CARNAVAL EM RAUL SOARES

Page 8

A devolução das almas

Raiou no céu em puro encanto sutil o sol do verão! Era 2005, em Belo Horizonte, em suas ruas coloridas de passos e carros enfileirados. Pessoas inquietas caminhando em direção ao trabalho, pelas calçadas da cidade. Um grande exército urbano nas calçadas da região central executando a manutenção do sistema da sociedade humana em nosso planeta! Havia juventude! Fevereiro, tempo de festas! Lembro que fui visitar a cidade de Raul Soares, interior de Minas Gerais. Fui a convite do tio Geraldinho, pois havia lugar sobrando no carro dele, porque somente o Ramom estava indo, a Vanessa não iria. O primo Mauro foi em seu carro com sua namorada, um colega de serviço e o primo Christiano. Época de carnaval. Nós estávamos naquele carro, a estrada bastante movimentada com as pessoas indo pra algum lugar: Sabará, João Monlevade; Rio Casca; Espírito Santo, ou então morrer no meio do caminho. Um clima de tristeza na estrada da morte, famosa rodovia BR 381, cujas curvas incrustadas nas montanhas parecem ter sido esculpidas pela própria morte, arquitetadas para colocar fim na vida do homem. Armadilhas milimetricamente projetadas para que os automóveis encontrem o seu destino mais cruel! Talvez indo de encontro a outro, ou despencando pelos desfiladeiros. Não havia sombra nem nuvens, somente o sol do verão. O ar era cinzento, sensação de quando estamos com febre alta e os olhos doem quando forçamos para olhar as coisas. Carros seguindo em fila, caminhões carregados de mercadorias, motocicletas, pessoas se arriscando ao atravessar, animais à beira do asfalto... Quando passei senti que várias almas se apegavam a mim, encantadas por desejos não realizados, sonhos, planos...oprimidos pelas curvas da estrada. Subtraídos, surrupiados pelo destino dessas curvas que pesam nessa parte do mundo, de tanta tristeza e tanta dor! Coisas que não foram vividas, alegrias não compartilhadas de uma viagem que talvez se desejasse há muito tempo, que jamais chegou a se concretizar. Às vezes me dava medo quando eu via algumas formas espectrais tentando entrar pelo vidro do carro, outras agarradas no teto ou na parte da frente do carro. Eu ouvia os seus gritos apavorantes! Gritos que assustam, mas não são de maldade, mas de desespero. Eu não comentei nada sobre isso com ninguém, até hoje. Eu era alegre e livre, tanto que para passar o carnaval até tingi meus cabelos de vermelho fogo, só pra destacar minha rebeldia, ou se

8


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.