Manual de História do Brasil

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MANUAL DO CANDIDATO – HISTÓRIA DO BRASIL

presidenciais salvadores, gigantescos do seu tamanho como na sua fantasia, que tornariam o país uma terra de abundância e igualdade. Reforçam-se assim mais uma vez algumas características de sistemas pretorianos; a capacidade mágica e todo-poderosa do presidente da República e o aumento do teor ilusório das expectativas sociais. 8) Todavia, os meios de comunicação revelam o caráter inautêntico da vida pública brasileira, resultado das características patrimonialistas do Estado e da ação das elites econômicas e políticas, para as quais a fronteira entre o bem público e o bem privado é profundamente obscura. Enraizada no desenvolvimento político do país, aprofundada durante o autoritarismo, a liberalização política torna transparente essa inautenticidade da vida política, que faz do espaço público uma arena para a manifestação das necessidades privadas, e não o lugar onde concepções conflitantes sobre o bem público se expressam e entram em disputa. Se para os políticos brasileiros a ação política não pode ou não deve ser dirigida para o debate ou para a representação dessas concepções, limitando-se eles a exercer o papel de “clientela de Estado”, a ação política da população passa a orientar-se para a descarga de frustrações enraizadas, ou para a imposição de punições ritualísticas aos políticos por meio do processo eleitoral. A inautenticidade e a desmoralização da vida pública brasileira dão um sentido maléfico às instituições partidárias e aos processos que lhes são correlatos. Mesmo aqueles que entram no processo político com idéias mais articuladas sobre seus valores e objetivos passam a perceber que pouca cousa no mundo dos partidos ou das eleições permitem a expressão do que sentem ou necessitem e, incapazes de articular suas posições públicas, utilizam-se do sistema político para expressar suas preocupações privadas. Quando as diretrizes sobre o processo de desenvolvimento econômico ou sobre o modelo de modernização não são elas mesmas objetos de debate público, o voto – que deveria ser uma forma, mesmo que genérica, de expressar objetivos – pode-se revelar, como tem ocorrido inúmeras vezes no Brasil, um instrumento privilegiado utilizado pela maioria da sociedade para manifestar de modo plebiscitário sua rejeição da vida política. Quando somente as necessidades privadas são projetadas na arena pública – ou pelo menos o processo é assim percebido pela sociedade –, não é de surpreender que, à medida que o crescimento econômico diminui e a insegurança e incerteza aumentam, os votantes tendem a se voltar para aqueles políticos que se denominam “pragmáticos”. É muito mais fácil falar sobre a necessidade de

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