira, a Vox Objetiva conversou com o secretário executivo do MEC, Luiz Cláudio Costa. Doutor em Agrometeorologia pela Universidade de Reading, na Inglaterra, o mineiro foi reitor da Universidade Federal de Viçosa entre 2008 e 2011. Em 2012, ele assumiu a presidência do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e ficou no cargo até fevereiro deste ano. 8 | www.voxobjetiva.com.br

O Brasil avançou significativamente na inclusão de crianças e de jovens na educação básica entre 1991 e 2010. Dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) comprovam essa inclusão. O número de crianças de 5 a 6 anos na escola passou de 37,3% para 91,1% nesse período. O total de adolescentes de 11 a 13 anos frequentando os anos finais do ensino fundamental também cresceu: de 36,8% para 84,9%. E a taxa de jovens de 15 a 17 anos com ensino fundamental completo subiu de 20% para 57,2% em 2010.

Temos a expectativa de entregar 3,1 mil creches e pré-escolas até o final de 2014. Esse é um investimento na inclusão. Mas nossos esforços também se aplicam à diminuição da evasão e à qualidade do ensino. O país também avançou na oferta de escolas com ensino integral. O Programa Mais Educação, indutor dessa política, conta com investimentos federais de R$ 1,8 bilhão em 2014. Até a metade do ano passado, 49,3 mil escolas públicas do país ofereciam educação em tempo integral. Desse total, 32 mil reuniam alunos do programa Bolsa Família. Nossa meta é chegar a 60 mil escolas até o final do ano. De 1991 a 2010, a educação do país melhorou 128,3%. O número é quase três vezes superior ao Ín-


Fabio Rodrigues Pozzebom - ABr

verbo

dice de Desenvolvimento Humano (IDH) brasileiro, que subiu 47,5% nesses 20 anos. Essa transformação é resultado da efetividade de programas que apostaram na democratização do acesso à educação, nos diversos níveis de ensino. Os esforços empreendidos pelo Governo Federal, pelos estados e pelos municípios são protagonistas dessa inclusão. O Brasil está fazendo uma equação complexa. A educação não é uma corrida de cem metros rasos. Temos que incluir alunos sem nos esquecer de investir na qualidade do ensino. Mas ainda é preciso investir muito para diminuir a desigualdade gerada pela educação... Se considerarmos diferentes dimensões, como renda, raça, sexo e região geográfica, nós podemos perceber que as políticas de inclusão precisam ser mantidas e ampliadas. Isso é necessário para que possamos garantir igualdade de oportunidades educacionais para os brasileiros. Levando em consideração o critério racial, vemos que 9% dos negros e 9,6% dos indígenas

entre 18 e 24 anos estão cursando ou concluíram o ensino superior. Há também 11,1% dos pardos na mesma situação. Para incluir com qualidade, é preciso investir no professor. Apenas quatro estados e o Distrito Federal pagam integralmente o piso nacional dos professores – estipulado em R$ 1.567,00. Como inverter esse cenário? O governo tem se preocupado – e muito – com essa questão. Não à toa, estamos trabalhando para formar 70 mil docentes até o final do ano com o Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica. Não medimos esforços para a formação continuada de professores por meio do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. O país também conta com o sistema Universidade Aberta do Brasil. Nesse sistema, os professores que atuam na educação básica têm prioridade de formação. Na sequência de prioridades vêm os dirigentes, gestores e trabalhadores em educa|9


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ção básica dos estados, municípios e do Distrito Federal. O sistema chegou a 270 mil matrículas ativas em 2012. Metade das matrículas foi para licenciaturas. O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcelo Cortês Neri, considera necessária a atração de mão de obra estrangeira para o país. Não teríamos que incentivar a qualificação dos jovens brasileiros por meio do ensino técnico? No Brasil, dois em cada dez jovens não trabalham nem estudam. Mas o Brasil avançou bastante no ensino técnico. Com o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), 1,25 milhão de jovens, alunos de escolas públicas, fizeram ou estão fazendo cursos técnicos. Com o lançamento do Sistema de Seleção Unificada da Educação Profissional e Tecnológica (Sisutec), os alunos que concluíram o ensino médio terão acesso a mais de 239 mil vagas gratuitas nessa modalidade de ensino. Em relação à formação superior, nunca se teve tantos profissionais graduados no país. Os dados do Censo de 2012 mostram que o número de matrículas cresceu de 2,8 milhões para 7 milhões nos últimos 12 anos. No mesmo período, o número de estudantes formados passou de cerca de 300 mil para mais de um milhão. Não dá para temer um apagão de mão de obra.

No Brasil, o valor aplicado por aluno também é inferior ao dos países da OCDE. O país investe US$ 26.765 (R$ 59.418) em cada aluno entre 6 e 15 anos. Mas o recomendado pela OCDE é, no mínimo, US$ 50 mil (R$ 111 mil). No ensino médio, essa diferença fica ainda mais explícita. Enquanto o Brasil investe US$ 2.148 (R$ 4.768) por aluno, os países da OCDE destinam US$ 9.543 (R$ 21.185). Quais são as perspectivas para que o Brasil venha a dar um salto definitivo na educação? A decisão do governo brasileiro de destinar 75% dos royalties do Pré-sal é um marco para a educação. A medida reafirma o compromisso do país com a melhoria da qualidade do ensino. O Brasil optou por destinar um recurso finito que vai assegurar condições essenciais para a educação em longo prazo. Em 30 anos, serão injetados na educação R$ 368 bilhões. Esse dinheiro vai ser fundamental para que possamos valorizar, principalmente, os professores, que são a base de todo o sistema de ensino. O acesso ao ensino foi o grande legado da educação brasileira

O Brasil sofre com um déficit histórico na educação. O sistema público de ensino no país nasceu atrasado durante o Segundo Império e está sucateado. O problema da educação brasileira passa pela quantidade do dinheiro investido? É inegável que o Brasil tem um atraso histórico na educação. Mas o país tem se esforçado para avançar com qualidade e investir ainda mais no ensino. Em 2010, o Brasil foi o país que destinou maior parte do investimento público total para a educação. A pasta ocupou 18,12% do orçamento da União. Com isso, ficamos à frente da Coreia do Sul (16,21%), Suíça (15,83%) e Dinamarca (15,27%). Entre 2005 e 2010, a participação da educação no investimento público total desses países reduziu. A postura tomada por essas nações foi contrária à brasileira. Na década passada, o investimento público brasileiro na educação aumentou 2,1%. Em 2010, o percentual chegou a 5,6%. Os números se baseiam na comparação com o Produto Interno Bruto (PIB). Mas o índice ficou 1% abaixo da média dos países da Organização para a Cooperação de Desenvolvimento Econômico (OCDE). 10 | www.voxobjetiva.com.br

Carol Garcia / AGECOM


ARTIGO

Ruibran dos Reis

Meteorologia

Os cuidados com o meio ambiente A população brasileira cresceu 0,9% entre 2012 e 2013, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A expectativa do órgão é de que essa população comece a diminuir somente a partir de 2042. O Brasil já tem mais de 201 milhões de habitantes. Assim como segue em alta a taxa de nascidos vivos no país, crescem os impactos da sociedade no ambiente. Infelizmente há mais de 3 mil municípios no Brasil sem um sistema adequado de descarte de lixo. A maioria deles está na Região Nordeste. No Brasil, a ascensão da classe C aumentou a geração de resíduos por pessoa. O volume diário per capita passou de 955 quilos para 1.223 quilos, como revelam estudos recentes. Os córregos das cidades estão virando verdadeiros esgotos a céu aberto. O material despejado nesses cursos d’água é carregado pela correnteza. Isso se deve à falta de locais para a coleta adequada do lixo e à diminuição do volume de água dos rios. A consequência é que entre 57 mil e 135 mil animais marinhos morrem todos os anos nos mares e oceanos devido à presença de redes, cordas, fitas adesivas e material plástico levados pelos rios. Os dados são da Sociedade Mundial de Proteção Animal (WSPA).

A atmosfera vem sendo bombardeada por inúmeras partículas de substâncias geradas pelo homem desde a Revolução Pré-Industrial. Se a dimensão da Terra fosse igual à de uma bola de futebol, a atmosfera seria apenas a tinta da bola. No entanto, a concentração dos gases causadores do efeito estufa já teria atingindo níveis críticos. Durante a era pré-industrial, a porcentagem de dióxido de carbono foi de apenas 280 partes por milhão (PPM) contra as mais de 400 ppm atuais. O gás metano, importante causador do efeito estufa, cresce a uma taxa elevada todos os anos. Mas o tempo de vida desse gás é de apenas 12 anos na atmosfera. No caso do dióxido de carbono, produzido pelo uso dos combustíveis fósseis, o tempo de vida na atmosfera é superior a cem anos.

"Há mais de 3 mil municípios no Brasil sem um sistema adequado de descarte de lixo"

A preservação do meio ambiente melhora a qualidade de vida do cidadão, mas é também uma responsabilidade de todos com as gerações futuras. Uma série de pesquisas mostra que o tempo de decomposição de uma ponta de cigarro na natureza é de 5 anos. Os sacos plásticos demoram entre 30 e 40 anos para se desfazer integralmente. Muito tempo? O vidro leva cerca de mil anos para se decompor.

O aquecimento global já vinha causando uma série de impactos na utilização dos recursos hídricos. Havia também um aumento no número de furacões, tornados e tempestades severas. Agora o fenômeno também vem elevando significativamente o número de casos de câncer de pele e de mortes decorrentes das fortes ondas de calor. Se queremos um mundo melhor para esta e as próximas gerações, precisamos diminuir urgentemente o consumo desnecessário de alguns bens e tornar a reciclagem uma prática corrente na nossa rotina.

Ruibran dos Reis Diretor Regional do Climatempo e professor da PUC Minas ruibrandosreis@gmail.com | 11


Mobilidade: uma política para quem? Brasileiros das capitais idealizam uma cidade com transporte público de qualidade, mas esbarram em altas tarifas, baixa qualidade do transporte e longos congestionamentos Daniela Rebello

A

s manifestações de junho do ano passado contra o aumento da tarifa dos ônibus colocaram a mobilidade urbana no centro dos debates políticos. A questão foi o estopim para os protestos nas grandes cidades brasileiras e representou a luta contra a concentração de riquezas no país. Lado a lado, carros com uma só pessoa e ônibus superlotados retratam como a desigualdade e as más políticas de mobilidade contribuem para que o direito de ir e vir se torne uma garantia para poucos. A cena também evidencia os problemas da falta de democratização do espaço urbano. A preocupação com o transporte se tornou cada vez mais notória. Em junho passado, uma pesquisa feita pela Liberty Seguros apontou as tendências para a mobilidade em seis grandes centros urbanos do país: Belo Horizonte, Salvador, Fortaleza, Curitiba, São Pau12 | www.voxobjetiva.com.br

lo e Rio de Janeiro. O levantamento foi preparado com base em entrevistas com seis importantes especialistas e produzido por meio de um aplicativo de smartphone. Participaram da pesquisa 950 pessoas de 18 a 50 anos. Os resultados obtidos na capital mineira são um reflexo do que se vê nas ruas. Em Belo Horizonte, 33% dos entrevistados disseram ter mudado a forma de locomoção nos últimos cinco anos. Dentre eles, 67% trocaram o transporte público pelo carro para evitar problemas como o crescente tempo de deslocamento e o desconforto dos coletivos. A cidade é a terceira no ranking de capitais do país com o maior número de carros por habitante: 0,45 veículo. Mas se engana quem pensa que dirigir diariamente é uma opção desejada. A cidade idealizada para 93% dos entrevistados seria com transporte público, bicicletas e o tráfego a pé.


metropolis

A visível contradição não surpreende. As altas tarifas, poucas linhas, rotas limitadas e a estrutura incompatível com as necessidades excluem uma enorme parte da população de ter acesso aos seus locais de interesse. As dificuldades enfrentadas com a locomoção impactam diretamente outros serviços, como a saúde e a educação. Pouco resolve para o cidadão ter um hospital público e uma escola pública, se não há meios acessíveis que o permitam chegar aos locais. Para muitos, o preço da passagem assusta. De acordo com a Federação das Empresas de Transportes de Passageiros dos Estados do Paraná e Santa Catarina (Fepasc), 35 em cada 100 brasileiros das grandes cidades não usam o transporte público por não ter condições de pagar a tarifa. No Brasil, esse número chega a 37 milhões de pessoas. Pensando na locomoção como um direito de todos, algumas cidades do exterior e do Brasil adotaram a tarifa zero. A proposta foi implantada há dez anos em Agudos, na Região Centro-Oeste de São Paulo, e há três anos em Porto Real, no Vale do Paraíba Fluminense. Nas duas cidades de menos de 50 mil habitantes, o passe livre é visto como um direito social, assim como a saúde e a educação. Nesses municípios foram feitos cortes de gastos com combustível e telefone e parte do dinheiro arrecadado com impostos foi direcionada para a gratuidade do transporte público. A ação se refletiu em números. Na cidade de Porto Real, o comércio cresceu 27% após a eliminação da tarifa.

Hasselt, na Bélgica, faz parte de um crescente número de cidades que veem como prioridade a adoção da tarifa zero no transporte público. Durante 16 anos, o modelo de gratuidade funcionou em Hasselt. O sistema instituído em 1º de julho de 1997 foi abolido no primeiro semestre de 2014, devido à crise econômica europeia. Antes da decisão pelo passe livre, a prefeitura subsidiava 75% do valor dos bilhetes. A iniciativa começou com pouco mais de 70 mil habitantes e, logo no primeiro ano, o número de viagens saltou de 360 mil para 1,5 milhão. O modelo atendeu 4,5 milhões de passageiros em 2004. A tarifa atual é de 0,5 euro ou R$ 1,43. Idealizador do projeto ‘Tarifa Zero’, o ex-secretário de Transportes da cidade de São Paulo, Lúcio Gregori entende que muitas cidades poderiam adotar a gratuidade do transporte público com o orçamento que têm. Em outras, seria preciso inverter as prioridades. “Em vez de as prefeituras gastarem fortunas com viadutos para automóveis, túneis que não comportam ônibus e avenidas que levam a loteamentos distantes, elas poderiam subsidiar a tarifa e até torná-la gratuita”, sugeriu Gregori em entrevista à UnBTV. Para viabilizar essa ideia em metrópoles e em cidades maiores, especialistas em transporte acreditam que seja necessária a adoção de um modelo mais democrático na redefinição dos impostos. Eles defendem a seguinte ideia: quem tem mais paga mais; quem tem menos paga menos e quem não tem nada não paga.

O trânsito de BH

3 LUGAR

2.479.165

Veículos por pessoa

Habitantes

(dentre as capitais do país)

(estimativa 2013)

IBGE e Denatran

1.116.896 Veículos (dez/2013)

0,45 Veículo por habitante | 13


Liberty Seguros (2014)

em Betim e trabalha há quase cinco anos como auxiliar doméstica em Belo Horizonte. Ela sofre rotineiramente com os transtornos causados pelo transporte público. “Eu pego dois ônibus com dificuldade e eles demoram muito tempo para passar. Às vezes, os motoristas até ‘matam’ os horários. Quando isso acontece, fico no ponto esperando, mas o coletivo não vem. Há também muita confusão para entrar no ônibus. As pessoas não respeitam as filas, lotam o coletivo e nos fazem esperar até a próxima lotação”, relata Geissa, moradora do Vila das Flores.

A redução da tarifa é mais do que benéfica para a população que sofre com as dificuldades de acesso ao transporte público no país. Mas a solução precisa vir acompanhada de melhorias na infraestrutura dos coletivos. A frota está longe de ter a mesma eficiência, o conforto e a segurança dos carros. Nos quatro primeiros meses de funcionamento do Bus Rapid Transit Move (BRT Move) na capital mineira, ocorreram oito falhas mecânicas e um incêndio nos ônibus articulados. Caso esses problemas não fossem recorrentes, o cidadão poderia manter o veículo particular em casa, usando o transporte coletivo. A opção pouparia o cidadão diariamente do cansaço de dirigir.

Por causa do desconforto, do desrespeito de alguns e dos atrasos, muitas pessoas optam pelo transporte individual. E a política federal de incentivo à compra de veículos novos vem facilitar essa decisão. A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e de outras contribuições colaborou para que a frota brasileira de carros dobrasse na última década. No Brasil, os subsídios ao transporte individual são oito vezes maiores do que os destinados ao transporte coletivo – isso contando investimentos diretos e indiretos. “Se invertemos a prioridade e desenharmos obras e planos para a construção de cidades baseadas no transporte público, poderíamos ter mobilidade urbana. Como bônus, ganharíamos uma cidade mais limpa, melhor para caminhar e mais generosa e bonita”, acredita Maria Elisa Baptista, doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Prourb-UFRJ).

Se o preço e a má qualidade do serviço dificultam o acesso ao transporte público, outros fatores reforçam o problema, como a insuficiência de veículos e de rotas. Em São Paulo, a prefeitura passou a adotar ônibus articulados e outros pouco maiores que os tradicionais. O número de assentos em cada veículo aumentou, mas a média de coletivos nas ruas é a menor desde 2009: 14,7 mil carros. Já a implantação do BRT Move vai eliminar 213 linhas de ônibus da capital mineira até o final do projeto. A expectativa da Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans) é de que o Move possa atender os usuários dessas linhas, embora o dia a dia venha mostrando o contrário. Os problemas da mobilidade afetam não só os moradores das capitais, mas os que vivem nas cidades das regiões metropolitanas. Geissa Pinheiro, 40 anos, mora 14 | www.voxobjetiva.com.br

Liberty Seguros (2014)


BHTrans (2013)

anos, tornando o uso da bicicleta crucial no dia a dia do cidadão. A metrópole também transporta 5 milhões de passageiros diariamente pelo metrô – cerca de 61% da população. Em média, um passageiro dentro de um automóvel ocupa de dez a 12 metros quadrados de rua. Enquanto isso, um usuário de transporte coletivo ocupa apenas um metro quadrado e meio. Por isso, quanto mais pessoas passarem a usar o transporte público e menos os carros estiverem circulando, melhor será o trânsito e mais tempo o cidadão vai ter para se dedicar a outras atividades ou ao lazer. “O que mais me cansa não é o trabalho, mas o estresse de esperar o ônibus. Tenho que aguardar em pé por muito tempo. Quando o ônibus chega ao ponto, ele já está lotado. Faço a viagem em pé e espremida até o destino. Às vezes, saio do trabalho às 15h e chego em casa entre 18h e 18h30, quando não chego às 19h”, lamenta Geissa. Outras políticas de mobilidade podem ser planejadas para trazer mais qualidade de vida à Geissa e à população. A construção de linhas de metrô e ciclovias são boas alternativas. Nova Iorque, por exemplo, tem a quarta maior rede de metrô do mundo e 1,44 mil quilômetros de ciclovias, sendo 410 quilômetros feitos nos últimos quatro anos. Com isso, a cidade quadruplicou o número de ciclistas nos últimos dez

Até as mudanças nas relações de trabalho tendem a ajudar na melhoria da mobilidade urbana. Para 78% dos belo-horizontinos entrevistados na pesquisa da Liberty Seguros, a flexibilização do horário e do espaço de trabalho pode trazer benefícios ao cidadão. As atividades feitas pela internet, por exemplo, podem diminuir o número de carros nas ruas, principalmente nos horários de pico. Essa forma de trabalho também pode reduzir o número diário de viagens feitas pelo trabalhador. Soluções não faltam para que congestionamentos de 306,37 quilômetros – como o registrado no dia 10 de abril do ano passado na capital mineira – sejam evitados. A medida serviria até mesmo para que o cidadão não perca 11 dias por ano à espera de ônibus nem fique preso no tráfego, como ocorre em Belo Horizonte. É preciso agir como fizeram os manifestantes do ‘Tarifa Zero’ e de outros movimentos autônomos ou como aqueles cidadãos que buscam entender a pauta da mobilidade urbana e se mobilizam em favor de melhorias para a própria cidade. | 15


Artigo

Robson Sávio

Justiça

Copa, educação, mídia e eleições Nos últimos meses, parte da mídia e de um grupinho de endinheirados tentou implantar pânico e contaminar o debate em torno da realização da Copa do Mundo no Brasil. Primeiro disseram que o jogo de abertura ia expor o país da incompetência. Depois garantiram que o Brasil passaria vergonha diante da comunidade internacional. Também falaram que faltaria energia elétrica e que os estádios e os aeroportos não estariam prontos nem preparados para receber os visitantes. Torceram ardorosamente para que as manifestações voltassem num ímpeto avassalador. E o que se viu foi um povo receptivo e acolhedor. Na abertura da Copa, ‘coxinhas’ da classe média protagonizaram uma cena de incivilidade e covardia ao xingar a presidente Dilma Rousseff. A turma da área vip da Arena Corinthians frequenta as páginas de ‘Caras’ e parece continuar na Idade Média. Esses mal-educados representam segmentos que não estão aguentando ver o país cada vez menos desigual e mais democrático, plural e polifônico. Eles têm saudades do velho Brasil, quando 30% da população tinha direitos e privilégios. O resto era tratado como cidadãos de segunda categoria.

Depois de mentir sobre a realidade da Copa, os donos das capitanias hereditárias da mídia nacional e alguns de seus colunistas pitbulls foram expostos ao ridículo. Não satisfeitos, ainda tentam criar falácias para manchar a imagem do país. No desastre do viaduto da avenida Pedro I, alguns jornalões noticiaram como “obra da Copa” uma intervenção de mobilidade urbana de responsabilidade municipal. Quando a mídia se transforma em partido político "Parte da elite e distorce os fatos, a democracia perde. “Estamos preparados para o costumeiconservadora ro desempenho da mídia nativa, a alegar e atrasada tem isenção e equidistância enquanto confirdinheiro, mas não ma o automatismo da escolha de sempre ir contra qualquer risco de mudança”, estem educação nem creveu Mino Carta.

civilidade"

Parte da elite conservadora e atrasada tem dinheiro, mas não tem educação nem civilidade. Uma pesquisa feita no jogo Brasil e Chile, no Mineirão, comprovou que 90% do público da Copa é das classes A e B. Desse grupo, 86% têm ensino superior. Esses dados lançam uma hipótese: assim como a educação básica, o ensino universitário no Brasil está falido. Estruturada para formar uma elite, a educação superior colaborou para a criação de castas conservadoras e refratárias às políticas de ampliação da cidadania, 16 | www.voxobjetiva.com.br

como o programa ‘Mais Médicos’. A tentativa de democratizar o ensino superior nos últimos anos pode ter incitado ainda mais o ódio de alguns segmentos sociais em relação às mudanças em curso no país.

Agora começa a disputa eleitoral. Cálculos feitos por especialistas dão conta que essa vai ser uma campanha bilionária, abastecida na lavanderia das obras superfaturadas. Sejamos claros: com esse sistema de financiamento privado de campanha, quem elege os políticos é o poder econômico; não o cidadão-eleitor. Poderíamos ter alguma esperança, caso tivéssemos uma Justiça Eleitoral eficiente. Mas essa instituição só pode se gabar, de fato, da urna eletrônica.

robson Sávio Reis Souza Filósofo e cientista social robsonsavio@yahoo.com.br


Arquivo/ABr

Vencendo a desconfiança

Fifa Fan Fest, no Vale do Anhangabaú, na Região Central da capital paulista

Vox Objetiva faz o balanço da Copa do Mundo nas capitais dos três maiores estados do país e registra o legado do maior evento de futebol do planeta

Leo Pinheiro, do Rio de Janeiro - Lucas Alvarenga, de Belo Horizonte - Paula Rangel, de São Paulo

SÃO PAULO | Onde o sonho começou Foram sete segundos de exibição de um dos mais promissores legados da Copa do Mundo no Brasil. Com a força do cérebro, o cadeirante Juliano Pinto fez mover um robô que o levantou e permitiu que ele desse o pontapé inicial do evento, em plena Arena Corinthians. O feito foi conseguido pelo projeto Exoskeleton, coordenado pelo neurocientista paulistano Miguel Nicolelis. Mostrada para todo o mundo por meio da TV, a iniciativa é um retrato do Mundial: um misto de superação e criatividade. Pronta às vésperas da Copa, a Arena Corinthians – popularmente conhecida como Itaquerão – lançou dú-

vidas sobre a participação paulista no Mundial. Mas o faturamento de mais de R$ 1 bilhão com o turismo surpreendeu. O valor é 15 vezes superior ao registrado em eventos, como a Fórmula 1 e o Carnaval. “As previsões mais otimistas foram superadas. Aqui os visitantes se sentiram em casa e foram bem atendidos”, disse o prefeito Fernando Haddad. Para bem receber mais de 540 mil turistas, a prefeitura de São Paulo investiu entre R$ 30 milhões e R$ 40 milhões em operações de trânsito e estruturas no Sambódromo do Anhembi e no Autódromo de Interlagos. Os palcos do samba e da velocidade paulistanos foram tomados principalmente por argentinos, espalhados por barracas e trailers. De acordo com dados da | 17


O turismo no Brasil da Copa Os números do setor durante o Mundial de futebol no país

Rio de Janeiro

Total de turistas

Total de turistas estrangeiros

Gasto médio do visitante por dia

Receita direta com turismo

886 mil

471 mil

R$ 639

R$ 4,4 bi

bELO hORIZONTE

Total de turistas

Total de turistas estrangeiros

Gasto médio do visitante por dia

355 mil

200 mil

R$ 179

Receita direta com turismo

R$ 451 mi

Belotur, Riotur e SP Turis.

sÃO PAULO

Total de turistas

Total de turistas estrangeiros

Gasto médio do visitante por dia

Receita direta com turismo

540 mil

220 mil

R$ 578

R$ 1 bi

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São Paulo Turismo (SP Turis), os ‘hermanos’ lideraram a lista de estrangeiros durante a Copa: eles eram 38% dos 220 mil ‘gringos’ presentes na capital paulista. Logo atrás deles vieram os chilenos (9,52%), os colombianos (7,7%) e os estadunidenses (5,05%). Em média, cada estrangeiro ficou oito dias na capital paulista e gastou R$ 4,8 mil durante o período do Mundial em São Paulo. Juntos, os turistas do Brasil e do exterior movimentaram R$ 1,8 bilhão na cidade. Parte desse sucesso se deve à gastronomia e à vida noturna, apontadas como os mais importantes atrativos paulistanos. O boêmio bairro da Vila Madalena, na Região Sul, reúne os principais bares e restaurantes da capital paulista. A cada jogo, o local recebeu mais de 50 mil pessoas. Outro sucesso foi o Fifa Fan Fest, instalado no Vale do Anhangabaú, na Região Central. O evento recebeu 1,8 milhão de pessoas nas 62 partidas do Mundial. E os números positivos se repetem, quando o assunto é a ocupação da Arena Corinthians. Em média, cada uma das seis partidas do Itaquerão contou com 62,9 mil torcedores. O índice de 99,07% de ocupação do estádio foi o terceiro melhor da Copa. Ao todo, 375.593 espectadores passaram pela arena. Antes motivo de preocupação, o transporte público foi a opção preferida dos turistas em São Paulo. O trem urbano e o metrô levaram juntos 345 mil passageiros para o Itaquerão. Aliás, o metrô foi o transporte mais usado pelos visitantes (43%), seguido pelo ônibus (19%) e o carro próprio (10%). Por essas e outras, 72,1% dos turistas deram notas entre 7 e 10 para a cidade de São Paulo durante o Mundial. A multidão de visitantes ficou majoritariamente hospedada em hotéis (26,1%) ou na casa de parentes e amigos (19,1%). Mas o índice aparentemente baixo do setor hoteleiro durante o Mundial engana. A primeira parcial mostra um aumento de 7% na ocupação de quartos em relação à média de 2013. Ao todo, foram reservados 105 mil leitos e 42 mil apartamentos nos 420 hotéis, flats, resorts e nas pousadas da cidade. No dia da abertura da Copa, o setor registrou um índice de 82% de ocupação, um dos maiores já vistos em São Paulo. Nos outros cinco jogos, a ocupação ficou acima de 70%. Os bons resultados vieram acompanhados de melhorias no atendimento e na infraestrutura do setor hoteleiro. Antes do torneio, foram feitos investimentos no treinamento de copeiros, garçons, recepcionistas e atendentes, e reformas físicas, como a troca de pisos e de luminárias.


Para alguns especialistas, o principal legado da Copa fica para o turismo, setor que teve a sua imagem transformada durante o Mundial. É nisso que acredita o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis de São Paulo (ABIH-SP) e coordenador da Câmara Temática da Copa do Conselho Estadual de Turismo, Bruno Omori. “As pessoas conheciam a cidade como um polo de negócios, mas agora a capital e o estado também passaram a ser referência de lazer e entretenimento. Quase 3,2 bilhões de espectadores acompanharam pela TV os jogos e a outra face paulista. O mundo viu as festas na Vila Madalena, as fazendas históricas, as praias, os bares, a gastronomia e a receptividade do povo. Somos uma gente que abraça, tira foto, dá carona, informação e até paga uma cerveja para o visitante”, ilustra Omori. O mundo conheceu uma nova São Paulo pelo turismo. Agora o empresariado espera rever esses turistas entre os momentos. “São Paulo recebeu seis jogos do torneio, e o estado hospedou 15 das 32 seleções. Esse fato gerou uma mídia internacional nunca vista. Nós esperamos consolidar essa marca trazendo mais negócios, turistas, congressos, feiras e passeios. Também queremos trazer para a capital paulista aquele visitante do fim de semana que deseja viver e aproveitar o lazer e a gastronomia da cidade”, assegura Omori.

BELO HORIZONTE | Uma Copa democrática Jorge Ben Jor cantou “deu no New York Times”, e Minas Gerais incorporou o verso da música W Brasil. Antes de a bola rolar, o principal jornal dos Estados Unidos destacava alguns atrativos do estado, que vão muito além do berço do barroco brasileiro. O Museu de Arte Contemporânea Inhotim, o Circuito Cultural Praça da Liberdade e as obras de Niemayer foram destacados pelo diário. Durante o período em que a bola rolou no estado, 32% dos turistas visitaram as cidades históricas de Ouro Preto, Mariana e Tiradentes, além de tantas outras no Interior mineiro. Nem o fatídico ‘Mineirazo’ apagou o brilho da participação mineira no maior evento de futebol do planeta. Minas Gerais recebeu 355 mil visitantes no período, sendo 200 mil estrangeiros. Em média, cada turista ficou sete dias na capital e gastou R$ 1,2 mil durante o Mundial em Belo Horizonte. O valor é 35% superior ao registrado no período da Copa das Confederações, em 2013. “O Mundial foi a oportunidade única para os mineiros. Tivemos um intercâmbio cultural muito positivo que transformou a cidade em uma grande festa”, observou o secretário estadual extraordinário para a Copa do Mundo, Tiago Lacerda.

João Marcos Rosa/ Portal da Copa

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O Mineirão foi o segundo estádio do país a conquistar o grau máximo de sustentabilidade

Além de injetar uma receita direta de R$ 451 milhões na economia, a Copa do Mundo serviu para revitalizar alguns espaços na capital mineira. De acordo com a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), a Savassi recebeu mais de 200 mil pessoas no período do Mundial. O grande movimento na região impulsionou o comércio, elevando as vendas em 200%. Dono do Bar e Restaurante Casa Cheia Savassi, Vinicius Pereira comemorou o aumento de 40% nos lucros durante a Copa. “Mudamos a decoração da casa, instalamos TVs, fizemos cardápios em inglês e contratamos dois garçons bilíngues. Eles foram treinados durante o festival ‘Comida de Buteco’. Agora nós colhemos os frutos do investimento. Nossa perspectiva é de que o movimento continue em alta e parte dos contratados seja efetivada”, projeta. A cada esquina da Savassi, turistas nacionais e estrangeiros eram tentados a experimentar alguma especialidade mineira. E eles se surpreenderam. De acordo com a Secretaria de Estado de Turismo e Esportes de Minas Gerais (Setes-MG), 77% dos visitantes provaram a culinária regional. Dentre eles, 41% experimentaram o feijão tropeiro e 32%, o pão de queijo. Antes estranho aos olhares estrangeiros, o tropeiro do Mineirão ganhou as páginas do jornal El País, da Espanha. Em 15 dias de Fan Fest na capital mineira, foram feitas mais 3,5 toneladas da iguaria, seguida por 900 quilos de pão de queijo. | 19


Mineiros na estrada Os números do setor durante o Mundial de futebol no país

Turistas brasileiros em São Paulo Paulistas do interior

Fluminenses

172 mil

Mineiros

9,7 mil

7,9 mil

Turistas brasileiros no Rio de Janeiro Paulistas

Mineiros

167 mil

A culinária e a hospitalidade foram fundamentais para a invasão estrangeira na capital mineira. Ainda de forma preliminar, a Empresa de Turismo de Belo Horizonte (Belotur) aponta argentinos, chilenos e colombianos como a maioria ‘forasteira’ pelas ruas de Beagá. No primeiro jogo da cidade no Mundial, 20 mil colombianos invadiram o Mineirão. Segundo o presidente da Belotur, Mauro Werckema, estrangeiros de mais de 60 nacionalidades estiveram em Belo Horizonte. “Mostramos um Brasil além do eixo Rio – São Paulo. Agora o desafio é fazer essa experiência se estender para depois da Copa”, enfatiza. A maioria latino-americana na cidade tem justificativa. A seleção argentina treinou até o final da Copa do Mundo na Cidade do Galo, Centro de Treinamento 20 | www.voxobjetiva.com.br

50 mil

Capixabas

28 mil

(CT) do Atlético Mineiro. Já os chilenos optaram pela Toca da Raposa II, CT do Cruzeiro. Por isso, além dos hotéis, o Parque Ecológico da Pampulha e o Parque Lagoa do Nado foram dominados pelos turistas desses países e seus milhares de motorhomes. De acordo com a pesquisa, 46% dos turistas se hospedaram em hotéis e pousadas durante a Copa; 20% ficaram em albergues e 19% utilizaram a casa de amigos e de parentes. O restante optou pelas ‘casas sobre rodas’ e as barracas de camping. O recorde de ocupação hoteleira foi atingido na véspera da semifinal entre Brasil e Alemanha: 95%. Nos demais jogos, a taxa média foi de 75%. Quem ficou de fora do estádio pôde acompanhar os jogos e as 45 atrações musicais das Fifa Fan Fests. Em


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15 dias de eventos, 250 mil pessoas frequentaram o Pavilhão do Expominas, na Região Oeste de Belo Horizonte. Enquanto isso, o Gigante da Pampulha recebeu mais de 345 mil torcedores em seis jogos, alcançando uma média de 57,5 mil torcedores por partida. O acesso ao Mineirão foi feito, em grande parte, pelo transporte público. Nos dias de jogos, 100 mil passageiros usaram os ônibus dos terminais da Copa e 30 mil optaram pelo Bus Rapid Transit Move (BRT Move). Aliás, fora de campo, o Mineirão também fez bonito. O estádio reformado para a Copa do Mundo foi o primeiro do Mundial e o segundo do mundo a conquistar o selo Leed Platinum. O certificado internacional representa o grau máximo de sustentabilidade conquistado por ‘construções verdes’. Com ações de reaproveitamento da água e de materiais, coleta seletiva de lixo e produção de energia por meio de uma usina solar, o Gigante da Pampulha mostrou que o legado da Copa nem sempre é percebido. Mas ao ver o olhar de satisfação dos turistas nacionais e estrangeiros pelas praças e ruas de Belo Horizonte, é possível ver que Minas Gerais deixou marcas profundas nos visitantes. A maioria aprovou a capital mineira e os demais destinos turísticos de Belo Horizonte. Para 92% dos turistas, as cidades mineiras atenderam plenamente ou superaram as expectativas. Esses visitantes garantem: retornariam à capital mineira para lazer. Enquanto isso, 96% das pessoas que vieram a Beagá indicariam a cidade como destino turístico para amigos e parentes.

“O Mundial foi um divisor de águas para a capital. Antes, a cidade era o destino do turismo de negócios. A partir de agora, é também uma referência de cultura para o mundo”, sentenciou o secretário extraordinário para a Copa do Mundo em Belo Horizonte, Camillo Fraga.

RIO JANEIRO | Sob as bênçãos do Cristo Oriundos de 203 países, eles escolheram o Rio de Janeiro como o porto seguro durante a Copa do Mundo. Pelo ar, por mar e por terra, 886 mil turistas desembarcaram na Cidade Maravilhosa, segundo a Polícia Federal. Foram 471 mil estrangeiros e 415 mil visitantes nacionais. Juntos, eles superaram em duas vezes a previsão inicial de presença de visitantes na cidade. Alguns turistas estrangeiros vieram de nações que sequer se classificaram para o torneio, como Suécia e China. Também havia ‘forasteiros’ de países cujas seleções disputaram jogos em outras cidades-sedes. “Quando se fala sobre o Brasil lá fora, automaticamente lembra-se do Rio. Fala-se em monumento brasileiro, lembra-se do Cristo Redentor. Fala-se em praia brasileira, lembra-se de Copacabana. É natural que o turista que fez uma viagem longa até aqui usufrua da ideia que ele tem do nosso país em seu imaginário”, diz Antonio Pedro Figueira de Mello, secretário municipal de Turismo do Rio de Janeiro e presidente da Riotur. Diversos turistas optaram por se hospedar no Rio de Janeiro para ir às partidas em outras sedes. E milhares Alexandre Macieira

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decidiram assistir ao Mundial na cidade mesmo sem ir aos jogos. “Muitas pessoas foram às cidades sem tickets apenas para viver o clima. Os Fifa Fan Fests ajudaram a criar essa ambientação. Acredito que isso também tenha influenciado a escolha dos visitantes, além da atração natural que o Rio exerce sobre as pessoas”, justifica Figueira de Mello. Para o secretário, a montagem do Centro de Mídia da Copa na capital fluminense foi estratégica para a cidade. “O foco do prefeito Eduardo Paes sempre foi diferente do dos demais dirigentes. Enquanto todos brigavam para sediar um jogo da seleção brasileira, a luta do Rio era pelo Centro de Mídia e pela final. Se a cidade foi o coração da Copa no Brasil, deve e muito ao fato de ter recebido o Centro Internacional de Transmissão (IBC) e o Centro Aberto de Mídia. Juntos, os espaços acomodaram quase 22 mil jornalistas. A cidade também recebeu a vila de árbitros e o quartel general da Fifa e das seleções da Holanda e da Inglaterra. Isso, sem falar na final, acompanhada por 3,6 bilhões de pessoas em todo o planeta. A decisão é praticamente um grande evento dentro de outro grande evento”, ressalta.

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Ser o cenário da maioria das matérias da Copa foi determinante para que muitos turistas viessem para o Rio após o início do Mundial. Na liderança do ranking de visitantes aparecem os ‘hermanos’ argentinos, com 77 mil turistas. Na sequência vêm os chilenos, com 45 mil; os colombianos, com 31 mil; e os equatorianos, com 24 mil. Estimulados pela proximidade territorial, eles cruzaram fronteiras de carro, moto, ônibus e motorhome e consagraram o turismo terrestre. “A grande demanda de camping para comportar os motorhomes dos vizinhos sul-americanos motivou um trabalho da Secretaria de Turismo em favor desse segmento”, explica Alfredo Lopes, presidente da Associação Brasileira de Indústria de Hotéis (ABIH-RJ). A iniciativa da prefeitura abriu vagas para 900 veículos distribuídos entre o Sambódromo, o Terreirão do Samba e o Pavilhão da Feira de São Cristóvão. O dirigente da ABIH-RJ acredita que as soluções usadas para receber turistas na Copa possam ser repetidas nos próximos grandes eventos. “O setor de motelaria se movimentou muito para adaptar suas instalações aos padrões de hotelaria. Isso reforçou


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a oferta de acomodações econômicas. Houve uma grande demanda de camas extras, especialmente em hotéis de classificação três estrelas e nos pacotes com maior número de diárias. Os albergues também tiveram altos índices de ocupação no Mundial. A tendência é de que isso se repita nas Olimpíadas”, vislumbra. Além do reforço de hospedagens alternativas e econômicas, os empresários da hotelaria fizeram grandes investimentos em tempo recorde. Desde 2009, foram criados mais 6,8 mil quartos de hotel na cidade. Até os Jogos Olímpicos serão mais 15 mil. O superávit criado pela Copa de 2014 e possivelmente ampliado pelas Olimpíadas de 2016 abriu uma nova perspectiva para a indústria do turismo carioca. Antes pouco vistos no Rio, norte-americanos (24 mil), franceses (16 mil), mexicanos (15 mil), ingleses e alemães (10 mil de cada nacionalidade) chegaram motivados pelo evento. Mas a boa experiência pode fazê-los voltar à cidade e indicá-la. É o que aponta uma pesquisa feita pelo Observatório do Turismo da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). De acordo com o levantamento, 98,8% dos turistas tiveram as expectativas atingidas ou superadas; 98,3% recomendariam o destino a parentes e amigos; e 58% dos entrevistados têm a intenção de acompanhar as Olimpíadas no Brasil. A

hospitalidade carioca foi o quesito mais elogiado pelos estrangeiros, com 97,1% de aprovação. Antes questionadas, a segurança pública e a limpeza também alcançaram bom índice de aprovação: 76%. A mesma pesquisa previa uma arrecadação de R$ 1 bilhão para o turismo carioca. Mas a receita mais que quadruplicou durante o Mundial. Os cofres públicos locais receberam R$ 4,4 bilhões no período. Em média, cada visitante permaneceu nove dias na cidade, com gasto diário de R$ 639,52. Se forem comparados com grandes eventos recentes, os números apontam evolução. Durante a Copa, até o sistema de transporte de massa e os aeroportos foram elogiados. Mas há muitos aspectos de infraestrutura e de serviços a evoluir para que a boa imagem recém-construída não se perca. “O maior ganho obtido com a Copa é intangível. É aquela imagem do Cristo com o sol por trás e a Fan Fest lotada na praia de Copacabana. A imagem foi exibida pela Fifa durante a final e projetada para lares de todo o mundo. É também a presença de mais de 20 mil jornalistas que saíram daqui absolutamente encantados com a experiência vivida. Os números são frios demais para descrever esse alcance”, comemora Figueira de Mello. Para ele, o gol já foi marcado.

Presidente da Riotur acredita que o Rio exerça uma atração natural nos turistas

Riotur

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podium

Uma goleada de emoções Especialistas em saúde advertem: o futebol é capaz de provocar emoções que vão do êxtase à frustração. Por isso, torça com equilíbrio Thalvanes Guimarães

o

nze ‘soldados’ de cada lado, dispostos em um gramado com dimensões médias de 105 metros por 68 metros. Os objetivos desses dois ‘exércitos’ são os mesmos: defender o seu lado, atacar o outro e fazer com que a bola entre em espaços de 17,8 metros quadrados situados nas extremidades do campo. Assim é o futebol: o esporte mais popular do mundo. Dizer que esse jogo se resume a 22 homens correndo atrás da bola não sugere sua real dimensão. No Brasil, o futebol é uma das principais expressões da identidade nacional. Em todo o mundo, esse esporte transcende as quatro linhas ao representar a cultura de um país, acumular recordes de audiência e de faturamento e promover a inserção social. Em setembro do ano passado, a negociação do winger Gareth Bale assombrou o mundo. O ponta galês custou 100 milhões de euros aos cofres do Real Madrid. O clube também foi o que mais faturou em 2013: 518,9 milhões de euros. De acordo com a consultoria suíça ATKearney, o valor obtido pelo clube espanhol é irrisório perto dos R$ 455 bilhões a R$ 577 bilhões que esse esporte movimenta anualmente.

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A audiência do futebol também é expressiva. A Federação Internacional de Futebol Associado (Fifa) acredita que a Copa de 2014 tenha superado o recorde de 3,2 bilhões de espectadores da Copa do Mundo de 2010. Mas isolados, os números não expressam o sentimento de milhares de torcedores. Algumas pessoas colocam o futebol como a maior paixão de suas vidas, perdendo o equilíbrio e arriscando a saúde. Foi o que aconteceu com o carioca Jairo de Oliveira, de 69 anos. Ele não resistiu a um infarto que o acometeu em pleno Mineirão, durante o jogo tenso entre Brasil e Chile. Em Bruxelas, um torcedor sofreu uma queda após subir em uma estátua para comemorar a vitória da seleção belga. Ele acabou morrendo. O mesmo destino teve a nepalesa Pragya Thapa. A garota de 15 anos não suportou a goleada sofrida pela seleção brasileira diante da Alemanha e se suicidou.

O envolvimento excessivo com o esporte pode ser prejudicial e acabar contribuindo para uma visão distorcida da realidade. Segundo a psicóloga do esporte Dafne Secco, o esporte contribui para a qualidade de vida, desde que seja tratado com equilíbrio. “O que é prioridade: o cuidado com a saúde ou a idolatria


Jefersson Bernardes - Vipcomm

podium

ao time? Não se pode tirar o foco da qualidade de vida por conta de uma equipe de futebol. É errado colocar o imaginário como algo mais importante que a saúde, os relacionamentos e o emprego”, salienta. Os nervos à flor da pele atrapalham até mesmo o torcedor que deseja celebrar uma vitória do time do coração. No dia em que os atleticanos festejaram a conquista mais importante da história alvinegra, a cantora Vitória Rabello pouco pôde comemorar. Durante um mês, ela não conseguia dormir direito. A ansiedade havia dominado a intérprete por inteiro, e o corpo logo respondeu à pressão. Era dia 24 de julho de 2013. O Atlético tinha dificuldades para fazer os dois gols que levariam a disputa da Copa Libertadores da América para os pênaltis. Vitória seguia com o coração apertado, quieta e introspectiva. O tempo passou, e o time mineiro conseguiu o que muitos julgavam impossível. Mas, depois da partida, a cantora não suportou tanta emoção. Enquanto os amigos foram para o Centro da cidade comemorar, ela parou no hospital, de onde saiu apenas às 9h do dia seguinte. “A tensão acumulada fez com que minha pressão abaixasse muito, e o médico não permitiu que eu fosse para a festa”, lamentou.

Quando a ansiedade não é controlada, ocorrem casos como o de Vitória. Mas riscos ainda maiores sofrem os torcedores obesos, hipertensos, sedentários, fumantes e diabéticos. O cardiologista e médico do esporte Marconi Gomes alerta: na maioria das vezes, a angústia, o medo e a tensão provocados pelo futebol são o estopim para problemas cardíacos. Um estudo desenvolvido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) aponta uma informação inusitada. As chances de os brasileiros terem um infarto durante a Copa do Mundo – especialmente em dias de jogos do Brasil – aumenta de 4% a 8%. “A angústia causada por aquela bola na trave ou pela disputa de pênaltis está ligada à liberação de catecolaminas – substâncias derivadas da adrenalina. Esses neurotransmissores promovem o aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial. Com mais picos hipertensivos, cresce a chance de um infarto ou de um Acidente Vascular Cerebral (AVC)”, esclarece Gomes. E os excessos não são exclusividade dos latinos, conhecidos por serem bastante passionais. Em 2002, um estudo feito durante a Copa do Japão e da Coreia do Sul constatou um aumento de 63% da incidência de morte súbita | 25


podium

Torcedores comemoram vitória do Atlético-MG contra o Olímpia na final da Copa Libertadores da América

ta. “Ele nos passou o caminho da torcida rival, não sei se por maldade ou por desinformação. Quando viramos a esquina, demos de cara com mais de 10 mil pessoas. Imediatamente começamos a correr, o que não nos impediu de apanhar um bocado”, relata. Ao entrar no estádio, os torcedores visitantes viram que eles tinham apanhado porque estavam sujos e machucados. A situação criou um clima ruim entre os ponte-pretanos, que se revoltaram. Mais brigas aconteceram dentro e fora do estádio, envolvendo até os policiais. Ocasiões em que o torcedor se torna violento infelizmente são comuns. A psicóloga do esporte Aline Ribas compara a intolerância esportiva com um ‘pensamento cego’. “O fanatismo ocorre quando o equilíbrio de uma realidade é mínimo. Para que haja compensação interna, o sujeito age de forma violenta e tenta obter prazer com essa atitude”, explica. Bruno Cantini

cardiovascular durante o evento. Mas a emoção também pode gerar efeitos contrários. Na França, o número de infartos em homens caiu significativamente após a seleção francesa vencer o Brasil na grande final. A cruzeirense Lorena Abreu agora sabe o limite da emoção e faz dela sua aliada. Ela assistia ao jogo entre Cruzeiro e Botafogo, válido pelo Campeonato Brasileiro do ano passado, quando se empolgou demais com o primeiro gol celeste. “Ao comemorar, acabei caindo e batendo com a cabeça na parte de trás do sofá. Cortei o meu rosto, que sangrou muito, e fiquei desmaiada por alguns instantes”, detalha. Os pais da garota de 15 anos se preparavam para levá-la ao hospital, em Florianópolis. Mas Lorena relutou. “Não queria sair da sala e deixar de ver o jogo. Fui teimosa e acabei me arriscando”, lembra a estudante.

O fanatismo pode despertar outras nuances. O assessor esportivo Oswaldo Botrel é torcedor do São Paulo, mas viveu uma experiência inesperada por conta de outro time. O jornalista saiu às 22h de Viçosa, na Zona da Mata mineira, para chegar às 5h em Guaratinguetá, no Vale do Paraíba paulista. Ele foi ver a partida entre o time homônimo à cidade e a Ponte Preta, válida pela semifinal do Campeonato Paulista de 2008. Botrel estava acompanhado de amigos ponte-pretanos e não conhecia bem Guaratinguetá. Por isso, ele pediu orientação de como chegar ao estádio para um motoris26 | www.voxobjetiva.com.br

A violência no futebol brasileiro matou 234 pessoas até dezembro do ano passado. O mês foi marcado pela briga entre torcedores do Atlético Paranaense e do Vasco, na última rodada do Campeonato Brasileiro. A partida entre os times rebaixou o clube carioca pela segunda vez. Na ocasião, quatro pessoas ficaram feridas gravemente. A cena manchou a reta final da competição e despertou um alerta: até onde vai o limite da emoção? A resposta talvez esteja no equilíbrio. “A melhor forma de torcer é ter uma rotina marcada por exercícios físicos e por uma postura mental capaz de entender que o futebol é apenas um jogo”, pondera Gomes. Cruzeirenses festejam gol na vitória de 3 a 0 contra o Botafogo Washington Alves/ Vipcomm


artigo

Maria Angélica Falci

Psicologia

‘Barco furado’ Viver com pessoas duvidosas e que mentem desperta diversos sentimentos. Quando constatamos que alguém se comporta assim, acabamos desenvolvendo reações que vão da compaixão até a absoluta aversão àquele indivíduo. Afinal, para alguns é insuportável se relacionar com pessoas que agem dessa forma. Estudos apontam que há três tipos de mentiras. Duas são gravíssimas, e uma, totalmente desnecessária: a mentira por conveniência. Essa é uma prática rotineira para justificar um ato inadequado, um atraso ou uma falha boba. Por isso, é supérflua. Mas quem a usa não é forte o suficiente para assumir isso. A segunda desculpa é a mentira compulsiva, fruto de um transtorno mental. Esse desvio coloca o indivíduo em risco constante de se expor e de orbitar um universo ‘tragicômico’. A pessoa passa a viver sem a menor credibilidade. Quem mente de forma compulsiva não consegue falar a verdade. Por isso, desenvolve vários conflitos em seus relacionamentos. Muitos transtornos potencializam essa estrutura emocional e comportamental.

estudam lugares, arquivam informações de terceiros e se apropriam delas. E, assim, muita gente é envolvida nessas mentiras porque essas pessoas se expressam com exatidão. Elas acabam embolando a vida emocional e financeira e levam outros indivíduos para o seu ‘barco furado’. Pessoas assim pretendem ser aceitas e valorizadas. Como a realidade delas não se aproxima da ideal, elas passam a construir um universo particular. Essa é uma realidade cruel, que traz constrangimentos para o sujeito e seus familiares. A insegurança e a pouca autoestima são as principais características do mentiroso compulsivo ou mitomaníaco. Eles geralmente desenvolvem um discurso de autopromoção porque creem que somente assim serão aceitos ou respeitados. Mas a maioria não move uma palha para conquistar esse lugar.

"A insegurança e a pouca autoestima são as principais características do mentiroso"

A terceira mentira é chamada de ‘mitomania’. As pessoas que a sofrem têm um distúrbio gravíssimo e se envolvem integralmente nas mentiras, criando cenários totalmente factíveis. Elas vivem naquele universo fantasioso como se fosse real e são capazes de inventar situações e descrever locais com riqueza de detalhes. Esses indivíduos são convincentes e persuasivos. Seria como uma pessoa sem estudos e com poucas possibilidades de crescimento dizer que é muito rica e que viveu anos nos Estados Unidos em um haras particular. Para dar veracidade à história, pegam fotos de outros,

É preciso viver a realidade sem fantasias mirabolantes; buscar um lugar ao sol com esforço e determinação; lutar para modificar as condições de vida, caso não esteja feliz. Mas também é necessário sonhar com foco na realidade. Aqueles que não conseguem absorver nem colocar em prática esses requisitos precisam de ajuda urgente. Uma vida fantasiosa leva à autodestruição. Saia desse ‘barco furado’!

Maria Angélica Falci Psicóloga clínica e especialista em Sáude Mental angelfalci@hotmail.com | 27


Salutaris

Pequenos &

sarados

Presença de crianças e de pré-adolescentes em academias suscita o debate: qual é o momento certo para começar treinamentos de musculação? André Martins

i

r à escola, assistir a desenhos animados e brincar são ações próprias da infância. Mas ainda que cumpra esses pré-requisitos, o romeno Giuliano Stroe não é o que se pode considerar uma criança normal. Com 10 anos recém-completados, o menino tem um condicionamento físico espantoso e um corpo esculpido. Tão impressionantes quanto a musculatura do garoto são as exibições de força que ele faz em vídeos divulgados na internet. Em todas as gravações, a voz do pai aparece ao fundo. ‘Força!’, diz ele em tom encorajador. O irmão mais novo de Giuliano, Claudio, está no mesmo caminho. Com apenas 7 anos, o caçula é detentor de dois recordes mundiais - um por fazer flexões verticais em 90 graus e outro por segurar um poste como uma bandeira humana. A receptividade para o conteúdo postado no perfil do garoto no facebook e no canal que ele mantém no youtube desde os 5 anos de idade não pende para uma opinião homogênea. Há quem considere tudo um verdadeiro abuso por parte do pai das crianças. Mas ele se defende dizendo que os filhos não usam medicamentos e que as crianças se exercitam porque gostam. Outros internautas parabenizam os esforços e chamam a atenção para a aparente saúde e o contentamento das crianças por praticar algo que supostamente lhes dá prazer.

Casos como o de Giuliano e Claudio Stroe compõem uma série de histórias exploradas pela mí28 | www.voxobjetiva.com.br


Salutaris

dia sem a devida atenção. É em que acredita o personal trainer Abel Assis. “Na hora de formar opinião, a criança depende dos responsáveis por elas. Provavelmente o pai dessas crianças esteja por trás disso tudo. Mesmo tendo ouvido falar dos irmãos Stroe, não tenho conhecimento de causa. Por isso, prefiro não opinar. Mas meu padrinho fisiculturista tem dois filhos que já vivem da atividade física. Um deles tem 10 anos e o outro, 14. Os dois fazem musculação e usam suplementos básicos de forma controlada. O pai deles não deu apenas um halter para os meninos carregar nem os encheu de suplemento. Há todo um cuidado e uma cultura física envolvidos”, relata Assis. A presença de crianças e de pré-adolescentes em espaços fitness vem crescendo no Brasil. É possível encontrar academias especializadas no atendimento a esse público. Além de se ocupar com atividades, como dança, natação e lutas, crianças e pré-adolescentes começam a migrar para salões com estrutura favorável ao culto do corpo. Mas qual seria a idade apropriada para iniciar esse tipo de atividade e obter massa muscular?

Com mais de 40 anos de experiência em endocrinologia, Antônio José das Chagas explica que há um acontecimento na maturação juvenil que possibilita esse tipo de atividade: a puberdade. Chagas é o primeiro endocrinologista do estado e presidente do Comitê de Endocrinologia Pediátrica da Sociedade Mineira de Pediatria. O especialista ressalta que o começo dessa fase pode variar de acordo com o biotipo corporal e até com as peculiaridades genéticas. “No caso das meninas, a puberdade inicia quando elas menstruam pela primeira vez. Para os meninos, a mudança acontece por volta dos 12 ou 13 anos. A partir dessa fase, o corpo começa a produzir hormônios específicos. Nos rapazes, a testosterona é gerada pelos testículos. Nas moças, o estrógeno e um pouco de testosterona, que é produzida via suprarrenal”, detalha. A testosterona é o principal responsável pelo desenvolvimento muscular humano. As diferentes quantidades desse hormônio no organismo e as características repassadas geneticamente – o biótipo – são as responsáveis pela variedade natural de portes físicos. Chagas atende pré-adolescentes que manifestam o desejo de desenvolver os músculos. A maioria são meninos com idade entre 14 e 16 anos. Para o endocrinologista, não é a busca por uma vida saudável que atrai os garotos para as academias. “Hoje em dia, há muito modismo. Eles chegam aqui querendo resultados, mas é preciso entender que os organismos são diferentes. Alguns têm estrutura e produção hormonal para atingir um corpo muito musculoso. Outras podem atingir resultados satisfatórios, mas não iguais aos do colega”, pondera. Estudante do oitavo ano do ensino fundamental, Vitor Hugo Nogueira tem 13 anos. Ele iniciou os treinamentos de musculação há três meses. Mas o interesse pela academia surgiu bem antes: aos 10 anos. “Sempre quis ficar mais forte”, conta o garoto de um metro e setenta de altura e 50 quilos. Para atingir os objetivos, Vitor diz que se alimenta corretamente e faz uso de suplementos hipercalóricos e à base de proteína. Para Chagas, o principal perigo da musculação precoce é a disfunção na fabricação do hormônio do crescimento: o GH. A dinâmica de produção do GH é inversamente proporcional à da testosterona. Enquanto o nível do GH cai até estabilizar a completa maturação óssea, a produção da testosterona cresce a partir da puberdade. Por isso, a diminuição do hormônio GH poderia levar a criança a não se desenvolver adequadamente e a torna propensa a um quadro de raquitismo. | 29

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Salutaris

Opinião contrária tem Bruno Coraucci, secretário-geral da Confederação Brasileira de Musculação, Fisiculturismo e Fitness (IFBB Brasil). Ele crê que não haja idade para começar a malhar e questiona um possível prejuízo na produção de GH. “O ideal é que esse treinamento seja controlado e coerente com a idade de cada um. A musculação sempre teve o estigma de ser prejudicial ao desenvolvimento das crianças. Mas, se pararmos para pensar, esportes como futebol, basquete e vôlei têm muito mais impactos do que a musculação”, opina.

André Martins

No Brasil, os pré-adolescentes iniciam em competições oficiais da IFBB Brasil a partir dos 16 anos. Nesses eventos, crianças fazem apresentações performáticas, mesmo não tendo corpos atléticos. As exibições funcionam como estímulo para uma vida mais saudável. De acordo com Coraucci, a IFBB já criou uma categoria de competição chamada ‘Fitness Infantil’. No entanto, os torneios que envolvem crianças se restringem principalmente a países europeus.

Mesmo com ‘ares de recreação’, o personal trainer Abel Assis desaconselha a prática de musculação para crianças. Segundo o especialista, os ossos e as articulações infantis não estão preparados para carregar peso. E é nessa fase que começa o desenvolvimento ósseo. No entanto, essas restrições não impedem que as crianças frequentem academias. Assis atende a públicos das três faixas etárias. Para os

Personal trainer Abel Assis esclarece vantagens e desvantagens da prática de musculação para crianças

pequenos, as possibilidades colocadas são os exercícios funcionais em três aulas de 50 minutos ao longo da semana.

“A criança está pronta para brincar. Mas se em uma academia a gente fala essa palavra, vira uma confusão” Abel Assis, personal trainer

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“A academia pode melhorar o raciocínio, a coordenação motora e a flexibilidade da criança, além de reduzir o percentual de gordura dela. Nesse ambiente, a criança passa a ter uma percepção melhor do próprio corpo e a querer se cuidar mais. Indiretamente, ela acaba apresentando melhora na vida escolar e social ao interagir com outras crianças”, entende. De acordo com o personal, o trabalho com crianças em uma academia requer estratégias. As atividades são dinâmicas e sempre têm ‘algo a mais’. “A princípio, elas não chegam à academia com a intenção de se cuidar. As crianças sabem que aqui vai ter algo diferente pra elas”, explica. “A criança está pronta para brincar. Mas se em uma academia a gente fala essa palavra, vira uma confusão. Então desenvolvemos desafios, disputas saudáveis e gincanas”, arremata.


artigo

Kênio Pereira

Imobiliário

Modelo de contrato favorece erros A busca por agilidade e praticidade em negociações imobiliárias tem feito algumas pessoas desprestigiar o estudo do caso concreto e das circunstâncias específicas do negócio. E assim pecam por visar o caminho mais fácil: a obtenção de um modelo de documento, contrato ou convenção, como se tudo fosse igual. Elas trabalham superficialmente, agem como se estivessem com uma viseira e enxergam apenas o objetivo. É como se tudo desse certo automaticamente. Por isso, tratam os documentos como uma mera formalidade ou burocracia, imaginando que, em algum momento, eles sejam desnecessários.

Muitos problemas seriam evitados, caso fosse feita uma análise isenta sobre o objeto negociado e os reflexos dessa transação e caso a outra parte tivesse condições de cumprir o contrato. Mas isso exige reflexão, experiência, interesse em ouvir, raciocínio lógico e matemático e muito tempo. Afinal, profissionais gabaritados não utilizam modelos a fim de evitar erros e prejudicar os envolvidos na transação. Esse trabalho tem um custo de 2% a 4% do negócio. O percentual é visto pelas grandes empresas como um investimento em vez de uma despesa. ‘Essas organizações sabem que um erro pode ser desastroso.

“A redação de contratos é um desafio que poucos estão aptos a executar com maestria”

Essa situação explica o enorme crescimento dos processos judiciais em contratos imobiliários. As demandas demoram anos e têm elevado custo financeiro. A situação decorre da falta de cuidado das pessoas ao assinar um contrato. Muitas chegam ao cúmulo de alegar que não leram ou não entenderam as obrigações assumidas. Quando há litígio, é comum o contratante jogar a culpa para o contratado, como se não fosse obrigação dele interpretar o que assinou. Muitos reclamam do amigo que ‘deu uma olhada’ no contrato e não o alertou, como se esse ‘quebra-galho’ fosse um especialista.

A elaboração dos documentos de um negócio está banalizada. Chega a ser irresponsável e inconsequente a atuação de algumas pessoas que se intitulam consultores, mas não passam de supostos profissionais. Eles utilizam modelos e não analisam as particularidades de cada lado envolvido no contrato e nos documentos inerentes ao negócio.

É deselegante solicitar a um profissional um modelo de contrato ou uma solução sem que ele seja contratado. O consultor investiu muito dinheiro, esforço e anos de estudo para dominar a execução desse tipo de serviço. A redação de contratos é um desafio que poucos estão aptos a executar com maestria. Muitos procedimentos decorrem de décadas de experiência, obtida com erros que custaram caro. O uso de modelos de contrato é uma prática comum das pessoas que veem as relações comerciais de maneira limitada e simplesmente desvalorizam a técnica e a orientação jurídica. Elas imaginam que um modelo remendado traz garantias a uma transação. Mas só quem domina a matéria pode redigir um contrato capaz de gerar segurança e lucratividade. É ingênuo quem imagina que uma palavra não pode mudar tudo.

Kênio Pereira Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG keniopereira@caixaimobiliaria.com.br | 31


Rafael Tavares

receita

Mineirinho Valente Chef Ilmar de Jesus - Bar e Restaurante Casa Cheia

INGREDIENTES 400 g de canjiquinha; 1 cebola picada; 1 pimentão vermelho picado; 2 talos de aipo picados em cubos; Tempero alho e sal; 1 litro de caldo de costela; 4 dentes de alho picados; 3 colheres de sobremesa de manteiga; 4 colheres de azeite; Pimenta-biquinho; Espinafre picado; Cheiro-verde; 300 g de queijo minas meia-cura ralado grosso; Pimenta-do-reino a gosto; 400 g de lombo defumado picado em cubos; 300 g de linguiça caseira; 400 g de costelinha de porco desossada, picada em cubos e temperada com vinho branco.

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MODO DE PREPARO e montagem Deixe a canjiquinha de molho na água por cerca de uma hora. Depois, frite o alho no azeite. Em seguida, coloque a cebola, o pimentão e o aipo. Deixe fritar por alguns minutos. Escorra a água da canjiquinha e coloque na panela. Adicione o caldo de costela, a pimenta-do-reino e tempere a gosto. Deixe cozinhar por aproximadamente 15 minutos. Mexa de vez em quando para não agarrar e vá colocando o caldo de costela à medida que ele for secando. Misture 2 colheres de manteiga e reserve. Frite levemente a linguiça e a costelinha desossada com um pouco de manteiga e reserve. Misture o lombo defumado, a linguiça e a costela na panela da canjiquinha por dez minutos em fogo baixo. Em seguida, coloque as folhas de espinafre e monte o prato com o queijo. Leve a canjiquinha preparada ao fogo no caldeirãozinho, forrando-o até ao meio. Coloque o queijo ralado, formando uma camada na panela. Complete com a canjiquinha e mais uma camada de queijo, cheiro-verde e pimenta-biquinho.


vINHOS

Uva Bonarda Julia Grossi Consultora de vinhos do Provincia Di Salerno

A segunda variedade de uva tinta mais produzida na Argentina é a Bonarda. Essa fruta é pouco conhecida no mercado brasileiro, mas vem conquistando novos paladares aos poucos. A Bonarda chegou ao Novo Mundo por meio dos imigrantes do Norte da Itália. Naquela região há uma grande produção de vinhos fabricados com essa uva. Já os vinhedos argentinos se desenvolveram na região mais quente de Mendoza e ali se adaptaram muito bem. A variedade agradou aos vinhateiros, que produziam vinhos com cor intensa e muita fruta. No momento em que a Bonarda chegou à Argentina, a produção ‘hermana’ não se baseava na qualidade, mas na quantidade. O objetivo dos produtores locais era atender ao mercado interno. A Bonarda é usada para a fabricação de excelentes vinhos varietais – elaborados com um tipo de uva ou com predominância de uma variedade. Essa uva também é utilizada para cortes de outros vinhos, como o Malbec. Nesse caso, misturam-se dois ou mais tipos de uva. Enquanto os Malbecs são mais intensos, potentes e alcoólicos, o vinho feito com a Bonarda é mais amigável e elegante. Caso essas uvas amadureçam corretamente em videiras mais antigas, é possível produzir vinhos bastante equilibrados, mas de taninos bem presentes. Para alguns produtores, a Bonarda plantada na Argentina é a mesma do Norte da Itália, prima das uvas da Lombardia e da Emilia-Romagna. Outros acreditam que tenha parentesco com a Corbeau ou a Douce

Noire de Savoia na França. Essa região está separada da Itália pelos Alpes. Por isso, é possível que a Bonarda também seja prima da Dolcetto ou da Barbera. Para vários especialistas, a Bonarda argentina se mostra bem superior à encontrada na Europa por se revelar mais elegante que a parenta do Velho Mundo. O ciclo de amadurecimento dessa uva é longo. A fruta precisa de bastante calor para estar em ponto de produção. Quando as Bonardas não amadurecem o suficiente, seus vinhos têm pouca cor e pouco corpo. E no palato, acentua-se um leve toque de ervas. Apesar disso, a Bonarda é muito produtiva. Alguns produtores elaboraram bons vinhos dessa uva e disponibilizam a bebida para as importadoras brasileiras. Os vinhos comercializados são marcados por frescor, acidez vibrante, fruta fresca e taninos suaves. Por um preço acessível, elas constituem uma excelente relação custo - benefício. Na Argentina, acredita-se que os vinhos feitos com a Bonarda sejam revigorantes para a alma e combatem as tristezas e saudades. Dentre os maiores produtores de Malbecs da Argentina, o ‘Altos Las Hormigas’ cedeu às tentações da Bonarda e começou a produzir o ‘Colonia Las Liebres Bonarda’. Esse vinho tem cor rubi intenso e é frutado e fresco. A bebida é ideal para acompanhar massas recheadas com molhos de tomates frescos ou um ravioli verde al sugo. As duas combinações são para saborear de joelhos! | 33


vaNGuarDa

ordem no ambiente virtual

Marco Civil entra em vigor para regulamentar o uso da internet no território nacional Bárbara Caldeira

‘a

internet é terra de ninguém’. Se essa afirmativa fazia sentido, desde o dia 23 de junho ela precisa ser revista. É que entrou em vigor o Marco Civil da Internet. O documento é como se fosse uma Constituição para o uso da rede no Brasil. A Lei nº 12.965/14 foi discutida por quase três anos no Congresso Nacional e sancionada em abril deste ano por Dilma Rousseff. A presidente manteve os termos redigidos pelo Senado. Aguardado com ansiedade por usuários brasileiros da web, o Marco Civil da Internet institui princípios, garantias, direitos e deveres para internautas e empresas. Até mesmo figuras famosas, como o cantor e ex-ministro da Cultura, Gilberto Gil, o humorista Gregório Duvivier e o ator Wagner Moura, apoiaram e defenderam publicamente a aprovação da lei. Para o professor de Direito Digital da Faculdade Cotemig, Lúcio Marcos do Bom Conselho, o estabelecimento das normas é um grande avanço. “A regulamentação do ambiente virtual se fazia necessária havia muito tempo. Por ausência de regras específicas, a lógica do mundo real era trazida para o digital”, argumenta. A opinião é partilhada com cautela pelo vice-presidente executivo da Sociedade de Usuários de Informática e Telecomunicações de Minas Gerais (Sucesu Minas) e conselheiro do programa Minas Gerais de Tecnologia da Informação (MGTI), Leonardo Bortoletto. “Estamos diante de uma novidade para a cultura da internet. Isso nos ajuda a consolidar o limite entre nossos direitos e deveres ao compartilhar alguma informação. Preci-

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samos de um tempo para ver se tudo vai funcionar na prática. Ainda existem pontos divergentes que podem ser ajustados e melhorados”.

A neutralidade de rede é um dos pilares do Marco Civil da Internet. O princípio obriga os provedores de conexão a tratar igualmente toda informação que trafega no meio virtual. O marco proíbe diferenciações por tipo, origem ou destino dos pacotes de dados. Antes da instauração da lei, a neutralidade de rede era prevista em documento da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Mas as reclamações dos usuários em relação à queda da velocidade de conexão após o uso de serviços pesados

“Precisamos de um tempo para ver se tudo vai funcionar na prática. Ainda existem pontos divergentes que podem ser ajustados e melhorados” Leonardo Bortoletto, especialista em Marketing Digital


vanguarda

– traffic shaping – eram constantes. Com a regulamentação, donos da infraestrutura da rede ficam impedidos de privilegiar alguns serviços, seus ou de terceiros, com os quais poderiam lucrar. A neutralidade vem tornar a concorrência desse mercado mais leal. O princípio assegura uma dinâmica em que novos produtos possam competir com gigantes digitais estabelecidos no mercado. Mas o tema é polêmico, assim como outros previstos pela nova legislação. Há quem pense que a garantia da neutralidade de rede possa prejudicar os usuários por restringir a personalização de planos de assinatura e tornar mais caro o acesso à internet. “As empresas de telefonia podem continuar oferecendo diferentes velocidades. Mas a venda dos serviços não pode prejudicar o tráfego normal dos dados. Isso faz com que a aplicação do princípio não implique encarecer o serviço, mas assegurar um acesso de qualidade para todos”, esclarece Bortoletto. Lúcio Marcos espera que o próprio mercado observe a concorrência e defina os preços de serviços de conexão à internet. O formato é o mesmo que ocorreu com a telefonia móvel. “A neutralidade de rede traz um grande ganho aos usuários. É provável que as empresas provedoras acabem nivelando os valores dos serviços na busca pela fidelidade do cliente”, defende.

O zelo pela privacidade, tão caro ao cidadão no dia a dia, também se tornou um desejo no mundo virtual. A ausência da obrigatoriedade de sigilo das informações que circulam na rede sempre assombrou os usuários. O calcanhar de aquiles da internet ficou claro no episódio que envolveu o ex-técnico da Agência Central de Inteligência (CIA) Edward Snowden. O especialista confirmou que os Estados Unidos estão de olho nas comunicações eletrônicas e em outras informações de usuários da rede mundial de computadores em todo o mundo. Nem mesmo a presidente Dilma Rousseff foi excluída do sistema de vigilância global da Agência Nacional de Segurança (NSA) norte-americana. Após as declarações de Snowden, Dilma pediu urgência constitucional para a tramitação do Marco Civil.

“A regulamentação do projeto é extremamente relevante e coerente para a manutenção das garantias constitucionais dos usuários brasileiros. E a privacidade tem grande importância no texto”, afirma Bortoletto. Para o executivo, o princípio da finalidade resguarda ainda mais o internauta porque garante que as empresas só vão poder utilizar os dados para os fins pelos quais eles foram coletados. A lei assegura a inviolabilidade e o sigilo do fluxo de comunicações feitas e armazenadas pela internet. Dessa forma, os diálogos via Skype ou as mensagens salvas na conta de e-mail só podem ser acessados mediante ordem judicial. “Também vai ser possível saber em quais sites um IP navegou e se alguém acessou seu e-mail. Mas o conteúdo fica resguardado”, elucida Lúcio Marcos. Além dessas medidas, a lei estabelece que os provedores de aplicação, como o Google e o facebook, terão de manter o registro de acesso de todos os usuários por seis meses. Essa prática era opcional e não tinha um período estabelecido.

Com o Marco Civil, o mar keting dirigido também está com os dias contados. É o fim daquele anúncio que insiste em aparecer em uma página só porque um produto ou serviço foi consultado em outra. As novas regras preveem que as empresas de acesso não podem espiar as informações trocadas pelos usuários na rede. A medida impede a formação de bases de clientes para marketing dirigido. A notícia é boa para Thayanna Sena. Mesmo sendo analista de marketing digital e de mídias sociais, ela se declara incomodada com a prática. “Basta cotar um produto em um e-commerce para que ele apareça quase instantaneamente nos anúncios do facebook. Às vezes, o mesmo produto entra em promoção dias depois e volta a aparecer para mim, quando nem estou mais pensando nele”, comenta. Para Thayanna, as propagandas que surgem nas buscas do Google e em blogs são ignoradas mais facilmente. Mas isso não acontece no facebook. “Os anúncios aparecem em todo lugar: nas laterais, nas sugestões de páginas a curtir e até em postagens patrocinadas. Entendo como isso funciona, mas fico incomodada. Nem sempre os | 35


vaNGuarDa

Moreira Mariz/ Agência Senado

Marco Civil da Internet é aprovado pela presidente Dilma Rousseff (PT) após quase três anos sendo discutido no Congresso Nacional

produtos cotados são pra mim. Nesse caso, mesmo com a invasão aos meus acessos, o anúncio acaba não atingindo a pessoa desejada”, argumenta. Ela confessa, porém, que é quase impossível resistir a tanta insistência. Certa vez, ela pesquisou um modelo de bota em vários sites de marcas renomadas. Depois de ver o produto inúmeras vezes em suas navegações, acabou adquirindo um exemplar. “A bota ficava o tempo todo me perseguindo. Assumo que comprei, mas foi em outro site”, brinca. Mas a sensação de invasão causada pelo marketing dirigido não é unânime. O universitário Mateus Meireles vê constantemente ofertas de roupas, acessórios e livros pipocarem da tela do computador. “Se for bem administrado, acredito que esse direcionamento possa ser muito útil. Antes de tudo, os termos devem estar claros para o usuário. Muita gente reclama, mas nem lê os termos que aceita ao abrir um perfil em uma rede social”, provoca. O estudante usa os sites para pesquisar preços de artigos, mas se aborrece com a falta de coerência do marketing que deveria ser direcionado. “Só fico incomodado quando, por exemplo, estou escutando uma playlist no youtube e passa um comercial que não tem nada a ver com o que ouço. Não há eficácia quando o anúncio de um cantor sertanejo é inserido entre um vídeo de rock”, reflete. 36 | www.voxobjetiva.com.br

O gerente de Novos Negócios da Animatto, Ricardo Mota, acredita que o Marco Civil possa ser visto como positivo para o setor. O executivo da agência especializada em soluções digitais também crê que vá haver uma autorregulamentação das dinâmicas capaz de repensar as táticas de remarketing e a utilização dos cookies e dados do usuário para entrega de conteúdo e publicidade customizados. “O maior impacto do Marco Civil tem sido na responsabilidade ao administrar e divulgar os dados dos usuários. As agências e os setores de marketing têm redobrado a cautela em relação às ferramentas de segurança da informação e no manejo das publicidades direcionadas”, pondera. De toda forma, as agências digitais bem-estruturadas têm essa preocupação há mais tempo. O jornalista e especialista em Marketing Digital Marcelo Paulo faz um balanço do Marco Civil em sua área. “A norma pode influenciar a perda de informações sobre o comportamento dos usuários, tão valiosa para a tomada de decisões nas campanhas”, ressalta. Embora a inteligência digital seja prejudicada, Marcelo Paulo julga ser importante resguardar a privacidade dos internautas. Nesse embate, cabe ao mercado se reinventar e suprir a ausência de informações das ferramentas web analytics. O jornalista defende que se criem iscas digitais para verificar, por meio de formulários, o que desperta o interesse


vaNGuarDa

Os usuários são responsáveis pelo o que publicam

Provedores não podem armazenar as informações guardadas na rede

Os dados devem ser tratados sem distinção de origem, conteúdo e destino

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Midia Ninja

vanguarda

dos usuários naquele negócio. As iscas vão desde sorteios até downloads gratuitos de e-books e conteúdo de cursos e palestras. “Os dados cedidos nessas ações permitem criar um diálogo personalizado por e-mail a fim de obter novas informações e oferecer mais dados para que o usuário decida sobre a aquisição de um produto ou de um serviço. Isso é o oposto de ser invasivo”, afirma. As técnicas de aproximação com o público estão entre as preferidas do empresário Daniel Rodrigues, diretor dos sites de perfumes importados ‘Na Mordomia’ e da franquia mineira de turismo ‘Encontre Sua Viagem’. O ‘Na Mordomia’ ficou mais de um ano vendendo produtos em site de compras coletivas e a preços bem mais baixos, como explica Daniel. A intenção era formar uma base sólida de clientes. Agora a divulgação de novidades flui por meio das redes sociais. “O marketing dirigido é mais efetivo somente com empresas que consolidaram seus nomes. Descobri isso testando”, conta.

A garantia da liberdade de expressão e o impedimento da censura são outros temas polêmicos contemplados pelo Marco Civil. Com a nova legislação, a exclusão de conteúdos da rede – ofensivos ou não – só pode ser solicitada judicialmente. A norma impede os 38 | www.voxobjetiva.com.br

provedores de manter ou de retirar do ar informações, notícias ou imagens polêmicas. “Há a liberdade de expressão, mas é importante usar o bom senso na hora de compartilhar algum conteúdo”, sugere Bortoletto. “Cabe frisar que as empresas que receberem ordens judiciais e não tomarem providências podem ser punidas”, complementa. Lúcio Marcos faz ressalvas em relação a esse tópico do Marco Civil. A medida torna a retirada de conteúdo do ar ainda mais morosa. “A exclusão ficou mais burocrática e bem mais lenta. Antes, bastava uma notificação ao provedor. Caso não providenciasse a retirada imediata do conteúdo, ele passaria a ser corresponsável. O processo era mais rápido e eficiente”, avalia. Como consequência, o ambiente virtual pode se tornar, a princípio, mais ofensivo, como observa Lúcio. Mas, se o conteúdo apresentar imagens de nudez ou ato sexual do ofendido, o provedor deve excluí-lo apenas com a notificação, sem necessidade de ação judicial. “Essas regras precisam amadurecer. A sedimentação do Marco Civil vai se consolidar apenas no dia a dia. Em breve, é possível que novas determinações venham complementar ou modificar as atuais. O ambiente virtual ainda é muito novo e dinâmico. Por isso, as reflexões e os debates serão constantes”, projeta.


Leca Novo

A arte particular de Mary Arantes A artista que saiu do Vale do Jequitinhonha para ganhar o mundo com acessórios artesanais e temas bem brasileiros Tati Barros

M

ary Arantes é uma pessoa rara. A artista à frente da grife Mary Design não acumula histórias. Ela transforma momentos em arte. Por isso, cada peça desenvolvida em seu ateliê é muito mais do que um simples acessório. Sua obra poderia ser facilmente comparada a uma narrativa poética, capaz de eternizar referências, vivências e inspirações.

que a imaginação não tem limites e que, por meio dela, era capaz até mesmo de ‘transformar’ galhos de goiabeiras em aviões e folhas secas em dinheiro. “Acredito que essa vida simples que levei na infância tenha dado asas à cabeça fantasiosa que eu tenho. Essa vivência também foi responsável por eu sempre carregar os valores nacionais, que são tão fortes para mim”, observa.

A artista nasceu no Vale do Jequitinhonha, local que lhe proporcionou o raro dom de ver beleza na simplicidade. Na infância, Mary aprendeu que a magia não está no que se vê, mas no que se cria. Assim, ela descobriu

O vilarejo de Rio do Prado logo viria a se mostrar pequeno para a menina que vivia em um mundo particular, no qual abraçava árvores e demonstrava uma riqueza criativa singular. Mary chegou à capital mi| 39


Luiza Vilarroel

femme

Na conversa proposta pela artista são levantados temas que ela considera fundamentais. “Vejo a minha marca como uma bandeira que posso hastear em favor de questões que eu queria discutir. Atualmente 90% das minhas coleções trazem temáticas nacionais. Eu também valorizo o que é feito a mão, e isso acontece por conta da minha origem e das pessoas do Jequitinhonha. Entendo que, se o estilista não tiver a delicadeza de valorizar o trabalho artesanal, ele não estará valorizando a arte. Esse é o olhar transformador de que tanto se fala, mas também é uma troca de saber entre as pessoas”, reflete. Para muitos, a formação acadêmica em Odontologia pode parecer distante do caminho que Mary optou seguir. Mas ela e o seu olhar particular são capazes de enxergar similaridade entre os dois ofícios. “A odontologia e a bijuteria são muito parecidas. A destreza para o trato fino com os objetos pequenos, a estética, o processo de esculpir e a fundição em liga e em metais são idênticos. E não para por aí! Anos depois de me formar, descobri que os primeiros dentistas eram ourives”, compara. Para quem nasceu em um lugar tão simples, em que a única geladeira do local pertencia ao bar da região, é significativo ver que a sua marca está em nada menos do que 300 pontos de vendas no Brasil. Isso, fora as incontáveis lojas que vendem as peças em pronta-entrega e os nove escritórios de representação da grife espalhados pelas principais capitais do país.

Acessórios desenvolvidos pela grife de Mary Arantes e apresentados na última edição do Minas Trend Preview, em 2014

Filha de alfaiate, Mary aprendeu a fazer e a customizar as próprias roupas e os acessórios. O estilo diferenciado chamou a atenção das amigas. E de maneira despretensiosa, essa expressão artística espontânea foi se tornando sua profissão. Ao ver as criações da artista, não é difícil entender a razão para tamanho sucesso e identificação por parte das mulheres. Mary vê em suas peças uma maneira de conversar com cada uma de suas clientes. “Estou dialogando com elas próximo de locais muito especiais do corpo: o colo, a orelha, o pulso, o dedo,... Essas regiões são primorosas para uma interação”, explica. 40 | www.voxobjetiva.com.br

Luiza Vilarroel

neira aos 12 anos acompanhando a família e intimidada pela cidade grande. “Eu passava em frente ao Museu de Mineralogia e fazia o sinal da cruz achando que fosse uma igreja. Tudo era gigantesco para mim. Rapidamente percebi que eu deveria ser alguém nesta cidade, se não quisesse retornar para as minhas origens”, relembra.


femme

A arte da ‘ilustre filha de Rio do Prado’ ultrapassou fronteiras, mas as inevitáveis burocracias e barreiras impostas pelo país fizeram com que ela desistisse do mercado internacional. No entanto, o exterior não desiste dela. Lojistas de países como o Japão vêm até o Brasil para comprar as peças de Mary em feiras e revender no Oriente. Mas por meio do alcance sem limites da tevê que a arte dessa mineira ganhou o mundo. Desde a década de 80, foram diversas as novelas em que seus acessórios apareceram, fazendo com que a marca ganhasse a projeção que tem hoje. "Isso tudo", ela frisa, "de forma solta e espontânea, sem contar com uma assessoria por trás". Atualmente as suas criações em resina da marca podem ser admiradas na atriz Taís Araújo, na novela global Geração Brasil. Outra importante vitrine para Mary, assim como para tantos outros designers, é o Minas Trend. E na última edição da semana de moda mineira, a artista emocionou com uma coleção sobre a loucura. Segundo ela, mais uma vez a intenção foi dar uma sacudida nas pessoas e tirá-las do lugar comum. “Quis propor um questionamento sobre essa loucura de vida que estamos levando ultimamente”, esclarece.

Divulgação

Um dos fascínios da arte é o seu poder de ganhar sentidos que vão muito além do imaginado durante a criação. E com esse desfile, Mary pôde comprovar isso mais uma vez. “Muitas pessoas se emocionaram na apresentação por diferentes motivos. Uma mãe chorou ao ver as modelos de camisa de força, porque ela reviveu a dor que sentiu ao perder o filho. A arte tem o poder de provocar todos os tipos de sentimentos. Ela permite essa liberdade poética”. Divulgação

Ao falar de uma mente que não para de criar, é inevitável pensar que novos projetos estejam a caminho. O próximo passo? O lucrativo universo das noivas. Mary antecipa que está desenvolvendo acessórios exclusivos, que vão desde os enfeites de cabelo até os brindes para padrinhos e a identidade visual da celebração. “É um leque muito grande e personalizado. Futuramente pretendo também criar uma linha de peças para aluguel”, projeta. Mary é como uma fonte que não seca. Ela desperta a expectativa pelas próximas criações e novidades, e sabe, como poucos artistas, encantar e emocionar. Que venham mais incontáveis histórias, em forma de acessórios que enfeitam o corpo e alegram a alma!

Divulgação

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kulTur

Mercado fonográfico evangélico está entre os mais fortes do Brasil e deixa para trás gigantes do meio musical Bruno Gonzaga Érica Fernandes

O

número de evangélicos no Brasil tem crescido de forma vertiginosa, como indicam pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em comparação com o último Censo, a estimativa do órgão é de que esse público já ocupe um quarto da população brasileira – aproximadamente 50 milhões de pessoas. Com um grupo tão expressivo, eles têm motivos de sobra para chamar a atenção. A própria presidente Dilma Rousseff já demonstrou perceber essa relevância. No ano passado, ela convidou importantes líderes desse segmento para um diálogo em seu gabinete. Mas não é só o poder público que está atento à representatividade dos evangélicos. Grandes empresários do mercado financeiro estão se esforçando para se adaptar às necessidades e às demandas desses clientes em potencial. Dentre tantos interessados nesse mercado em ascensão, quem sai na frente são os gigantes da indústria fonográfica. E não é de surpreender o interesse. A 42 | www.voxobjetiva.com.br

música gospel ocupa o segundo lugar em vendas no Brasil, ficando atrás apenas do sertanejo. A cantora pentecostal Damares é um belo exemplo da força do mercado fonográfico evangélico. No ano passado, ela teve o álbum ‘O Maior Troféu’ entre os dez mais vendidos do Brasil, de acordo com dados da Associação Brasileira de Produtores de Discos. Até então, gravadoras de peso atuavam especificamente no mercado laico. Esse era o caso da Sony e da Som Livre. Agora as maiores representantes da indústria fonográfica nacional estão convidando nomes de destaque nacional e internacional da música cristã. Dentre esses clientes está o Ministério Diante do Trono, liderado pela cantora Ana Paula Valadão Bessa. A intérprete mineira lidera o ranking de sucessos gospel com mais de 10 milhões de discos vendidos durante os 16 anos de carreira. Ana Paula Valadão é cantora e pastora na Igreja Batista da Lagoinha. Ela revela que parte do lucro obtido com a venda dos discos é re-


vertida para projetos sociais no Brasil e no exterior. O outro cantor gospel recordista em vendas também é mineiro. Thalles Roberto nasceu em Passos, no Sudoeste de Minas. Com o estilo de música diversificado, Thalles já vendeu mais de 1 milhão de discos em cinco anos de carreira. O número é um recorde entre os músicos do mesmo segmento. Apenas o álbum ’Uma história escrita pelo dedo de Deus’ chegou à marca de 350 mil cópias. Para explicar a causa de tanto sucesso, o cantor mineiro é categórico ao afirmar que a resposta está na fé (ver entrevista inbox). Rits do artista já foram cantados por Ivete Sangalo, Cláudia Leitte e, recentemente, o funkeiro Naldo – que tem gerado grande repercussão na mídia por sua aproximação com a religião evangélica.

Mas, por que vende tanto? “Nenhuma gravadora está abraçando esse mercado porque deseja fazer bem para sociedade brasileira. É que o segmento é bastante lucrativo mesmo. O admirador da música cristã compra menos pirataria. O crente é mais fiel ao músico. Então, para outras gravadoras, esse mercado é muito interessante. Afinal, elas investem menos e têm um retorno bem maior”, alega o diretor de vídeo e produtor Alex Passos, que há dez anos trabalha especificamente no mercado gospel. O empresário e produtor musical Felipe Barros endossa o argumento de Passos em relação à reprodução ilegal de obras. “Nas igrejas, a pirataria é tratada como pecado. As pessoas levam um peso moral ao adquirir algo pirateado. Os evangélicos estão numa constante busca de santificação, que é a base

do evangelho”, acrescenta Barros. O produtor musical é responsável por uma vasta lista de projetos visuais no setor gospel, que incluem trabalhos para os cantores Fernandinho, Thalles Roberto e André Valadão. A ideia de que pirataria não é apenas crime foi reforçada intensamente por muitos cantores do gênero por meio da campanha ‘Pirataria é crime e pecado’. A atriz Cristiane Soares é uma das adeptas desse pensamento. Ela confessa ser consumidora assídua dos CDs do cantor Thalles Roberto, mas garante que só adquire produtos originais. “Conheço a palavra de Deus e sei que a pirataria é crime. Além disso, há problemas por trás da reprodução ilegal de obras, como a lavagem de dinheiro. Quando eu adquiro um produto do Thalles, estou valorizando o trabalho dele como profissional”, enfatiza a atriz. A queda na comercialização de discos pirateados já é percebida nas ruas de Belo Horizonte. A equipe de fiscalização da Regional Barreiro da Prefeitura informa que a presença desse tipo de mercadoria em vias públicas vem reduzindo drasticamente. De acordo com o órgão municipal, as apreensões se tornaram bem mais raras e ocorreram em menor proporção nos últimos dois anos. Segundo a equipe de fiscalização, é possível que as pessoas tenham optado por baixar as músicas por meio de programas de download ou por adquirir as faixas pelo iTunes em vez de ouvi-las em um CD. Mas então o que mais tem fomentado o gigante de vendas? Para Felipe Barros, outros segmentos da sociedade também se identificam com a música evangélica. “Muitas pessoas sentem paz, amor e alegria nas | 43


kultur

músicas religiosas, porque as canções retratam os princípios cristãos. É bom para qualquer pessoa ouvir esse tipo de canção, e isso não implica necessariamente que elas sigam a crença evangélica”, pondera. Se as gravadoras faturam alto, o mesmo não acontece com os profissionais desse setor. Ainda que os números indiquem que a música gospel é rentável, Barros alerta que um músico evangélico do mesmo patamar de um laico recebe quatro vezes menos. Segundo o produtor musical, a causa para a redução nos ganhos se deve à cultura embutida no meio religioso de que quase tudo deve ser doado ou voluntário. “A igreja ensina muitos valores a respeito de doação e generosidade. E o músico segue essa linha de pensamento. Em geral, os membros das igrejas

criticam quando há cobrança exorbitante nas apresentações”, explica. Por isso, grandes gravações de diversos cantores da música gospel são gratuitas e abertas ao público. Vários musicistas do gênero, como a cantora Fernanda Brum e o Ministério Diante do Trono, revertem parte do lucro das vendas de discos para projetos sociais. O cantor Juliano Son faz parte desse grupo de músicos engajados socialmente. Há alguns anos, ele desenvolve o projeto ’Livres Ser’ na Região Nordeste do país. O trabalho social procura oferecer abrigo e proteção para aproximadamente cem crianças em situação de risco social. Que o mercado da música evangélica envolve altas vendagens, pouco reconhecimento e trabalhos sociais, isso é fato. Mas há um ditado que resume as reais motivações desse universo e leva esses cristãos a entoar seus cânticos e multiplicá-los por meio de discos: “Quem canta seus males espanta”.

Juliano Son

Divulgação

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kultur

Rapidíssima com Thalles Roberto Você é um dos cantores cristãos que mais vendem discos no Brasil. A que fatores você atribui o sucesso do seu trabalho? O sucesso do meu trabalho vem de Deus, mas busco fazer tudo com excelência e qualidade. A música cristã está de cara nova? Sim. Sem dúvida. Com muita ousadia, a música cristã começou a chegar a diversos lugares e sem preconceito. Espaços tradicionalmente seculares, como a mídia e as gravadoras, têm dado mais espaço para a música cristã. O que você acredita que exista no mercado gospel que tem chamado tanto a atenção? Qualidade, baixa pirataria e compromisso social por meio da renda obtida com as nossas músicas. Durante a Copa, você vai fazer turnê internacional. Esse fato foi destaque em várias revistas e em sites de notícias. O público internacional tem recebido bem o seu trabalho? Tem recebido muito bem. Estamos com muitos projetos fora do Brasil e vamos aproveitar este período para promovê-los. Quais são os cantores que você ouve no carro? Não costumo ouvir muitos colegas para não ser influenciado e deixar de fazer algo que seja originalmente meu. Muitos cantores de renome admiram o seu trabalho e até o elogiam publicamente. A cantora Ivete Sangalo já cantou uma de suas canções. Cláudia Leitte entoou ‘Uma história escrita pelo dedo de Deus’ e até o funkeiro Naldo cantou com você a música ‘Quero sua vida em mim’. Você acredita que os universos secular e gospel possam se misturar?

Marcus Castro

Creio que a música não tenha religião nem rótulos. O que muda é a verdade inserida em cada uma. Quando se canta a verdade, essa verdade começa a fazer sentido na vida. A minha verdade é o que Jesus fez na minha vida e é essa transformação que me faz viver. Fico feliz quando vejo cantores, independentemente do segmento, cantando minhas músicas. Isso significa que eles também estão sendo impactados pela verdade da palavra de Deus. | 45


Marcos Hermes

Paryitno

TERRA BRASILIS • AGENDA

Cássia Eller O Musical O Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) recebe uma homenagem a uma das principais roqueiras nacionais: Cássia Eller. O musical narra a trajetória da cantora de voz rouca e grande força cênica, que iniciou a carreira em Brasília e anos mais tarde conquistou o país. Cássia morreu quando atingiu o auge do sucesso em 2001, antes de completar 40 anos. O espetáculo é dirigido por Vinícius Arneiro e João Fonseca. João é também o diretor de 'Tim Maia – Vale Tudo' e 'Cazuza – Pro Dia Nascer Feliz'. CCBB Até 1º de setembro Sexta e segunda, às 20h; sábado e domingo, às 19h R$ 10 (inteira) culturabancodobrasil.com.br

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Uma Noite em Buenos Aires

Savassi Festival

Há 40 anos excursionando pelo mundo, ‘Uma Noite em Buenos Aires’ retorna ao Brasil após mais de 30 mil apresentações feitas mundo afora. O espetáculo apresenta o que há de mais sofisticado na música e na dança argentina. O bailado da peça está a cargo do Ballet de Johana Copes e da dupla campeã mundial de tango, Guido Palácios e Florencia Castilla. A direção musical é do maestro Carlo Buono e seu Tango Sinfônico. Buono também atua como convidado especial do ‘Embaixador das Valsas’, André Rieu.

Pela 12ª vez, Belo Horizonte se torna a capital do jazz no Brasil. Durante uma semana, a Região Centro-Sul da cidade recebe shows nacionais e internacionais de música instrumental e do tradicional ritmo norte-americano. O Savassi Festival 2014 oferece também lançamentos de CDs, residências artísticas, workshops e concursos, como o ‘Novos Talentos do Jazz’. O evento se consolidou ao longo dos anos como o mais importante festival de jazz da América do Sul. Neste ano, a iniciativa também vai ser levada para Nova Iorque e Londres.

Palácio das Artes 18 e 19 de agosto, às 21h De R$ 180 a R$ 220 (inteira) fcs.mg.gov.br

Diversos locais da cidade 18 a 24 de agosto, a partir das 17h Preços variados savassifestival.com.br


TERRA BRASILIS • AGENDA

joão Caldas

Guga Melgar

A Toca do Coelho Eva Wilma celebra seis décadas de carreira e oito de vida ao interpretar o avesso de si mesma. A artista encena uma atriz precocemente aposentada, Blanca Estela, que volta aos palcos graças à insistência de um ator medíocre. Fã incondicional da atriz, ele decide bancar uma grande produção para ver sua diva dar a volta por cima. Com texto-base do peruano Eduardo Adrianzén, a comédia dramática discute os bastidores do universo teatral e o ávido interesse do público sobre a vida privada dos artistas, cada vez mais cultuados. Cine Theatro Brasil Vallourec 30 e 31 de agosto, sábado às 21h; domingo às 20h De R$ 80 a R$ 120 (inteira) vmcentrodecultura.com.br

Over mundo

Virada Cultural Diversos locais da cidade 30 a 31 de agosto, das 19h às 19h Entrada gratuita viradaculturalbh.com.br

São 24 horas ininterruptas de música, teatro, dança, circo, manifestações audiovisuais, literatura, artes plásticas, moda e gastronomia. Essa é a Virada Cultural de BH, promovida pelo segundo ano consecutivo. Em 2014, o evento traz conceitos, como o uso do espaço público, a sustentabilidade, a mobilidade e as novas vivências para aglutinar espectadores e atores culturais. Serão mais de 400 apresentações divididas entre artistas selecionados e convidados e projetos aprovados pela Lei Municipal de Incentivo à Cultura.

Quem tem medo de Virginia Woolf? Jorge (Daniel Dantas) e Marta (Zezé Polessa) recebem os jovens Nick (Erom Cordeiro) e Mel (Ana Kutner) para um drinque após uma festa. Casados há mais de duas décadas, os anfitriões vivem uma Guga Melgar relação de amor e ódio selada por um segredo. Esse mistério une e, ao mesmo tempo, transforma a vida de ambos em uma grande ilusão. Já os visitantes mantêm um relacionamento aparentemente sólido que se desfaz aos poucos quando eles conhecem a intimidade dos anfitriões. Cine Theatro Brasil Vallourec 22 a 24 de agosto, sexta às 21h; sábado às 20h e domingo às 19h De R$ 50 a R$ 60 (inteira) vmcentrodecultura.com.br

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TERRA BRASILIS • LITERÁRIA

Final do jogo Autor: Julio Cortázar Editora: Civilização Brasileira Páginas: 224 Preço: R$ 30,00 É brincando com o leitor que Julio Cortázar apresenta ‘Final do jogo’, obra-prima do autor cujo centenário de nascimento se comemora em agosto. O livro é composto por 18 contos que são habilmente divididos em três níveis de dificuldade. Os textos vão da Parte I – a mais fácil – à Parte III – a mais difícil. Cada nível expressa o esforço que o leitor deve fazer para entender e crer nas histórias propostas pelo belga naturalizado argentino. A obra começa pelo conto mais curto, ‘Continuidade dos parques’, um dos sucessos do escritor aclamado mundialmente por ‘O jogo da amarelinha’. Reprodução

Mussum Forevis Autor: Juliano Barreto Editora: LeYa Páginas: 432 Preço: R$ 49,00

Reprodução

Uma biografia imperdivis. Essa é a obra ‘Mussum Forevis: Samba, Mé e Trapalhões’, uma homenagem a um dos artistas mais completos do país. O livro de Juliano Barreto conta em detalhes da trajetória do humorista Antônio Carlos de Bernardes Gomes, que saiu do Morro da Mangueira para o estrelato. O relato traz a história do ‘trapalhão’ que bateu recordes de bilheteria e de audiência, conquistou o carnaval do Rio de Janeiro com a Mangueira, pôs sua irreverência a favor da música com os ‘Originais do Samba’ e tomou suco de cevadis com gênios, como Garrincha, Cartola e Baden Powell.

Eu sou Malala Autores: Malala Yousafzai e Christina Lamb Editora: Companhia das Letras Páginas: 360 Preço: R$ 34,50

Mais vendido

No Vale do Swat, na Região Norte do Paquistão, uma menina levantou a voz em favor do direito à educação feminina e foi baleada pelo Talibã. ‘Eu sou Malala’ é um dos livros de não ficção mais vendidos do país em 2014, conforme a PublishNews. A obra conta a história de Malala Yousafzai, uma paquistanesa de 16 anos que se recuperou milagrosamente de um atentado para se tornar símbolo de protesto pacífico e a mais jovem vencedora do Prêmio Nobel da Paz. O livro narra a trajetória de luta pela valorização da mulher em uma sociedade patriarcal, machista e profundamente desigual do Oriente. Reprodução

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TERRA BRASILIS • LITERÁRIA

Sargento Getúlio (1971) Autor: João Ubaldo Ribeiro Editora: Alfaguara Páginas: 168 Preço: R$ 32,00

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O Nordeste dos anos 50 serviu de cenário para a história de Getúlio Santos Bezerra. Homem de confiança de um poderoso coronel de Sergipe, ele precisa levar um preso político de Paulo Afonso até Aracaju. Mas, no meio do trajeto, uma mudança política faz com que as ordens se alterem. A premiada obra de Ubaldo o projetou mundialmente e ganhou adaptações para o cinema, com Lima Duarte no papel principal. O livro é um dos mais importantes da literatura nacional e diz muito sobre a identidade do povo brasileiro. Reprodução

Ostra feliz não faz pérola (2008) Autor: Rubem Alves Editora: Planeta Páginas: 280 Preço: R$ 37,00

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Indicado ao Prêmio Jabuti em 2009, o livro revela muitas experiências de vida de Rubem Alves. Por meio de um texto que extrapola o formato convencional das crônicas, é possível que o leitor tenha uma visão particular sobre a existência. O educador mineiro não se furta de discutir a busca pela felicidade e contrapor essa atitude à necessidade de criar. “O ato criador, seja na ciência seja na arte, surge sempre de uma dor. Não é preciso que seja uma dor doída. Por vezes, a dor aparece como aquela coceira que tem o nome de curiosidade”, propõe. Reprodução

Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta (1971) Autores: Ariano Suassuna Editora: José Olympio Páginas: 754 Preço: R$ 70,00

eSPECIAL

Unindo elementos típicos da cultura popular nordestina, como a literatura de cordel, os repentes e a embolada, Suassuna recriou, a seu modo, um tipo de Reino de Camelot no meio da caatinga. O universo mítico do memorável ‘A Pedra do Reino’ é apresentado ao leitor como um romance autobiográfico narrado por Dom Pedro Dinis Ferreira-Quadrena. O personagem-narrador é autoproclamado Rei do Quinto Império e do Quinto Naipe, Profeta da Igreja Católico-Sertaneja e pretendente ao trono do Império do Brasil. Reprodução

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crÖNIca

Joanita Gontijo

Comportamento

Confiar: sempre a melhor opção – De agora em diante, não vou confiar em mais ninguém! Serei outra pessoa. Com essa frase, minha amiga Laura encerrou um longo desabafo sobre seus últimos dias. Em uma semana, ela descobriu uma série de pequenos e grandes ‘golpes’ dos quais era vítima. O primeiro estelionatário foi um ‘ficante’. Havia meses que ele se declarava cada vez mais apaixonado, e Laura se enchia de esperanças de ter um relacionamento sério. Mas tinha um problema: ela não era a única. O ‘dito-cujo’ preferia estar com dois pássaros voando a ter um na mão. As pombinhas que se alimentavam do seu corpo, de sua boca e de suas promessas de amor eterno estavam sendo testadas, e não sabiam. A competição acabou para Laura assim que ela descobriu a safadeza do ‘peguete’. Sua confiança no amor teve uma indigestão de alpiste e morreu.

“Deixar de confiar não é se proteger da maldade alheia”

O segundo golpe lhe causou prejuízo financeiro. Há uma década, minha amiga leva o carro à mesma oficina. Como não entende nada de rebimbocas de parafusetas, jamais questionou o diagnóstico do mecânico. A vistoria, quase sempre, vinha acompanhada de uma frase nada auspiciosa: “Se não trocar a peça agora, o carro vai parar e você vai pagar muito mais caro depois”. Mesmo seguindo os conselhos do moço, essa semana o carro parou. O reboque o levou para a oficina mais perto. Com outro mecânico, Laura descobriu que nenhuma das peças compradas na última revisão era nova. Sua confiança nos prestadores de serviço ficou manchada de graxa e, pelo jeito, nada vai deixá-la branca novamente. 50 | www.voxobjetiva.com.br

Para encerrar esses ‘dias de cão’, Laura descobriu mais uma: a empregada, que trabalha na sua casa há cinco anos, não é tão dedicada quanto parece. Nos dias em que minha amiga não almoça em casa, os filhos têm apenas macarrão instantâneo – vulgo miojo – como opção. Prático, rápido e nada saudável. Assim sobrava tempo para a empregada ver TV e espalhar para as colegas do prédio e os porteiros os detalhes das brigas que Laura tem com a filha adolescente. O nome da patroa está na boca do povo, e a confiança em quem divide o mesmo teto desabou como em um elevador em queda livre.

A sensação de que somos enganados o tempo todo e pelo mundo inteiro é desesperadora e nos visita frequentemente. Dá vontade de entrar em um casulo blindado e ficar só observando qualquer aproximação. Sentimos raiva de quem nos engana, mas ainda mais de nós mesmos por termos confiado em quem nos enganou. Confiar é abaixar a guarda e entregar ao outro o direito de cuidar do que é nosso. Embora a escolha seja do outro, acreditamos que ele venha a fazer o melhor para nós e por nós. Mas nem sempre funciona assim. Agir como Laura não ajuda em nada. Deixar de confiar não é se proteger da maldade alheia, mas boicotar qualquer relação sincera. Se você se sente enganado, seja esperto. Não deixe que uns ou outros mudem sua essência. Continue confiando! Há muita gente por aí que merece. E você não vai abrir mão de conhecer as pessoas certas, vai?

joanita Gontijo jornalista e autora do livro “70 dias ao lado dela” joanitagontijo@yahoo.com.br


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