Manual de História do Brasil

Page 69

UNIDADE I – IMPÉRIO

ultramarinos”48. As forças da imaginação se desenvolveriam melhor no Novo Mundo, o que traria vantagens para os nascidos no continente. Quanto a outros aspectos do pensamento, como as faculdades racionais e a capacidade científica, caberia aos filósofos ilustrados americanos a missão de transmiti-los. No Brasil, a teoria climática de Montesquieu e Buffon foi debatida por Azeredo Coutinho, Gonçalves de Magalhães, Santiago Nunes Ribeiro, Sílvio Romero e Araripe Júnior. O bispo Azeredo Coutinho representa o lado oficial e reformador da ilustração ibérica, tendo fundado o Seminário de Olinda, de orientação científica e experimental, e ocupado um dos últimos postos de inquisidor de Portugal. No Ensaio econômico sobre o comércio de Portugal e suas colônias (1794), afirmou a coragem e a imaginação ardente dos americanos, contestando a teoria climática de Montesquieu com uma combinação de argumentos históricos e teológicos: a teoria das fibras nervosas faria supor “o absurdo que o Criador do universo só soube criar fibras próprias para os climas frios e temperados, mas não para o da Zona Tórrida”.49 Gonçalves de Magalhães, no Discurso sobre a história da literatura do Brasil (1836), atribuiu a futura autonomia da literatura brasileira à influência do meio, demonstrada por Buffon e Montesquieu: Pode o Brasil inspirar a imaginação dos poetas, e ter uma poesia própria? [...] Tão geralmente conhecida é hoje esta verdade, que a disposição e caráter de um país grande influência exerce sobre o físico e o moral dos seus habitantes, que a damos como um princípio, e cremos inútil insistir em demonstrá-lo com argumentos e fatos por tantos naturalistas e filósofos apresentados. Aí estão Buffon e Montesquieu que assaz o demonstram.50 Magalhães valoriza a natureza local, cuja beleza compensaria a debilidade da cultura no Brasil. Propõe que os poetas brasileiros retratem a América, junto com os costumes indígenas, ao invés de se inspirarem na natureza clássica, cantada por Homero, Píndaro, Virgílio e Horácio. Para isso, invoca o testemunho, tido como insuspeito, dos viajantes estrangeiros sobre a exuberância da pátria: Falem por nós todos os viajores, que por estrangeiros não os tacharão de suspeitos. [...] o coração do Brasileiro, não tendo por ora muito de que se 48 UNÁNUE, Hipólito. Observaciones sobre el clima de Lima (1806) in Obras científicas y literárias,

v. 1, p. 103. COUTINHO, Azeredo. Ensaio econômico sobre o comércio de Portugal e suas colônias (1794) in

49

Obras econômicas, p. 103. 50 MAGALHÃES, G. De. Discurso sobre a história da literatura do Brasil (1836) in Caminhos do pensamento crítico, org. A. Coutinho, v. 1, p. 23.

69


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.